Muuuuito boa esse série da Netflix. A dramaticidade dos acontecimentos foi preservada, sem sacrifício da historicidade dos fatos. Mas algo interessante deve ser ressaltado, que é o gênero da série, pois ela não é rigorosamente uma obra cinematográfica dramáticá nem um documentário histórico, mas sim um misto destes dois gêneros, com preponderância para a dramaticidade. Gostei dessa mistura. Recomendo a todos.
Acabei de assistir a segunda temporada de Poldark. Minha alta expectativa quanto ela, acabou sendo confirmada com satisfação plena, pois de maneira alguma ela ficou atrás da primeira temporada, pois continuou na mesma trilha de excelência.
Poldark, o protagonista do filme, por causa da dignidade de sua vida, continua sendo uma personalidade mais do que interessante, chegando mesmo a ser cativante. De fato, assim acontece, pois ele, com um negócio familiar (uma mina) através do qual deseja sair da sua miséria, acaba repudiando o modo de ser ganancioso dos capitalistas da época da Revolução Industrial Inglesa. E assim o faz, porque ele vê seus trabalhadores como ele vê a si próprio, como um ser humano necessitado de oportunidade para vencer a miséria, e não como uma massa de mão de obra a ser explorada por causa de sua necessidade.
Por isso, a despeito dele ser amado pelos pobres, ele é odiado pelos grandes capitalistas, que além de não medirem esforços para acabar com sua mina, também fazem de tudo para pessoalmente o destruir. Mas será que a nobreza de caráter irá vencer vileza moral de seus opositores? Ou será que o infortúnio e a má sorte, advindas das circunstâncias imprevistas da vida, irão derrotá-lo naturalmente? Só assistindo a série para saber das respostas a estas indagações.
Eis aqui uma série muito boa, mas pouco vista. Fala do momento histórico da revolução industrial inglesa, baseada em documentos da época. Assim, essa série retrata o funcionamento de uma fábrica nesse período histórico, num contexto de pobreza extrema, onde seres humanos são tidos como propriedade do industrial. A exploração é generalizada, com trabalho quase escravo de menores, especialmente de meninas, que são correntemente abusadas moral e sexualmente. Mas, de uma forma bela e admirável, mostra a união delas por respeito e melhores condições de trabalho, onde certos personagem se destacam por sua nobreza na adversidade.
Não se deve confundir esta série japonesa com um filme de mesmo título. No Brasil, a série teve dois títulos (Um Litro de Lágrimas e Rios de Lágrimas) e nos Estados Unidos circulou com dois títulos também (One litre of Tears e A Diary with Tears). O tema do filme trata de uma adolescente portadora de uma enfermidade degenerativa que compromete sua mobilidade, retratando o fato desde quando ela apresenta os primeiros sinais da doença até quando a doença esta no seu estágio final. Nesse contexto, o filme mostra como ela, sua família e seus amigos (inclusive o jovem por quem estava apaixonada) lidaram com esse fato. Não é algo para se assistir, como uma amiga me disse, com um lenço na mão, mas com uma toalha no pescoço, pois é impossível conter as lágrimas. Mas, a par das lágrimas, o filme nos deixa uma mensagem de amor e de solidariedade.
Excelente em todos os aspectos, especialmente pela trilha sonora de abertura, que é verdadeiramente sublime, a melhor que eu já vi em animes. Essa canção de abertura, intitulada LILIUM, foi escrita em latim medieval e é cantada, na abertura do anime, nessa mesma língua já extinta. A seguir, para quem possa se interessar, passo um link dessa canção com tradução para o português: https://www.youtube.com/watch?v=5K80wzbcBkI
Acabei de assistir a segunda temporada de Narcos. A primeira temporada foi muito boa, e a segunda está melhor ainda, tanto pelas interpretações como pelo realismo como fala do tráfico de drogas. Ela tem sido um sucesso em termos de crítica, pelo que mais duas temporadas estão para serem produzidas (3a. e 4a.). mas a série foi censurada por alguns por enfatizar a versão do DEA (que é a agência americana de combate ao narcotráfico). A própria família do Pablo Escobar (esposa e um dos filhos) fez essa acusação, mas até aí dá para entender, porque quiseram ajudar a série com "sua versão" dos fatos desde que lhes fosse paga considerável importância, o que foi rejeitado pelo diretor da mesma. E isso sem contar que a esposa do falecido Pablo Escobar está sendo processada atualmente na Argentina por acusação de lavagem de dinheiro do narcotráfico (espólio remanescente do império do narcotráfico deixado por Pablo e não aprendido anteriormente), acusação essa que tirou ela do anonimato (seu nome foi trocado) em que vivia desde quando foi aceito seu pedido de exílio no citado pais. Recomendo que todos a vejam, pois, lamentavelmente, não se pode entender a América Latina sem falar de narcotráfico.
Gostei demais desse anime, que até fiz uma resenha/comentário:
ANÁLISE DO ANIME ZANKYOU NO TERROR (Terror in Resonance)
1. PERSONAGENS E ENREDO
A) PLANO ATHENA E MAMIYA O Japão, através do cientista e político Shunzo Mamiya, criou um plano no qual, através da ministração de uma droga, seria reproduzida artificialmente a Síndrome de Savant, que se caracteriza pela alta atividade do cérebro, no qual seus portadores desenvolvem, em certas áreas específicas, grande inteligência e sensitividade, muito superiores às das pessoas comuns. A finalidade do plano era produzir pessoas com capacidades sobre-humanas, que seriam mais eficazes do que armas, para mudar um suposto quadro de um Japão fracassado, que tinha sido derrotado na segunda guerra mundial e que supostamente ainda conservava um espírito de perdedor. Para operacionalizar o referido plano, são escolhidas 26 crianças órfãs como cobaias para receberem a citada droga, crianças essas que são confinadas num lugar chamado “complexo” e que passam a ser conhecidas simplesmente pelos seus números. O plano fracassa porque a droga acaba arruinando os corpos e as mentes das crianças, pelo que a maioria delas morre e as que ainda sobrevivem estão com os seus dias contados. As três crianças remanescentes do grupo original procuram fugir do complexo, mas somente duas delas conseguem (as de número 9 e 12, ou seja, Nine e Twelve).
