Uma das críticas mais comuns é de que a Kate não tem um arco nem se desenvolve ao longo da história. Ela começa o filme no ponto A e termina no ponto A. Eu concordo até certo ponto, mas não acho que isso seja algo ruim. Ao meu ver a grande mensagem do filme é exatamente o dilema que ela enfrentou: você pode lutar contra um monstro sem se tornar um? Ela teve a chance de se tornar alguém como o Alejandro ou o Matt, mas no final escolheu não virar um lobo, mesmo que isso colocasse ela em risco.
''Nada fará sentido aos seus ouvidos americanos. Você irá duvidar de tudo o que fazemos, mas, no final, irá entender'' diz o Alejandro pouco depois deles se conhecerem. Eu não sei se fez sentido depois de tudo isso, acho que não, porque aquele não era o seu mundo. Ela escolheu não alimentar o lobo mal que existia ali dentro.
Tem uma frase do Sartre que ajuda a entender esse pensamento: o mais importante de tudo não é o que fizeram de você, mas o que você vai fazer, com o que fizeram de você.
É assim que eu vejo esse filme. Tenho que citar também a trilha sonora que é muito boa, parecem trombetas anunciando o apocalipse, que aliás, combina muito com aquela tempestade que chega ao fundo, evidenciada por uma das melhores fotografias dos últimos anos.
''Lembre da história que eu lhe contava quando você era pequeno. Sobre um jovem príncipe, um cavaleiro enviado pelo pai, o rei do Leste, para o Oeste, no Egito, para encontrar uma pérola. Uma pérola das profundezas do mar. Mas quando o príncipe chegou, as pessoas lhe serviram uma taça que apagou a sua memória. Ele esqueceu que era filho do rei. Esqueceu da pérola e caiu em um sono profundo. O rei não esqueceu do filho, continuou enviando recados, mensageiros, guias. Mas o príncipe dormia.''
As obras do Malick são essencialmente cristãs, mas as questões que as movem fazem parte de qualquer ser humano. No tarot, cavaleiro de copas é um arcano menor. Um dos seus significados é meditativo, sobre aquele momento da vida em que olhamos pra ela e começamos a questionar se o que fazemos e temos é o mesmo que queremos para o resto dela. É um despertar, como um terremoto, que nos faz reavaliar nossas ações até o momento presente.
Quando essa geração da primeira metade dos anos setenta deixar o cinema vai ser uma perda imensa. Poucos filmes conseguem reunir tantos nomes de alto nível em personagens tão bem montados como Deer Hunter. É muito legal ver eles no inicio de carreira, sabendo que hoje já são consagrados.
Quanto a duração, eu revi Apocalypse Now recentemente, a versão redux tem 3 horas e 16 minutos, tempo que passou voando pra mim. Já esse filme tem um tempo menor e a primeira hora demorou pra passar. Eu entendo que o diretor quis contextualizar a trama, fazer um paralelo entre o antes e o depois e criar uma afinidade e empatia entre os personagens daquela pacata cidade e o público, mas foi mais longo que o necessário. Poderoso chefão tem um início parecido, com uma cena de casamento também e é muito mais eficiente nisso. Dava pra ter reduzido uns 15 ou 20 minutos.
Fora isso, eu adoro como alguns diretores fazem filmes sobre a guerra sem enaltecer ela, mostrando os verdadeiros horrores e os transtornos que elas causam aos seus soldados, pessoas comuns que são tiradas dos seus lares, pra lutar em uma linha de frente criada por políticos que não arriscariam a própria vida em um campo de batalha.
Uma das características do cinema de Paul Thomas Anderson é a retratação de épocas importantes na criação da história norte americana. Seja o início do império petrolífero em "Sangue negro", a decadência da era hippie em "Vício inerente" ou a violenta e conturbada transição dos anos 70 para os 80 em "Boogie Nights".
Em O Mestre, PTA se preocupa em mostrar a construção do mito da década dourada que foi os anos 50. Direcionando seu foco para um veterano de guerra que deu sua vida e sanidade para proteger o seu país, mas, ironicamente, já não tem mais espaço nela ao regressar para casa.
O maior embate do filme fica por conta de Freddie Quell, que perdeu o senso de sociedade, extremamente impulsivo como um animal selvagem e que tenta a todo custo ser domesticado por Lancaster Dodd. Este, que por sua vez, tem a necessidade de se auto-afirmar e ter o controle da situação, mostra instabilidade e insegurança sempre que é minimamente confrontado, nos mostrando que sua imagem calma, paterna e benevolente não tem muito a ver com sua personalidade.
Ao meu ver, Lancaster vê em Freddie apenas mais uma oportunidade de exercer o seu controle e poder. Freddie, porém, é indomesticável. Oscila entre o aluno comportado e um rebelde desinteressado. Em alguns momentos, vemos ele defendendo Lancaster e até mesmo agredindo aqueles que descordam do líder d'A Causa.
Não que o ex-soldado acredite nela, mas aquilo é seu porto seguro, sua estabilidade. Talvez ele não queira ouvir a verdade. Ela se torna sua inimiga por um momento. Mas como toda alma indomesticável, ele se revolta e vai para longe, qualquer lugar que não seja ali.
O veterano de guerra se torna uma alma penada, excluído, vivendo a margem da sociedade que ele mesmo defendeu. Mas acredito que esse homem de latitudes sem terras tenha se tornado mais livre e mestre de si mesmo, do que qualquer membro do grupo jamais conseguiu em sua vida. Sem ter quem o diga para onde ir e o que fazer.
Freddie é o retrato de uma geração fundamental para criar o mito americano. Personagem de um filme sobre guerra que não mostra ela em si, mas suas consequências. Consequências que ecoaram em uma década que foi mãe do baby boomer e do crescimento da qualidade de vida, mas que esqueceu o nome e o rosto dos seus outros filhos tão importantes
Amo esse filme por inúmeros motivos, acabou se tornando meu preferido junto com Clube da luta. Tenho uma relação emocional com ambos que dificilmente eu conseguiria colocar em palavras. Sou um consumidor da cultura que foi criada no final dos anos 60 e admirador daquela geração que marcou o século XX. Por esses e outros pontos, Vício inerente se tornou uma obra que eu já vi e revi inúmeras vezes. Acho que depois de tantas visitas feitas ao filme, posso fazer uma interpretação pessoal desse longa que ao meu ver é injustiçado pelo público.
Agora, mais importante do que entender quem matou quem, o que aconteceu, quem atirou primeiro ou todas as outras coisas que acontecem em filmes de detetives, precisamos entender aqui o contexto da obra e analisar seus personagens para obter um valor mais profundo do filme. Vamos aos detalhes da trama que a maioria ficou confusa
Michael Z. Wolfmann é um milionário dos imóveis, dono de várias propriedades em LA, cujo a esposa tem um amante. Ela e o amante desejam jogar Wolfmann no manicômio para ficar com a fortuna dele. Mas o empresário também possui uma amante, que é procurada pela esposa dele para entrar na jogada e pegar ele desprevenido.
Essa amante é Shasta, ex-namorada de Doc, um detetive particular que ela procura para pedir ajuda, já que não sabe o que fazer nessa situação. Logo ele percebe que ela não quer entrar no esquema, já que é apegada ao Wolfmann, e que talvez o ame de um jeito que nunca amou o próprio Doc no passado.
“Quando eles estavam juntos, ela passava semanas com nada mais complicado do que um beicinho. Agora ela exibia uma combinação pesada de expressões faciais que Doc não conseguia decifrar. Pensando bem, nunca houve tanto sofrimento na voz dela.”
“Doc nunca conseguiu entender o que Shasta tinha visto nele, além dele ser o único viciado conhecido dela que não usava heroína, o que dava a eles muito tempo livre. E também não era bem claro o que os havia separado. Aos poucos, eles entraram em diferentes correntes cármicas, eles observaram um ao outro deslizar suavemente para um destino diferente. Uma relação acaba? Mas é claro que sim! Essa acabou.”
Shasta parece ter seguido bem a sua vida após o termino com Doc, a narração no começo do filme sinaliza que hoje ela é outra pessoa e que os tempos de hippie ficaram para trás, ao contrário dele que apesar de ter uma nova namorada vinculada ao “sistema” e um emprego quase-formal, é o avatar de sua geração já em decadência, alguém que se recusa em abandonar uma década que chega ao fim, talvez o ultimo de sua espécie. Aquela década que prometeu a paz e o amor, o fim das guerras, preconceitos, mas que se perdeu em meio ao exagero das drogas e a paranoia que se instalou nos Estados Unidos da época, sintoma de acontecimentos como a guerra do Vietnã, exageros lisérgicos e tragédias como a seita da Família Manson.
