Franciane

A beleza do roteiro é inegável, entretanto sendo alguém extremamente crítica com as obras que assisto e sendo alguém que vê e vive a realidade retratada no filme diariamente, entendo que neste caso o roteiro pode ser visto como "óbvio" para aqueles que não precisam lidar com este tipo de problemática no dia-a-dia (se é tão óbvio assim porque vocês continuam se preocupando com o elevador quebrado há duas semanas?).
Por já esperar um roteiro de nível altíssimo como o que foi apresentado pude aproveitar melhor as cenas apresentadas no filme, como no momento em que a inspetora e o deputado apertam as mãos e fica claro que em comparação com a pele dele a pele dela é ligeiramente mais escura.
Particularmente sempre que vejo um grupo de pessoas reunidos meu cérebro automaticamente procura pessoas de cor ou com algum tipo de deficiência, buscando representatividade e diversidade (fotos de empresas que pregam a diversidade mas só contratam negros com pele mais clara geralmente são bem sofríveis), e ver as cenas externas com apenas figuras brancas me fez ficar nauseada durante o filme.
Estou ansiosa para voltar ao cinema e assistir novamente, pois sei que só irei conseguir processar todos os sentimentos que tive durante a sessão após rever ao menos mais duas vezes, aproveitando todos os detalhes que Lazaro Ramos e sua equipe colocaram na história.

A história não se trata unicamente de estar morto ou vivo, mas sim sobre a culpa que carregamos ao longo do tempo que chamamos de vida. O final me despertou um receio de que como cada pessoa tem um pós-vida diferente, então a coisa toda não seria "real" e sim uma realidade única de cada pessoa, com personagens e não pessoas reais, tornando o morto o centro daquele pequeno universo. Até que lembrei do questionamento "o seu vermelho é igual ao meu vermelho?", onde somos colocados à encarar o fato de que não sabemos como as coisas são na cabeça das outras pessoas. Sabendo que há muito mais coisas entre o céu e a terra que podemos entender, acredito que a camada oculta do filme fala sobre a percepção de tempo, e como ela é na verdade uma construção humana, algo quase ilusório - algo que chega a ser citado em determinado ponto do filme-.
Do meu ponto de vista entendi que não somente "pulamos" para uma realidade paralela (tal como em The OA), mas também pulamos no tempo. Este conceito cria a ideia de que a realidade em si é um emaranhado de linhas onde tempo e espaço só correm para nós, presos na terceira dimensão, e a morte é uma maneira de transitarmos entre as linhas emboladas deste grande novelo de lã.
Pela minha percepção também ficou subentendido que após a finalização de todos os conflitos, há enfim um "seguir em frente", quase como as notas do autor após um prólogo - que por vezes é mais longo que a própria história inicial -, sendo assim A Descoberta tal como tudo que trata de vida e morte acaba por encerrar-se em outro questionamento, neste caminho sem fim que temos em busca de um final feliz.