Sem sombra de dúvidas, o seriado tem momentos apavorantes (e outros pavorosos). Como exercício de incutir inquietação e angústia no espectador, possui sequências que fazem isso de forma super eficiente e outras tantas de forma bem gratuita. Contudo, infelizmente, parece que a trama vai do nada para lugar nenhum. Não sou conhecedor da franquia e creio eu que só vi o primeiro O Grito e há muuuuito tempo atrás, mas a impressão que me fica é que os realizadores levaram o subtítulo demasiadamente ao pé da letra e só se preocuparam em realizar conexões com os filmes, deixando de dar uma história própria a isso daqui.
Acho que uma das muitas temáticas que Mr Robot aborda (e, nossa, são MUITAS) é a da autosabotagem e me parece que nessa temporada isso se tornou o tema central. Como de costume, me doeu na alma ver o Elliot falar comigo e não ter como responder o pobre coitado de volta. Ele, desesperado por qualquer tipo de amparo, sem poder confiar em si, recorre completamente aterrorizado pra essa figura que ele criou na própria cabeça -- a audiência de seu seriado --, numa última tentativa frustrada de ter com quem se comunicar e, mais importante, de ter como ser reconfortado.
O temor nos olhos do Elliot, passando pra mais pura confusão e então de volta ao medo é de cortar o coração. É bizarro pensar como nosso maior inimigo somos nós próprios. Gosto de como a série retrata isso das maneiras mais literais e também metafóricas possíveis. Elliot enquanto Elliot quer algo, Elliot como a projeção do algoz de sua infância quer outra coisa e é apavorante vê-lo falar de si mesmo como se fosse outra pessoa de modo tão vívido. A cisão psicológica do Elliot é tão crível e palpável que em nenhum momento questionamos se Elliot e Mr Robot são pessoas distintas, mas é quando se pára pra pensar no quão fodido mentalmente é nosso protagonista que bate aquela insidiosa realização de que é um homem desesperado agindo contra si mesmo, e na maioria das vezes sem nem sequer saber disso.
É impressionante como Mr Robot sempre se reinventa, graças à mente brilhante de Sam Esmail e à sua incrível equipe. Esse sujeito encontra meios novos de retratar algo que, se não dada a devida atenção, ficaria rapidamente exaustivo, que é justamente a dinâmica das múltiplas personalidades do Elliot. Desde o primeiro episódio vemos o Rami Malek e o Christian Slater interpretando o mesmo personagem e é reverenciável que mesmo após tanto tempo ainda somos surpreendidos pelo batido fato de que o Elliot é absolutamente maluco. Assim, me parece ter sido certeira a decisão de "separar" ainda mais essas pessoas que vivem no interior mental do protagonista, raramente as colocando em tela juntas, diminuindo sua interação mútua e aumentando o escopo de suas diferentes ações na vida alheia.
Acho que isso contribuiu pra essa impressão de que a autosabotagem, mais do que nunca, é o alvo central do que o Sam Esmail quer falar aqui. A todo instante destruímos nossos sonhos, censuramos nossos desejos, amplificamos nossos medos, duvidamos de nossas capacidades, não confiamos em nossas decisões, nos julgamos por nossos traumas e no geral achamos que somos péssimas pessoas que não merecem qualquer tipo de compreensão ou afeto.
Pra melhor ou pra pior, me vejo muito nessas questões privadas do Elliot consigo mesmo, do Elliot com sua figura paterna e do Elliot com sua total inabilidade de lidar com seus traumas. Os esbugalhados olhos do sujeito são uma janela não pra alma dele, mas pra minha. O episódio em que ele tenta desesperadamente desativar aquela programação dentro do prédio, se batendo, se chocando contra as coisas, apagando sem lembrar do que fez há apenas 5 minutos... o estrago físico como uma manifestação total do estrago mental que o Elliot carrega dentro de si 24/7 me causou uma agonia, me deixou num nível de pânico tão grande. O tragicômico daquela situação encheu meus olhos de lágrimas.
O Elliot precisa urgentemente se deixar ser cuidado, se deixar ser compreendido, deixar as pessoas entrarem em sua vida... se deixar ser amado. Suas paranóias só pioram, não parece haver qualquer tipo de solução pra como o Elliot se enxerga e se tornou incontornável o fato de que ele coloca no pai tudo aquilo que ele rejeita dentro de si. O que o Elliot carrega em seu âmago me angustia.
Absolutamente sem defeitos. Big Little Lies é um retrato cru e hiper realista de uma espiada no idílico retrato da vida perfeita. Casas de veraneio, mulheres bem casadas em seus 40 anos, casais ridiculamente ricos e bonitos, com a adição de crianças sorridentes permeando o clima de Monterey, que chega a exalar cheiro de maresia pela tv. Mas quando David E. Kelley e Jean Marc Vallée se juntam pra colocar uma lente de aumento nessa rotina, a grave condição humana se revela, escancarada, sem pudores, nos seus mais pungentes e aterradores impulsos. É repulsivo, mas humanamente sedutor.
Eu me senti absolutamente fascinado pela construção da narrativa desse seriado, como roteirista e diretor não têm papas na língua pra revelar as intricadas personalidades de nossas protagonistas. Elas são incríveis, corajosas, obstinadas, frágeis, sensíveis, inseguras — são humanas. Por detrás de toda a banca que colocam, escondem-se pessoas profundamente afetadas por traumas da vida. Madeline, Celeste e Jane poderiam facilmente cruzar meu caminho na rua, e eu nem me daria conta.