E aquele flashback onde vemos Shasta e Doc usando um tabuleiro para descobrir aonde comprar drogas? Eles não conseguiram nada naquele dia, mas tiveram um momento de casal, um momento de felicidade que ambos jamais esqueceriam, mesmo após o termino.
Agora vamos a outra parte do roteiro:
"A longa história triste do uso de terno em Los Angeles”.
Uma sinalização de que todas as cores e a juventude dos anos 60 dariam lugar a burocrática, tensa e obscura década de 70, marcada pela derrota no Vietnã, o escândalo de Watergate e o fim do Flower power.
E se Doc é o avatar de sua geração, somos apresentados agora ao reacionário Tenente conhecido como Bigfoot, descrito como “o velho cachorro louco que odeia hippies em carne e osso. Membro do sindicato de atores, andar de John Wayne, corte de cabelo dos Flintons, e aquele brilho maligno nos olhos que diz ‘violação dos direitos civis’ “. O cara que vive no encalço do nosso herói, acha que ele é só mais um criminoso qualquer, mas que na verdade não consegue enxergar um palmo a sua frente. Aliás, o filme dá algumas pistas de que talvez Bigfoot seja homossexual e que sente uma atração por Doc, tentando reprimir ela de todas as formas, o que poderia explicar seu autoritarismo exacerbado e a pouca paciência que ele tem com o detetive particular. (Isso me lembrou Beleza americana)
“Seria possível que em toda aglomeração pela música, pela paz, pelo amor, pelo país, pelas drogas, aqui no norte, no leste, onde fosse, esses reacionários estivessem empenhados o tempo todo em se aproveitar da música, da resistência ao poder, do desejo sexual épico e cotidiano? Tudo que pudessem angariar para os antigos da ambição e do medo.”
Doc não era um marginal como Bigfoot imaginava, ele ajudou a salvar algumas vidas. Talvez essa geração não tenha dado certo como gostaria, mas acredito que logo antes das cortinas abaixarem e a juventude ir embora, Doc conseguiu compensar um pouco toda a loucura daqueles tempos, mostrando que era alguém de boas intenções e um coração enorme, assim como tantos outros que fizeram parte da geração paz e amor.
“Mas o tempo é inexorável, o mar do tempo, o mar da memória e do esquecimento. Os anos promissores se foram irrecuperavelmente. A terra que quase obteve permissão de exigir um destino melhor, viu essa permissão ser assaltada por mal feitores bem conhecidos, ser retirada e ser feita refém de um futuro no qual somos todos obrigados a viver para sempre.”
Vício inerente é algo inevitável. Como a passagem do tempo, o fim da juventude, a mudança e o amadurecimento das pessoas. No final, a história não é sobre um crime desvendado ou uma comédia fora do usual. É uma história sobre o relacionamento de dois jovens que sintetizam uma geração, onde precisam largar costumes da juventude e aceitar que o tempo passa. Certas coisas devem ficar para trás. É sobre aceitar que certas ideias não deram certo, que tempos mais obscuros estão por vir e que precisam enfrentar isso juntos.
No final, Doc e Shasta dirigem juntos por uma estrada que talvez os leve para o futuro. Ela, cansada e apoiada nos ombros dele, mistura uma tristeza nostálgica com a felicidade de finalmente estarem ali, juntos.
É importante entender que os filmes do Paul Thomas Anderson funcionam como um documento de uma época, nesse caso, o fim dos anos 60. Um retrato que só poderia ter sido feito por alguém que passou por tudo isso, Thomas Pynchon, e adaptado por aquele que eu considero o maior diretor de sua geração.
Sandoval apesar de ser o amigo bêbado e ter claros problemas como isso, é também o que tem os momentos de mais lucidez. Como aquele em que ele conclui o diálogo dizendo que ''não se pode trocar de paixão".
O final tem uma cena muito interessante, quando Espósito descobre o que Morales fez com Gomez, a câmera foca no rosto dos dois, com as grades cobrindo o rosto deles, mostrando que ambos também estão presos naquilo.
''Você disse perpetua'', conclui Morales, que também parou no tempo. Mas apenas o Espósito sai dali, sendo o único que se liberta daquele passado.
Fico um pouco triste por uma obra como essa ter essa nota baixa,
Eu não sou religioso, mas esse filme conseguiu me tocar profundamente. Eu diria que não é necessário acreditar em algo ou ter alguma religião para assisti-lo e aproveita-lo ao máximo. Independente de qualquer coisa, a maior mensagem e sensação que se pode ter ao vê-lo é essa: amor.
Ele não possui uma narrativa tradicional, não é feito para o grande público. Mas as pessoas precisam parar de dizer que o filme é ruim porque não entenderam ele. É corajoso, pretensioso (no melhor sentido), e incrivelmente bonito.
Você pode assisti-lo quantas vezes quiser que ainda sim terá interpretações diferentes sobre alguns pontos, mas sem dúvida, a sua proposta principal é clara e objetiva. Eu fico feliz por ter encontrado uma obra com uma mensagem tão incrível e bonita como essa.
Obrigado, cinema!
''A menos que você ame, sua vida passará rapidamente"
A primeira vez que vi esse filme eu não entendi nada, assim como a maioria. Decidi rever eles anos depois, com uma bagagem cinematográfica maior e confesso que poucas vezes na vida eu fiquei tão encantado com um filme. Resolvi fazer uma analisa mais aprofundada, com base na minha interpretação e algumas coisas que li por ai.
Antes de tudo, é importante entender que na maioria dos filmes do Lynch, a interpretação é algo fundamental, pois sua obra não trás respostas mastigadas nem um ponto final em várias de suas questões, apesar de que sim, existem momentos onde o roteiro deixa a interpretação de lado e dá uma resposta objetiva, mesmo que seja em uma quantidade muito rara de vezes. Mas o importante aqui é explorar algumas das infinitas possibilidades com base em todo o contexto na filmografia do David Lynch.
Logo na primeira cena nós vemos um grupo de pessoas dançando. Algo importante, já mostrando logo de cara a “esquisitice” do filme e nos dando algumas referencias como ponto de partida. Em uma imagem sobreposta, vemos uma mulher loira, acompanhada de duas pessoas idosas e um som de aplausos atrás. Talvez ela tenha ganhado esse concurso de dança, e a partir dai, segue seu sonho de ir para Hollywood e fazer carreira. Podemos notar através do seu semblante, já de início, o fascínio que a fama e o entretenimento exercem nela. Mais tarde essa mesma mulher se apresentará como Betty.
Em seguida temos uma cena chave. Uma câmera com a visão de alguém em primeira pessoa se aproxima do travesseiro e apaga, dando a entender que pegou no sono. É Betty. Essa cena já é no final do filme, quase tudo que vemos depois é um sonho dela nos dando pistas do que aconteceu antes e como seu subconsciente trabalha isso.
A cena corta e depois vemos uma outra mulher de cabelo escuro dentro de um carro sendo ameaçada por dois homens, ela será morta. Mas isso não acontece, pois um acidente atrapalha os planos deles e ela consegue escapar. Betty mandou matar ela, o que de fato acaba acontecendo no mundo real. Mas em seus sonhos o plano dá errado e ela consegue sair viva, uma amostra de que a Betty foi consumida pela culpa e gostaria que as coisas fossem diferentes. Mais a frente, temos dois detetives na cena do acidente investigando o que aconteceu.
Agora, uma das cenas mais enigmáticas do filme e que abre possibilidade para várias interpretações. Dois homens estão em uma lanchonete e um deles confessa que sonhou com esse mesmo lugar na noite passada, que após sair dali encontrou com um homem de aspecto assustador . Após a conversa acabar dá pra notar na mesa que existem duas xícaras de café e um prato, logo em seguida vemos apenas as xícaras de ponta cabeça e o prato sumiu. Erro de continuidade? Não, apenas um sinal sutil de que aquele lugar é diferente. Quando eles saem desse lugar e vão para a rua, logo atrás deles tem uma pichação na parede, uma das palavras que se pode ler com mais destaque é “dream”. E de fato, assim como no sonho do homem, eles se encontram com o homem assustador, mas qual o significado dele?
