The Mandalorian – Temporadas 1 e 2 (2019-2020)

Por André Dick

Este texto apresenta spoilers

A série Star Wars ganhou uma nova trilogia na década passada, com uma reinicialização nas mãos de J.J. Abrams, em O despertar da força, que também a encerrou, com A ascensão Skywalker. No meio do caminho, foram feitos dois spin-offs, Rogue One e Han Solo, ambos tentando desenvolver histórias paralelas à central, com destaque para o primeiro, uma grande realização de Gareth Edwards, recuperando elementos do filme original dos anos 70. Já no final dos anos 2010, a Disney colocou no ar, por seu canal Disney+, a série The Mandalorian. O intuito era usar esse universo criado por George Lucas focando na linhagem dos mandalorianos, da qual fazia parte o caçador de recompensas Boba Fett, da primeira e segunda trilogias.
Interpretado por Pedro Pascal, o Mandaloriano inicia a série sendo requisitado por Greef Karga (Carl Weathers), num bar em Maldo Kreis, a encontrar uma criatura misteriosa, que parece, como se fala, um bebê Yoda, a fim de que possa ser entregue ao Império, a um homem denominado cliente (o cineasta Werner Herzog). Depois de conseguir encontrar a criatura, ele inicia a volta para a entrega. Este é o início de uma aventura que irá se estender a outros personagens e planetas. Ele se depara com os jawas no segundo episódio, que roubam parte de sua nave para vender como sucata e pedem um favor em troca da devolução, com a ajuda de Kuiil (Nick Nolte), interessado em se livrar dos mercenários que cresceram com a retomada do Império.

Mais adiante, o Mandaloriano, por acontecimentos do segundo episódio, tem a impressão de que a criatura possui mais poderes extraordinários do que se imagina e pensa em recuperá-la das mãos do império. Então, ele segue para Sorgan, um planeta repleto de pântanos, a fim de se esconder com a criatura. Lá, ele encontra a shock trooper “Cara” Dune (Gina Carano), e acaba se abrigando numa aldeia. Quando volta a Maldo Kreis, ele vai pedir novamente a ajuda de “Cara” e de Kuiil, quando se vê numa situação complicada e que o coloca frente a frente com uma figura que emerge no Império.
Esta primeira temporada de The Mandalorian tem todos os elementos que remetem principalmente à primeira trilogia clássica, com sua paisagem desértica e um clima de faroeste nas cantinas onde o Mandaloriano entra. No quarto episódio, dirigido com muito talento por Bryce Dallas Howard, filha de Ron, de Willow e Han Solo, isso é um destaque, mesclando-se também às paisagens de O retorno de Jedi e O império contra-ataca. No oitavo episódio, encerrando a temporada, de Taika Waititi, as imagens remetem ao primeiro Star Wars e um pouco a Rogue One, também pelo auxílio na fotografia do mesmo Greig Fraser em alguns episódios, como no todo a concepção da série criada por Jon Favreau. Um elemento que começa mais estranho talvez (por se diferenciar bastante daquela de John Williams para o cinema) é o da trilha sonora de Ludwig Göransson, com menos estilo épico, mas que depois vai se adequando aos episódios.

Favreau é um dos nomes que conseguiram se adaptar à nova realidade da Disney, abastecida principalmente por live-actions e os universos da Marvel e de Star Wars. Diretor dos dois primeiros Homem de Ferro e de Mogli e O rei leão, Favreau faz uma dosagem milimétrica das aspirações de George Lucas com uma nova visão sobre planetas distantes. Diretor também de Cowboys & aliens, ele mescla bem a ideia de Star Wars como um faroeste espacial, assim como consegue estabelecer um vínculo sentimental entre o Mandaloriano e a criatura, com a tentativa sempre do primeiro em proteger o segundo, mesmo que este tenha poderes incomuns. Também há o uso muito pertinente de Kuiil, que lembra as figuras mais simpáticas da série criada por George Lucas, com um misto de bondade e perseverança, lembrando, pelo tamanho, tanto os jawas quanto os ewoks.
O episódio inicial da segunda temporada, que Favreau também dirige, mostra bem esse detalhe, quando mostra o Mandaloriano procurando seus pares, acabando por chegar a Mos Pelgo, em Tatooine, um lugar onde o xerife da cidade, Cobb Vanth (Timothy Olyphant), tem uma armadura mandaloriana. Ele não é um mandaloriano de origem, tendo comprado a armadura de jawas, e ambos decidem enfrentar o Grande Dragão Krayt, que ataca constantemente o gado da cidadezinha, com a ajuda dos Tusken Raiders, um povo do deserto. Este é um episódio épico, com o melhor de Star Wars mesclado com filmes de Clint Eastwood, além de elementos de Duna, de Frank Herbert, e O senhor dos anéis, com traços decisivamente grandiosos, fazendo com que muitos experimentos que Abrams tentou fazer em O despertar da força, no uso exatamente do deserto, ecoando Tatooine, soem pouco interessantes. É interessante como Favreau utiliza os melhores elementos exatamente dos episódios de Dallas Howard, no uso frequente de imagens que remetem a uma certa nostalgia, mas, ao mesmo tempo, trazem algo novo e instigante. E Olyphant é um destaque, fazendo uma homenagem também às suas participações em Deadwood e Era uma vez em… Hollwyood. Do mesmo modo, os três episódios de Rick Famuyiwa, que fez o interessante Dope e estava escalado para dirigir anos atrás o filme de The Flash, são muito competentes ao lidar com imagens desérticas e de floresta, compondo um panorama visual para a série.

