Em meados de 1999 Paul Thomas Anderson lançava Magnólia, uma homenagem virtuosa e pouco modesta ao cinema de Robert Altman, e o crítico Pablo Villaça escrevia sua afamada análise do filme. Indo desde uma crítica discreta sobre o peso das atuações até uma paranoia conspiratoria sobre o uso de signos através da narrativa, o texto de Villaça se tornou muito famoso por ser base para a iniciação cinéfila de muita gente -inclusive da minha, confesso- mas também por ser, numa segunda leitura, um ótimo exemplo de como o cinema de PTA, muito claramente pensado para ser um experimento cinemático/sensorial virtuoso, se torna prato cheio para a paranoia superanalítica de certa porção da crítica. Qual a função das artes coloridas, o quê significavam os sapos, ou porquê Daniel Plainview disse aquelas palavras naquela cena final, são muito bons exemplos de questionamentos que fermentam vigorosamente as expectativas dessa crítica investigativa, que não consegue conceber um cinema diferente daquele com três atos e arcos dramáticos delineados, e ao se deparar com isso só consegue estranhar ou entender como digressão artística. Obviamente não pensaria que Vício Inerente existe pura e simplesmente para minar e se divertir com as expectativas daqueles que planejavam esse tipo de leitura, mas além de ser um filme delicioso e trazer um frescor perfumado de maconha para a filmografia de Anderson, ele está visivelmente esmerado em não se deixar encaixotar ou rotular, e consegue sem maiores esforços. O sucesso da empreitada deve muito ao material original, é claro. Pynchon nunca teve um trabalho transcrito para as telas por cair na categoria dos “inadaptáveis”, os famosos livros tão embuídos de vigor literário que desafiam a capacidade dos roteiristas que tentam objetivá-los num padrão cinematográfico. A maneira saudável como Anderson faz o texto de Pynchon encontrar seu lugar na tela me remeteu muito àquilo que Luiz Fernando Carvalho fez com o Lavoura Arcaica de Raduan Nassar, outro livro tido como impossível de adaptar, e que virou um grande título do cinema brasileiro contemporâneo justamente pela coragem que o diretor teve de ser fiel às palavras já bastante pomposas deixadas pelo autor do material original. Vício Inerente, o livro, é um volume modesto com menos de 400 páginas, mas que abarca uma quantidade tão exasperante de acontecimentos enevoados pela constante letargia do protagonista Doc Sportello, nomes esdrúxulos como Shasta Fay Hepworth e Japonica Fenway, violência explosiva e conspirações afins. De fato um material algo complicado de se transcrever em filme mas, muito lucidamente, Anderson não tenta modelar a confusão e as saídas falsas de Pynchon em algo palatável. Pelo contrário, Vício Inerente, o filme, é uma mistura de neo-noir com conto de máfia onde ninguém diz ou faz algo efetivamente relevante. (...) http://pipocracia.blogspot.com.br/2015/04/vicioinerente.html
(...)São desejos destrutivos de menosprezar o amor do marido e a lealdade dos amigos, é a perda dos pequenos prazeres da vida, como um almoço com os filhos, mas também a compreensão de que esta não é uma sensação permanente, e que as alegrias ainda podem ser compartilhadas, nos melhores momentos; e acima de tudo isso, é especialmente um peso no olhar, que vem das tantas fadigas físicas que a doença causa, e que vão suprimindo a vontade de viver. Muito haveria para se falar sobre as questões humanistas do trabalho dos Dardenne, que a cada filme se tornam mais expositivas, e que talvez por isso tenham começado a perder sua magia para dar lugar a um didatismo descabido; mas me parece muito mais interessante se manter atento à pessoa de Sandra, ao seu caminhar, às suas ligações aflitas no telefone, e em como ela segue, em direção ao horizonte pronta para viver mais, e melhor. http://www.pipocracia.blogspot.com.br/2015/02/doisdias.html
Ao fugir da inabalável sobriedade -e porquê não dizer industrialização- que norteavam seu cinema desde inícios da carreira, Fincher cria o objeto mais estranho, camp, cheio de classe, e deliciosamente demente que uma tela viu nos últimos anos; provavelmente desde que Herzog chocou a crítica, e alguma parcela do público, com o absurdo que era sua releitura do Vício Frenético de Abel Ferrara. A cada novo enquadramento que isola e evidencia um ator, como fosse ele uma peça neste grande jogo de gato e rato, percebe-se como o rosto, dentro do filme, e principalmente dentro do filme de Fincher é por si só, a maior bandeira da perpétua falta de balanço que existe numa relação humana. Existir como imagem é estar pronto para autodestruir-se.(...) http://pipocracia.com/critica-garota-exemplar/
A fragmentação e a apatia desta estreia de Gia Coppola seriam muito mais bem vindas e interessantes se não soasse como se ela estivesse se espelhando tão intensamente em sua tia famosa. Baseado no livro irregular de James Franco, Palo Alto é, assim como o tema recorrente no cinema de Sofia, um filme sobre a vida de jovens ricos e entediados dos subúrbios californianos, mas trata desse personagens com um pouco mais de carinho e menos tragédia que o filme de coming-of-age comum. No entanto, a falta de foco e ritmo de Gia prejudicam bastante a experiência, que só não deixa de ser interessante por causa das performances ótimas de Emma Roberts e Jack Kilmer.