Possibilidade 1: É uma figura criada pelo subconsciente da Betty, mostrando tudo aquilo que ela não quer se tornar, e por isso esse homem da lanchonete (outro aspecto do subconsciente dela) se assusta ao ver aquilo de perto. Parece ser um morador de rua, algo muito de longe de ser uma estrela de Hollywood.
Possibilidade 2: Como é apenas um sonho, talvez seja um espectro abstrato, tipo um pesadelo. As vezes os pesadelos não fazem sentido, eles são apenas desagradáveis.
Então vemos Betty de novo chegando em Los Angeles, acompanhada de uma senhora que estão muito feliz com aquilo tudo, mas ao mesmo tempo exerce uma pressão para que ela não fracasse. A minha interpretação aqui é que esse casal que acompanha ela, seja uma projeção de todos aqueles que apostam nela e cobram resultados. Podemos notar isso com a frase dita nessa cena “queremos ver você na telona”.
Betty chega na casa da sua tia e é lá que ela conhece a mulher que escapou do acidente. Nós ainda não sabemos como as duas se conheceram na vida real, mas nos sonhos de Betty esse foi o modo encontrado para elas se aproximarem, ou seja, o próprio acidente que fez a mulher misteriosa escapar de ser morta por dois homens a mando de Betty, é que faz elas se conhecerem. Confuso? Pois é, isso é um sonho. Finalmente descobrimos que ela se chama Rita. Na verdade esse é o nome que ela leu no cartaz do filme "Gilda". O dialogo delas nessa cena tem algumas frases importantes, como “Vou melhorar, se dormir”.
A próxima cena é a reunião do diretor de um filme com os figurões do estúdio e mais alguns homens misteriosos. Eles pressionam o diretor para que ele escolha uma determinada atriz, e não importa o qual boas sejam as outras, elas não podem ser escolhidas. Aqui eu vejo mais de uma interpretação para a cena:
Possibilidade 1: Esse é o subconsciente da Betty criando um modo de explicar porque ela não ganhou o papel, mesmo indo tão bem nos testes.
Possibilidade 2: Uma metáfora do próprio David Lynch criticando a industria e como ela tenta controlar seus realizadores. Quem conhece a filmografia dele, sabe que o mesmo teve vários contra-tempos com estúdios e até mesmo com a criação de Twin Peaks. Veremos várias pistas dessa possível crítica ao longo do filme.
Possibilidade 3: Os homens que tentam persuadir ele são excêntricos e agressivos. Talvez uma forma do próprio Lynch de fazer uma sátira com os executivos de Hollywood.
Possibilidade 4: Aparece também um homem em uma sala trancada observando tudo, como se fosse o cabeça de toda a operação. Veja como ele está isolado de todos. Intocável é a palavra certa. Outra metáfora do próprio diretor para aqueles que controlam tudo? Talvez. Então há um diálogo entre eles deixando claro que se não for do jeito que eles escolheram, não haverá filme.
Agora nós temos um homem conversando com alguém que parece ser seu amigo. Dá a entender que esse segundo cara estava envolvido no acidente da noite passada, aquele que impediu a Rita de ser morta.Ele é morto pelo amigo, que leva também um caderno que supostamente é importante.
Voltamos pra casa da Betty e há um diálogo importante agora, com algumas frases que dão pistas do que está acontecendo: “Achei que, ao acordar...achei que dormir resolveria tudo”
Depois vemos o diretor que se recusou a aceitar as ordens na reunião, e quando ele chega em casa, dá de cara com a sua mulher na cama com outro homem. É até estranho porque ele parece não se importar tanto e quando resolve revidar, joga tinta na caixa de jóias da mulher. A minha interpretação é que esse é novamente o subconsciente da Betty mostrando uma parte importante da sua faceta: a vaidade. Assim como ela teme se tornar ninguém, representação feita na cena do homem na lanchonete, vemos aqui ela temendo pela sua imagem, com a projeção do diretor atacando as jóias da esposa dele.
Na lanchonete, Betty e Rita conversam tentando entender o que aconteceu na noite passada, quando são atendidas por uma garçonete com o nome de Diana, o verdadeiro nome de Betty na vida real. Dá pra notar que a garçonete também é loira e tem o cabelo curto, assim como a nossa protagonista. Logo a Rita disse que se lembra de um nome chamado "Diana Selwyn", e que talvez seja ela. Claro que não é, isso é apenas o sonho da Betty fazendo um paralelo com a realidade, manifestando ela através da Rita. As duas decidem irem atrás desse nome e ver o que descobrem, acham seu número e ligam. Então Betty olha para a Rita dizendo uma frase ambígua: É estranho ligar para si mesma.
Novamente o diretor aparece em cena com um homem dizendo a ele “Eu não sei de quem você se esconde, mas eles já sabem onde você está”. Possibilidades:
Possibilidade 1: Essa é a culpa da Betty dizendo a ela que o que ela fez foi errado, e que pagará por isso. Lembrando que na vida real, Rita foi morta por um homem a mando de Betty(Diana).
Possibilidade 2: Outra vez o Lynch mostrando como a industria exerce pressão sobre o diretor e como a cabeça dele é posta a prêmio se não obedecer.
Depois aparece uma mulher muito estranha na casa da Betty, dizendo que alguém está em perigo e quando Betty se apresenta dizendo seu nome, a mulher responde com “não, não é”.
Corta a cena para o diretor se encontrando com um homem conhecido como Cowboy. O diálogo aqui é importante porque ele diz ao diretor “A atitude de um homem diz revela que caminhos a vida dele vai tomar”.
Possibilidade 1: O que é o Cowboy se não uma figura de autoridade? Talvez essa seja mais uma pista do próprio Lynch nos mostrando a pressão que os diretores sofrem dos chefões da industria.
Possibilidade 2: O sentimento de culpa da Betty vai tomando conta dela, dizendo que as suas escolhas trouxeram consequências e que ela irá pagar por isso. Seja por ter matado a Rita ou por ter fracassado como atriz e pessoa, algo que só iremos descobrir mais para a frente.
Agora Betty e Rita ensaiam uma cena com um diálogo muito fraco, e logo ela irá para o estúdio fazer um teste, onde se sairá muito bem. Podemos ver como a mente de Betty age tentando conforta-la, colocando em um mundo onde ela é uma ótima atriz e se sai muito bem, mesmo que o roteiro não seja dos melhores. E se no mundo dos sonhos ela é tudo aquilo que não é na vida real, creio que ela não era uma boa atriz.
Então o diretor escolhe uma outra mulher para o papel principal, assim como os homens misteriosos ordenaram, mesmo que o teste da Betty tenha sido perfeito. Acredito que aqui é mais uma vez a própria Betty tentando arrumar um motivo do porque ela tenha fracassado, colocando a culpa em fatores esternos e nunca em si mesma, lembrando que sempre que esse diretor aparece, podemos levar em conta uma mensagem do próprio Lynch sobre Hollywood, o modo como ela trata seus criadores de arte, e todo o processo por trás da criação de um filme.
Quando Rita Betty vão atrás da Diana (achando o endereço dela na lista telefônica), se deparam com uma casa fechada e tentam entrar assim mesmo, descobrindo um cadáver na cama. Uma mulher loira que é supostamente a própria Diana. Eu diria que aqui é a própria Betty manifestando seu estado de espirito.
Ao voltar pra casa, as duas tem a primeira relação sexual e então temos uma pista de que as duas tiveram uma relação na vida real. Betty diz “eu me apaixonei por você” e Rita não responde, fazendo uma cara estranha. Percebemos que talvez esse tenha sido o problema que gerou toda a confusão. Depois de Rita falar enquanto dorme, as duas acabam indo para um lugar chamado Clube Silencio, atrás de respostas. Ao entrarem em um taxi, a câmera passa por um poste com o adesivo “hell”, talvez mais uma manifestação da perturbação de Betty.
Essa parte é importante porque aqui podemos extrair inúmeros significados de tudo que acontece nesse lugar. Irei explorar aquelas que eu acho mais plausíveis. O anfitrião do lugar diz “Não há banda, é tudo gravação”. Podemos entender que não há nada daquilo, é tudo um sonho (uma gravação). Uma mulher sobe ao palco para se apresentar, curiosamente ela é apresentada como “A chorosa de Los Angeles”. Uma manifestação da personalidade da Betty. Ela canta uma música cujo a letra explica tudo que aconteceu e mostra como Betty se sentia com o amor não correspondido da Rita, no final ela morre, assim como a Rita morreu na vida real. Outra interpretação é o próprio Lynch, mais uma vez, mostrando como a industria age. Atores/Atrizes vem e vão, mas o show continua, assim como a música continuou mesmo após a cantora morrer.
