O tradutor (2018)

Título original: Un traductor

Título em inglês: A translator

Países: Cuba, Canadá

Duração: 1 h e 47 min

Gênero: Drama

Elenco Principal: Rodrigo Santoro, Maricel Álvarez, Yoandra Suárez

Diretores: Rodrigo Barriuso, Sebastián Barriuso

IMDB: https://www.imdb.com/title/tt4488744/


Opinião: “Uma belíssima história humanista que merece ser conhecida.”


Considero como uma das facetas mais interessantes do cinema apresentar personagens anônimos que participaram, de alguma forma, de passagens importantes da história da humanidade. Em 1986, o reator 4 da usina nuclear de Chernobil, na Ucrânia, explodiu e provocou o maior acidente nuclear da história de nosso planeta. Nessa tragédia, muito se fala dos liquidadores, que foram pessoas que ajudaram a minimizar as consequências do desastre, no entanto, como em todo acontecimento relevante, há muitos coadjuvantes ignorados e/ou esquecidos pela história, que cumpriram funções de suma importância dentro do contexto – aqueles chamados “heróis anônimos”. Assim, mais uma vez, um desses coadjuvantes tem sua emocionante atuação revelada para o mundo pela sétima arte, mesmo  estando tão distante do local da catástrofe, mais precisamente em Havana, Cuba: Manuel Barriuso Andino, que no filme se chama Malin.

Eis a sinopse: “Após o acidente nuclear de Chernobil, mais de 25.000 pessoas vieram da URRS para Cuba, que possuía um dos melhores sistemas de saúde do planeta, para se tratarem dos malefícios decorrentes da grande exposição à radiação imposta à população pelo desastre. Nessa conjuntura, alguns professores de literatura russa foram recrutados para trabalharem no Hospital de Havana no intuito de traduzirem as palavras dos médicos para os pacientes soviéticos e seus familiares que lá estavam. Um deles, Malin, foi alocado para trabalhar na ala que abrigava as crianças cancerosas do hospital, e essa experiência mudou a sua vida, interferindo, inclusive, em seu cotidiano familiar.”

Para melhor entendimento, há de haver um conhecimento prévio da conjuntura global da época dos acontecimentos. O mundo estava em ebulição: o Muro de Berlim tinha caído (1989); o colapso da URRS estava cada vez mais próximo (1991); Cuba passava por sérias dificuldades de abastecimento por conta de uma relação cada vez mais distante com os soviéticos, que, historicamente, enviavam ao país combustíveis e alimentos, para minimizar os embargos comerciais impostos à Cuba pelos Estados Unidos; etc. Tudo isso é mostrado ou subentendido no filme em tela de alguma maneira, mas, em alguns momentos, esses fatos históricos carecem de uma melhor explicação em nome da inteligibilidade da narrativa. No meio dessa metamorfose mundial – duros golpes ao socialismo, diga-se de passagem – e suas consequências para a população cubana, a história real do pai dos dois diretores é contada, tanto em seu aspecto íntimo, através de sua relação com a família, quanto em seu aspecto laboral, e, porque não, histórico, através de seu trabalho como tradutor na ala infantil do Hospital de Havana.

Como se depreende, há dois fios condutores em “O tradutor“: a relação de Malin com a família e sua atuação no hospital. São duas histórias fortes e é nessa peculiaridade que a narrativa derrapa, ou seja, ambas retiram força uma da outra, pois são mostradas concomitantemente. São duas linhas narrativas que requerem desenvolvimento aprofundado para que denotem completude, mas que, apesar de todo o esforço empregado, terminam na seara da superficialidade. Nenhuma das duas histórias apresenta um nível de detalhamento satisfatório, o que não chega a atrapalhar a experiência proporcionada ao espectador, mas deixa aquela sensação de que faltou algo, pois não é rara a observação de um certo “atropelamento” das cenas. Dá-se muita importância à vida privada de Malin e sua jornada de transformação íntima – como se fosse o argumento principal do filme -, o que torna a narrativa um tanto quanto desinteressante, pois sua atuação como tradutor – e até pedagogo ou educador – é muito mais relevante, pois problemas familiares como o dele são absolutamente banais e abordados com bastante recorrência na história do cinema.

Todavia, pontos positivos abundam na obra. O principal deles talvez seja a atuação de Rodrigo Santoro, não só pela excelente interpretação, mas também por ser um ator brasileiro e ter que falar espanhol e russo em decorrência do seu papel. Segundo li, ele teve apenas 4 semanas para aprender a lidar com o idioma russo e a falar o espanhol cubano, que é mais “cantado”. Realmente impressionante! O roteiro adentra em alguns momentos em um viés melodramático, até pela própria situação mostrada – crianças morrendo de câncer em um hospital -, mas os diretores são diligentes no sentido de evitar emoções forçadas através de cenas angustiantes. As doses de emoção são bem equilibradas, são suficientes. Deve-se destacar também a bela e contemplativa fotografia, os enquadramentos artísticos propiciados pelos cinegrafistas e a bela trilha sonora.

O tradutor” é a submissão de Cuba ao Oscar de melhor longa metragem internacional em 2020 (antigo Oscar de melhor filme estrangeiro). Não acredito que chegue a ser escolhido como um dos 5 finalistas, mas, de qualquer forma, não merece ser desprezado em hipótese alguma, afinal, qualquer narrativa que mexe com o coração dos espectadores deve ser levada em consideração. É um concorrente competitivo, um excelente filme e uma recomendação especialíssima.

O trailer segue abaixo.

Adriano Zumba


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