Madeline, muito mais do que as outras, busca ativamente a vida perfeita. Se casou com mais um cara rico, se orgulha do tempo que dedica à família, possui um trabalho não tão importante mas muito significativo à parte, é danada das ideias, engraçada e possui a boca maior que a própria cabeça. Dentro desse mulherão, há um ser terrivelmente egoísta e ingrato, que gostaria de dar mais voz aos seus desejos irrefreáveis do que sustentar essa falsa imagem que passa aos outros. Por conta disso, nem percebe o mal que inconscientemente causa àqueles que lhes são mais queridos, através da traição ao marido e da negligência quanto à filha. Tragicômico, coitada.
Celeste hits really close to home. Me compadeço e me identifico com essa giganta esguia que, ao mesmo tempo que exala uma nobreza intimidadora, é frágil e quebradiça como porcelana, se entregando de corpo e alma ao seu mefistófeles. Seria muito fácil fazer com que ela caísse num estereótipo da coitada abusada, coisa que felizmente não acontece aqui. Celeste é violentada das mais variadas formas, sofre abuso emocional e físico, é cobrada e controlada, mas ela não se aliena ao que lhe é feito e ao que faz. Sim, ela é uma vítima e ela possui profunda ciência disso. Ela se culpa, acredita piamente que merece o abuso que lhe é causado, mas, à sua maneira sutil e às vezes até mesmo atrapalhada, ela revida as agressões, derrama veneno na própria língua e o destila ao falar com o marido. Ela sabe que vive uma situação errada, mas o sentimento de gratidão ao homem que lhe ajudou no pior momento de sua vida fala mais alto, na maioria das vezes. Ela é forte, determinada e inteligente. Os momentos de confissão com a terapeuta são um assalto aos sentidos, uma verdadeira ostentação do poder de atuação da Nicole Kidman. O que senti para com essa personagem é extremamente pessoal.
Apesar da identificação com a Celeste e do quanto ela me cativou, a personagem que mais me intrigou e capturou meu interesse foi a Jane. Ela é simplória, gente como a gente, uma plebéia perdida no salão da realeza. Ela não se revela ao mundo, muito pelo contrário: sempre se encontra soterrada sob as volumosas roupas escuras com as quais se veste quando se encontra com outras pessoas. Ela é quieta, mas não sossegada. Ela é invisível, mas não inexistente. Ela vive nas sombras e só consegue ser ela mesma quando sozinha. As suas corridas, muito reveladoras por sinal, são os momentos que mais me pregaram à tela. Ela corre, corre e CORRE, fugindo de seus demônios, fugindo de seu passado, fugindo de seu estupro... diria até que foge de si mesma, justamente para encontrar a si própria, só que num futuro distante, numa outra realidade, uma Jane que não viveu aqueles traumas ou que, ao menos, tenha a audácia de destruí-los. A Jane é uma crua manifestação de Eros e Tânatos, dos impulsos de vida e morte, e ela constantemente busca a destruição de quem a violou, mesmo que pra isso ela precise se obliterar no caminho. Assustadoramente fascinante.
Para contar suas histórias e desnudar suas emoções, Jean Marc Vallée mais uma vez recorre ao uso de músicas e de metaforas visuais. Felizmente ele é inteligente o suficiente para não escolher canções que “cantam” as situações das personagens, mas, sim, composições que ECOAM seus sentimentos, que EXPANDEM o contexto de seus dramas. Com isso, sua maior aliada nessa tentativa de mostrar sem falar é a montagem, que alterna entre futuro, presente e passado de uma maneira tão suave e imperceptível, como fragmentos de lembranças que acometem as personagens em momentos de emoções mais fortes. Além disso, há o uso de tomadas de apoio que constroem metáforas, tal qual nos momentos finais do último episódio, em que diversas “Davis” destroem Golias com entrecortes de violentas ondas atacando grandes rochas, tudo isso acontecendo ao som de uma paradoxal tranquilizante música. Elas encontraram paz no caos da violência, como verdadeiras forças da natureza. É de uma sutileza simplesmente genial.
Big Little Lies me acometeu instantaneamente, como um tiro no peito. Fui fisgado por completo. É costume meu tentar solucionar quebra cabeças antes do mistério ser revelado, muitas das vezes com acertos. Eu fiquei profundamente satisfeito em ter errado em todas minhas suposições, tendo tudo sido uma grande surpresa a cada novo andar da história. Senti as mais diversas emoções: revolta, tristeza, euforia, ódio, medo e alegria; são algumas das emoções básicas do ser humano. Com uma série tão visceral, é compreensível eu ter sentido tanto ao ver ela. Honestamente? É uma daquelas experiências estéticas que me faz me sentir grato por ter tido.
Meu deus, alguém ensina a esse diretor de fotografia que existe algo além de primeiro plano, além outras distâncias focais de lente aaaaaaa absolutamente EM NADA ajuda, em termos de narrativa, a linguagem fotográfica se manter a mesma, tão fechadinha e com fundo desfocado o tempo inteiro. Além disso, o Pete é indescritivelmente insuportável, ô personagem enjoado e sem personalidade, mero cachorrinho de bolsa da Tiff. Engraçado pensar como o Pete nos é introduzido como o protagonista, e se mantém assim por boa parte da série, sendo que ele não tem backstory próprio e todas as ações dele acontecem em função de outra personagem. A Tiff é o estereótipo da mulher escrota e babaca que mantém uma armadura a sua volta por traumas do passado, mas que secretamente é uma flor indefesa em busca de alguém que a entenda. Levando em conta a temática central da série, não achei que fossem enveredar por tantos clichês de comédia romântica e que pecariam tanto em ambientação e construção de personagem. Não parece que eles vivem num mundo orgânico, vivo — do jeito como as situações são introduzidas, parece que o contexto das cenas fica “pausado” esperando nossa dupla aparecer, como um videogame de mundo aberto vagabundo. Fora que há umas situações forçadas, sem pé nem cabeça, como o episódio final. Esses roteiros precisam passar por uma revisão que não inclua o tendencioso olhar do criador do seriado. Bonding tem algo de especial, mas tá rapidamente se tornando uma merda em apenas uma temporada de sete episódios curtíssimos.