B) GRUPO TERRORISTA SPHINX, NINE, TWELVE e LISA O grupo terrorista Sphinx (esfinge) foi criado pelos dois fugitivos do complexo do Plano Athena (Nine e Twelve), sendo que Nine é o líder do grupo, por ser o mais capaz daquele grupo original de 26 crianças. O Sphinx cria terror em Tókio, por meio de enigmas que teriam que ser decifrados para se evitar detonação de bombas, com a finalidade de chamar a atenção do Japão para aquilo que aconteceu no Plano Athena, que vitimou muitas crianças inocentes. Assim, a finalidade do grupo não era matar pessoas, contudo nem sempre foi possível deixar de ferir algumas delas. Lisa Mishima, inicialmente é apresentada como não tendo pai, estando em conflito com a mãe (desequilibrada) e sendo vítima de bullying na escola. Depois, porém, será considerada cúmplice no primeiro atentado terrorista do grupo sphinx e também será, logo em seguida, convertida num terceiro integrante do grupo. Lisa, ainda que se identifique com o grupo e tenha afetos pelos seus integrantes, contrasta-se com eles em dois pontos: 1) ela não tem a mesma capacidade deles, sendo geralmente desastrada em suas atitudes, pelo que tornar-se involuntariamente divertida; 2) mas ela se sensibiliza com a possibilidade de pessoas ficaram feridas mais dos que os outros dois integrantes do Sphinx, pelo que é fator de humanização das demais pessoas do grupo.
C) POLÍCIA METROPOLITANA DE TÓKIO E SHIBAZAKI Assim que os atos de terrorismo começam a acontecer, a Polícia Metropolitana de Tókio começa a investigá-los, mas Kenjiro Shibazaki, um ex-investigador deste órgão que foi rebaixado para a posição de arquivista, é quem mais entende os enigmas do grupo terrorista Sphinx e é quem pode entender a objetivo real deste grupo. Interessante notar que, no capítulo nove do anime, descobrir-se-á que o responsável pelo rebaixamento de Shibazaki foi também o responsável pela criação do Plano Athena, ou seja, o Dr.Mamiya.
D) ESTADOS UNIDOS, FBI E FIVE Inicialmente, o enredo do anime mostra os Estados Unidos intervindo no Plano Athena logo que tomou conhecimento dele, e acaba levando sob sua guarda a última criança do complexo (a de número 5, denominada Five), que é aquela que não conseguiu fugir com Nine e Twelve. Depois, os Estados Unidos reaparecem no enredo quando sua Agência de Investigação Federal (FBI) passa a investigar, conjuntamente com o Departamento de Polícia Metropolitana de Tókio, os atos de terrorismo praticados pelo Grupo Sphinx, quando se constata que Five está liderando os agentes especiais do FBI. Entretanto, os objetivos de Five não são exatamente os do FBI, pois ela tem algo pessoal contra Nine. É que Five sempre desejou ser melhor que Nine desde o tempo do Plano Athena e, quando o FBI entra nas investigações, ela está determinada a comprovar que é mais capaz do que ele, procurando frustrar o objetivo do grupo Sphinx. Além disso, Five tinha mágoas de Nine, porquanto este não a pode levar consigo na ocasião da fuga do complexo do Plano Athena. Primeiramente, os Estados Unidos entram na investigação do terrorismo porque tem interesse que o Plano Athena não seja descoberto, vez que se aproveita do resultado do mesmo (tem a guarda de Five e a usa em seu proveito no FBI), mas depois procura encobrir o resultado danoso das investigações do FBI acerca dos atos de terrorismo do sphinx, pois pessoas são feridas por causa de Five (uma agente do FBI) em sua rivalidade pessoal contra Nine.
2. MITOLOGIA GREGA E SUA INFLUÊNCIA NO ANIME Ao que parece, alguns aspectos do enredo e dos personagens principais do anime foram criados baseando-se na mitologia grega, como se pode constatar abaixo:
A) PLANO ATHENA E NINE Na mitologia grega, Athena desde o princípio era vista como a deusa da Sabedoria e das Artes, e depois se torna também uma deusa relacionada com a guerra por causa de suas capacidades sobre-humanas, porque ela sempre é retratada portando uma lança que lhe dá a vitória. Ora, são precisamente essas características da deusa que são vistas no Plano Athena do anime, pois tal plano foi criado para se produzir seres com capacidade sobre-humana de inteligência (sabedoria) e de sensitividade (artes), que fossem mais eficazes do que armas (guerra) para superar a visão de um Japão fracassado desde a segunda guerra mundial. É bem provável que Nine também esteja relacionado com o deus Zeus da mitologia grega, pois esse deus sentia intensas dores de cabeça porque nela estava Athena, que veio ao mundo quando Zeus pediu que se fizesse uma fenda em sua cabeça com um machado para que dela saísse aquilo (Athena) que lhe estava causado dores. No anime, verifica-se que o sofrimento de Nine, inclusive as suas dores de cabeça, tem por causa o Plano Athena, dores que somente cessarão com a morte de Nine, quando tal plano será revelado ao mundo.
B) SPHINX (ESFINGE) E SHIBAZAKI O grupo terrorista Sphinx baseia-se no mito grego da Esfinge, e Shibazaki no mito grego de Édipo, como retratados por Sóflocles em Édipo-Rei, abaixo resumido. A esfinge, um ser com corpo de animal e cabeça de ser humano, propunha um enigma para todos, que falava: “Decifra-me ou devoro-te: Que criatura tem quatro pés de manhã, dois pés ao meio-dia e três pés no final da tarde?” A resposta certa seria que tal criatura é o homem, que quando nasce engatinha como se tivesse quatro pés, que anda com dois pés quando adulto e que precisa de uma bengala, como terceiro pé, para caminhar na velhice. Quem não conseguia responde o enigma era estrangulado. Édipo decifra o enigma da Esfinge, que leva essa ao suicídio. Porém, Édipo, sem saber, casa-se com a própria mãe como fora profetizado antes do seu nascimento, o que é a causa de sua infelicidade quando ele veio a descobrir tal acontecimento. Que o grupo terrorista Sphinx baseia-se no mito da Esfinge fica claro porque tal grupo propõe enigmas que, se não fossem decifrados, poderiam supostamente causar a morte de pessoas. Que o personagem Shibazaki retrata o mito de Édipo pode se constatar pelo fato de que ele acabará resolvendo o mistério do grupo Sphinx, que é a revelação do Plano Athena, tal qual Édipo fez com o da Esfinge. Mas, note-se que Shibazaki é infeliz na sua convivência familiar, pois é um pai ausente porque é casado com seu trabalho. Assim, para demonstrar o erro de casar-se com o trabalho, é que se compara esse com o casar-se com a própria mãe, o que só traz infelicidade, como acontece no mito de Édipo.
3) ALGUMAS LIÇÕES DE VIDA TIRADAS DO ANIME
3.1) Decifra-se o sentido básico do anime da mesma forma que se decifrou o enigma da Esfinge, porquanto o sentido do anime é revelar o homem (ser humano) em suas misérias, mas sem pessimismo, vez que há uma esperança de mudança para ele, esperança essa que o anime expressa (tanto no seu início como no seu final) através da palavra VON, que no idioma da Islândia significaria esperança. Mas, tal esperança está fundamentada em certas lições de vida que o anime procura expressar, dentre as quais menciono somente as duas principais:
A) O desejo de proeminência como povo (propósito do Plano Athena), ou de proeminência pessoal (Five relativamente a Nine), poderá ter consequências trágicas, que devem ser evitadas, pois quando se procura obcecadamente ser proeminente através de capacidades sobre-humanas, corremos o risco de acabarmos renunciando nossa própria humanidade, quando ficaremos sujeitos a praticar atos anti-humanos, como aconteceu, por exemplo, na Alemanha Nazista, quando se implantou a ideologia da superioridade da raça ariana que, para se manter pura, justificava o extermínio do Judeus nos campos de concentração.