Então vemos pela primeira vez a misteriosa caixa azul, encontrada pela Betty na própria bolsa. Já em casa, Rita usa uma chave azul para abrir, a câmera da um zoom no interior da caixa, tudo fica escura. Novamente aparece o cowboy (figura de autoridade) para dizer o que ela deve fazer: acordar.
Betty, agora Diana, acorda no mesmo lugar e na mesma posição que aquele cadáver encontrado em seu sonho. Há uma mudança na fotografia. As cores ficam mais escuras e as luzes não ofuscam como antes, estamos na realidade de Diana. Ela é menos colorida que o mundo dos sonhos.
Aparentemente ela já está a três semanas reclusa, uma vizinha (que apareceu em seus sonhos) comenta que dois detetives procuraram por ela. Nos sonhos, esses mesmos detetives investigavam o acidente de Rita, na vida real, eles investigam o assassinato dela. Aliás, Rita na verdade se chama Camilla. Diana tem uma alucinação com ela, percebemos que ela é totalmente diferente na vida real. Nos sonhos, Diana era Betty, uma atriz promissora e que tinha tudo pra dar certo, com um talento impar e um futuro todo pela frente. Na vida real, Diana matou Camilla, fracassou como atriz, como pessoa e agora vive sozinha.
Através de memórias de Diana, vamos descobrindo o que aconteceu. Mas não se pode confiar 100%, já que estamos vendo a história do ponto de vista de alguém com alguns problemas emocionais.
Diana e Camilla tinham uma relação, o diretor se aproximou de Camilla, manteve uma relação com ela, que acabou deixando Diana de lado para ficar com ele. Talvez ai seja também um modo do próprio Lynch de mostrar com as coisas podem ser nos bastidores. Aliás, Camilla deu certo, Diana não. Ela era apenas uma figurante, alguém bem longe de ser a atriz dos sonhos. Dá pra notar que até a postura dela muda. Nos sonhos, Diana andava sempre de cabeça erguida, na vida real ela sempre está curvada e de cabeça baixa.
A mulher que aparece nos sonhos como Coco, é a mãe do diretor na vida real. Diana conta a ela que ganhou um concurso de dança na sua cidade natal, aquele lá da primeira cena, e que após isso ela foi para Los Angeles.
Dá pra perceber que quase todas as pessoas que aparecem no sonho estão nessa cena. Diana deu um rosto a todas as suas emoções e sentimentos reprimidos.
O assassino de aluguel que matou o amigo nos sonhos de Diana, é na verdade o cara que ela contratou para matar a amante.
Então, o casal de idosos aparece novamente em uma alucinação para atormentar Diana. Ela se sente péssima com o fracasso, a pressão e a culpa pela morta da Camilla.
Diana se mata consumida pela culpa de tantos fracassos e percebendo que ela se tornou tudo aquilo que não queria: ninguém.
Fecham-se as cortinas, apagam-se as luzes. Silêncio.
Espero que eu não tenha super-interpretado o filme, mas o que eu gosto do David Lynch é isso, as possibilidades de suas obras.
Durante todo o filme, o Cobb age de forma paranoica e usa o totem (da esposa) pra saber se está acordado. Ele sempre espera o totem parar de rodar até ficar calmo, mas não na ultima cena. Lá no limbo, ele tem uma ultima conversa com a Mal e percebe que precisa se perdoar e deixar o passado. Quando volta pra casa, ele roda novamente o totem, vê seus filhos, vai em direção a eles sem esperar o objeto parar de rodar. Ele não se importa, nem ele tem certeza se aquilo é um sonho ou real, mas não faz diferença. Cobb completou a sua maior jornada: se perdoar e deixar o passado no seu devido lugar.
E após toda essa viagem, ele entendeu que não poderia transformar seus sonhos em obsessões.
Acho que o que faz as pessoas desgostarem desse filme é que sempre se espera muito dos irmãos Coen. Ironicamente, todos os elementos que fazem eles serem conhecidos estão presentes nessa história. Não é uma obra de arte memorável, mas não acho que esse filme tenha essa pretensão. Ele é leve, se preocupa com a estética e mistura homenagem e ironia em uma coisa só, conseguindo se sair bem nesses pontos.
A aparição dos nomes mais conhecidos, que para alguns pode ser frustrante, já que não ficam tanto tempo em tela, para mim é algo cirúrgico, acertado e feito na medida certa. Aliás, a primeira cena do Channing Tatum é a minha preferida.
E se os grandes nomes não aparecem tanto quanto se imagina, Josh Brolin rouba a cena, fazendo um dos personagens mais interessantes e carismáticos que os irmãos Coen já criaram.
É um filme que vale a pena se não for visto com grandes expectativas.
Vi esse filme quando era mais novo, não tinha entendido nada. E agora, revendo com uma cabeça diferente, é um dos filmes mais incríveis que já tive o prazer de assistir. Além de ter uma das introduções mais interessantes que eu já vi em um filme, aquele monólogo do Xerife, tem também outros diálogos e questões sobre a passagem do tempo que são muito interessantes.
"O que você sente não tem nada de novo. Essa terra é dura com as pessoas. Não dá pra impedir as mudanças. O mundo não lhe dá esse privilégio."
A fotografia me lembrou muito "Paris, Texas". Aquele lugar árido, clima seco e solitário. O por do sol constante, como se algo sempre estivesse acabando. E ao mesmo tempo em que se fala sobre o ciclo natural da vida, esse mesmo ambiente parece que parou no tempo, vazio, parecendo que esqueceu a existência de um mundo fora dali. Algo que combina com o Xerife Ed.
Sou fã dos Beach boys e do Brian. Ver esse filme é uma mistura de alegria, tristeza, raiva. Muitas coisas. Fico feliz em saber que é um bom filme, ao mesmo tempo em que, ver uma pessoa tão talentosa e carismática se desfazendo é triste. Raiva em saber que se aproveitaram dele por tanto tempo, dá até uma sensação de angustia.
“Voo noturno para São Francisco, seguindo a Lua através da América. Não entro em um avião há anos. Quando chegarmos à 35 mil pés atingiremos a tropopausa, aquela área de ar calmo. O mais perto que chegarei de ozônio. Sonhei que estávamos lá. O avião passa pela tropopausa. Pelo ar seguro. E entra na camada externa, na de ozônio. Irregular e em frangalhos, manchado como um velho tecido. E aquilo foi aterrorizante. Mas vi algo que só eu vi por meu dom de ver essas coisas. Almas se elevando, vinda da Terra lá embaixo. Alma dos mortos, daqueles que pareceram. Pela fome, pela guerra, pela peste. Flutuavam ao céus, como paraquedistas ao contrário. Como postura séria. Rodando e girando. As almas desses que partiram deram as mãos, juntaram os pés, formando uma rede de almas. E as almas 3 moléculas de oxigênio como o ozônio a camada as absorveu e se reparou. Por que nada se perde para sempre. Nesse mundo há um avanço doloroso. Sentimos falta daquilo que deixamos, e sonhando com o futuro.. Ao menos eu penso assim”
Sicario: Terra de Ninguém
3.7 942 Assista AgoraDepois de um tempo parei pra rever o filme e notei algumas coisas que tinha me escapado na primeira vez
Uma das críticas mais comuns é de que a Kate não tem um arco nem se desenvolve ao longo da história. Ela começa o filme no ponto A e termina no ponto A. Eu concordo até certo ponto, mas não acho que isso seja algo ruim. Ao meu ver a grande mensagem do filme é exatamente o dilema que ela enfrentou: você pode lutar contra um monstro sem se tornar um? Ela teve a chance de se tornar alguém como o Alejandro ou o Matt, mas no final escolheu não virar um lobo, mesmo que isso colocasse ela em risco.
''Nada fará sentido aos seus ouvidos americanos. Você irá duvidar de tudo o que fazemos, mas, no final, irá entender'' diz o Alejandro pouco depois deles se conhecerem. Eu não sei se fez sentido depois de tudo isso, acho que não, porque aquele não era o seu mundo. Ela escolheu não alimentar o lobo mal que existia ali dentro.
Tem uma frase do Sartre que ajuda a entender esse pensamento: o mais importante de tudo não é o que fizeram de você, mas o que você vai fazer, com o que fizeram de você.