Mesmo passando bastante longe da energia de Reino Animal, sua impecável estreia em longas metragens, Michôd mantêm neste A Caçada parte da aridez e da virulência que fizeram daquele primeiro um filme tão interessante. Em teoria, o filme acompanha Guy Pearce e sua microjornada carregada de violência pelas estradas da Austrália devastada por uma crise econômica, no melhor estilo Mad Max de distopia, mas o grande foco -e surpresa- acaba sendo a performance impecável de Robert Pattinson. Somando a violência sem reservas às locações vastas no outback australiano, sempre evidenciadas pelo intenso granulado da fotografia de Natasha Braier, A Caçada se torna muito mais uma experiência sensorial do que efetivamente narrativa.
(...)Para comportar radicalmente toda a amplitude daquilo que este corpo solitário gostaria de afirmar quando se coloca -ou se retira- do mundo, é preciso vê-lo por completo, e assim, por mais lindo que fosse, qualquer outro formato de tela além desse escolhido por Cao Guimarães, Marcelo Gomes e Ivo Lopes Araújo para fotografar a história de seu Homem das Multidões passaria muito longe do real sentimento que comanda a história. Quanto mais larga a tela, mais espaço haveria para respirar, para tomar contato com o mundo e com as pessoas, para se jogar numa liberdade que não é particularmente atraente ao personagem de Paulo André. Ao mesmo tempo que a tela achatada soa como um molde feito exclusivamente para comportar um único corpo, aquele tão desinteressante para a velocidade da urbe mas tão interessado nela, essa escolha também soa como uma brecha, uma janela que de certa maneira nos coloca na mesma posição quasi-voyeurista desse homem, volta e meia nos forçando a tentar encontrá-lo por trás de multidões apressadas, festivas, ou mesmo no quadro vazio, quando sua presença pode ser apenas um devaneio.(...)
Não deve ser difícil encontrar quem relegue Blue Ruin a um mero pastiche do humor fino dos Coen com a aridez brutal de John Hillcoat, mas esta é uma leitura bastante reducionista do poderoso trabalho de Jeremy Saulnier. Fotógrafo com larga experiência, Saulnier agrega a função, junto a roteiro e direção, atingindo um controle minucioso de cada aspecto de seu filme, e felizmente consegue não ser vencido pelas atribuições. Blue Ruin é essencialmente uma tradicional história de vingança, mas com um frescor de originalidade que vem de seu protagonista, um homem perdido e demasiado humano, que não sabe calcular bem seus próximos passos e acaba por se perder mais e mais numa espiral de violência. Se o primeiro filme do rapaz era muito mais uma curiosidade divertida do que outra coisa, este aqui faz dele alguém para se acompanhar com muita atenção.
Se Um Brinde à Amizade soou como uma guinada de Joe Swanberg para certo caminho mais tradicional, Happy Christmas vem provar que aquele foi apenas um experimento estético/narrativo, como quase tudo que o diretor já fez até aqui. Joe volta a se preocupar pouco com a textura da imagem, e não pensar na narrativa de uma maneira tão específica como fez no trabalho anterior. O precioso estudo de personagem que surge da relação entre Melanie Lynskey e Anna Kendrick, e especialmente nas experiências da segunda com seu egoísmo infantil, é moldado quase exclusivamente através dos diálogos, sempre improvisados, e da edição assombrosa de Swanberg, que costura tema e intenção com uma classe que pouco se vê no cinema americano como um todo, não só no independente. É provavelmente um dos filmes mais valiosos de sua enorme filmografia.
A Culpa é das Estrelas é cinema de precisão cirúrgica, e quando digo isso não estou me referindo a uma maneira kubrickiana de se fazer filmes, em que luz, som e atores deviam estar em níveis neuroticamente controlados para que o diretor se desse por satisfeito, mas sim à maneira como todos os aspectos do filme gritam indústria, mecanicidade, e uma infelicidade soturna, que nada tem a ver com aquela tristeza que o filme tenta retratar, e que resvala muito mais na ideia de que o cinema, enquanto produto, raramente vai conseguir se aproximar das emoções que, por exemplo, o já citado Kubrick consegue exalar num espectador. Eu vi De Olhos Bem Fechados uma única vez a alguns anos, e talvez ainda consiga descrever boa parte de suas cenas; vi A Culpa é das Estrelas três dias atrás, e ele já está se decompondo em algum lugar do meu subconsciente. E antes que alguém venha a aventar a questão, a comparação é perfeitamente cabível; ambos são filmes. (...)
No início de Sob a Pele, atravessamos o universo na companhia de uma voz que repete uma dezena de fonemas, como uma criança em suas primeiras aulas de alfabetização. Muito da inocência latente que a personagem de Scarlett Johansson vai exibir durante o filme realmente tem algo que ver com este seu descobrimento da linguagem, numa maneira tão naturalmente associada com a infância. Para todos os efeitos, a alienígena que vêm à terra numa missão tão complexa que nem ela mesma é capaz de compreender em totalidade, nada mais é do que um ser inocente perdido na violência que a envolve; um androide que vai se ver forçado à aceitar, compreender e finalmente absorver um pouco da humanidade que existe em cada ser terrestre. Essa sensação de (re)descoberta dos sentidos que Johansson percebe a cada situação que o contato com suas vítimas proporciona, seja através do sabor de uma torta de chocolate ou da música alta em uma boate lotada, caminha muito próxima daquilo que o espectador está experimentando, ainda que em nível completamente diferente. O filme se mostra uma experiência tão brutalizante em sua intencional falta de “comos e porquês”, que o frio das inóspitas ruas de Edinburgo atravessa a tela e começa a incidir diretamente sobre qualquer um que se proponha a lhe experimentar. A noção de que o ser humano pode ignorar a maneira descortês com a qual é tratado pela natureza, e continuar inabalável em sua crença -como demonstra a cena em que um casal se joga no mar congelante para tentar salvar seu cão de estimação- apenas potencializa essa leitura quase espiritual que Jonathan Glazer faz da vida na terra.