Ah, expectativas altas são uma foda, né. Desde que anunciaram a volta definitiva de True Detective, lá atrás, com a adição do Mahershala Ali ao elenco, eu fiquei o queEUFÓRICO
Dois anos se passaram e eu FINALMENTE pus minhas mãos na temporada nova e, oooolha, não é isso tudo ahauhuahha :(
É ridiculamente evidente o desespero da produção e do roteiro em tentar emular a fórmula da primeira temporada. Flashbacks e flashforwards alternados em entrevistas, dois investigadores conflituosos, um crime hediondo que assombra a galera envolvida por décadas e um público quebrando a cabeça pra entender o que caralhos aconteceu. Funcionou uma vez, isso não quer dizer que funcionaria uma segunda. Não mesmo.
Num texto afiadíssimo mas repetitivo, aliado a direções (sim, três marmanjos) duras, às vezes inventivas, mas redundantes em seu outlook pessimista e agourento, a força motriz da narrativa se encontra sem dúvidas na performace MONUMENTAL e HERCÚLEA de Mahershala Ali. O cara atua com os OLHOS. Ah, os olhos de Mahershala Ali. Neles, eu vi confusão, melancolia, fúria, remorso, paixão, esperança, amor e ternura. É um talento ímpar.
Nosso protagonista, (((na inflexão de Hendricks))), PURPLE HAZE, é um cara maculado pelas experiências da guerra que travou no Vietnã, com o sistema de polícia e consigo mesmo. Ele definitivamente não se conhece, e como ele mesmo diz, não dispende muito tempo pensando "nessas coisas", e pouco sabe do que quer, apesar da determinação sem par que investe em seu trabalho e no carinho com o qual trata sua família. Infelizmente, um cara comum se viu preso numa teia de crimes e conspirações que estão completamente além do ordinário.
Assim, ao longo de uns 30 anos, vemos Hays se afundar mais e mais numa investigação imprudente, irresponsável, infrutífera e completamente incompetente, tanto por parte dos investigadores, quanto da promotoria. É tanto despreparo metido com corrupção que o caso dos Purcell tava fadado ao fracasso antes mesmo de acontecer. As falhas são ensurdecedoras.
Com isso, Mahershala Ali abraçou com tudo que podia seu papel complexo e repleto das mais imperceptíveis camadas. Ele não se limita somente a entregar um bom texto de maneira satisfatória, ele vai ALÉM, construindo uma postura específica para cada época, assim como especificidades no discurso, na cadência da fala, no timbre de voz, se preocupando com os maneirismos de seu personagem, vícios de expressão e olhares. Mais uma vez, os OLHOS de Mahershala Ali. Esse cara ainda tem muito Emmy, Globo de Ouro e Oscar pra ganhar, amém.
Ademais, temos nosso outro investigador que se meteu nessa maracutaia, o parceiro de Hays. Rapaz, esse daí eu vi por 8 episódios e não aprendi ABSOLUTAMENTE NADA sobre ele. Sim, ele é meio rude e grosseiro, fala merda sem olhar a quem, e, com o passar dos anos, vai se tornando um velho frágil e solitário. Muitas foram as chances perdidas para dar um desenvolvimento decente a esse personagem, tais como quando ele menciona suas questões pessoais com religião e segregação social, mas tudo soa superficial, sem preocupação em fazer do Roland um cara crível. Nem mesmo deram chance a uma possível "amizade" com o pai das crianças perdidas.
Por falar em superficial, também soa oco e pretensioso o momento quando, num episódio avulso, Pizzolato tenta enfiar uma crítica descarada ao racismo institucional nos EUA. Não vou me estender aqui, mas é muito mais eficiente demonstrar repetidas situações de invalidez de opiniões e atitudes dos personagens negros da história do que colocarem eles pra falar "Ó ESTOU SOFRENDO RACISMO". Não subestime a audiência.
Isso me leva a outro ponto. Na minha resenha ridiculamente minuciosa e longa sobre a primeira temporada (se quiser, é só procurar no meu perfil), eu elogio repetidas vezes a ousadia do texto de Pizzolato e da direção do Fukunaga em entregarem as mais diversas perspectivas filosóficas sobre a existência e as mais vastas suspeitas sobre os crimes sem, em nenhum momento, explicar ou dar de mão beijada pra audiência explicações exageradas sobre as atitudes dos personagens. Dá pra entender e, se não der, dá pra pesquisar. Eu gostava de como o público tinha de fato que engajar na história com os personagens e participar ativamente, ao invés de se abstrair dos fatos como um observador. Tentou emular a fórmula, mas a substância ficou faltando, hein.
Há muito simulacro da primeira temporada e, talvez, este seja o grande problema. Não senti ousadia, coragem e inovação aqui, somente mais do mesmo. Claro, há um apreço pela história e pela forma como a narrativa a guia. Nem tudo são maçãs podres aqui.
Nessa temporada, Pizzolato e diretores se aprofundaram muito mais no que chamei de "fluxo de consciência" na minha resenha sobre a primeira temporada; as linhas de tempo se entrelaçam com muito mais frequência e com menos avisos, me lembrando, de certa forma, da montagem de Sharp Objects. Junto com Hays, vagamos por sua memória enevoada e incerta, nos perguntando, junto a ele, sobre a relevância e, ainda, sobre a validade de certos momentos. Os relatos das bocas dos personagens vão se perdendo completamente com as suas rememorações avulsas.