B) O próprio título do anime em inglês (Terror in Resonance) evidencia que o terror tem repercussões tremendamente negativas, pois terror gera terror, como acontece com o Sphinx, que pratica atos de terror (ainda que bem intencionados) em decorrência dos seus integrantes terem experimentado terror no complexo do Plano Athena. Mas note-se que, contra a intenção de Nine e Twelve (que não desejam matar pessoas com seus atos terroristas), as coisas acabam fugindo do controle deles e pessoas acabam sendo feridas, pois é impossível controlar atos de terror, porquanto imprevistos podem acontecer a qualquer momento.
3.2) Além dessas duas lições principais, outras poderiam ser acrescentadas como coadjuvantes, dentre as quais citamos somente três:
A) Note-se que o anime expressa a ideia de que não se pode casar com o trabalho, por mais relevante e necessário que este pareça, pois isso sempre acabaria sacrificando a realidade da familiar, como aconteceu inicialmente com Shibazaki.
B) Note-se ainda que o anime expressa a ideia de que a fragilidade das pessoas, em decorrência de circunstâncias difíceis da vida, podem torná-las alvos do pior que há no gênero humano, como acontece com os órfãos, que são escolhidos para serem vítimas do Plano Athena, e como acontece também com Lisa, que fica suscetível a se integrar ao grupo terrorista do Sphinx em face de se encontrar socialmente marginalizada, porque não tem pai, porque vive em conflito com a mãe desequilibrada e porque sofre bullying na escola. Daí, ser emocionante quando Shibazaki, que procura ser um pai melhor para sua filha, passa também, no capítulo final do anime, a dar conselhos paternais e se dispõe a ajudar Nine, Twelve e Lisa, pois eles não podem ser ignorados nem esquecidos, mas acolhidos e protegidos por causa da circunstâncias que os tornaram mais vulneráveis.
C) Note-se, por fim, que o ponto alto do anime não está simplesmente no fato de procurar fortalecer a esperança em se ter um mundo melhor com pessoas melhores, mas especialmente em nos motivar a contribuir com esse fato, deixando-nos o exemplo daqueles que, contra toda expectativa em contrário, sacrificaram-se por essa causa no anime.
Gostei tanto desse anime, que fiz até uma resenha/comentário dele:
ANÁLISE DO ANIME DEATH PARADE
1) O SENTIDO BÁSICO DO ANIME O autor do anime expressa em sua obra a filosofia de que haverá um julgamento das pessoas depois da morte delas, que levará em conta não somente as memórias delas dos acontecimentos da vida (fatos visivelmente expressos), mas também a extensão de sua humanidade (fatos que nem sempre são expressos visivelmente). Participarão desse julgamento juízes que, segundo pensamos, representam certas realidades importantes da existência do ser humano, como nos próximos itens demonstraremos. O julgamento se dará num contexto de tensão extrema, por isso ele acontecerá num jogo decisivo de “vida ou morte” (os mortos, sob julgamento, não sabem que estão mortos, pois essa lembrança lhe foi retirada pelo choque da morte), pois se acredita que somente num contexto assim que as pessoas serão reveladas como de fato são, o que supostamente determinaria julgamentos mais justos. O destino das pessoas julgadas seria a reencarnação, se as pessoas fossem consideradas justas ou boas no julgamento, ou o vazio (limbo), se as pessoas fossem consideradas injustas ou ruins no julgamento. Esse fato demonstra que o autor do anime não expressa exatamente a crença do budismo da sociedade japonesa em que vive, pois no budismo não existe o vazio (limbo), mas simplesmente reencarnações sucessivas, nas quais as pessoas vão se aperfeiçoando até que atingem o nirvana (estado de beatitude ou perfeição final), ou, no caso deste aperfeiçoamento não ocorrer, elas ficariam presas num ciclo interminável de reencarnações. Por outro lado, o autor do anime, aparentemente tira o termo vazio (limbo) da teologia da Igreja Católica (que não é aceita pelas igrejas evangélicas) que, até pouco tempo atrás, usava esse termo para expressar o lugar de destino das crianças mortas sem batismo, porquanto sem batismo não poderiam entrar no céu. A despeito disso, o autor do anime não expressa a crença do cristianismo concernente ao julgamento, pelas seguintes razões: a) o cristianismo não aceita a idéia de reencarnação sucessivas (como acontece com o budismo), porquanto a Bíblia professa que o homem morre uma única vez, depois do que vem o julgamento, e quem julga é Deus, que não somente conhece os atos visíveis que os homens realizaram em vida, como também o que se passou dentro do coração deles quando agiram nesse mundo, pelo que tal julgamento não seria sujeito a falhas. b) o cristianismo professa que o destino final dos mortos depois do julgamento será o céu (para os salvos, absolvidos) ou o inferno (para os condenados), mas para o autor do anime, como também para o budismo, tais lugares (céu e inferno) não existem com essa conotação (ou seja, como lugares para onde se vai depois do julgamento dos mortos). No máximo, para o budismo, o inferno seria viver na terra num ciclo interminável de reencarnações, e céu seria atingir o estágio final de perfeição, onde não se precisaria mais reencarnar.
2) A TEMÁTICA DA MÚSICA PRINCIPAL DO ANIME A música principal da trilha sonora do anime expressa o fato das pessoas estarem vivendo sem se dar conta de que um dia morrerão e serão julgadas pelo que fizeram em vida, pelo que expressa que essas pessoas vivem temerariamente buscando a empolgação do coração e entretenimento até o êxtase. Daí, o tema da música principal é uma espécie de ironia que se contrasta com tema filosófico básico do anime, porquanto nessa musica há uma ignorância completa quanto ao fato inevitável de que haverá um julgamento futuro (após a morte), pois as pessoas são estimuladas a somente procurem diversão nessa vida, esquecendo-se do dever de serem corretas, pelo que serão surpreendidas por um julgamento futuro que não tratará de como elas se divertiram nessa vida, mas sim de como elas foram justas. Por fim, deve-se salientar que o fato dos próprios juízes serem colocados dançando ao ritmo da música principal do anime revela a zombaria e o escárnio quanto a possibilidade de um julgamento futuro, pois o enredo do anime jamais coloca os juízes como sendo adeptos da filosofia de que o sentido mais importante dessa vida é se divertir ao máximo.