Mesmo sendo um trabalho genuinamente autoral, daqueles que cada fala e gesto parecem carregar consigo uma porção dos sentimentos de seu diretor, Praia do Futuro está muito distante das dimensões emocionais que Aïnouz alcançou em seus trabalhos anteriores. Se Suely ou Violeta eram pessoas cujos motivos nos eram apresentados de forma tão terna, que se tornava impossível não se imiscuir de suas dores, este aqui parece tão indeciso sobre qual história está contando, e de que maneira pretende contá-la, que se torna muito difícil criar conexão verdadeira com seus personagens. Moura, Schick e Barbosa servem perfeitamente bem a seus papéis, mas o roteiro parece algo limitado, receoso de se jogar completamente no drama do homem que abandona a família para viver um amor; trama essa que se desenrola de maneira quase abstrata, com sobressaltos temporais desnorteantes, no sentido menos elogioso da palavra. É certamente um dos momentos menos interessantes de Aïnouz, mas ainda um filme que merece ser visto, de preferência no cinema; o som e as cores trabalham juntos de maneira espetacular numa tela grande.
Wes Anderson continua firme na crença em seu charme aventureiro e obsessão estética, mas O Grande Hotel Budapeste é muito mais sombrio e climático que seus trabalhos anteriores. Além da inédita quantidade de violência, este também é um de seus filmes mais fortemente dedicados à exploração da memória e de como revisitar o passado não necessariamente implica em uma análise do presente.
Diferente do esperado, o segundo capítulo da franquia do Homem-Aranha -e sim, se trata de um capítulo, por não se preocupar em introduzir ou concluir muito bem suas tramas- parece não ter aprendido com seus erros anteriores, mas acerta em vários outros âmbitos. Diferente do primeiro, onde tudo era muito mais econômico e contido, Webb parece ter interesse em injetar certo charme de aventura noventista na história, que ganha um ar descompromissado, jovial, e por vezes bastante bobo. Das atuações exageradas, as implausibilidades do roteiro, tudo parece estar sendo tratado com pouquíssima seriedade. A sensação de desperdício de tempo e dinheiro que acompanhava o início da série continua reverberando aqui, mas se não é possível combatê-la, é melhor aproveitar o que for possível. Por sinal, uma cena chave envolvendo Stone e Garfield já está entre as mais bonitas do ano, e de certo entre as melhores já produzidas pela Marvel.
Desnecessário, mas surpreendentemente agradável, este reboot do Homem-Aranha não tem o charme ou a classe cinematográfica que o primeiro filme de Sam Raiimi havia alcançado, mas também está longe de ser ruim. Marc Webb consegue transformar Andrew Garfield numa figura mais interessante do que Tobey Maguire jamais foi, e mantêm o filme num clima agradável, menos denso que os da série anterior. Não é nada profundo, mas bastante divertido.
Até para um leigo no universo Marvel -ou qualquer universo de quadrinhos que seja, como eu-, este segundo filme do Capitão América funciona tão bem, para além de conexão com o episódio anterior ou outros personagens das histórias originais, que se torna de fato o melhor trabalho deste nicho a ser lançado até aqui. A surpreendente habilidade da dupla de diretores balanceia drama e ação -focando mais nesta última, é verdade- com uma classe que pouco se vê em grandes blockbusters. Diferente de grande parte dos produtos em seu gênero, não há sujeira visual ou tempo desperdiçado, especialmente no que diz respeito ao terceiro ato; longo, mas tão bem construído que convence até o mais cético dos cinéfilos a aceitar sua beleza.
Tão psicologicamente enigmático quanto todo o resto de sua obra, Uma Relação Delicada é também a maneira que Breillat encontrou para exorcizar um episódio dramático de sua vida; porém, a frieza e distância com a qual somos mantidos da personagem -muito bem interpretada por Huppert-, e que aparentemente foi pensada como forma de tragar o espectador para a inacreditável sucessão de fatos que levam à derrocada financeira e emocional daquela mulher, acaba sendo mais enervante do que sedutora, e compromete um pouco a apreciação de outros pontos.
Poderia ser um curioso exercício de suspense, mas a maneira absolutamente relaxada com que Confia em Mim é construído, mina suas chances de ser levado a sério. O par formado por Machado e Solano não tem química, muito por conta das péssimas performances de ambos, e o fato de não se dar tempo para que suas personagens sejam devidamente desenvolvidas deixa ainda mais difícil que se crie algum interesse por ele. Ocorrência comum no mau cinema brasileiro, a sensação geral é de estar vendo um bom episódio de um seriado descartável da Globo. Não chega a ser tragicamente ruim, mas esta longe de ser interessante.
