O Clube

Em O Clube, a união entre os padres que moram juntos em um local distante e recluso pode ser vista como um modo de autopreservação e a sobrevivência deles na sociedade - ainda que o contato destes com pessoas fora da casa onde vivem seja estritamente proibido. Eles não possuem uma história em comum ou são de qualquer forma relacionados, apenas compartilham segredos sujos e atos criminosos que marcaram suas vidas religiosas. Encobertos pela igreja católica para que a sua reputação não fosse afetada, vemos que os padres não se arrependem de seus crimes odiosos e, além disso, se consideram inocentes.

Afastados de suas obrigações eclesiásticas e colocados em uma casa que tem como objetivo recuperá-los, acompanhamos os padres em uma rotina diária baseada em missas, orações, confissões e, nos momentos de lazer, corridas de cachorros. Eles tentam achar um equilíbrio para suas vidas desgraçadas no apoio e companhia entre eles. O diretor Pablo Larraín é eficiente ao representar a união dos padres em planos que mostram o grupo reunido em volta da mesa durante as refeições, na sala cantando hinos e rezando, e na cena em que eles estão no cemitério. Com a chegada do padre Lazcano (José Soza), a aparente tranquilidade em que eles vivem é quebrada, resultando em uma série de eventos violentos.

Responsável pela gestão da casa e pelo cuidado do padres, a Irmã Mónica (Antonia Zegers) se dedica em período integral ao seu ofício e mantém sempre um sorriso nervoso e falso no rosto. No entanto, ela não deve ser vista como um membro fora do grupo dos padres, Mónica também possui um passado obscuro e problemático. Apesar de compartilharem histórias horríveis, estarem deslocados socialmente e serem obrigados a seguir um conjunto de normas e regras, os padres não hesitam em culpar o padre Lazano por suas ações. Sandokan (Roberto Farías), um pescador da região, aparece na frente da casa e grita, bêbado, durante muito tempo, com detalhes explícitos e pornográficos, os abusos que sofreu quando era criança e servia como coroinha de Lazcano. À luz dos acontecimentos, a igreja católica envia o padre García (Marcelo Alonso) para investigar e determinar o futuro da casa, se ela merece continuar funcionando ou deve ser fechada. Podemos, dessa forma, conhecer os motivos que colocaram os padres naquela casa.

Esses personagens frágeis e problemáticos são enquadrados em planos fechados de seus rostos cansados e velhos que, com o decorrer do filme, criam um desconforto no espectador conforme conhecemos a personalidade e história de cada um deles. A intimidade que Larraín tenta criar se transforma em repulsa, e qualquer empatia que desenvolvemos pelos personagens se perde rapidamente. Igualmente importante no desenvolvimento da atmosfera opressiva e melancólica do filme é o trabalho do diretor de fotografia Sergio Armstrong, que confere ao longa um visual sujo, como se estivesse coberto por uma fina camada de fuligem, e mostra a horrível realidade daquela casa através de uma paleta acinzentada de cores, além de escurecer e borrar as laterais da tela. 

O Clube divide sua atenção entre todos seus personagens e a trama explora o lado psicológico deles, além de questionar a gravidade de seus atos e o fato deles não enxergarem - ou escolherem não enxergar - as responsabilidades que deveriam assumir. Apesar de só conhecermos uma das vítimas, Sandokan, é difícil não sentirmos pena e nos solidarizarmos com seu sofrimento. Seu passado não permite que ele tenha uma vida normal e as lembranças dos abusos contribuem para o desenvolvimento de sua personalidade perturbada e instável. Sua concepção deturpada de santidade e proximidade de Deus é associada ao sexo que tinha com Lazcano, que acaba se tomando uma fissura e toma conta de sua vida e prejudica seu discernimento. A cena em que Sandokan transa com uma mulher é triste e incômoda, e ilustra os conflitos que ele enfrenta com a própria sexualidade. 

“Levamos uma vida santa.” diz a Irmã Mónica para o padre García quando esta tentava convencê-lo da recuperação dos outros padres. No entanto, a intimidade que Larraín constrói entre os personagens e o espectador revela uma verdade totalmente diferente da dita por Mónica. Verdade que nem ela parece acreditar.  

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