No segundo episódio da nova temporada, o diretor de Homem-Formiga Peyton Reed se inspira no melhor visual proporcionado pela trilogia mais recente de J.J. Abrams e Rian Johnson, com ecos de O império contra-ataca, para mostrar o Mandaloriano tentando levar uma mãe alienígena que lembra uma rã e os ovos não fertilizados para uma lua chamada Trask, onde seu marido irá inseminá-los e poderá oferecer ao Mandaloriano informações sobre seus pares. Isso acontece no terceiro episódio, dirigido novamente com grande talento por Bruce Dallas Howard, com uma atmosfera que remete a Han Solo, de seu pai Ron, mas com uma concepção visual mais atraente e cenas de ação impressionantemente reais. No episódio de Reed, há um clima que remete tanto a O império contra-ataca quanto à série O senhor dos anéis, no uso de túneis assustadores e criaturas gigantes, considerando-se que, visualmente, a série nunca se limita a uma derivação, mas vai expandindo elementos visuais.
No episódio seguinte, o Mandaloriano reencontra Greef Karga e “Cara” Dune e os ajuda a enfrentar uma base imperial, enquanto recebe como favor a reconstrução da sua nave avariada depois de idas e vindas. Este é o ponto inicial para que, atrás de um jedi que possa cuidar da criatura, o Mandaloriano vá para o planeta florestal de Corvus. Lá, uma jedi, Ahsoka Tano (Rosario Dawson), confronta Morgan Elsbeth (Diane Lee Inosanto), governante da cidade de Calodan. O Mandaloriano é chamado por Elsbeth para enfrentar a jedi. Com um design de produção notável, este é um segmento inspirado claramente nos filmes de Akira Kurosawa, principalmente Os sete samurais, e tem um duelo que remete a Kill Bill, de Quentin Tarantino. Além do design de produção refinado, são belíssimas as cenas numa floresta, que evocam algo tanto de The Clone Wars, a série de animação de Star Wars, quanto fantasias dos anos 80, como A lenda e Krull. Neste episódio, também fica mais clara a intenção do Mandaloriano de encontrar um lar para a criatura que carrega com cuidado, mostrando uma faceta cada vez mais dedicada a fazer o certo, o que fica claro na atuação de Pedro Pascal, mesmo encoberto pela máscara (sob certo ponto de vista, mesmo com a mitologia do personagem, explicada reiterada vezes, de forma um pouco injusta para a desenvoltura do ator).

Na procura de um espaço para a criatura, o personagem central acaba indo parar em outro planeta onde há uma pedra na qual se poderá ter contato com forças capazes de atrair um jedi. Com ótimas lutas, este novo episódio, decisivo para a criatura que parece um bebê Yoda, tem na direção Robert Rodriguez, mais dedicado depois de seu interessante experimento visual Alita – Anjo de combate, que prepara para o sétimo e oitavo episódios, novamente com aventuras do Mandaloriano em novos planetas, e um grande momento final, sob a direção novamente de Peyton Reed, na entrega de uma grande surpresa para o espectador.
Nesta segunda temporada, Favreau restabelece a premissa de The Mandalorian: um ritmo mais lento, mais contemplativo, do que o dos filmes, e ainda assim com elementos ágeis para que o espectador se interesse pela história. A maneira como ele costura os elementos épicos e não deixa o espectador desnorteado com as viagens espaciais, mas sempre situado em lugares-chave para que se possa ter um vínculo também com os personagens, é muito bem realizada. O formato também de oito episódios por temporada, com cada duração tendo em média 30-50 minutos, não deixa o espectador cansar em relação à narrativa. Tudo vai num crescente, ou seja, cada episódio, mesmo construindo uma história independente, remete a um mosaico geral em que as peças vão se encaixando de maneira que agradam tanto ao fã de Star Wars quanto ao espectador que está chegando a este universo fascinante. Com uma produção minuciosa e atuações competentes de modo geral levando a trama adiante, The Mandalorian não fica nada a dever para a saga do cinema, sendo, ao mesmo tempo, uma continuidade e uma expansão da melhor qualidade.

The Mandalorian – Season 1 and Season 2, EUA, 2019-2020 Direção: Dave Filoni, Rick Famuyiwa, Deborah Chow, Bryce Dallas Howard, Taika Waititi (1ª temporada), Jon Favreau, Peyton Reed, Carl Weathers, Rick Famuyiwa, Bryce Dallas Howard, Dave Filoni, Robert Rodriguez (2ª temporada) Criador: Jon Favreau Elenco: Pedro Pascal, Carl Weathers, Timothy Olyphant, Rosario Dawson, Werner Herzog, Gina Carano, Nick Nolte, Diane Lee Inosanto Fotografia: Greig Fraser, Barry “Baz” Idoine, Matthew Jensen, David Klein Trilha Sonora: Ludwig Göransson Produtores executivos: Jon Favreau, Dave Filoni, Kathleen Kennedy, Colin Wilson Duração: 32-54 min. (16 episódios). Estúdio: Lucasfilm, Fairview Entertainment, Golem Creations Distribuidora: Disney Platform Distribution

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