Junto a isso, há algumas sacadas de gênio que nos fazem pensar em temas da primeira temporada, tais como a persistência do tempo e outras nem tanto sobre a falsa dicotomia entre "bem vs mal". Sobre este último, com o passar dos episódios, voltamos a nos indagar sobre os rótulos que colocamos em certos personagens, contudo, a maneira didática com a qual é feita me fez revirar os olhos, porque nos foi colocado um sujeito para nos EXPLICAR que, poxa, as coisas não são bem assim como imaginastes. Ridículo, poderiam ter deixado a preguiça e os diálogos expositivos de lado.
De qualquer forma, quanto à questão da temporalidade, com a narrativa indo e voltando nas linhas de tempo de Wayne Hays, notamos algumas coisinhas singelas que, de soslaio, passam batido, mas que reforçam uma perspectiva que volta lá nas falas emblemáticas de Rust Cohle. Umas duas vezes, notei, Hays fala sobre "a little clip on it", além da GENIAL escolha da direção em refletir, no corpo de um jovem Hays, um senil Hays.
Junto a isso, há alguns precisos matching cuts que, ao cortar, numa determinada cena, de um Hays para outro Hays, nos entrega uma maior profundidade temática sobre que situação ou que diálogo terá certa ressonância emocional para o personagem no futuro. A isso, adicione algumas quebras de quarta parede e alucinações mnemônicas, que, em retrospecto, dão insights sobre momentos das investigações.
É como Rust Cohle dizia, "all right, all right, all right", opa, "time is a flat circle". De fato, nos damos conta que nossos personagens seguem dando murro em ponta de faca, com parcos resultados positivos, sempre dando de cara com uma rua sem saída.
Senti falta, cara, de um maior aprofundamento filosófico nessa narrativa. Algo que nos faça pensar nesses personagens como algo além de meros homens falhos investigando um crime, algo que os ETERNIZE. Rust Cohle é quase uma figura mítica e Marty segue ali no panteão dos semideuses, como uma figura barroca, em busca do eterno e do divino, mas mergulhado até o talo no mundano e no profano.
Ways é um veterano melancólico e com problemas de memória e Roland, bem, o Roland fala uns palavrões. É isso. Ah, tem a escritora, mas ela me é uma figura tão ambígua que mostra mais um defeito de escrita do que uma personalidade bem construída. Acho ela oca. E tem o pai das crianças, numa interpretação agonizante de Scoot McNairy, mas não é nada além de alguém em profunda dor. Ele é raso.
Acabei sendo mais desfavorável a essa temporada do que achei que seria hauahuuah Enfim, True Detective sairia muito melhor como uma minisérie do que como uma interminável amostra de oportunidades desperdiçadas.
O quão improvável é a história central desse seriado? O quão improvável é que um pacato professor de química de ensino médio, em meio às atribulações da vida, decida que não há mais jeito de seguir com seu cotidiano sem graça, que é hora de se tornar um "chefão do crime"? Não sei, caguei, pouco me importa, Breaking Bad me convenceu.
Walter White, de certa maneira, me lembra o Neil Armstrong de O Primeiro Homem, um dos filmes que tava nessa leva do último Oscar. Um homem pacato, sem grandes ambições e em contento com uma vidinha meia boca, apesar do intelecto ímpar que carrega. Ele deixou sua existência passar por si como vento e nem sequer esticou a mão para sentir a brisa dentre os dedos. Contudo, em algum momento, a vida chama. O dever bate na porta e, muitas vezes, é muito próximo da morte.
Quando descobre que está com câncer inoperável no pulmão, Walter é atingido como que por um tiro. O impacto é tão forte que ele olha ao seu entorno e finalmente percebe que não alcançou nenhum dos seus sonhos. Não casou com a mulher que queria, não construiu a empresa que queria, e, sobretudo, não se tornou quem queria. Um dos monólogos mais pungentes que já vi é quando Walt discorre para sua família que nunca conseguiu realmente tomar as rédeas de sua vida: ele não é o protagonista da própria existência.
Desse solilóquio belamente trágico, surge o entendimento sobre as atitudes de nosso personagem. Ele acha que se entregando à vida do crime, poderá finalmente ser alguma coisa, e não apenas habitar uma concha vazia dada a ele pelas circunstâncias ou pelas pessoas à sua volta. É irônico pensar nisso, já que ele continua vivendo em função dos outros: Walter apenas trocou de emprego e de nome.
Sendo assim, temos um personagem que facilmente poderia cair na caricatura de um velho chato e desinteressante que decidiu dar a louca. Mas, graças à uma feliz decisão de casting, não foi isso que aconteceu. Bryan Cranston abraça seu papel de tal forma que não parece estarmos vendo uma atuação, estamos sendo observadores da vida de alguém.
Isso se dá por dois fatores primordiais, o ator e a fotografia. A performance de Bryan Cranston é holística. Ele não se contenta apenas em entregar diálogos com bom timing e entonação. Há um trabalho de inflexão vocal -- o grave da voz de Walt se acentua em momentos de estresse e de conflito --, uma elaboração de trejeitos e maneirismos -- Walt gesticula demais quando ansioso, esbugalha os olhos ao explicar coisas óbvias e se esperneia todo quando tem de aturar a burrice alheia.
