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No Desvendando buscaremos interpretar filmes mais reflexivos e com explicações não tão óbvias ou com finais abertos, trazendo uma visão diferenciada e que talvez possibilite aos espectadores entender melhor a obra. Inaugurando o quadro, temos As Palavras (The Words), drama de 2012 com roteiro e direção de Brian Klugman e Lee Sternthal. O filme me fez refletir por uns bons 30 minutos após terminar de vê-lo, procurando entender e conectar as histórias. Àqueles que ainda não assistiram, mais que uma resenha, aqui buscarei passar minha interpretação pessoal (recheada de spoilers). É um ótimo filme, principalmente para aqueles que têm interesse pela escrita ou por boas histórias, recomendadíssimo. Em um primeiro momento pode parecer desconexo, sentimento que eu mesmo tive após a cena final, mas com uma boa reflexão acabei por apreciar a genialidade contida nesse trabalho de metalinguagem.

O filme conta 3 histórias de 3 escritores. Primeiramente, mostra Clay, interpretado por Dennis Quaid, um escritor bem sucedido que está fazendo a leitura de seu novo romance para o público. No romance de Clay, Rory, através da digna apresentação de Bradley Cooper, é um escritor novato em busca da sua primeira publicação. Tem a felicidade com sua esposa, Dora (Zoe Saldana), com a qual vive o amor de sua vida. Contudo, as coisas não vão tão bem para Rory, uma vez que ninguém quer publicar o que ele está escrevendo. É aí que ele se depara com um romance antigo e esquecido na maleta de Paris. A trama é genial, e ele acaba publicando como se tivesse sido por ele escrito. É uma história roubada, mas ver a felicidade de sua amada Dora ao achar que aquela era uma história dele o faz seguir em frente com o golpe.

Entra em cena Jeremy Irons, como The Old Man, grande atuação do filme. Ele vem à Rory e conta a verdadeira história por trás do livro que trouxe tanto sucesso ao personagem de Cooper. O universo do filme restrito ao Rory e ao Old Man traz uma bela história, mas a verdadeira sacada está na perspectiva de Clay, o contador do livro. Fiquei me perguntando qual era o papel dele naquilo tudo, qual era a utilidade dele para o filme. Foi assim que busquei entender a metalinguagem e a conexão das histórias.

Na verdade, Clay, Rory e The Old Man são todos a mesma pessoa, na cabeça de Clay. Em sua história, ele se projeta no Old Man: é o cara que queria muito escrever, e que tinha o grande amor da sua vida em suas mãos. Quando o momento crucial chegou, ele deu preferência às palavras do que a sua amada, tratando ela com grosseria e consequentemente perdendo-a. Rory está vivendo a mesma situação, mas Clay escreve esse personagem da maneira que ele gostaria de ter vivido a sua vida. Clay está, assim como Rory, roubando uma história, só que de si mesmo. Ele não merece crédito por aquilo; está apenas retratando a sua vida como gostaria que tivesse sido.

Clay, Rory e Old Man enfrentam o mesmo dilema em algum ponto de suas vidas: as palavras ou o amor. Fazer escolhas é fácil. O difícil é viver com as consequências. É interessante notar aqui a importância da personagem de Olivia Wilde, Daniella. Ela pergunta à Clay qual é o final da história de Rory. Ele diz que ele simplesmente tomou a história roubada como sua, e que às vezes mesmo cometendo um erro uma pessoa consegue continuar vivendo a sua vida, e vivendo bem. Essa era a mentira que Clay estava tentando contar a si mesmo: mesmo tendo cometido o erro de escolher as palavras ao amor de sua esposa, quer acreditar que está vivendo uma vida boa; um ótimo apartamento, sucesso em sua carreira literária e uma jovem com metade da sua idade lhe fazendo companhia.

Contudo, Daniella continua a confrontá-lo em busca da verdade. Ela ameaça ir embora e diz o que acha que aconteceu com Rory; “He’s fucked”, e dá um belíssimo discurso que, na minha visão, é para Clay, e não para a história dele. Ele não consegue dormir a noite pois vê o Old Man: a pessoa que tomou todas as decisões erradas e acabou sozinha. Ele responde: “Talvez… vê seu próprio rosto, e o velho é apenas uma história que ele inventou”. Enfim, eles se beijam.

É então que vem a grande cereja no topo dessa obra prima. Clay não consegue continuar a beijar Daniella. Tendo cometido um grande erro, ele deve encarar que não conseguirá viver uma vida boa, e aquela história é apenas a mentira que ele continua vivendo em sua mente de que está tudo bem. Daniella pergunta pra ele: “Clay. O que você realmente quer?” E então a cena mais genial de todas: Dora e Rory estão na cozinha, da mesma maneira que o Old Man (Clay) esteve com sua amada em sua história. E Rory faz o que Clay sempre quis ter feito; ele vive na ficção aquilo que gostaria de ter tornado real, rouba sua própria história para poder dar um final feliz a ela, mesmo sabendo que ficção e realidade, apesar de muito próximos, nunca se tocam. Abraçado com o seu amor, ele finalmente deixa as palavras de lado e vai em busca da sua felicidade: “Me desculpe”. Fim.

Essa foi a minha interpretação após algum tempo refletindo sobre o filme, atividade que eu aconselho a qualquer um, pois irá engradecer significativamente a experiência. As Palavras deixa ao espectador uma abertura para entender a obra da maneira que melhor lhe convir; espero que compactuem da minha visão, uma vez que para mim tudo pareceu fazer muito sentido. E você, o que achou do filme? Concorda com a interpretação ou tem a sua própria? Compartilhe conosco nos comentários!

Nota do Minha Pipoca: 10/10.