A partida (2008)

Título original: Okuribito

Título em inglês: Departures

País: Japão

Duração: 2 h e 10 min

Gêneros: Drama

Elenco Principal: Masahiro Motoki, Ryôko Hirosue, Tsutomu Yamazaki

Diretor: Yôjirô Takita

IMDB: http://www.imdb.com/title/tt1069238/


A morte é tão banalizada em obras audiovisuais, principalmente quando pensamos em cinema de terror, horror, suspense e afins – e até mesmo em outros gêneros -, que, quando nos deparamos com um filme que trabalha a temática de uma forma bela e singela e concede a ela ares de normalidade, de passagem para outro plano, de agradecimento pela vida que se encerrou, temos realmente que aplaudir de pé. “A partida” é um filme especialíssimo, que utiliza a cultura oriental – cuja característica no tocante à morte apresenta o respeito como princípio basilar – como pano de fundo para proporcionar a seus espectadores uma experiência recheada de muito humor, drama e enormes emoções. O filme foi baseado no livro Nokanshi Niki (Diário de Nokanshi, 1993) do poeta e escritor Aoki Shinmon e foi o ganhador do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2009.

Eis a sinopse: “Após o fechamento da orquestra, na qual toca violoncelo, Daigo fica desempregado e consegue um emprego de nokanshi, ou seja, aquele que limpa, faz a maquiagem, o tamponamento, a troca de roupa e conduz o ritual de passagem – ou acondicionamento – dos cadáveres em cada funeral, chamado de noukan. Por conta disto, ele é discriminado pela sociedade local e até pela sua esposa, por este ser considerado um trabalho impuro e que denota vergonha. Após suportar todas as implicações que seu ofício proporciona, o destino e a morte fazem com que ele compreenda o sentido da vida e resolva um dilema familiar que há décadas o atormenta.”

Há duas correntes narrativas que caminham lado a lado em “A partida“: a que trata da morte propriamente dita, ao desnudar o trabalho de acondicionar e purificar os mortos para a derradeira viagem e tudo que cerca esse processo, inclusive o foco no comportamento de alguns enlutados; e o relacionamento mal resolvido entre um pai ausente há 30 anos e seu filho, que é o protagonista. Ambas as correntes narrativas transitam entre o presente e o passado. Nota-se, sem muito esforço, que o filme é previsível. Um pai que deixou a família e que, na linha temporal presente da narrativa, possui um filho que trabalha como nokanshi – e a morte como temáticas preponderantes. Não precisa ser gênio para pensar em um final óbvio, no entanto, o filme encanta pela quantidade de simbolismos que apresenta e a excelente adaptação que transformou temas espinhosos – e tendentes a serem obscuros – em poéticos.

Em relação à morte, a palavra-chave que resume o tratamento dado pelo filme é a dignidade, que a narrativa não deixa de exaltar em nenhum segundo. O filme se presta a quebrar tabus e preconceitos, pois a promoção dos mortos à condição de belos no cerimonial funerário japonês vai de encontro ao medo da morte, que é absolutamente normal entre os vivos. A boa aparência dos mortos é mostrada como sinal de uma agonia que se pretende tornar insensível – e invisível – aos que permanecem, para que o processo de passagem seja realizado em paz, sem maus sentimentos ao redor, só com saudades e agradecimentos, apesar de haver exceções dotadas de um aprendizado instantâneo, pela observação de todo o processo durante os funerais. Além disso, outras situações simbolizam a impossibilidade de separar a vida da morte, pois, onde há vida, a morte está sempre presente, como a cena dos salmões, do polvo, da galinha morta, do jantar, etc. Nesse contexto, o roteiro possui uma necessidade premente de sugerir que a morte é um tema intrínseco da própria humanidade, que não é feia, não é impura, é um processo natural, biológico e relacionado diretamente à vida, cuja busca do sentido é primordial para o entendimento de seu momento final.

Mesmo transformando a morte em poesia, os momentos mais emocionantes do filme são reservados à (pouca) relação mostrada entre pai e filho, através dos sonhos frustrados, das promessas não cumpridas e das saudades convertidas em queixumes, em tristeza. A ligação entre passado e presente é imperiosa e realizada através de lindas melodias do violoncelo – o que concede uma beleza inenarrável ao filme – e através de um objeto importantíssimo: uma “pedra-carta” – extraída da cultura japonesa. O relacionamento mal resolvido com o pai ressurge de forma decisiva, por Daigo enfrentar cotidianamente a morte, que também é a responsável pelo acalentamento de seu coração e a obtenção de compreensão em relação a seu genitor. A morte traz o perdão e exalta a vida no ciclo infinito e natural da espécie humana. Um belo simbolismo!

No fim de tudo, percebe-se que “A partida” conquista a todos com um roteiro que versa sobre a morte, mas que no fundo mostra mesmo é a beleza da vida.

O trailer, com legendas em português, segue abaixo.

Adriano Zumba


 

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