Guilherme Correia

A moment in the reeds: Ficção ou experiência? – Experiência

Uma obra de arte que utiliza a imagem, mas captura informações e as comunica como um bom amante da literatura realiza.

De abordagem realista o filme traz o barulho, o silêncio, a luz e o escuro de maneira totalmente orgânica, a ponto de me ensurdecer, compenetrar, cegar e cerrar os olhos sem perceber que eu não era parte daquele todo.

Ao espectador um filme dinâmico e complexo em suas passagens lentas, ao leitor uma narrativa de camadas. Em um primeiro plano nos são apresentados os temas da orientação sexual e identidade de gênero numa célula familiar com membros de diferentes gerações.

Em uma segunda camada a apresentação do estrangeiro como o grotesco, bárbaro, de fenótipo escuro. O encontro do tradicional e do novo, da força física sobre o conhecimento, e a subversão gradativa do contraste para uma composição de semelhança.

No mais profundo, especialmente para aquele que vive, o debate do ser e estar no mundo da pessoa LGBT. O não pertencimento à origem nem ao destino. O fato de não me encontrar aqui, mas não desejar voltar para lá. Nessa construção o espaço para lutos. O luto da mãe falecida, o luto da família deixada, e o luto do amor que não cabe além do hoje.

O mote da reforma inacabada e do filho que volta, mas não comunica. O barco no meio do lago à deriva, a presença do pai que restringe e constrange, a língua global que conecta e o idioma local que segrega, o impulso do surrealismo de Rimbaud e o idílico do romantismo de Sarkia. O relacionamento que torna o tradutor em autor de si mesmo.

“You can only appreciate beauty of you saw ugliness”.

Um filme cativante, provocante de reflexões e construtor de um ponto de partida difícil de se chegar, a realidade. Tornou-se um dos meus favoritos. Nota 10/10. Perfeito no que se propõe.