O olfato e o tato são, com toda certeza, os sentidos mais abstratos de todos. Enquanto artes visuais, sonoras e até mesmo gastronômicas fazem parte do nosso dia a dia, representar os outros dois de formas artísticas já é, por si só, uma adversidade. O tato, porém, é muitíssimo acessível e pode ser evocado sem muitas dificuldades, o que possibilita com que a arte convencional o desperte através dos outros sentidos: mesmo o puro som consegue arrepios provocar.
"Perfume: A História de um Assassino" é, portanto, um grande desafio de linguagem cinematográfica. Apelando para a memória olfativa do observador, o filme consegue, com primor, transmitir os mais variados cheiros e suas sensações através de cenas muito bem desenvolvidas e repletas de closes surpreendentemente não claustrofóbicos. As percepções do público através dos cheiros "virtuais" transformam a intenção usual de um plano fechado, ilustrando, simultaneamente, a forma como o protagonista "enxerga" o mundo. Além disso, a unicidade controversa do cheiro humano é retratada de uma maneira tão sensível - ainda que controversa e psicótica - que cada indivíduo, ao assistir e se entregar a proposta, terá uma experiência completamente diferente, recordando-se dos cheiros humanos que lhe tocaram de algum modo.
Outros aspectos técnicos não ficam para trás. Com fotografia ideal, figurino excelente e ótimas atuações, o roteiro se desenvolve em um bom ritmo, criando uma profundidade em Grenouille que será essencial na composição das principais dicotomias do filme: Repulsivo e encantador, cruel e inocente. O encanto pessoal de quem assiste, recordando-se de suas memórias olfativas únicas, se mistura violentamente com suas questões morais. Essa interessante mistura de sentimentos, o "ensaio" de linguagem nos cheiros despertados e a qualidade técnica brilhante fazem das 3 horas do filme uma experiência artística, cativante e repugnante - ao mesmo tempo. Marcante.
P.S: A reação negativa de um público mais conservador, relativa ao aspecto "imoral" do desfecho, é uma clara demonstração de ignorância e, portanto, deve ser ignorada. A arte, em qualquer um de seus meios, não é produzida com o único e exclusivo fim de gerar sorrisos e/ou satisfazer sensos de justiça pessoais. Pelo contrário, a arte é muito mais utilizada para questionar, provocar sensações! E "Perfume" é exatamente sobre isso: Provocação de sentires, conceitos e até mesmo da nossa imaginação.
A estética da histeria sexual coletiva, o desejo que o perfume desperta, o que seria tudo isso senão um admirável exemplo de arte provocativa?
Mas já dizia o também "imoral" Nelson Rodrigues "O artista tem que ser gênio para alguns e imbecil para outros. Se puder ser imbecil para todos, melhor ainda."
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O Mágico de Oz
4.2 1,3K Assista AgoraBom de assistir ouvindo Dark Side of the Moon
Perfume: A História de um Assassino
4.0 2,2KO olfato e o tato são, com toda certeza, os sentidos mais abstratos de todos. Enquanto artes visuais, sonoras e até mesmo gastronômicas fazem parte do nosso dia a dia, representar os outros dois de formas artísticas já é, por si só, uma adversidade. O tato, porém, é muitíssimo acessível e pode ser evocado sem muitas dificuldades, o que possibilita com que a arte convencional o desperte através dos outros sentidos: mesmo o puro som consegue arrepios provocar.
"Perfume: A História de um Assassino" é, portanto, um grande desafio de linguagem cinematográfica. Apelando para a memória olfativa do observador, o filme consegue, com primor, transmitir os mais variados cheiros e suas sensações através de cenas muito bem desenvolvidas e repletas de closes surpreendentemente não claustrofóbicos. As percepções do público através dos cheiros "virtuais" transformam a intenção usual de um plano fechado, ilustrando, simultaneamente, a forma como o protagonista "enxerga" o mundo. Além disso, a unicidade controversa do cheiro humano é retratada de uma maneira tão sensível - ainda que controversa e psicótica - que cada indivíduo, ao assistir e se entregar a proposta, terá uma experiência completamente diferente, recordando-se dos cheiros humanos que lhe tocaram de algum modo.
Outros aspectos técnicos não ficam para trás. Com fotografia ideal, figurino excelente e ótimas atuações, o roteiro se desenvolve em um bom ritmo, criando uma profundidade em Grenouille que será essencial na composição das principais dicotomias do filme: Repulsivo e encantador, cruel e inocente. O encanto pessoal de quem assiste, recordando-se de suas memórias olfativas únicas, se mistura violentamente com suas questões morais. Essa interessante mistura de sentimentos, o "ensaio" de linguagem nos cheiros despertados e a qualidade técnica brilhante fazem das 3 horas do filme uma experiência artística, cativante e repugnante - ao mesmo tempo. Marcante.
P.S: A reação negativa de um público mais conservador, relativa ao aspecto "imoral" do desfecho, é uma clara demonstração de ignorância e, portanto, deve ser ignorada. A arte, em qualquer um de seus meios, não é produzida com o único e exclusivo fim de gerar sorrisos e/ou satisfazer sensos de justiça pessoais. Pelo contrário, a arte é muito mais utilizada para questionar, provocar sensações! E "Perfume" é exatamente sobre isso: Provocação de sentires, conceitos e até mesmo da nossa imaginação.
A estética da histeria sexual coletiva, o desejo que o perfume desperta, o que seria tudo isso senão um admirável exemplo de arte provocativa?