Sem Escalas é exatamente o tipo de filme que se espera de Liam Neeson hoje em dia: ação frenética, pouco desenvolvimento de personagem, e uma trama que tem tantos buracos quanto reviravoltas. Mas à parte isso, é fato que este é talvez o filme mais divertido à estampar o rosto do ator desde que ele fez o primeiro Busca Implacável, em 2008. Além do divertido jogo de gato e rato que se desdobra dentro do avião onde a história se passa, um elenco coadjuvante maravilhoso que conta com Michelle Dockery, Corey Stoll, Lupita Nyong'o, Scoot McNairy e Julianne Moore também salta aos olhos.
Mesmo sem ter visto nenhum grande valor em Coração Louco, trabalho anterior de Scott Cooper que rendeu um Oscar à Jeff Bridges, fiquei interessado neste Tudo por Justiça depois de ver uma cena maravilhosa entre Bale e Saldana. A cena realmente se mostrou a melhor de todo o longa, mas o filme tem sido injustamente massacrado pela crítica. Sim, é uma história sobre vingança, família, falta de perspectiva e tantas outras coisas que o cinema americano já está cansado de visitar, mas Cooper trata de tudo isso com uma desesperança e cinismo tamanhos, que toda a carga melodramática parece estar vindo mais do espectador do que da própria trama. Bale, Saldana, Affleck e Harrelson estão maravilhosos, e suas atuações são o carro chefe, já que o roteiro é mais do mesmo, ainda que bem realizado.
In Fear é mais um desses brilhantes filmes de horror que o cinema britânico entrega a cada par de anos (vide Extermínio, Eden Lake, Abismo do Medo, Kill List), e que mesmo não oferecendo nada de original em termos de construção ou estética, tem um vigor impressionante em sua modéstia. Lovering faz aqui um filme com três atores, um carro, e um labirinto de estradas no interior da Irlanda. O casal cai num jogo perturbador, o maníaco planta suas armadilhas, a noite cai, a chuva traz frio, e mesmo com tantos elementos conhecidos, o diretor consegue injetar algo de muito particular na maneira como olha para aquelas pessoas, interferindo muito sutilmente na relação deles com o público. Não tem o poder de deixar os nervos à flor da pele como seus conterrâneos já citados, mas é uma experiência narrativa muito potente.
O interesse que Korine nutria pelos desajustados, perturbados e deficientes que se escondem nos subúrbios americanos já havia sido exposto em Gummo, e voltou neste segundo filme, comprovando as preferências estéticas e temáticas de sua carreira. Julien Donkey-Boy é um mergulho profundo na esquizofrenia, pela proximidade violenta com que a câmera do diretor nos leva para o universo de um personagem perturbado por seus próprios demônios, e por um seio familiar tão insalubre que jamais permitirá avanço ou redenção para ele.
As escolhas que Jean-Marc Vallée faz para recriar a história real de um homem que lutou contra os regulamentos sanitários de seu país para tentar salvar a própria vida, e tempos depois as vidas de outras pessoas, parecem se resumir em jogar todo o trabalho de criar inflexões e questionamentos para seus atores. McConaughey e Leto estão fisicamente assombrosos, e suas performances são vigorosas, mas ao procurar substância no resto do filme para dar suporte aos dois, pouco se encontra. O roteiro perde chances interessantes de fazer um comentário social mais profundo, e se coloca numa posição muito fácil de observar relações rasas entre o protagonista e as pessoas que o circundam. Não é de todo ruim, mas como grande parte dos filmes da safra de premiações, vai ser esquecido em três meses.
Nebraska não é propriamente cínico nem pessimista, mas raros são os momentos que Alexander Payne permite um respiro de vivacidade à seus personagens. Mesmo as parcelas mais doces e poéticas do filme -quase sempre atreladas à Will Forte e sua performance discreta, que parece não querer estragar o espetáculo de Bruce Dern- estão mergulhadas num preto e branco amargo, num sentimento de estagnação, da qual aquelas pessoas e seus desejos muito provavelmente jamais conseguirão se libertar. É o filme mais sombrio de toda a bela carreira de Payne, e isso é um enorme elogio.
Último Desejo é mais uma das notáveis evidências do pouco talento que James Franco tem para dirigir filmes, e também do enorme talento que ele tem para fugir totalmente da essência de seu material original. O seminal romance de William Faulkner é um sombrio e deprimente retrato de um sul esquecido, ao qual Franco não consegue impôr o tom necessário. Os esforços de atuação, que são as únicas coisas boas do longa, parecem vir mais dos próprios atores do que das ideias do diretor e seu ego descontrolado.
Vício Inerente
3.5 554 Assista AgoraEm meados de 1999 Paul Thomas Anderson lançava Magnólia, uma homenagem virtuosa e pouco modesta ao cinema de Robert Altman, e o crítico Pablo Villaça escrevia sua afamada análise do filme. Indo desde uma crítica discreta sobre o peso das atuações até uma paranoia conspiratoria sobre o uso de signos através da narrativa, o texto de Villaça se tornou muito famoso por ser base para a iniciação cinéfila de muita gente -inclusive da minha, confesso- mas também por ser, numa segunda leitura, um ótimo exemplo de como o cinema de PTA, muito claramente pensado para ser um experimento cinemático/sensorial virtuoso, se torna prato cheio para a paranoia superanalítica de certa porção da crítica. Qual a função das artes coloridas, o quê significavam os sapos, ou porquê Daniel Plainview disse aquelas palavras naquela cena final, são muito bons exemplos de questionamentos que fermentam vigorosamente as expectativas dessa crítica investigativa, que não consegue conceber um cinema diferente daquele com três atos e arcos dramáticos delineados, e ao se deparar com isso só consegue estranhar ou entender como digressão artística. Obviamente não pensaria que Vício Inerente existe pura e simplesmente para minar e se divertir com as expectativas daqueles que planejavam esse tipo de leitura, mas além de ser um filme delicioso e trazer um frescor perfumado de maconha para a filmografia de Anderson, ele está visivelmente esmerado em não se deixar encaixotar ou rotular, e consegue sem maiores esforços.