3) OS JUÍZES PRINCIPAIS Os juízes, segundo nosso entendimento do anime, representam figuradamente certas realidades da vida humana que interagem no processo de julgamento dos seres humanos.
A) UCULUS Três fatos revelam a realidade desse juiz: I) é aparentemente o mais velho dos juízes; II) o significado do seu nome vindo do latim (Uculus); III) e a barba (e os cabelos também) em forma de flor (flor de lótus). O fato de ser o mais velho dos juízes faz dele um representante da tradição, pois os velhos são apegados à tradição dos antigos que se transmite de geração em geração. E quando se lhe dá o nome de Uculus (olho, em latim), logo se entende que essa tradição se importa com aquilo que é visível (o que o olho vê), mas o anime vai revelar que há coisas que não são visíveis (porque acontecem no coração), mas que são importantes para um julgamento justo. E quando se lhe apresenta a barba em forma de flor (flor de lótus), logo se constata que o critério deste juiz não é bom, mas ele quer impor o seu critério como um critério exclusivo, como sendo o único critério válido de julgamento. Tal coisa acontece porque a barba desse juiz tem a forma de uma flor de lótus que, no budismo, simboliza pureza, pois ela nasce e desabrocha no lodo (charco, lama, sujeira) e, mesmo nascendo no lodo, permanece pura. Ora, se entendermos que toda vez que tal flor desabrocha no anime, ela revela a verdade com pureza, temos que entender também que ela desabrocha como sendo a barba desse juiz, que então representa o lodo (conotação do critério mau de julgamento desse juiz). Assim, a barba (em forma de flor de lótus) sai desse juiz semelhantemente como a flor de lótus sai do lodo, daí a realidade da pessoa desse juiz está necessariamente associado com o significado do lodo.
B) NONA Três fatos também revelam a realidade deste Juiz: I) o significado do seu nome vindo do latim (Nona); II) a sua baixa estatura; III) e a sua personalidade forte. Essas características irão contrastar-se com as de Uculus. Nona, em latim, significa vovó, mas no anime a ênfase não está na velhice (como acontece com Uculus, que representa a tradição dos antigos), mas nos afetos do coração dela (comparáveis a de uma avó), que, desejando fazer o bem (e desejando que seus netos também façam o bem), a torna sisuda quanto à idéia do certo e do errado que se aprende com as experiências da vida, pelo que esse personagem representa a consciência humana, com sua noção de certo e de errado, de justo e de injusto, que se aprende com o tempo. Assim, fica claro que Nona tem características aparentemente semelhantes às de Uculus, mas Uculus representa a tradição ultrapassada dos antigos enquanto Nona representa a consciência do certo e do errado, que se adquire com o curso da existência, pelo que é sabedoria atual que jamais ficaria ultrapassada, daí ela ser apresentada de forma jovial e sisuda, enquanto Uculus apenas como um velho teimoso. Apesar disso, Nona é apresentada como sendo de baixa estatura quando comparada com Uculus, pelo que isso representa o fato de que, quando se trata de julgar almas dos seres humanos, a tradição dos antigos (por ser conhecimento comum inquestionado) geralmente (mas não corretamente) tem mais crédito que os ditames da sabedoria gerada pela atividade da consciência. Por esta razão, Nona, constatando falhas nos julgamentos anteriores (pois ela tem consciência daquilo que é certo e daquilo que é errado), irá se opor a Uculus, porque ela entende que os juízes não são nem podem ser bonecos que agem maquinalmente, sempre decidindo da mesma forma, com base somente naquilo que o olho vê (critério de Uculus), pelo que eles podem mudar e julgar as almas com mais humanismo. Diante disso, como logo ficará mais claro, é que Nona contrariará Uculus estabelecendo Chiyuki, um ser humano mulher, para assistir Decim, um juiz subordinado a Nona, no intuito de humanizar mais os julgamentos, o que só aconteceria se, indo para além daquilo que os olhos veem, fosse também considerado os sentimentos do coração. Porém, para tanto, necessário será que o modo de racionalizar de Decim seja quebrado pelo modo de sentir de Chiyuki, mas tal quebra é reputado como sendo má aos olhos de Uculus.
C) DECIM E CHIYUKI O Juiz Decim pode ser entendido também pelo seu nome, que vem do latim. Decim (ou Decem) significa décimo (numeral), proveniente do verbo decimate (dizimar), que se originou da prática do exército romano punir legiões que se rebelavam contra seus superiores, na qual, a cada dez soldados contados, o décimo era destinado a morte por decapitação. Assim, chamando esse juiz de Decim, o anime quis representar que ele iria se rebelar contra as regras de Uculus, aderindo ao plano traçado por sua superiora Nona. É importante destacar que o Juiz Decim só pode ser entendido na sua relação com Chiyuki, sua assistente de julgamento nomeada por Nona. Diante disso, compreende-se que os dois não se contrastam exatamente, mas se complementam, da forma abaixo relatada. Decim representa a razão humana, que se move pela lógica daquilo que é visível, daí o fato dele se parecer frio e insensível no seu julgamento, que inicialmente é realizado de acordo com as regras de Uculus, ou seja, de acordo somente com aquilo que o olho seja capaz de ver. Chiyuki, que só é chamada por esse nome mais no final do anime, já que antes disso só é conhecida como a mulher de cabelos negros (Kurokami no Onna), representa o coração com seus sentimentos e intuições, que não são visíveis, mas que será responsável pela mudança do modo de Decim realizar julgamentos, que serão mais humanitários com tempo, pois ele deixará de julgar somente de acordo com as memórias dos acontecimentos visíveis dos mortos, para também julgar de acordo com os sentimentos que eles expressaram somente no coração e que, por isso, não puderam ser vistos nos fatos gravados na memória. Contudo, deve ser notado que Decim consentiu mudar o seu modo de julgar, porque ele se permitiu sentir emoções e assim humanizou seu julgamento, o que acarretou sua quebra, que nada mais foi do que renunciar sua natureza exclusivamente sobre-humana, mas isso não foi um mal, mas um bem para si e para os que ele iria julgar. Antes, Decim somente tinha um primitivo sentimento de medo de se quebrar, mas agora, que ele parcialmente se humanizou, ele tornou-se capaz de ter outros sentimentos (amor, compaixão, arrependimento, etc) que possibilitaram que ele se colocasse no lugar dos seres humanos que julga para sentir o que eles sentiram quando agiam nesse mundo como vivos, pelo que agora seus julgamentos passariam a ser mais justos.
Império Romano: Império de Sangue (1ª Temporada)
3.7 48 Assista AgoraMuuuuito boa esse série da Netflix. A dramaticidade dos acontecimentos foi preservada, sem sacrifício da historicidade dos fatos. Mas algo interessante deve ser ressaltado, que é o gênero da série, pois ela não é rigorosamente uma obra cinematográfica dramáticá nem um documentário histórico, mas sim um misto destes dois gêneros, com preponderância para a dramaticidade. Gostei dessa mistura. Recomendo a todos.