É assim que eu vejo esse filme. Tenho que citar também a trilha sonora que é muito boa, parecem trombetas anunciando o apocalipse, que aliás, combina muito com aquela tempestade que chega ao fundo, evidenciada por uma das melhores fotografias dos últimos anos.
Cavaleiro de Copas
3.2 412 Assista Agora''Lembre da história que eu lhe contava quando você era pequeno. Sobre um jovem príncipe, um cavaleiro enviado pelo pai, o rei do Leste, para o Oeste, no Egito, para encontrar uma pérola. Uma pérola das profundezas do mar. Mas quando o príncipe chegou, as pessoas lhe serviram uma taça que apagou a sua memória. Ele esqueceu que era filho do rei. Esqueceu da pérola e caiu em um sono profundo. O rei não esqueceu do filho, continuou enviando recados, mensageiros, guias. Mas o príncipe dormia.''
As obras do Malick são essencialmente cristãs, mas as questões que as movem fazem parte de qualquer ser humano. No tarot, cavaleiro de copas é um arcano menor. Um dos seus significados é meditativo, sobre aquele momento da vida em que olhamos pra ela e começamos a questionar se o que fazemos e temos é o mesmo que queremos para o resto dela. É um despertar, como um terremoto, que nos faz reavaliar nossas ações até o momento presente.
O Franco Atirador
4.0 355 Assista AgoraQuando essa geração da primeira metade dos anos setenta deixar o cinema vai ser uma perda imensa. Poucos filmes conseguem reunir tantos nomes de alto nível em personagens tão bem montados como Deer Hunter. É muito legal ver eles no inicio de carreira, sabendo que hoje já são consagrados.
Quanto a duração, eu revi Apocalypse Now recentemente, a versão redux tem 3 horas e 16 minutos, tempo que passou voando pra mim. Já esse filme tem um tempo menor e a primeira hora demorou pra passar. Eu entendo que o diretor quis contextualizar a trama, fazer um paralelo entre o antes e o depois e criar uma afinidade e empatia entre os personagens daquela pacata cidade e o público, mas foi mais longo que o necessário. Poderoso chefão tem um início parecido, com uma cena de casamento também e é muito mais eficiente nisso. Dava pra ter reduzido uns 15 ou 20 minutos.
Fora isso, eu adoro como alguns diretores fazem filmes sobre a guerra sem enaltecer ela, mostrando os verdadeiros horrores e os transtornos que elas causam aos seus soldados, pessoas comuns que são tiradas dos seus lares, pra lutar em uma linha de frente criada por políticos que não arriscariam a própria vida em um campo de batalha.
O Mestre
3.7 1,0K Assista AgoraUma das características do cinema de Paul Thomas Anderson é a retratação de épocas importantes na criação da história norte americana. Seja o início do império petrolífero em "Sangue negro", a decadência da era hippie em "Vício inerente" ou a violenta e conturbada transição dos anos 70 para os 80 em "Boogie Nights".
Em O Mestre, PTA se preocupa em mostrar a construção do mito da década dourada que foi os anos 50. Direcionando seu foco para um veterano de guerra que deu sua vida e sanidade para proteger o seu país, mas, ironicamente, já não tem mais espaço nela ao regressar para casa.
O maior embate do filme fica por conta de Freddie Quell, que perdeu o senso de sociedade, extremamente impulsivo como um animal selvagem e que tenta a todo custo ser domesticado por Lancaster Dodd. Este, que por sua vez, tem a necessidade de se auto-afirmar e ter o controle da situação, mostra instabilidade e insegurança sempre que é minimamente confrontado, nos mostrando que sua imagem calma, paterna e benevolente não tem muito a ver com sua personalidade.
Ao meu ver, Lancaster vê em Freddie apenas mais uma oportunidade de exercer o seu controle e poder. Freddie, porém, é indomesticável. Oscila entre o aluno comportado e um rebelde desinteressado. Em alguns momentos, vemos ele defendendo Lancaster e até mesmo agredindo aqueles que descordam do líder d'A Causa.
Não que o ex-soldado acredite nela, mas aquilo é seu porto seguro, sua estabilidade. Talvez ele não queira ouvir a verdade. Ela se torna sua inimiga por um momento. Mas como toda alma indomesticável, ele se revolta e vai para longe, qualquer lugar que não seja ali.
O veterano de guerra se torna uma alma penada, excluído, vivendo a margem da sociedade que ele mesmo defendeu. Mas acredito que esse homem de latitudes sem terras tenha se tornado mais livre e mestre de si mesmo, do que qualquer membro do grupo jamais conseguiu em sua vida. Sem ter quem o diga para onde ir e o que fazer.
Freddie é o retrato de uma geração fundamental para criar o mito americano. Personagem de um filme sobre guerra que não mostra ela em si, mas suas consequências. Consequências que ecoaram em uma década que foi mãe do baby boomer e do crescimento da qualidade de vida, mas que esqueceu o nome e o rosto dos seus outros filhos tão importantes
Vício Inerente
3.5 554 Assista AgoraAmo esse filme por inúmeros motivos, acabou se tornando meu preferido junto com Clube da luta. Tenho uma relação emocional com ambos que dificilmente eu conseguiria colocar em palavras. Sou um consumidor da cultura que foi criada no final dos anos 60 e admirador daquela geração que marcou o século XX. Por esses e outros pontos, Vício inerente se tornou uma obra que eu já vi e revi inúmeras vezes. Acho que depois de tantas visitas feitas ao filme, posso fazer uma interpretação pessoal desse longa que ao meu ver é injustiçado pelo público.
Agora, mais importante do que entender quem matou quem, o que aconteceu, quem atirou primeiro ou todas as outras coisas que acontecem em filmes de detetives, precisamos entender aqui o contexto da obra e analisar seus personagens para obter um valor mais profundo do filme. Vamos aos detalhes da trama que a maioria ficou confusa
Michael Z. Wolfmann é um milionário dos imóveis, dono de várias propriedades em LA, cujo a esposa tem um amante. Ela e o amante desejam jogar Wolfmann no manicômio para ficar com a fortuna dele. Mas o empresário também possui uma amante, que é procurada pela esposa dele para entrar na jogada e pegar ele desprevenido.
Essa amante é Shasta, ex-namorada de Doc, um detetive particular que ela procura para pedir ajuda, já que não sabe o que fazer nessa situação. Logo ele percebe que ela não quer entrar no esquema, já que é apegada ao Wolfmann, e que talvez o ame de um jeito que nunca amou o próprio Doc no passado.
“Quando eles estavam juntos, ela passava semanas com nada mais complicado do que um beicinho. Agora ela exibia uma combinação pesada de expressões faciais que Doc não conseguia decifrar. Pensando bem, nunca houve tanto sofrimento na voz dela.”
“Doc nunca conseguiu entender o que Shasta tinha visto nele, além dele ser o único viciado conhecido dela que não usava heroína, o que dava a eles muito tempo livre. E também não era bem claro o que os havia separado. Aos poucos, eles entraram em diferentes correntes cármicas, eles observaram um ao outro deslizar suavemente para um destino diferente. Uma relação acaba? Mas é claro que sim! Essa acabou.”
Shasta parece ter seguido bem a sua vida após o termino com Doc, a narração no começo do filme sinaliza que hoje ela é outra pessoa e que os tempos de hippie ficaram para trás, ao contrário dele que apesar de ter uma nova namorada vinculada ao “sistema” e um emprego quase-formal, é o avatar de sua geração já em decadência, alguém que se recusa em abandonar uma década que chega ao fim, talvez o ultimo de sua espécie. Aquela década que prometeu a paz e o amor, o fim das guerras, preconceitos, mas que se perdeu em meio ao exagero das drogas e a paranoia que se instalou nos Estados Unidos da época, sintoma de acontecimentos como a guerra do Vietnã, exageros lisérgicos e tragédias como a seita da Família Manson.
E aquele flashback onde vemos Shasta e Doc usando um tabuleiro para descobrir aonde comprar drogas? Eles não conseguiram nada naquele dia, mas tiveram um momento de casal, um momento de felicidade que ambos jamais esqueceriam, mesmo após o termino.
Agora vamos a outra parte do roteiro:
"A longa história triste do uso de terno em Los Angeles”.
Uma sinalização de que todas as cores e a juventude dos anos 60 dariam lugar a burocrática, tensa e obscura década de 70, marcada pela derrota no Vietnã, o escândalo de Watergate e o fim do Flower power.