O sucesso da empreitada deve muito ao material original, é claro. Pynchon nunca teve um trabalho transcrito para as telas por cair na categoria dos “inadaptáveis”, os famosos livros tão embuídos de vigor literário que desafiam a capacidade dos roteiristas que tentam objetivá-los num padrão cinematográfico. A maneira saudável como Anderson faz o texto de Pynchon encontrar seu lugar na tela me remeteu muito àquilo que Luiz Fernando Carvalho fez com o Lavoura Arcaica de Raduan Nassar, outro livro tido como impossível de adaptar, e que virou um grande título do cinema brasileiro contemporâneo justamente pela coragem que o diretor teve de ser fiel às palavras já bastante pomposas deixadas pelo autor do material original. Vício Inerente, o livro, é um volume modesto com menos de 400 páginas, mas que abarca uma quantidade tão exasperante de acontecimentos enevoados pela constante letargia do protagonista Doc Sportello, nomes esdrúxulos como Shasta Fay Hepworth e Japonica Fenway, violência explosiva e conspirações afins. De fato um material algo complicado de se transcrever em filme mas, muito lucidamente, Anderson não tenta modelar a confusão e as saídas falsas de Pynchon em algo palatável. Pelo contrário, Vício Inerente, o filme, é uma mistura de neo-noir com conto de máfia onde ninguém diz ou faz algo efetivamente relevante.
(...)
http://pipocracia.blogspot.com.br/2015/04/vicioinerente.html
Dois Dias, Uma Noite
3.9 542(...)São desejos destrutivos de menosprezar o amor do marido e a lealdade dos amigos, é a perda dos pequenos prazeres da vida, como um almoço com os filhos, mas também a compreensão de que esta não é uma sensação permanente, e que as alegrias ainda podem ser compartilhadas, nos melhores momentos; e acima de tudo isso, é especialmente um peso no olhar, que vem das tantas fadigas físicas que a doença causa, e que vão suprimindo a vontade de viver. Muito haveria para se falar sobre as questões humanistas do trabalho dos Dardenne, que a cada filme se tornam mais expositivas, e que talvez por isso tenham começado a perder sua magia para dar lugar a um didatismo descabido; mas me parece muito mais interessante se manter atento à pessoa de Sandra, ao seu caminhar, às suas ligações aflitas no telefone, e em como ela segue, em direção ao horizonte pronta para viver mais, e melhor.
http://www.pipocracia.blogspot.com.br/2015/02/doisdias.html
Garota Exemplar
4.2 5,0K Assista AgoraAo fugir da inabalável sobriedade -e porquê não dizer industrialização- que norteavam seu cinema desde inícios da carreira, Fincher cria o objeto mais estranho, camp, cheio de classe, e deliciosamente demente que uma tela viu nos últimos anos; provavelmente desde que Herzog chocou a crítica, e alguma parcela do público, com o absurdo que era sua releitura do Vício Frenético de Abel Ferrara. A cada novo enquadramento que isola e evidencia um ator, como fosse ele uma peça neste grande jogo de gato e rato, percebe-se como o rosto, dentro do filme, e principalmente dentro do filme de Fincher é por si só, a maior bandeira da perpétua falta de balanço que existe numa relação humana. Existir como imagem é estar pronto para autodestruir-se.(...)
http://pipocracia.com/critica-garota-exemplar/
Palo Alto
3.2 429A fragmentação e a apatia desta estreia de Gia Coppola seriam muito mais bem vindas e interessantes se não soasse como se ela estivesse se espelhando tão intensamente em sua tia famosa. Baseado no livro irregular de James Franco, Palo Alto é, assim como o tema recorrente no cinema de Sofia, um filme sobre a vida de jovens ricos e entediados dos subúrbios californianos, mas trata desse personagens com um pouco mais de carinho e menos tragédia que o filme de coming-of-age comum. No entanto, a falta de foco e ritmo de Gia prejudicam bastante a experiência, que só não deixa de ser interessante por causa das performances ótimas de Emma Roberts e Jack Kilmer.
The Rover: A Caçada
3.3 354 Assista AgoraMesmo passando bastante longe da energia de Reino Animal, sua impecável estreia em longas metragens, Michôd mantêm neste A Caçada parte da aridez e da virulência que fizeram daquele primeiro um filme tão interessante. Em teoria, o filme acompanha Guy Pearce e sua microjornada carregada de violência pelas estradas da Austrália devastada por uma crise econômica, no melhor estilo Mad Max de distopia, mas o grande foco -e surpresa- acaba sendo a performance impecável de Robert Pattinson. Somando a violência sem reservas às locações vastas no outback australiano, sempre evidenciadas pelo intenso granulado da fotografia de Natasha Braier, A Caçada se torna muito mais uma experiência sensorial do que efetivamente narrativa.