A fisicalidade é notável quando a postura mais relaxada de Walt se apresenta frente à família, enquanto seu andar e movimentação ficam mais rígidos frente a assuntos escusos. Além disso, o OLHAR de Walter White transmite muita coisa. Não há dúvidas sobre as emoções de nosso personagem. Sabemos quando está empolgado ou angustiado, permeado de fúria ou de remorso. O mais brilhante é quando Bryan Cranston tem de interpretar seu personagem mentindo. Os olhos dele também entregam uma emoção no intuito de camuflar outra. Não tenho palavras pra esse tipo de coisa.
Já a fotografia se responsabiliza em ditar esse "realismo" pelo aspecto visual. É muito evidente como a série é fotografada, sobretudo no episódio piloto, como um simulacro de cinema verdade. Há muito uso de câmera na mão -- mesmo quando não há necessidade alguma, como, por exemplo, quando o Walt se senta à mesa pra comer aquele bacon vegetariano -- e utilização frequente de longos takes -- como se a ação fosse contínua e apenas tivesse sido capturada durante aqueles instantes.
Entretanto, o "ficcional" vai, pouco a pouco, sendo mais incorporado ao seriado, ficando patente quando os diretores recorrem a steadycams ou mesmo ao tripé, deixando a imagem mais "estática", balanceada, e com movimentação mais suave. Ademais, a fotografia vai se tornando mais autoral, não por iluminação, filtros ou tratamento de cor, mas pelas incomuns escolhas de planos ou posicionamento de câmera, como supostamente "dentro" de objetos, nos tornando "parte" da cenografia ao, por exemplo, nos fazer ver os personagens pelo ponto de vista do chão ou de uma banheira.
Autoral também se mostra o roteiro, ao escolher tratar de uma história tão incomum e improvável, mas, ao mesmo tempo, tão mundana e pé no chão. Não estamos acostumados com esse tipo de coisa em nosso dia a dia, mas a abordagem dada à narrativa, fazendo com que continuamente vejamos os personagens em conversas cotidianas ou fazendo tarefas privadas, como limpar o chão, comprar roupas, falar no telefone durante uma apreensão policial, nos faz enxergar aquele mundo como algo vivo e tangível.
Assim, se torna genial o tratamento dado aos personagens e à trama, quando os roteiristas permeiam os episódios de sujeira e dúvidas mundanas, mas, mais importante, de HUMOR. Seria muito conveniente e lugar-comum abordar essa história de maneira taciturna e sombria, como um conto noir ou se aproveitando da estrutura de filmes de máfia, colorindo as imagens com tons escuros e sombras. Mas não aqui. Breaking Bad nos faz GARGALHAR.
O último episódio é um ótimo arquétipo da estrutura narrativa da série. Nossos personagens se encontram numa quina de sinuca, com poucas opções para conseguir se safar de uma situação inóspita. Walter surge com uma ideia mirabolante, suportada por seu batcinto de química para solucionar o conflito. Assim, com muito humor situacional e satírico, rimos de nossos protagonistas roubando um galpão, vestidos com roupa chamativa e amarrando um guarda num banheiro químico -- chega ao limiar da galhofa. E, em meio às nossas risadas e à ridicularização dos personagens, quando menos esperamos, vemos um drogado ensandecido murrar o crânio de alguém até a morte.
Genialmente, a trama e os temas lúgubres são salpicados com humor para que haja um baque que faça tanto audiência quanto personagens colocarem seus pés no chão e se tocarem que, sim, eles estão metidos com assuntos muito pesados.
Quanto a isso, o personagem do Jesse Pinkman não me é satisfatório. Ele não funciona em seus momentos solo, sendo apenas um drogado imbecil com um sideplot muito do desinteressante e comum. Wow, a família dele não vai com a cara dele porque ele nunca demonstrou potencial suficiente como ser humano. Meh. De qualquer forma, a química entre ele e o Mr White é invejável, fazendo com que Pinkman, ainda, seja muito mais eficaz somente como um sidekick.
Por mais que eu já tenha tentado ver Breaking Bad umas cinco vezes, nunca conseguindo ir até o final, estou finalmente ansiosíssimo para ver até onde esses dois patetas vão. Eu lembro mais ou menos, mas, nossa, como tá sendo gostoso redescobrir isso daqui.
True Detective foi uma das primeiras séries que peguei pra ver quando comecei a levar Cinema (e produções audiovisuais por extensão) a sério e, em meio à minha arrogância adolescente de quem finge que sabe alguma coisa sobre alguma coisa, não demorou pra se tornar uma das minhas favoritas e continuar nesse posto até hoje. Possivelmente foi o que ajudou a cimentar meu gosto por mistérios policiais envolvendo crimes hediondos e temas existencialistas, uma mescla que, felizmente, anda tendo a rodo, amém.
Nic Pizzolatto claramente tava MUITO mais preocupado em desenvolver seus subtemas adjacentes à trama do que tornar a resolução dos crimes como uma prioridade, o que geralmente prejudica o enredo, mas, genialmente, neste caso, não houve esse problema. A força motriz de True Detective se encontra nas crenças e valores de seus protagonistas e no embate existencial inerente às suas personalidades tão díspares e é tão lírico ver isso acontecendo <3
Assim, possuímos um grande tema geral clássico e comumente batido em produções culturais há milênios, desde Caos e Ordem na mitologia grega, envolvendo Luz vs Escuridão, que se desdobra em subtemas bem específicos e que alimentam a série, tais como livre arbítrio vs determinismo, Homem vs Natureza, e em outros que fogem a dicotomias, como responsabilidade, integridade, religião, deus, relacionamentos, e tocando em questões inerentes à natureza humana, como para onde vamos? o que somos? há algo além daqui?