Poldark - Herói de Guerra (2ª Temporada)
4.3 27Acabei de assistir a segunda temporada de Poldark. Minha alta expectativa quanto ela, acabou sendo confirmada com satisfação plena, pois de maneira alguma ela ficou atrás da primeira temporada, pois continuou na mesma trilha de excelência.
Poldark, o protagonista do filme, por causa da dignidade de sua vida, continua sendo uma personalidade mais do que interessante, chegando mesmo a ser cativante. De fato, assim acontece, pois ele, com um negócio familiar (uma mina) através do qual deseja sair da sua miséria, acaba repudiando o modo de ser ganancioso dos capitalistas da época da Revolução Industrial Inglesa. E assim o faz, porque ele vê seus trabalhadores como ele vê a si próprio, como um ser humano necessitado de oportunidade para vencer a miséria, e não como uma massa de mão de obra a ser explorada por causa de sua necessidade.
Por isso, a despeito dele ser amado pelos pobres, ele é odiado pelos grandes capitalistas, que além de não medirem esforços para acabar com sua mina, também fazem de tudo para pessoalmente o destruir. Mas será que a nobreza de caráter irá vencer vileza moral de seus opositores? Ou será que o infortúnio e a má sorte, advindas das circunstâncias imprevistas da vida, irão derrotá-lo naturalmente? Só assistindo a série para saber das respostas a estas indagações.
A Fábrica (1ª Temporada)
4.2 17Eis aqui uma série muito boa, mas pouco vista. Fala do momento histórico da revolução industrial inglesa, baseada em documentos da época. Assim, essa série retrata o funcionamento de uma fábrica nesse período histórico, num contexto de pobreza extrema, onde seres humanos são tidos como propriedade do industrial. A exploração é generalizada, com trabalho quase escravo de menores, especialmente de meninas, que são correntemente abusadas moral e sexualmente. Mas, de uma forma bela e admirável, mostra a união delas por respeito e melhores condições de trabalho, onde certos personagem se destacam por sua nobreza na adversidade.
1 Litro de Lágrimas
4.7 223Não se deve confundir esta série japonesa com um filme de mesmo título. No Brasil, a série teve dois títulos (Um Litro de Lágrimas e Rios de Lágrimas) e nos Estados Unidos circulou com dois títulos também (One litre of Tears e A Diary with Tears). O tema do filme trata de uma adolescente portadora de uma enfermidade degenerativa que compromete sua mobilidade, retratando o fato desde quando ela apresenta os primeiros sinais da doença até quando a doença esta no seu estágio final. Nesse contexto, o filme mostra como ela, sua família e seus amigos (inclusive o jovem por quem estava apaixonada) lidaram com esse fato. Não é algo para se assistir, como uma amiga me disse, com um lenço na mão, mas com uma toalha no pescoço, pois é impossível conter as lágrimas. Mas, a par das lágrimas, o filme nos deixa uma mensagem de amor e de solidariedade.
Elfen Lied
4.2 315 Assista AgoraExcelente em todos os aspectos, especialmente pela trilha sonora de abertura, que é verdadeiramente sublime, a melhor que eu já vi em animes. Essa canção de abertura, intitulada LILIUM, foi escrita em latim medieval e é cantada, na abertura do anime, nessa mesma língua já extinta. A seguir, para quem possa se interessar, passo um link dessa canção com tradução para o português: https://www.youtube.com/watch?v=5K80wzbcBkI
Narcos (2ª Temporada)
4.4 460 Assista AgoraAcabei de assistir a segunda temporada de Narcos. A primeira temporada foi muito boa, e a segunda está melhor ainda, tanto pelas interpretações como pelo realismo como fala do tráfico de drogas. Ela tem sido um sucesso em termos de crítica, pelo que mais duas temporadas estão para serem produzidas (3a. e 4a.). mas a série foi censurada por alguns por enfatizar a versão do DEA (que é a agência americana de combate ao narcotráfico). A própria família do Pablo Escobar (esposa e um dos filhos) fez essa acusação, mas até aí dá para entender, porque quiseram ajudar a série com "sua versão" dos fatos desde que lhes fosse paga considerável importância, o que foi rejeitado pelo diretor da mesma. E isso sem contar que a esposa do falecido Pablo Escobar está sendo processada atualmente na Argentina por acusação de lavagem de dinheiro do narcotráfico (espólio remanescente do império do narcotráfico deixado por Pablo e não aprendido anteriormente), acusação essa que tirou ela do anonimato (seu nome foi trocado) em que vivia desde quando foi aceito seu pedido de exílio no citado pais. Recomendo que todos a vejam, pois, lamentavelmente, não se pode entender a América Latina sem falar de narcotráfico.
Zankyou no Terror
4.3 96Gostei demais desse anime, que até fiz uma resenha/comentário:
ANÁLISE DO ANIME ZANKYOU NO TERROR
(Terror in Resonance)
1. PERSONAGENS E ENREDO
A) PLANO ATHENA E MAMIYA
O Japão, através do cientista e político Shunzo Mamiya, criou um plano no qual, através da ministração de uma droga, seria reproduzida artificialmente a Síndrome de Savant, que se caracteriza pela alta atividade do cérebro, no qual seus portadores desenvolvem, em certas áreas específicas, grande inteligência e sensitividade, muito superiores às das pessoas comuns.
A finalidade do plano era produzir pessoas com capacidades sobre-humanas, que seriam mais eficazes do que armas, para mudar um suposto quadro de um Japão fracassado, que tinha sido derrotado na segunda guerra mundial e que supostamente ainda conservava um espírito de perdedor.
Para operacionalizar o referido plano, são escolhidas 26 crianças órfãs como cobaias para receberem a citada droga, crianças essas que são confinadas num lugar chamado “complexo” e que passam a ser conhecidas simplesmente pelos seus números. O plano fracassa porque a droga acaba arruinando os corpos e as mentes das crianças, pelo que a maioria delas morre e as que ainda sobrevivem estão com os seus dias contados. As três crianças remanescentes do grupo original procuram fugir do complexo, mas somente duas delas conseguem (as de número 9 e 12, ou seja, Nine e Twelve).
B) GRUPO TERRORISTA SPHINX, NINE, TWELVE e LISA
O grupo terrorista Sphinx (esfinge) foi criado pelos dois fugitivos do complexo do Plano Athena (Nine e Twelve), sendo que Nine é o líder do grupo, por ser o mais capaz daquele grupo original de 26 crianças.