O Homem das Multidões
3.4 106(...)Para comportar radicalmente toda a amplitude daquilo que este corpo solitário gostaria de afirmar quando se coloca -ou se retira- do mundo, é preciso vê-lo por completo, e assim, por mais lindo que fosse, qualquer outro formato de tela além desse escolhido por Cao Guimarães, Marcelo Gomes e Ivo Lopes Araújo para fotografar a história de seu Homem das Multidões passaria muito longe do real sentimento que comanda a história. Quanto mais larga a tela, mais espaço haveria para respirar, para tomar contato com o mundo e com as pessoas, para se jogar numa liberdade que não é particularmente atraente ao personagem de Paulo André. Ao mesmo tempo que a tela achatada soa como um molde feito exclusivamente para comportar um único corpo, aquele tão desinteressante para a velocidade da urbe mas tão interessado nela, essa escolha também soa como uma brecha, uma janela que de certa maneira nos coloca na mesma posição quasi-voyeurista desse homem, volta e meia nos forçando a tentar encontrá-lo por trás de multidões apressadas, festivas, ou mesmo no quadro vazio, quando sua presença pode ser apenas um devaneio.(...)
http://pipocracia.com/2014/07/30/critica-homem-das-multidoes/
Ruína Azul
3.5 131Não deve ser difícil encontrar quem relegue Blue Ruin a um mero pastiche do humor fino dos Coen com a aridez brutal de John Hillcoat, mas esta é uma leitura bastante reducionista do poderoso trabalho de Jeremy Saulnier. Fotógrafo com larga experiência, Saulnier agrega a função, junto a roteiro e direção, atingindo um controle minucioso de cada aspecto de seu filme, e felizmente consegue não ser vencido pelas atribuições. Blue Ruin é essencialmente uma tradicional história de vingança, mas com um frescor de originalidade que vem de seu protagonista, um homem perdido e demasiado humano, que não sabe calcular bem seus próximos passos e acaba por se perder mais e mais numa espiral de violência. Se o primeiro filme do rapaz era muito mais uma curiosidade divertida do que outra coisa, este aqui faz dele alguém para se acompanhar com muita atenção.
Um Novo Começo
2.6 57 Assista AgoraSe Um Brinde à Amizade soou como uma guinada de Joe Swanberg para certo caminho mais tradicional, Happy Christmas vem provar que aquele foi apenas um experimento estético/narrativo, como quase tudo que o diretor já fez até aqui. Joe volta a se preocupar pouco com a textura da imagem, e não pensar na narrativa de uma maneira tão específica como fez no trabalho anterior. O precioso estudo de personagem que surge da relação entre Melanie Lynskey e Anna Kendrick, e especialmente nas experiências da segunda com seu egoísmo infantil, é moldado quase exclusivamente através dos diálogos, sempre improvisados, e da edição assombrosa de Swanberg, que costura tema e intenção com uma classe que pouco se vê no cinema americano como um todo, não só no independente. É provavelmente um dos filmes mais valiosos de sua enorme filmografia.
A Culpa é das Estrelas
3.7 4,0K Assista AgoraA Culpa é das Estrelas é cinema de precisão cirúrgica, e quando digo isso não estou me referindo a uma maneira kubrickiana de se fazer filmes, em que luz, som e atores deviam estar em níveis neuroticamente controlados para que o diretor se desse por satisfeito, mas sim à maneira como todos os aspectos do filme gritam indústria, mecanicidade, e uma infelicidade soturna, que nada tem a ver com aquela tristeza que o filme tenta retratar, e que resvala muito mais na ideia de que o cinema, enquanto produto, raramente vai conseguir se aproximar das emoções que, por exemplo, o já citado Kubrick consegue exalar num espectador. Eu vi De Olhos Bem Fechados uma única vez a alguns anos, e talvez ainda consiga descrever boa parte de suas cenas; vi A Culpa é das Estrelas três dias atrás, e ele já está se decompondo em algum lugar do meu subconsciente. E antes que alguém venha a aventar a questão, a comparação é perfeitamente cabível; ambos são filmes. (...)
http://www.pipocracia.com/2014/06/a-culpa-e-das-estrelas.html
Sob a Pele
3.2 1,4K Assista AgoraNo início de Sob a Pele, atravessamos o universo na companhia de uma voz que repete uma dezena de fonemas, como uma criança em suas primeiras aulas de alfabetização. Muito da inocência latente que a personagem de Scarlett Johansson vai exibir durante o filme realmente tem algo que ver com este seu descobrimento da linguagem, numa maneira tão naturalmente associada com a infância. Para todos os efeitos, a alienígena que vêm à terra numa missão tão complexa que nem ela mesma é capaz de compreender em totalidade, nada mais é do que um ser inocente perdido na violência que a envolve; um androide que vai se ver forçado à aceitar, compreender e finalmente absorver um pouco da humanidade que existe em cada ser terrestre. Essa sensação de (re)descoberta dos sentidos que Johansson percebe a cada situação que o contato com suas vítimas proporciona, seja através do sabor de uma torta de chocolate ou da música alta em uma boate lotada, caminha muito próxima daquilo que o espectador está experimentando, ainda que em nível completamente diferente. O filme se mostra uma experiência tão brutalizante em sua intencional falta de “comos e porquês”, que o frio das inóspitas ruas de Edinburgo atravessa a tela e começa a incidir diretamente sobre qualquer um que se proponha a lhe experimentar. A noção de que o ser humano pode ignorar a maneira descortês com a qual é tratado pela natureza, e continuar inabalável em sua crença -como demonstra a cena em que um casal se joga no mar congelante para tentar salvar seu cão de estimação- apenas potencializa essa leitura quase espiritual que Jonathan Glazer faz da vida na terra.