Para um drama policial, esse aqui vai muito além do que qualquer um esperava.
Rust é um cara cínico, maculado por experiências brutais da vida, sem perspectiva de futuro e com crenças firmadas em pedra sobre o gênero humano e o mundo ao seu redor. A realidade é pintada em tons de cinza e chumbo, as pessoas são cruéis e egoístas, todo mundo vai morrer e que se foda suas boas intenções. Para alguém tão mergulhado num niilismo, ele enxerga bem além das aparências que veste nas coisas ao seu redor, sendo íntegro e verdadeiro ao que considera certo.
Marty é um pai de família, cheio de vida e otimista quanto à sua existência, sobre a qual não delonga muito e deixa pra deus resolver; talvez se pensasse mais sobre quem é e sobre o que quer não seria tão babaca com todo mundo que o ama. Apesar de tanto falar sobre VALORES, CRENÇAS e FAMÍLIA, é o primeiro a ficar doidão e colocar um par de chifres na esposa e a esnobar suas filhas. Fala tanto sobre a preciosidade do casamento e como compromisso dita o valor de um homem, mas não enxerga as merdas que faz, uma atrás da outra.
É como se o véu da ignorância tivesse sido retirado dos olhos do Cohle e amarrado feito uma venda na cara do Hart, cegando um eternamente para suas ações e jogando o outro na boca do demônio pra ser devorado. Não é a toa que somente depois de experienciarem muita merda juntos é que começam a se entender, um pouco.
Há um diálogo emblemático, tanto da personalidade de cada um, quanto da relação dos dois, e que diz muito sobre o que a série busca tratar logo na meia hora inicial do primeiro episódio. Não dura mais do que cinco minutos e, numa exposição singela da mais pura habilidade de escrita e de síntese, Nic consegue abordar isso tudo e ainda tocar brevemente, não didaticamente, não expositivamente, mas de forma orgânica e essencial à natureza de nossos dois personagens, em assuntos concernentes a Camus, Unamuno e Hume.
Faz Rust divagar sobre a ausência de pessoalidade, como se o "eu" fosse apenas uma junção randômica de matéria reunida que possui ímpetos e impulsos arbitrários e naturais que, devido a uma falsa noção de "consciência", nos faz entendê-los como desejos, sonhos e vontades. Não há de fato um "eu" consciente que controla minhas ações, mas muito mais uma amálgama de estímulo-resposta senciente do que há à volta que se transveste num falso ego. E, apesar dessa constatação, seguimos nossas vidas com essa mentira tornada verdade por puro efeito de uma "programação", ou como Sísifo com sua pedra, eternamente seguindo em frente alheios à "verdade" porque a existência nos obriga. É, é bem cerebral.
Assim, nos damos com um Marty claramente confuso mas implicitamente admirado por seu parceiro, mandando-o calar a boca, estabelecendo que o trajeto no carro é um momento de reflexão silenciosa. Em sua ignorância, Hart se vê incapaz de tentar dar continuidade à conversa e aprender mais não somente pelo que há ao seu redor, mas no seu interior. É uma constatação vergonhosa de que ignorância é uma benção e, quanto menos perceber a si, mais feliz será -- à custa dos outros.
Ademais, vamos entrar em contato com a hipocrisia emblemática do Marty, cego demais pra evidenciar que não vive de acordo com nenhum de seus lemas, que suas frases são ocas e suas ações traiçoeiras daquilo que tanto diz buscar. Trai sua esposa, trai suas filhas, trai sua religião, trai até mesmo sua noção do que são as pessoas, mas, sobretudo, trai sua falsa concepção de si mesmo. Ele não quer ser um pai de família, provedor, religioso e íntegro. Ele quer se entregar à gandaia e viver como um Baco. Mas sua criação e os valores que adotou ao longo do caminho para ser aceito o impedem de perceber quem realmente é.
Já Rust, ah, Rust diz em algum momento aí que lutou muito para descobrir quem realmente é e que não abrirá mão de finalmente ter se encontrado. Tiro meu chapéu pra quem, no auge de seus 50 anos, se entupindo de cerveja, cigarro, maculado por tanta droga e experiências atrozes, com a aparência estragada e vivendo num casebre atrás de um barzinho meia boca, diz isso pra uma câmera num interrogatório. Ah, ele tá realmente pouco se fodendo pra tudo e todos. Esse daí não se esconde atrás de nada nem ninguém, não age em nome de coisa alguma, não dá graças de sua vida a absolutamente nada. Ele é. Íntegro, verdadeiro a si mesmo e honesto. É isso.
Por falar em interrogatórios, são nessas "entrevistas" que nossos personagens se apresentam a nós, público. Por meio de suas falas, ora contraditórias, ora absurdamente fora da realidade, ora cruas e honestas, é que vemos o que relatam e o que viveram em tal período.
Muito do que aprendemos sobre eles não é propriamente dito, deixando para a edição, através de montagem paralela, matching cut ou comparações temáticas, nos revelar suas vidas, tais como num fluxo de consciência em que, ao contar sobre algum evento, você, pouco a pouco, vai lembrando de acontecimentos correlatos que, por mais que acabem não entrando em seu discurso, permeiam sua memória e imaginação da mesma maneira.
Assim, visualmente, entramos na mente de Rust e Cohle, misturando relatos com vivências não contadas, apenas rememoradas, tal como os escritos de Dostoiévski, que discorre sem fim sobre as experiências de seus personagens com uma naturalidade tal como o próprio funcionamento dos pensamentos e lembranças. Mais uma vez, é lírico.