E se Doc é o avatar de sua geração, somos apresentados agora ao reacionário Tenente conhecido como Bigfoot, descrito como “o velho cachorro louco que odeia hippies em carne e osso. Membro do sindicato de atores, andar de John Wayne, corte de cabelo dos Flintons, e aquele brilho maligno nos olhos que diz ‘violação dos direitos civis’ “. O cara que vive no encalço do nosso herói, acha que ele é só mais um criminoso qualquer, mas que na verdade não consegue enxergar um palmo a sua frente. Aliás, o filme dá algumas pistas de que talvez Bigfoot seja homossexual e que sente uma atração por Doc, tentando reprimir ela de todas as formas, o que poderia explicar seu autoritarismo exacerbado e a pouca paciência que ele tem com o detetive particular. (Isso me lembrou Beleza americana)
“Seria possível que em toda aglomeração pela música, pela paz, pelo amor, pelo país, pelas drogas, aqui no norte, no leste, onde fosse, esses reacionários estivessem empenhados o tempo todo em se aproveitar da música, da resistência ao poder, do desejo sexual épico e cotidiano? Tudo que pudessem angariar para os antigos da ambição e do medo.”
Doc não era um marginal como Bigfoot imaginava, ele ajudou a salvar algumas vidas. Talvez essa geração não tenha dado certo como gostaria, mas acredito que logo antes das cortinas abaixarem e a juventude ir embora, Doc conseguiu compensar um pouco toda a loucura daqueles tempos, mostrando que era alguém de boas intenções e um coração enorme, assim como tantos outros que fizeram parte da geração paz e amor.
“Mas o tempo é inexorável, o mar do tempo, o mar da memória e do esquecimento. Os anos promissores se foram irrecuperavelmente. A terra que quase obteve permissão de exigir um destino melhor, viu essa permissão ser assaltada por mal feitores bem conhecidos, ser retirada e ser feita refém de um futuro no qual somos todos obrigados a viver para sempre.”
Vício inerente é algo inevitável. Como a passagem do tempo, o fim da juventude, a mudança e o amadurecimento das pessoas. No final, a história não é sobre um crime desvendado ou uma comédia fora do usual. É uma história sobre o relacionamento de dois jovens que sintetizam uma geração, onde precisam largar costumes da juventude e aceitar que o tempo passa. Certas coisas devem ficar para trás. É sobre aceitar que certas ideias não deram certo, que tempos mais obscuros estão por vir e que precisam enfrentar isso juntos.
No final, Doc e Shasta dirigem juntos por uma estrada que talvez os leve para o futuro. Ela, cansada e apoiada nos ombros dele, mistura uma tristeza nostálgica com a felicidade de finalmente estarem ali, juntos.
É importante entender que os filmes do Paul Thomas Anderson funcionam como um documento de uma época, nesse caso, o fim dos anos 60. Um retrato que só poderia ter sido feito por alguém que passou por tudo isso, Thomas Pynchon, e adaptado por aquele que eu considero o maior diretor de sua geração.
12 Anos de Escravidão
4.3 3,0K"Eu digo, nenhum homem de consciência pode levantar o chicote para outro ser humano sem chicotear a ele mesmo."
O Segredo dos Seus Olhos
4.3 2,1K Assista AgoraSandoval apesar de ser o amigo bêbado e ter claros problemas como isso, é também o que tem os momentos de mais lucidez. Como aquele em que ele conclui o diálogo dizendo que ''não se pode trocar de paixão".
O final tem uma cena muito interessante, quando Espósito descobre o que Morales fez com Gomez, a câmera foca no rosto dos dois, com as grades cobrindo o rosto deles, mostrando que ambos também estão presos naquilo.
''Você disse perpetua'', conclui Morales, que também parou no tempo. Mas apenas o Espósito sai dali, sendo o único que se liberta daquele passado.
A Árvore da Vida
3.4 3,1K Assista AgoraFico um pouco triste por uma obra como essa ter essa nota baixa,
Eu não sou religioso, mas esse filme conseguiu me tocar profundamente. Eu diria que não é necessário acreditar em algo ou ter alguma religião para assisti-lo e aproveita-lo ao máximo. Independente de qualquer coisa, a maior mensagem e sensação que se pode ter ao vê-lo é essa: amor.
Ele não possui uma narrativa tradicional, não é feito para o grande público. Mas as pessoas precisam parar de dizer que o filme é ruim porque não entenderam ele. É corajoso, pretensioso (no melhor sentido), e incrivelmente bonito.
Você pode assisti-lo quantas vezes quiser que ainda sim terá interpretações diferentes sobre alguns pontos, mas sem dúvida, a sua proposta principal é clara e objetiva. Eu fico feliz por ter encontrado uma obra com uma mensagem tão incrível e bonita como essa.
Obrigado, cinema!
''A menos que você ame, sua vida passará rapidamente"
Traffic: Ninguém Sai Limpo
3.7 215 Assista AgoraUma das cenas mais bonitas do cinema é o Del Toro vendo as crianças jogarem baseball. Dá aquele fio de esperança de que as coisas podem melhorar.
Cidade dos Sonhos
4.2 1,7K Assista AgoraA primeira vez que vi esse filme eu não entendi nada, assim como a maioria. Decidi rever eles anos depois, com uma bagagem cinematográfica maior e confesso que poucas vezes na vida eu fiquei tão encantado com um filme. Resolvi fazer uma analisa mais aprofundada, com base na minha interpretação e algumas coisas que li por ai.
Antes de tudo, é importante entender que na maioria dos filmes do Lynch, a interpretação é algo fundamental, pois sua obra não trás respostas mastigadas nem um ponto final em várias de suas questões, apesar de que sim, existem momentos onde o roteiro deixa a interpretação de lado e dá uma resposta objetiva, mesmo que seja em uma quantidade muito rara de vezes. Mas o importante aqui é explorar algumas das infinitas possibilidades com base em todo o contexto na filmografia do David Lynch.
Logo na primeira cena nós vemos um grupo de pessoas dançando. Algo importante, já mostrando logo de cara a “esquisitice” do filme e nos dando algumas referencias como ponto de partida. Em uma imagem sobreposta, vemos uma mulher loira, acompanhada de duas pessoas idosas e um som de aplausos atrás. Talvez ela tenha ganhado esse concurso de dança, e a partir dai, segue seu sonho de ir para Hollywood e fazer carreira. Podemos notar através do seu semblante, já de início, o fascínio que a fama e o entretenimento exercem nela. Mais tarde essa mesma mulher se apresentará como Betty.
Em seguida temos uma cena chave. Uma câmera com a visão de alguém em primeira pessoa se aproxima do travesseiro e apaga, dando a entender que pegou no sono. É Betty. Essa cena já é no final do filme, quase tudo que vemos depois é um sonho dela nos dando pistas do que aconteceu antes e como seu subconsciente trabalha isso.
A cena corta e depois vemos uma outra mulher de cabelo escuro dentro de um carro sendo ameaçada por dois homens, ela será morta. Mas isso não acontece, pois um acidente atrapalha os planos deles e ela consegue escapar. Betty mandou matar ela, o que de fato acaba acontecendo no mundo real. Mas em seus sonhos o plano dá errado e ela consegue sair viva, uma amostra de que a Betty foi consumida pela culpa e gostaria que as coisas fossem diferentes. Mais a frente, temos dois detetives na cena do acidente investigando o que aconteceu.
Agora, uma das cenas mais enigmáticas do filme e que abre possibilidade para várias interpretações. Dois homens estão em uma lanchonete e um deles confessa que sonhou com esse mesmo lugar na noite passada, que após sair dali encontrou com um homem de aspecto assustador . Após a conversa acabar dá pra notar na mesa que existem duas xícaras de café e um prato, logo em seguida vemos apenas as xícaras de ponta cabeça e o prato sumiu. Erro de continuidade? Não, apenas um sinal sutil de que aquele lugar é diferente. Quando eles saem desse lugar e vão para a rua, logo atrás deles tem uma pichação na parede, uma das palavras que se pode ler com mais destaque é “dream”. E de fato, assim como no sonho do homem, eles se encontram com o homem assustador, mas qual o significado dele?
Possibilidade 1: É uma figura criada pelo subconsciente da Betty, mostrando tudo aquilo que ela não quer se tornar, e por isso esse homem da lanchonete (outro aspecto do subconsciente dela) se assusta ao ver aquilo de perto. Parece ser um morador de rua, algo muito de longe de ser uma estrela de Hollywood.