http://www.pipocracia.com/2014/05/sob-pele
Praia do Futuro
3.4 934 Assista AgoraMesmo sendo um trabalho genuinamente autoral, daqueles que cada fala e gesto parecem carregar consigo uma porção dos sentimentos de seu diretor, Praia do Futuro está muito distante das dimensões emocionais que Aïnouz alcançou em seus trabalhos anteriores. Se Suely ou Violeta eram pessoas cujos motivos nos eram apresentados de forma tão terna, que se tornava impossível não se imiscuir de suas dores, este aqui parece tão indeciso sobre qual história está contando, e de que maneira pretende contá-la, que se torna muito difícil criar conexão verdadeira com seus personagens. Moura, Schick e Barbosa servem perfeitamente bem a seus papéis, mas o roteiro parece algo limitado, receoso de se jogar completamente no drama do homem que abandona a família para viver um amor; trama essa que se desenrola de maneira quase abstrata, com sobressaltos temporais desnorteantes, no sentido menos elogioso da palavra. É certamente um dos momentos menos interessantes de Aïnouz, mas ainda um filme que merece ser visto, de preferência no cinema; o som e as cores trabalham juntos de maneira espetacular numa tela grande.
O Grande Hotel Budapeste
4.2 3,0KWes Anderson continua firme na crença em seu charme aventureiro e obsessão estética, mas O Grande Hotel Budapeste é muito mais sombrio e climático que seus trabalhos anteriores. Além da inédita quantidade de violência, este também é um de seus filmes mais fortemente dedicados à exploração da memória e de como revisitar o passado não necessariamente implica em uma análise do presente.
O Espetacular Homem-Aranha 2: A Ameaça de Electro
3.5 2,6K Assista AgoraDiferente do esperado, o segundo capítulo da franquia do Homem-Aranha -e sim, se trata de um capítulo, por não se preocupar em introduzir ou concluir muito bem suas tramas- parece não ter aprendido com seus erros anteriores, mas acerta em vários outros âmbitos. Diferente do primeiro, onde tudo era muito mais econômico e contido, Webb parece ter interesse em injetar certo charme de aventura noventista na história, que ganha um ar descompromissado, jovial, e por vezes bastante bobo. Das atuações exageradas, as implausibilidades do roteiro, tudo parece estar sendo tratado com pouquíssima seriedade. A sensação de desperdício de tempo e dinheiro que acompanhava o início da série continua reverberando aqui, mas se não é possível combatê-la, é melhor aproveitar o que for possível. Por sinal, uma cena chave envolvendo Stone e Garfield já está entre as mais bonitas do ano, e de certo entre as melhores já produzidas pela Marvel.
O Espetacular Homem-Aranha
3.4 4,9K Assista AgoraDesnecessário, mas surpreendentemente agradável, este reboot do Homem-Aranha não tem o charme ou a classe cinematográfica que o primeiro filme de Sam Raiimi havia alcançado, mas também está longe de ser ruim. Marc Webb consegue transformar Andrew Garfield numa figura mais interessante do que Tobey Maguire jamais foi, e mantêm o filme num clima agradável, menos denso que os da série anterior. Não é nada profundo, mas bastante divertido.
Capitão América 2: O Soldado Invernal
4.0 2,6K Assista AgoraAté para um leigo no universo Marvel -ou qualquer universo de quadrinhos que seja, como eu-, este segundo filme do Capitão América funciona tão bem, para além de conexão com o episódio anterior ou outros personagens das histórias originais, que se torna de fato o melhor trabalho deste nicho a ser lançado até aqui. A surpreendente habilidade da dupla de diretores balanceia drama e ação -focando mais nesta última, é verdade- com uma classe que pouco se vê em grandes blockbusters. Diferente de grande parte dos produtos em seu gênero, não há sujeira visual ou tempo desperdiçado, especialmente no que diz respeito ao terceiro ato; longo, mas tão bem construído que convence até o mais cético dos cinéfilos a aceitar sua beleza.
Uma Relação Delicada
3.0 27Tão psicologicamente enigmático quanto todo o resto de sua obra, Uma Relação Delicada é também a maneira que Breillat encontrou para exorcizar um episódio dramático de sua vida; porém, a frieza e distância com a qual somos mantidos da personagem -muito bem interpretada por Huppert-, e que aparentemente foi pensada como forma de tragar o espectador para a inacreditável sucessão de fatos que levam à derrocada financeira e emocional daquela mulher, acaba sendo mais enervante do que sedutora, e compromete um pouco a apreciação de outros pontos.