O Sphinx cria terror em Tókio, por meio de enigmas que teriam que ser decifrados para se evitar detonação de bombas, com a finalidade de chamar a atenção do Japão para aquilo que aconteceu no Plano Athena, que vitimou muitas crianças inocentes. Assim, a finalidade do grupo não era matar pessoas, contudo nem sempre foi possível deixar de ferir algumas delas.
Lisa Mishima, inicialmente é apresentada como não tendo pai, estando em conflito com a mãe (desequilibrada) e sendo vítima de bullying na escola. Depois, porém, será considerada cúmplice no primeiro atentado terrorista do grupo sphinx e também será, logo em seguida, convertida num terceiro integrante do grupo.
Lisa, ainda que se identifique com o grupo e tenha afetos pelos seus integrantes, contrasta-se com eles em dois pontos: 1) ela não tem a mesma capacidade deles, sendo geralmente desastrada em suas atitudes, pelo que tornar-se involuntariamente divertida; 2) mas ela se sensibiliza com a possibilidade de pessoas ficaram feridas mais dos que os outros dois integrantes do Sphinx, pelo que é fator de humanização das demais pessoas do grupo.
C) POLÍCIA METROPOLITANA DE TÓKIO E SHIBAZAKI
Assim que os atos de terrorismo começam a acontecer, a Polícia Metropolitana de Tókio começa a investigá-los, mas Kenjiro Shibazaki, um ex-investigador deste órgão que foi rebaixado para a posição de arquivista, é quem mais entende os enigmas do grupo terrorista Sphinx e é quem pode entender a objetivo real deste grupo. Interessante notar que, no capítulo nove do anime, descobrir-se-á que o responsável pelo rebaixamento de Shibazaki foi também o responsável pela criação do Plano Athena, ou seja, o Dr.Mamiya.
D) ESTADOS UNIDOS, FBI E FIVE
Inicialmente, o enredo do anime mostra os Estados Unidos intervindo no Plano Athena logo que tomou conhecimento dele, e acaba levando sob sua guarda a última criança do complexo (a de número 5, denominada Five), que é aquela que não conseguiu fugir com Nine e Twelve.
Depois, os Estados Unidos reaparecem no enredo quando sua Agência de Investigação Federal (FBI) passa a investigar, conjuntamente com o Departamento de Polícia Metropolitana de Tókio, os atos de terrorismo praticados pelo Grupo Sphinx, quando se constata que Five está liderando os agentes especiais do FBI.
Entretanto, os objetivos de Five não são exatamente os do FBI, pois ela tem algo pessoal contra Nine. É que Five sempre desejou ser melhor que Nine desde o tempo do Plano Athena e, quando o FBI entra nas investigações, ela está determinada a comprovar que é mais capaz do que ele, procurando frustrar o objetivo do grupo Sphinx. Além disso, Five tinha mágoas de Nine, porquanto este não a pode levar consigo na ocasião da fuga do complexo do Plano Athena.
Primeiramente, os Estados Unidos entram na investigação do terrorismo porque tem interesse que o Plano Athena não seja descoberto, vez que se aproveita do resultado do mesmo (tem a guarda de Five e a usa em seu proveito no FBI), mas depois procura encobrir o resultado danoso das investigações do FBI acerca dos atos de terrorismo do sphinx, pois pessoas são feridas por causa de Five (uma agente do FBI) em sua rivalidade pessoal contra Nine.
2. MITOLOGIA GREGA E SUA INFLUÊNCIA NO ANIME
Ao que parece, alguns aspectos do enredo e dos personagens principais do anime foram criados baseando-se na mitologia grega, como se pode constatar abaixo:
A) PLANO ATHENA E NINE
Na mitologia grega, Athena desde o princípio era vista como a deusa da Sabedoria e das Artes, e depois se torna também uma deusa relacionada com a guerra por causa de suas capacidades sobre-humanas, porque ela sempre é retratada portando uma lança que lhe dá a vitória. Ora, são precisamente essas características da deusa que são vistas no Plano Athena do anime, pois tal plano foi criado para se produzir seres com capacidade sobre-humana de inteligência (sabedoria) e de sensitividade (artes), que fossem mais eficazes do que armas (guerra) para superar a visão de um Japão fracassado desde a segunda guerra mundial.
É bem provável que Nine também esteja relacionado com o deus Zeus da mitologia grega, pois esse deus sentia intensas dores de cabeça porque nela estava Athena, que veio ao mundo quando Zeus pediu que se fizesse uma fenda em sua cabeça com um machado para que dela saísse aquilo (Athena) que lhe estava causado dores. No anime, verifica-se que o sofrimento de Nine, inclusive as suas dores de cabeça, tem por causa o Plano Athena, dores que somente cessarão com a morte de Nine, quando tal plano será revelado ao mundo.
B) SPHINX (ESFINGE) E SHIBAZAKI
O grupo terrorista Sphinx baseia-se no mito grego da Esfinge, e Shibazaki no mito grego de Édipo, como retratados por Sóflocles em Édipo-Rei, abaixo resumido.
A esfinge, um ser com corpo de animal e cabeça de ser humano, propunha um enigma para todos, que falava: “Decifra-me ou devoro-te: Que criatura tem quatro pés de manhã, dois pés ao meio-dia e três pés no final da tarde?” A resposta certa seria que tal criatura é o homem, que quando nasce engatinha como se tivesse quatro pés, que anda com dois pés quando adulto e que precisa de uma bengala, como terceiro pé, para caminhar na velhice. Quem não conseguia responde o enigma era estrangulado. Édipo decifra o enigma da Esfinge, que leva essa ao suicídio. Porém, Édipo, sem saber, casa-se com a própria mãe como fora profetizado antes do seu nascimento, o que é a causa de sua infelicidade quando ele veio a descobrir tal acontecimento.
Que o grupo terrorista Sphinx baseia-se no mito da Esfinge fica claro porque tal grupo propõe enigmas que, se não fossem decifrados, poderiam supostamente causar a morte de pessoas. Que o personagem Shibazaki retrata o mito de Édipo pode se constatar pelo fato de que ele acabará resolvendo o mistério do grupo Sphinx, que é a revelação do Plano Athena, tal qual Édipo fez com o da Esfinge. Mas, note-se que Shibazaki é infeliz na sua convivência familiar, pois é um pai ausente porque é casado com seu trabalho. Assim, para demonstrar o erro de casar-se com o trabalho, é que se compara esse com o casar-se com a própria mãe, o que só traz infelicidade, como acontece no mito de Édipo.