Possibilidade 2: Como é apenas um sonho, talvez seja um espectro abstrato, tipo um pesadelo. As vezes os pesadelos não fazem sentido, eles são apenas desagradáveis.
Então vemos Betty de novo chegando em Los Angeles, acompanhada de uma senhora que estão muito feliz com aquilo tudo, mas ao mesmo tempo exerce uma pressão para que ela não fracasse. A minha interpretação aqui é que esse casal que acompanha ela, seja uma projeção de todos aqueles que apostam nela e cobram resultados. Podemos notar isso com a frase dita nessa cena “queremos ver você na telona”.
Betty chega na casa da sua tia e é lá que ela conhece a mulher que escapou do acidente. Nós ainda não sabemos como as duas se conheceram na vida real, mas nos sonhos de Betty esse foi o modo encontrado para elas se aproximarem, ou seja, o próprio acidente que fez a mulher misteriosa escapar de ser morta por dois homens a mando de Betty, é que faz elas se conhecerem. Confuso? Pois é, isso é um sonho. Finalmente descobrimos que ela se chama Rita. Na verdade esse é o nome que ela leu no cartaz do filme "Gilda". O dialogo delas nessa cena tem algumas frases importantes, como “Vou melhorar, se dormir”.
A próxima cena é a reunião do diretor de um filme com os figurões do estúdio e mais alguns homens misteriosos. Eles pressionam o diretor para que ele escolha uma determinada atriz, e não importa o qual boas sejam as outras, elas não podem ser escolhidas. Aqui eu vejo mais de uma interpretação para a cena:
Possibilidade 1: Esse é o subconsciente da Betty criando um modo de explicar porque ela não ganhou o papel, mesmo indo tão bem nos testes.
Possibilidade 2: Uma metáfora do próprio David Lynch criticando a industria e como ela tenta controlar seus realizadores. Quem conhece a filmografia dele, sabe que o mesmo teve vários contra-tempos com estúdios e até mesmo com a criação de Twin Peaks. Veremos várias pistas dessa possível crítica ao longo do filme.
Possibilidade 3: Os homens que tentam persuadir ele são excêntricos e agressivos. Talvez uma forma do próprio Lynch de fazer uma sátira com os executivos de Hollywood.
Possibilidade 4: Aparece também um homem em uma sala trancada observando tudo, como se fosse o cabeça de toda a operação. Veja como ele está isolado de todos. Intocável é a palavra certa. Outra metáfora do próprio diretor para aqueles que controlam tudo? Talvez. Então há um diálogo entre eles deixando claro que se não for do jeito que eles escolheram, não haverá filme.
Agora nós temos um homem conversando com alguém que parece ser seu amigo. Dá a entender que esse segundo cara estava envolvido no acidente da noite passada, aquele que impediu a Rita de ser morta.Ele é morto pelo amigo, que leva também um caderno que supostamente é importante.
Voltamos pra casa da Betty e há um diálogo importante agora, com algumas frases que dão pistas do que está acontecendo:
“Achei que, ao acordar...achei que dormir resolveria tudo”
Depois vemos o diretor que se recusou a aceitar as ordens na reunião, e quando ele chega em casa, dá de cara com a sua mulher na cama com outro homem. É até estranho porque ele parece não se importar tanto e quando resolve revidar, joga tinta na caixa de jóias da mulher. A minha interpretação é que esse é novamente o subconsciente da Betty mostrando uma parte importante da sua faceta: a vaidade. Assim como ela teme se tornar ninguém, representação feita na cena do homem na lanchonete, vemos aqui ela temendo pela sua imagem, com a projeção do diretor atacando as jóias da esposa dele.
Na lanchonete, Betty e Rita conversam tentando entender o que aconteceu na noite passada, quando são atendidas por uma garçonete com o nome de Diana, o verdadeiro nome de Betty na vida real. Dá pra notar que a garçonete também é loira e tem o cabelo curto, assim como a nossa protagonista. Logo a Rita disse que se lembra de um nome chamado "Diana Selwyn", e que talvez seja ela. Claro que não é, isso é apenas o sonho da Betty fazendo um paralelo com a realidade, manifestando ela através da Rita. As duas decidem irem atrás desse nome e ver o que descobrem, acham seu número e ligam. Então Betty olha para a Rita dizendo uma frase ambígua: É estranho ligar para si mesma.
Novamente o diretor aparece em cena com um homem dizendo a ele “Eu não sei de quem você se esconde, mas eles já sabem onde você está”. Possibilidades:
Possibilidade 1: Essa é a culpa da Betty dizendo a ela que o que ela fez foi errado, e que pagará por isso. Lembrando que na vida real, Rita foi morta por um homem a mando de Betty(Diana).
Possibilidade 2: Outra vez o Lynch mostrando como a industria exerce pressão sobre o diretor e como a cabeça dele é posta a prêmio se não obedecer.
Depois aparece uma mulher muito estranha na casa da Betty, dizendo que alguém está em perigo e quando Betty se apresenta dizendo seu nome, a mulher responde com “não, não é”.
Corta a cena para o diretor se encontrando com um homem conhecido como Cowboy. O diálogo aqui é importante porque ele diz ao diretor “A atitude de um homem diz revela que caminhos a vida dele vai tomar”.
Possibilidade 1: O que é o Cowboy se não uma figura de autoridade? Talvez essa seja mais uma pista do próprio Lynch nos mostrando a pressão que os diretores sofrem dos chefões da industria.
Possibilidade 2: O sentimento de culpa da Betty vai tomando conta dela, dizendo que as suas escolhas trouxeram consequências e que ela irá pagar por isso. Seja por ter matado a Rita ou por ter fracassado como atriz e pessoa, algo que só iremos descobrir mais para a frente.
Agora Betty e Rita ensaiam uma cena com um diálogo muito fraco, e logo ela irá para o estúdio fazer um teste, onde se sairá muito bem. Podemos ver como a mente de Betty age tentando conforta-la, colocando em um mundo onde ela é uma ótima atriz e se sai muito bem, mesmo que o roteiro não seja dos melhores. E se no mundo dos sonhos ela é tudo aquilo que não é na vida real, creio que ela não era uma boa atriz.
Então o diretor escolhe uma outra mulher para o papel principal, assim como os homens misteriosos ordenaram, mesmo que o teste da Betty tenha sido perfeito. Acredito que aqui é mais uma vez a própria Betty tentando arrumar um motivo do porque ela tenha fracassado, colocando a culpa em fatores esternos e nunca em si mesma, lembrando que sempre que esse diretor aparece, podemos levar em conta uma mensagem do próprio Lynch sobre Hollywood, o modo como ela trata seus criadores de arte, e todo o processo por trás da criação de um filme.
Quando Rita Betty vão atrás da Diana (achando o endereço dela na lista telefônica), se deparam com uma casa fechada e tentam entrar assim mesmo, descobrindo um cadáver na cama. Uma mulher loira que é supostamente a própria Diana. Eu diria que aqui é a própria Betty manifestando seu estado de espirito.
Ao voltar pra casa, as duas tem a primeira relação sexual e então temos uma pista de que as duas tiveram uma relação na vida real. Betty diz “eu me apaixonei por você” e Rita não responde, fazendo uma cara estranha. Percebemos que talvez esse tenha sido o problema que gerou toda a confusão. Depois de Rita falar enquanto dorme, as duas acabam indo para um lugar chamado Clube Silencio, atrás de respostas. Ao entrarem em um taxi, a câmera passa por um poste com o adesivo “hell”, talvez mais uma manifestação da perturbação de Betty.
Essa parte é importante porque aqui podemos extrair inúmeros significados de tudo que acontece nesse lugar. Irei explorar aquelas que eu acho mais plausíveis. O anfitrião do lugar diz “Não há banda, é tudo gravação”. Podemos entender que não há nada daquilo, é tudo um sonho (uma gravação). Uma mulher sobe ao palco para se apresentar, curiosamente ela é apresentada como “A chorosa de Los Angeles”. Uma manifestação da personalidade da Betty. Ela canta uma música cujo a letra explica tudo que aconteceu e mostra como Betty se sentia com o amor não correspondido da Rita, no final ela morre, assim como a Rita morreu na vida real. Outra interpretação é o próprio Lynch, mais uma vez, mostrando como a industria age. Atores/Atrizes vem e vão, mas o show continua, assim como a música continuou mesmo após a cantora morrer.