Confia em Mim
3.2 283 Assista AgoraPoderia ser um curioso exercício de suspense, mas a maneira absolutamente relaxada com que Confia em Mim é construído, mina suas chances de ser levado a sério. O par formado por Machado e Solano não tem química, muito por conta das péssimas performances de ambos, e o fato de não se dar tempo para que suas personagens sejam devidamente desenvolvidas deixa ainda mais difícil que se crie algum interesse por ele. Ocorrência comum no mau cinema brasileiro, a sensação geral é de estar vendo um bom episódio de um seriado descartável da Globo. Não chega a ser tragicamente ruim, mas esta longe de ser interessante.
Sem Escalas
3.5 902 Assista AgoraSem Escalas é exatamente o tipo de filme que se espera de Liam Neeson hoje em dia: ação frenética, pouco desenvolvimento de personagem, e uma trama que tem tantos buracos quanto reviravoltas. Mas à parte isso, é fato que este é talvez o filme mais divertido à estampar o rosto do ator desde que ele fez o primeiro Busca Implacável, em 2008. Além do divertido jogo de gato e rato que se desdobra dentro do avião onde a história se passa, um elenco coadjuvante maravilhoso que conta com Michelle Dockery, Corey Stoll, Lupita Nyong'o, Scoot McNairy e Julianne Moore também salta aos olhos.
Tudo por Justiça
3.4 376 Assista AgoraMesmo sem ter visto nenhum grande valor em Coração Louco, trabalho anterior de Scott Cooper que rendeu um Oscar à Jeff Bridges, fiquei interessado neste Tudo por Justiça depois de ver uma cena maravilhosa entre Bale e Saldana. A cena realmente se mostrou a melhor de todo o longa, mas o filme tem sido injustamente massacrado pela crítica. Sim, é uma história sobre vingança, família, falta de perspectiva e tantas outras coisas que o cinema americano já está cansado de visitar, mas Cooper trata de tudo isso com uma desesperança e cinismo tamanhos, que toda a carga melodramática parece estar vindo mais do espectador do que da própria trama. Bale, Saldana, Affleck e Harrelson estão maravilhosos, e suas atuações são o carro chefe, já que o roteiro é mais do mesmo, ainda que bem realizado.
Uma Noite Para Esquecer
2.4 201 Assista grátisIn Fear é mais um desses brilhantes filmes de horror que o cinema britânico entrega a cada par de anos (vide Extermínio, Eden Lake, Abismo do Medo, Kill List), e que mesmo não oferecendo nada de original em termos de construção ou estética, tem um vigor impressionante em sua modéstia. Lovering faz aqui um filme com três atores, um carro, e um labirinto de estradas no interior da Irlanda. O casal cai num jogo perturbador, o maníaco planta suas armadilhas, a noite cai, a chuva traz frio, e mesmo com tantos elementos conhecidos, o diretor consegue injetar algo de muito particular na maneira como olha para aquelas pessoas, interferindo muito sutilmente na relação deles com o público. Não tem o poder de deixar os nervos à flor da pele como seus conterrâneos já citados, mas é uma experiência narrativa muito potente.
Julien Donkey-Boy
3.8 37O interesse que Korine nutria pelos desajustados, perturbados e deficientes que se escondem nos subúrbios americanos já havia sido exposto em Gummo, e voltou neste segundo filme, comprovando as preferências estéticas e temáticas de sua carreira. Julien Donkey-Boy é um mergulho profundo na esquizofrenia, pela proximidade violenta com que a câmera do diretor nos leva para o universo de um personagem perturbado por seus próprios demônios, e por um seio familiar tão insalubre que jamais permitirá avanço ou redenção para ele.
Clube de Compras Dallas
4.3 2,8K Assista AgoraAs escolhas que Jean-Marc Vallée faz para recriar a história real de um homem que lutou contra os regulamentos sanitários de seu país para tentar salvar a própria vida, e tempos depois as vidas de outras pessoas, parecem se resumir em jogar todo o trabalho de criar inflexões e questionamentos para seus atores. McConaughey e Leto estão fisicamente assombrosos, e suas performances são vigorosas, mas ao procurar substância no resto do filme para dar suporte aos dois, pouco se encontra. O roteiro perde chances interessantes de fazer um comentário social mais profundo, e se coloca numa posição muito fácil de observar relações rasas entre o protagonista e as pessoas que o circundam. Não é de todo ruim, mas como grande parte dos filmes da safra de premiações, vai ser esquecido em três meses.
Nebraska
4.1 1,0K Assista AgoraNebraska não é propriamente cínico nem pessimista, mas raros são os momentos que Alexander Payne permite um respiro de vivacidade à seus personagens. Mesmo as parcelas mais doces e poéticas do filme -quase sempre atreladas à Will Forte e sua performance discreta, que parece não querer estragar o espetáculo de Bruce Dern- estão mergulhadas num preto e branco amargo, num sentimento de estagnação, da qual aquelas pessoas e seus desejos muito provavelmente jamais conseguirão se libertar. É o filme mais sombrio de toda a bela carreira de Payne, e isso é um enorme elogio.
Último Desejo
3.2 51Último Desejo é mais uma das notáveis evidências do pouco talento que James Franco tem para dirigir filmes, e também do enorme talento que ele tem para fugir totalmente da essência de seu material original. O seminal romance de William Faulkner é um sombrio e deprimente retrato de um sul esquecido, ao qual Franco não consegue impôr o tom necessário. Os esforços de atuação, que são as únicas coisas boas do longa, parecem vir mais dos próprios atores do que das ideias do diretor e seu ego descontrolado.