3) ALGUMAS LIÇÕES DE VIDA TIRADAS DO ANIME
3.1) Decifra-se o sentido básico do anime da mesma forma que se decifrou o enigma da Esfinge, porquanto o sentido do anime é revelar o homem (ser humano) em suas misérias, mas sem pessimismo, vez que há uma esperança de mudança para ele, esperança essa que o anime expressa (tanto no seu início como no seu final) através da palavra VON, que no idioma da Islândia significaria esperança. Mas, tal esperança está fundamentada em certas lições de vida que o anime procura expressar, dentre as quais menciono somente as duas principais:
A) O desejo de proeminência como povo (propósito do Plano Athena), ou de proeminência pessoal (Five relativamente a Nine), poderá ter consequências trágicas, que devem ser evitadas, pois quando se procura obcecadamente ser proeminente através de capacidades sobre-humanas, corremos o risco de acabarmos renunciando nossa própria humanidade, quando ficaremos sujeitos a praticar atos anti-humanos, como aconteceu, por exemplo, na Alemanha Nazista, quando se implantou a ideologia da superioridade da raça ariana que, para se manter pura, justificava o extermínio do Judeus nos campos de concentração.
B) O próprio título do anime em inglês (Terror in Resonance) evidencia que o terror tem repercussões tremendamente negativas, pois terror gera terror, como acontece com o Sphinx, que pratica atos de terror (ainda que bem intencionados) em decorrência dos seus integrantes terem experimentado terror no complexo do Plano Athena. Mas note-se que, contra a intenção de Nine e Twelve (que não desejam matar pessoas com seus atos terroristas), as coisas acabam fugindo do controle deles e pessoas acabam sendo feridas, pois é impossível controlar atos de terror, porquanto imprevistos podem acontecer a qualquer momento.
3.2) Além dessas duas lições principais, outras poderiam ser acrescentadas como coadjuvantes, dentre as quais citamos somente três:
A) Note-se que o anime expressa a ideia de que não se pode casar com o trabalho, por mais relevante e necessário que este pareça, pois isso sempre acabaria sacrificando a realidade da familiar, como aconteceu inicialmente com Shibazaki.
B) Note-se ainda que o anime expressa a ideia de que a fragilidade das pessoas, em decorrência de circunstâncias difíceis da vida, podem torná-las alvos do pior que há no gênero humano, como acontece com os órfãos, que são escolhidos para serem vítimas do Plano Athena, e como acontece também com Lisa, que fica suscetível a se integrar ao grupo terrorista do Sphinx em face de se encontrar socialmente marginalizada, porque não tem pai, porque vive em conflito com a mãe desequilibrada e porque sofre bullying na escola. Daí, ser emocionante quando Shibazaki, que procura ser um pai melhor para sua filha, passa também, no capítulo final do anime, a dar conselhos paternais e se dispõe a ajudar Nine, Twelve e Lisa, pois eles não podem ser ignorados nem esquecidos, mas acolhidos e protegidos por causa da circunstâncias que os tornaram mais vulneráveis.
C) Note-se, por fim, que o ponto alto do anime não está simplesmente no fato de procurar fortalecer a esperança em se ter um mundo melhor com pessoas melhores, mas especialmente em nos motivar a contribuir com esse fato, deixando-nos o exemplo daqueles que, contra toda expectativa em contrário, sacrificaram-se por essa causa no anime.
Death Parade
4.2 81Gostei tanto desse anime, que fiz até uma resenha/comentário dele:
ANÁLISE DO ANIME DEATH PARADE
1) O SENTIDO BÁSICO DO ANIME
O autor do anime expressa em sua obra a filosofia de que haverá um julgamento das pessoas depois da morte delas, que levará em conta não somente as memórias delas dos acontecimentos da vida (fatos visivelmente expressos), mas também a extensão de sua humanidade (fatos que nem sempre são expressos visivelmente).
Participarão desse julgamento juízes que, segundo pensamos, representam certas realidades importantes da existência do ser humano, como nos próximos itens demonstraremos.
O julgamento se dará num contexto de tensão extrema, por isso ele acontecerá num jogo decisivo de “vida ou morte” (os mortos, sob julgamento, não sabem que estão mortos, pois essa lembrança lhe foi retirada pelo choque da morte), pois se acredita que somente num contexto assim que as pessoas serão reveladas como de fato são, o que supostamente determinaria julgamentos mais justos.
O destino das pessoas julgadas seria a reencarnação, se as pessoas fossem consideradas justas ou boas no julgamento, ou o vazio (limbo), se as pessoas fossem consideradas injustas ou ruins no julgamento.
Esse fato demonstra que o autor do anime não expressa exatamente a crença do budismo da sociedade japonesa em que vive, pois no budismo não existe o vazio (limbo), mas simplesmente reencarnações sucessivas, nas quais as pessoas vão se aperfeiçoando até que atingem o nirvana (estado de beatitude ou perfeição final), ou, no caso deste aperfeiçoamento não ocorrer, elas ficariam presas num ciclo interminável de reencarnações.
Por outro lado, o autor do anime, aparentemente tira o termo vazio (limbo) da teologia da Igreja Católica (que não é aceita pelas igrejas evangélicas) que, até pouco tempo atrás, usava esse termo para expressar o lugar de destino das crianças mortas sem batismo, porquanto sem batismo não poderiam entrar no céu. A despeito disso, o autor do anime não expressa a crença do cristianismo concernente ao julgamento, pelas seguintes razões:
a) o cristianismo não aceita a idéia de reencarnação sucessivas (como acontece com o budismo), porquanto a Bíblia professa que o homem morre uma única vez, depois do que vem o julgamento, e quem julga é Deus, que não somente conhece os atos visíveis que os homens realizaram em vida, como também o que se passou dentro do coração deles quando agiram nesse mundo, pelo que tal julgamento não seria sujeito a falhas.
b) o cristianismo professa que o destino final dos mortos depois do julgamento será o céu (para os salvos, absolvidos) ou o inferno (para os condenados), mas para o autor do anime, como também para o budismo, tais lugares (céu e inferno) não existem com essa conotação (ou seja, como lugares para onde se vai depois do julgamento dos mortos). No máximo, para o budismo, o inferno seria viver na terra num ciclo interminável de reencarnações, e céu seria atingir o estágio final de perfeição, onde não se precisaria mais reencarnar.
2) A TEMÁTICA DA MÚSICA PRINCIPAL DO ANIME
A música principal da trilha sonora do anime expressa o fato das pessoas estarem vivendo sem se dar conta de que um dia morrerão e serão julgadas pelo que fizeram em vida, pelo que expressa que essas pessoas vivem temerariamente buscando a empolgação do coração e entretenimento até o êxtase. Daí, o tema da música principal é uma espécie de ironia que se contrasta com tema filosófico básico do anime, porquanto nessa musica há uma ignorância completa quanto ao fato inevitável de que haverá um julgamento futuro (após a morte), pois as pessoas são estimuladas a somente procurem diversão nessa vida, esquecendo-se do dever de serem corretas, pelo que serão surpreendidas por um julgamento futuro que não tratará de como elas se divertiram nessa vida, mas sim de como elas foram justas.