Por meio dessas rememorações, acompanhamos pessoalmente o caminhar de suas vidas e, portanto, de suas investigações. Um dos problemas principais, se não o problema-mor, de produções de cunho investigativo é que a audiência é alienada do processo investigativo propriamente dito. Vemos pessoas, lugares, crimes e atos, mas não nos é oferecida a oportunidade de justamente investigar; simplesmente temos de acatar as decisões dos investigadores que, por meio de inexplicáveis insights, descobrem a causa disso, o responsável daquilo ou o que aconteceu com fulaninho. Somos passivos à investigação e não agentes ativos do procedimento de conclusão do crime. E, amém, isso não acontece aqui.
O roteiro sagaz e a direção meticulosa não se deixam utilizar de diálogos expositivos e inflamados para nos esclarecer sobre os acontecimentos, A NÃO SER QUANDO NÃO ESTIVEMOS PRESENTES COM NOSSOS PERSONAGENS. Em suas lembranças, vemos seus olhares examinadores nas cenas dos crimes, aos elementos que atentam, os documentos que estudam, os ambientes bem adereçados que visitam, as pessoas esquisitas que investigam.
Reparem, cada papel tem detalhes reveladores, cada parede e mesa entregam uma informação, seja por um quadro, um objeto largado... Nós somos incentivados a investigar e a criar nossas próprias teorias. Isso é ótimo, porque experimentamos exatamente o que nossos personagens experimentaram e nada além do que eles sabem nós sabemos, por isso o twist é tão frustrante, mas tão revelador. Nós também fomos ludibriados pelas pistas a seguir um caminho e a não enxergar aquilo que estava tão patente à nossa frente. Não soa forçado, não soa como um coelho tirado da cartola. Assim como o Cohle não viu aquilo e foi enganado por todo um sistema opressor, nós também fomos.
Assim, a reunião fatídica e reveladora que os dois têm tantos anos depois, com Rust explicando seus achados faz sentido e não soa facilitadora, porque ninguém sabe o que ele fez nesse ínterim e tampouco ele faz questão de contar, até determinado ponto. Até nisso, a exposição foi calculada e bem pensada. Poxa, nenhum defeito.
Com isso, fica evidente que a série não tá fazendo a mínima questão de esperar pelo telespectador. Ela respira por conta própria e ai de você se não acompanhar. Isso torna a experiência muito mais recompensadora e pessoal, porque não te trata como um traste desprovido de capacidade cognitiva, mas, sim, como um ser inteligente e ávido por entender aquela história. É fantástico.
Dessa maneira, pode-se inferir que a absolutamente impecável obra prima visual que é a abertura dessa primeira temporada também cumpre seu trabalho de instigadora do mistério e de reconhecedora da inteligência do espectador. Ao som de uma pesada música country, somos imersos numa atmosfera taciturna e lúgubre, cheia de mistérios, lascívia e escroques, acompanhada de imagens chave, que nos entregam sem esclarecer absolutamente nada justaposições de corpos, natureza, elementos urbanos e rostos. A highway que encobre a cara do Marty, o fogo que abraça um recém amanhecido Rust e o gordinho de óculos que é abatido não se sabe se por uma bala ou por um estado de nirvana religioso. É genial, genial.
Por conta dessa genialidade em tantos aspectos, seja no design de produção, na direção, no roteiro, na fotografia, nas performances ou na montagem e articulados em conjunto de uma maneira única, tornam True Detective a nata de investigações policiais, ditando estilo e prosa pra produções subsequentes que aspiram ao nível de profundidade temática e complexidade narrativa, como The Sinner, Parfum, Ozark, The Alienist, Borderliner, dentre outras, demonstrando sua relevância como um marco histórico na história da televisão.
"Parfum" é o tipo de série que meu ego inflado diz que foi ~~~feita para mim. Européia -- em termos de construção da narrativa diz muita coisa--, cínica, permeada de personagens não confiáveis e quebrados, com uma atmosfera agourenta e muito mais preocupada em desenvolver seus temas principais que agem como subtexto do que em de fato resolver o mistério -- o que, muitas vezes, um em detrimento do outro, acaba por penalizar a resolução da trama. E é o que acontece aqui.
Fiquei muito encucado tentando ligar um ponto ao outro conforme o passar dos episódios. Rememorando aqui, achei ousado a série já ter entregado de cara os envolvidos em alguns dos assassinatos e, não obstante, os motivos para tais. Logo de início, o Roman inquire a Elena, insiste em reunir o grupinho da escola e a esfregar na cara deles o acontecido, etc. O seriado já nos faz desconfiar de antemão de seus protagonistas, sem nem ao menos sabermos os nomes deles.
Eu curti MUITO cada um deles. Os desenvolvimentos, os arcos e os motivos de cada um deles são minuciosamente construídos, mas isso não significa que as informações nos são dadas de mão beijada -- pelo menos não na maioria das vezes, somente quando a série falhou em algum ponto e, no intuito de avançar a trama, nos revela algum dado pela boca de alguém. De qualquer forma, todos os personagens me pareceram tangíveis e com potencial de existência, até mesmo os terciários.
Roman é um pai de família insatisfeito com sua ausência de virilidade e desconta sua insatisfação em sua mulher e, sob o olhar do Outro, age como um santo por vergonha e covardia, se mostrando um verdadeiro frouxo sempre que se encontra em cena com Butsche.
Elena é completamente perturbada das ideias, muito por causa dos traumas causados pelos homens de sua vida: seja seu pai que odeia mulheres por um término conturbado com a esposa, seu marido violento e covarde ou seu amigo estuprador que a usou como objeto de vingança. Em Perfume, Elena é exatamente isso: um objeto que passa nas mãos dos homens. Por falta de amparo emocional, ela não sabe lidar com o que sente, causando uma inabilidade de compreender suas emoções. Assim, ela mal entende a tamanha crueldade do que faz quando criança.