Então vemos pela primeira vez a misteriosa caixa azul, encontrada pela Betty na própria bolsa. Já em casa, Rita usa uma chave azul para abrir, a câmera da um zoom no interior da caixa, tudo fica escura. Novamente aparece o cowboy (figura de autoridade) para dizer o que ela deve fazer: acordar.
Betty, agora Diana, acorda no mesmo lugar e na mesma posição que aquele cadáver encontrado em seu sonho. Há uma mudança na fotografia. As cores ficam mais escuras e as luzes não ofuscam como antes, estamos na realidade de Diana. Ela é menos colorida que o mundo dos sonhos.
Aparentemente ela já está a três semanas reclusa, uma vizinha (que apareceu em seus sonhos) comenta que dois detetives procuraram por ela. Nos sonhos, esses mesmos detetives investigavam o acidente de Rita, na vida real, eles investigam o assassinato dela. Aliás, Rita na verdade se chama Camilla. Diana tem uma alucinação com ela, percebemos que ela é totalmente diferente na vida real. Nos sonhos, Diana era Betty, uma atriz promissora e que tinha tudo pra dar certo, com um talento impar e um futuro todo pela frente. Na vida real, Diana matou Camilla, fracassou como atriz, como pessoa e agora vive sozinha.
Através de memórias de Diana, vamos descobrindo o que aconteceu. Mas não se pode confiar 100%, já que estamos vendo a história do ponto de vista de alguém com alguns problemas emocionais.
Diana e Camilla tinham uma relação, o diretor se aproximou de Camilla, manteve uma relação com ela, que acabou deixando Diana de lado para ficar com ele. Talvez ai seja também um modo do próprio Lynch de mostrar com as coisas podem ser nos bastidores. Aliás, Camilla deu certo, Diana não. Ela era apenas uma figurante, alguém bem longe de ser a atriz dos sonhos. Dá pra notar que até a postura dela muda. Nos sonhos, Diana andava sempre de cabeça erguida, na vida real ela sempre está curvada e de cabeça baixa.
A mulher que aparece nos sonhos como Coco, é a mãe do diretor na vida real. Diana conta a ela que ganhou um concurso de dança na sua cidade natal, aquele lá da primeira cena, e que após isso ela foi para Los Angeles.
Dá pra perceber que quase todas as pessoas que aparecem no sonho estão nessa cena. Diana deu um rosto a todas as suas emoções e sentimentos reprimidos.
O assassino de aluguel que matou o amigo nos sonhos de Diana, é na verdade o cara que ela contratou para matar a amante.
Então, o casal de idosos aparece novamente em uma alucinação para atormentar Diana. Ela se sente péssima com o fracasso, a pressão e a culpa pela morta da Camilla.
Diana se mata consumida pela culpa de tantos fracassos e percebendo que ela se tornou tudo aquilo que não queria: ninguém.
Fecham-se as cortinas, apagam-se as luzes. Silêncio.
Espero que eu não tenha super-interpretado o filme, mas o que eu gosto do David Lynch é isso, as possibilidades de suas obras.
A Origem
4.4 5,9K Assista AgoraDurante todo o filme, o Cobb age de forma paranoica e usa o totem (da esposa) pra saber se está acordado. Ele sempre espera o totem parar de rodar até ficar calmo, mas não na ultima cena. Lá no limbo, ele tem uma ultima conversa com a Mal e percebe que precisa se perdoar e deixar o passado. Quando volta pra casa, ele roda novamente o totem, vê seus filhos, vai em direção a eles sem esperar o objeto parar de rodar. Ele não se importa, nem ele tem certeza se aquilo é um sonho ou real, mas não faz diferença. Cobb completou a sua maior jornada: se perdoar e deixar o passado no seu devido lugar.
E após toda essa viagem, ele entendeu que não poderia transformar seus sonhos em obsessões.
Eles Matam e Nós Limpamos
3.6 106Senti que tava vendo a demo de Dexter
Ave, César!
3.2 311 Assista AgoraAcho que o que faz as pessoas desgostarem desse filme é que sempre se espera muito dos irmãos Coen. Ironicamente, todos os elementos que fazem eles serem conhecidos estão presentes nessa história. Não é uma obra de arte memorável, mas não acho que esse filme tenha essa pretensão. Ele é leve, se preocupa com a estética e mistura homenagem e ironia em uma coisa só, conseguindo se sair bem nesses pontos.
A aparição dos nomes mais conhecidos, que para alguns pode ser frustrante, já que não ficam tanto tempo em tela, para mim é algo cirúrgico, acertado e feito na medida certa. Aliás, a primeira cena do Channing Tatum é a minha preferida.
E se os grandes nomes não aparecem tanto quanto se imagina, Josh Brolin rouba a cena, fazendo um dos personagens mais interessantes e carismáticos que os irmãos Coen já criaram.
É um filme que vale a pena se não for visto com grandes expectativas.
Onde os Fracos Não Têm Vez
4.1 2,4K Assista AgoraVi esse filme quando era mais novo, não tinha entendido nada. E agora, revendo com uma cabeça diferente, é um dos filmes mais incríveis que já tive o prazer de assistir. Além de ter uma das introduções mais interessantes que eu já vi em um filme, aquele monólogo do Xerife, tem também outros diálogos e questões sobre a passagem do tempo que são muito interessantes.
"O que você sente não tem nada de novo. Essa terra é dura com as pessoas. Não dá pra impedir as mudanças. O mundo não lhe dá esse privilégio."
A fotografia me lembrou muito "Paris, Texas". Aquele lugar árido, clima seco e solitário. O por do sol constante, como se algo sempre estivesse acabando. E ao mesmo tempo em que se fala sobre o ciclo natural da vida, esse mesmo ambiente parece que parou no tempo, vazio, parecendo que esqueceu a existência de um mundo fora dali. Algo que combina com o Xerife Ed.
Capitão América: Guerra Civil
3.9 2,4K Assista AgoraPor quê esse filme medíocre tem uma nota tão alta?
Conflitos Internos
4.0 111O nome desse filme ganhou um sentido totalmente diferente depois de vê-lo.
Memórias de um Assassino
4.2 366 Assista AgoraPrimeiro filme sul-coreano que eu vejo. Surpreendentemente bom.
The Beach Boys: Uma História de Sucesso
3.9 169 Assista AgoraSou fã dos Beach boys e do Brian. Ver esse filme é uma mistura de alegria, tristeza, raiva. Muitas coisas. Fico feliz em saber que é um bom filme, ao mesmo tempo em que, ver uma pessoa tão talentosa e carismática se desfazendo é triste. Raiva em saber que se aproveitaram dele por tanto tempo, dá até uma sensação de angustia.
Garota Sombria Caminha Pela Noite
3.7 343 Assista AgoraVivi o suficiente pra ver um filme com uma vampira indie/skatista e dizer: cara, que foda.
Claro, o filme é muito mais que a estética. Mas acho que todos os comentários positivos já foram tecidos.
A Bruxa
3.6 3,4K Assista AgoraSe esse filme fosse francês/oriental ou dos anos 70, o pessoal tava dando 5 estrelas sem nem ter entendido porra nenhuma.
Sicario: Terra de Ninguém
3.7 942 Assista AgoraDica: não vejam o trailer.
Para Sempre Alice
4.1 2,3K Assista Agora“Voo noturno para São Francisco, seguindo a Lua através da América. Não entro em um avião há anos. Quando chegarmos à 35 mil pés atingiremos a tropopausa, aquela área de ar calmo. O mais perto que chegarei de ozônio. Sonhei que estávamos lá. O avião passa pela tropopausa. Pelo ar seguro. E entra na camada externa, na de ozônio. Irregular e em frangalhos, manchado como um velho tecido. E aquilo foi aterrorizante. Mas vi algo que só eu vi por meu dom de ver essas coisas. Almas se elevando, vinda da Terra lá embaixo. Alma dos mortos, daqueles que pareceram. Pela fome, pela guerra, pela peste. Flutuavam ao céus, como paraquedistas ao contrário. Como postura séria. Rodando e girando. As almas desses que partiram deram as mãos, juntaram os pés, formando uma rede de almas. E as almas 3 moléculas de oxigênio como o ozônio a camada as absorveu e se reparou. Por que nada se perde para sempre. Nesse mundo há um avanço doloroso. Sentimos falta daquilo que deixamos, e sonhando com o futuro.. Ao menos eu penso assim”
A Garota Dinamarquesa
4.0 2,2K Assista Agora<3
Relíquia Macabra
4.0 182 Assista AgoraQuando se perde um filho, arruma-se outro. Mas só existe um falcão maltes.