Por fim, deve-se salientar que o fato dos próprios juízes serem colocados dançando ao ritmo da música principal do anime revela a zombaria e o escárnio quanto a possibilidade de um julgamento futuro, pois o enredo do anime jamais coloca os juízes como sendo adeptos da filosofia de que o sentido mais importante dessa vida é se divertir ao máximo.
3) OS JUÍZES PRINCIPAIS
Os juízes, segundo nosso entendimento do anime, representam figuradamente certas realidades da vida humana que interagem no processo de julgamento dos seres humanos.
A) UCULUS
Três fatos revelam a realidade desse juiz: I) é aparentemente o mais velho dos juízes; II) o significado do seu nome vindo do latim (Uculus); III) e a barba (e os cabelos também) em forma de flor (flor de lótus).
O fato de ser o mais velho dos juízes faz dele um representante da tradição, pois os velhos são apegados à tradição dos antigos que se transmite de geração em geração.
E quando se lhe dá o nome de Uculus (olho, em latim), logo se entende que essa tradição se importa com aquilo que é visível (o que o olho vê), mas o anime vai revelar que há coisas que não são visíveis (porque acontecem no coração), mas que são importantes para um julgamento justo.
E quando se lhe apresenta a barba em forma de flor (flor de lótus), logo se constata que o critério deste juiz não é bom, mas ele quer impor o seu critério como um critério exclusivo, como sendo o único critério válido de julgamento. Tal coisa acontece porque a barba desse juiz tem a forma de uma flor de lótus que, no budismo, simboliza pureza, pois ela nasce e desabrocha no lodo (charco, lama, sujeira) e, mesmo nascendo no lodo, permanece pura. Ora, se entendermos que toda vez que tal flor desabrocha no anime, ela revela a verdade com pureza, temos que entender também que ela desabrocha como sendo a barba desse juiz, que então representa o lodo (conotação do critério mau de julgamento desse juiz). Assim, a barba (em forma de flor de lótus) sai desse juiz semelhantemente como a flor de lótus sai do lodo, daí a realidade da pessoa desse juiz está necessariamente associado com o significado do lodo.
B) NONA
Três fatos também revelam a realidade deste Juiz: I) o significado do seu nome vindo do latim (Nona); II) a sua baixa estatura; III) e a sua personalidade forte. Essas características irão contrastar-se com as de Uculus.
Nona, em latim, significa vovó, mas no anime a ênfase não está na velhice (como acontece com Uculus, que representa a tradição dos antigos), mas nos afetos do coração dela (comparáveis a de uma avó), que, desejando fazer o bem (e desejando que seus netos também façam o bem), a torna sisuda quanto à idéia do certo e do errado que se aprende com as experiências da vida, pelo que esse personagem representa a consciência humana, com sua noção de certo e de errado, de justo e de injusto, que se aprende com o tempo.
Assim, fica claro que Nona tem características aparentemente semelhantes às de Uculus, mas Uculus representa a tradição ultrapassada dos antigos enquanto Nona representa a consciência do certo e do errado, que se adquire com o curso da existência, pelo que é sabedoria atual que jamais ficaria ultrapassada, daí ela ser apresentada de forma jovial e sisuda, enquanto Uculus apenas como um velho teimoso.
Apesar disso, Nona é apresentada como sendo de baixa estatura quando comparada com Uculus, pelo que isso representa o fato de que, quando se trata de julgar almas dos seres humanos, a tradição dos antigos (por ser conhecimento comum inquestionado) geralmente (mas não corretamente) tem mais crédito que os ditames da sabedoria gerada pela atividade da consciência.
Por esta razão, Nona, constatando falhas nos julgamentos anteriores (pois ela tem consciência daquilo que é certo e daquilo que é errado), irá se opor a Uculus, porque ela entende que os juízes não são nem podem ser bonecos que agem maquinalmente, sempre decidindo da mesma forma, com base somente naquilo que o olho vê (critério de Uculus), pelo que eles podem mudar e julgar as almas com mais humanismo.
Diante disso, como logo ficará mais claro, é que Nona contrariará Uculus estabelecendo Chiyuki, um ser humano mulher, para assistir Decim, um juiz subordinado a Nona, no intuito de humanizar mais os julgamentos, o que só aconteceria se, indo para além daquilo que os olhos veem, fosse também considerado os sentimentos do coração. Porém, para tanto, necessário será que o modo de racionalizar de Decim seja quebrado pelo modo de sentir de Chiyuki, mas tal quebra é reputado como sendo má aos olhos de Uculus.
C) DECIM E CHIYUKI
O Juiz Decim pode ser entendido também pelo seu nome, que vem do latim. Decim (ou Decem) significa décimo (numeral), proveniente do verbo decimate (dizimar), que se originou da prática do exército romano punir legiões que se rebelavam contra seus superiores, na qual, a cada dez soldados contados, o décimo era destinado a morte por decapitação. Assim, chamando esse juiz de Decim, o anime quis representar que ele iria se rebelar contra as regras de Uculus, aderindo ao plano traçado por sua superiora Nona.
É importante destacar que o Juiz Decim só pode ser entendido na sua relação com Chiyuki, sua assistente de julgamento nomeada por Nona. Diante disso, compreende-se que os dois não se contrastam exatamente, mas se complementam, da forma abaixo relatada.
Decim representa a razão humana, que se move pela lógica daquilo que é visível, daí o fato dele se parecer frio e insensível no seu julgamento, que inicialmente é realizado de acordo com as regras de Uculus, ou seja, de acordo somente com aquilo que o olho seja capaz de ver.
Chiyuki, que só é chamada por esse nome mais no final do anime, já que antes disso só é conhecida como a mulher de cabelos negros (Kurokami no Onna), representa o coração com seus sentimentos e intuições, que não são visíveis, mas que será responsável pela mudança do modo de Decim realizar julgamentos, que serão mais humanitários com tempo, pois ele deixará de julgar somente de acordo com as memórias dos acontecimentos visíveis dos mortos, para também julgar de acordo com os sentimentos que eles expressaram somente no coração e que, por isso, não puderam ser vistos nos fatos gravados na memória.
Contudo, deve ser notado que Decim consentiu mudar o seu modo de julgar, porque ele se permitiu sentir emoções e assim humanizou seu julgamento, o que acarretou sua quebra, que nada mais foi do que renunciar sua natureza exclusivamente sobre-humana, mas isso não foi um mal, mas um bem para si e para os que ele iria julgar.
Antes, Decim somente tinha um primitivo sentimento de medo de se quebrar, mas agora, que ele parcialmente se humanizou, ele tornou-se capaz de ter outros sentimentos (amor, compaixão, arrependimento, etc) que possibilitaram que ele se colocasse no lugar dos seres humanos que julga para sentir o que eles sentiram quando agiam nesse mundo como vivos, pelo que agora seus julgamentos passariam a ser mais justos.