Os trabalhos de drenagem do Zuiderzee

1930

Zuiderzee

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ZUIDERZEE é um filme inicial da obra de Joris Ivens, dos anos 1930, na Holanda. Não é dos
primeiros, filmes de família dos anos 1910 e 1920, e os primeiros célebres, de finais dessa
década, ÉTUDES DE MOUVEMENTS, DE BRUG, REGEN, acompanhados do filme em que Rouch
filmou Ivens em 1980, CINEMAFIA. Por estranho que possa parecer assim dito, indo na terceira
década de vida a filmar, Joris Ivens estava na fase inicial da obra que, diz-se, repete-se e não
só faz parte da lenda como é um facto independentemente dela, acompanha o movimento da
História do século XX. No mesmo gesto, acompanha igualmente a história do cinema do
século XX e neste sentido é justo defender que o belíssimo ZUIDERZEE é um filme em fase
com esse duplo movimento, da História e da História do cinema. Centrando-se, na construção
do dique de Wieringermeer que isola o Zuiderzee do Mar do Norte, reflecte o espírito da
época. ZUIDERZEE guarda de DE BRUG e REGEN o espírito das vanguardas europeias.
Plasticamente fulgurante, fulgurantemente dirigido ao elemento humano e na acção da sua
força de trabalho, é também, já, de um olhar militante que se trata, da militância que Ivens
assumiu como prática cinematográfica documental. Está em causa o trabalho dos homens,
num combate com a terra e a natureza, a domar pela acção do homem
ZUIDERZEE é um filme exaltante, um filme de imagens exaltantes. Em quatro partes,
distinguidas por separadores que as identificam em intertítulos explicativos, registam-se as
fases e as técnicas do processo de drenagem das terras para a construção do dique,
assinalando a conquista do território ao mar pelos holandeses. Documentando-as, o que a
câmara fixa com uma invulgar força é o trabalho dos homens nesse desafio ao mar. Os planos
são compostos pelos movimentos dos homens e das máquinas e ferramentas que os
coadjuvam no seu trabalho. Tudo mexe dentro dos planos, que toma o movimento da
realidade e frequentemente se junta a ele, pondo a câmara em circulação, obtendo uma
vitalidade e uma euforia absolutamente consonantes com a força visual de cada
enquadramento, de cada cena, de cada sequência. O espírito dos estudos de movimento, da
poesia do olhar dos filmes de vanguarda – o raccord com DOURO, FAINA FLUVIAL de Oliveira,
da mesma altura, é evidente visto daqui – trabalhado em DE BRUG e REGEN, é posto ao serviço
da ilustração de um processo que esse mesmo espírito devolve numa dimensão ampliada, no
limite negando-lhe o lado meramente ilustrativo. Filmados individualmente ou no colectivo
da sua força de trabalho, usando a força das suas mãos ou operando as máquinas que têm ao
dispor, os operários de ZUIDERZEE são personagens de uma odisseia dramática que é
simultaneamente um poderoso motivo visual.
Contado por Ivens (em Joris Ivens ou la Mémoire d’un Regard, 1982, retomado em tradução
portuguesa no catálogo publicado pela Cinemateca em 1983), o emblemático episódio da
recepção pública do filme na Rússia, para onde viajou em 1930 juntando-se a Pudovkin dá
conta da justeza do seu olhar: no final de uma projecção na casa dos trabalhadores em
Moscovo, organizada para uma público de mineiros, Ivens é interpelado com uma torrente de
questões que, entre uma série de pormenores técnicos e laborais relacionados com o processo
de trabalho filmado, o interrogam sobre as suas origens sociais. Dando conta da sua
descendência da média burguesia, o “cidadão Ivens” é acusado de ser “um farsante e um
mentiroso” por um dos espectadores porque o operário russo, que deslocava pedras à
semelhança dos trabalhadores holandeses do filme, achou, especificamente a partir da
sequência em que Ivens filma o transporte dos blocos de pedra sobre o dique, que “quem fez o
filme percebe do assunto. Viu as coisas como eu as vejo e como eu as sinto, não é nenhum
filho de burguês que filmou aquilo”. À assembleia de operários russos, Ivens conta então
como se tinha apercebido durante as filmagens de que “precisava sentir como deveria filmálos, precisava de perceber o peso das pedras, sentir nos meus músculos o mesmo esforço que
eles e, como quando avançara pelo mar dentro para filmar a rebentação, tinha de entrar
fisicamente no seu elemento”. O que tinha feito, como a seguir descreve, concluindo como
essa experiência lhe permitira aprender a saber o que fazer com a câmara. O remate do
episódio dá conta como, para além de arrebatar o público de mineiros, o “camarada holandês”
lhes prova saber “observar e filmar os trabalhadores” assim conseguindo “a possibilidade de
realizar um filme sobre os trabalhadores da URSS no quadro do plano quinquenal”. Diz-nos
naturalmente mais do que isso sobre a personalidade e a obra de Ivens, oferecendo-se como
uma chave do seu entendimento cinematográfico.
Maria João Madeira

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