Banguela é absolutamente patético. Cresceu como alvo de risadas e assim permaneceu. Não sabe socializar e vê tudo ao seu redor como uma ameaça a si. Para lidar com sua imensa inutilidade como ser humano, desenvolve apego estranhos por mulheres que não dão a mínima para ele -- na verdade, quanto mais elas o humilham, melhor ele se sente. Freud nunca esteve tão certo.
Moritz é um charme de tão misterioso. Sempre com aquele olhar de "eu sei MUITO mais do que você, o que me torna MUITO melhor do que você". Confesso que por gostar dos trabalhos anteriores de August Diehl, não foi nada difícil ir com a cara do personagem dele. Infelizmente, o perfumista sempre parece estar estranhamente deslocado na trama, independente de que cena ele esteja. Isso que acontece quando o casting é feito para atrair público e não há preocupação em desenvolver o personagem depois do ator escolhido. De qualquer forma, ele serve como o instigador intelectual da série, estabelecendo o tom de cada episódio com suas divagações e reflexões acerca da natureza humana. Um espetáculo.
Butsche é um dos personagens mais palatáveis. Ele possui infinitas camadas. É um brutamontes. É um cafetão. É duro como pedra. É um estuprador. Ele cobiça as mulheres como um sommelier degusta vinhos. Ele também é uma vítima sexual que já cogitou virar padre. Ele possui diversas questões mal resolvidas dentro de si, descontando nos outros à sua volta através de grosserias e violência. Mas ele também é sensível e carrega em si uma ingenuidade infantil quanto a relações afetivas. Sua personalidade é, no mínimo, curiosa.
A investigadora é uma das mais instigantes aqui e definitivamente sem maturidade emocional alguma pra ser policial. Ela possui uma questão notavelmente latente dentro de si quanto a apego e confiança, se deixando ser um bichinho indefeso nas mãos de quem a oprime. Ela é completamente voraz, impiedosa, volátil e sem um pingo de autocontrole. Por ter sido desamparada quando criança, ela anseia desesperadamente pela mínima noção de família -- e quanto esta surge, não há nada que a faça parar para atingí-la.
Representada aqui pela terapeuta, se fazem presente as noções de psicanálise e outras tantas dentro da psicologia de que o passado do indivíduo, sobretudo suas experiências na infância, voltam com tudo para assombrá-lo no tempo futuro.
Afinal, para o inconsciente não há temporalidade, há apenas um "plano" onde tudo se desenrola. Lembranças passadas agem como se ainda estivessem acontecendo. E isso é genialmente ligado ao olfato e à sua relação com a memória: é um sentido muito forte na infância, agregando muito afeto ao fato estocado. Assim, é comum que quando sintamos o cheiro de algo familiar, nossas lembranças nos remetam a eventos passados de maneira arrebatadora.
Essa perspectiva de completa ausência de livre arbítrio e que somos somente peões do mundo físico, agindo em funções intermináveis de ação e reação, se torna patente aqui. Não temos qualquer controle sobre nossos atos, não entendemos nossos motivos, não somos nem sequer um "eu": somos apenas uma coleção em constante mudança de coisas que acontecem a um conglomerado de matéria em movimento. Nem sequer sentimentos existem.
Há diversas inspirações filosóficas e psicológicas agindo como subtexto de Parfum, algo notavelmente laborioso de se construir em narrativas coesas e instigantes. Por um lado, isso a torna genial e, por outro, a faz falhar na resolução de seu mistério.
Não há indícios suficientes para fazerem a audiência engolir que a psicóloga é a assassina, somente jogam diversos diálogos expositivos tirados da cartola nos últimos minutos. A série terminaria de maneira muito mais satisfatória em se contentar em não ter um final definitivo, nos deixando com os diversos plot twists para concluirmos a trama por conta própria. De uma maneira ou de outra, fui deixado perturbado e reflexivo. Pelo menos as intenções foram alcançadas.
Comecei a ver You por recomendações de uns amigos que andam trabalhando comigo num curta que escrevi, pensando que o Joe poderia servir de referência pra construção do protagonista. Acabou que Joe não bate com meu personagem, mas, de qualquer forma, segui assistindo, porque fiquei definitivamente intrigado pelo sujeito.
Logo de início, percebi que Joe não é um psicopata. Ele SENTE as coisas e se esforça ao máximo para se colocar no lugar de seus alvos, por mais que falhe miseravelmente nisso. Ademais, os flashbacks sabiamente nos indicam que Joe nem sempre foi perturbado do jeito como nos é mostrado: ele teve um passado conturbado, os pais foram ausentes, houve uma supressão de contato social e, ao que tudo indica, a única relação interpessoal próxima foi com um velho amargo, abusivo, tóxico e com delírios de grandeza. Joe não nasceu assim: Joe foi criado.
O que me leva a outro ponto: Joe é um sociopata ou apenas um egomaníaco narcisista que passou muito tempo sem contato humano? Ele obviamente funciona à base de obsessões e paranoias envolvendo sentimentos. Por traumas do passado envolvendo nunca ter tido afeto e cuidado de verdade, com afeição e ternura substituídos por possessividade e submissão, ele busca amor, ou sua visão deturpada de amor, nas mulheres que permeiam seu dia a dia pacato. O modus operandi dele é função de sua necessidade de se sentir preenchido por outra pessoa e, sobretudo, de ser admirado.
Coitado, ele se esforça TANTO, ele se presta a TANTO, ele faz, isso, faz aquilo, leva pra passear, faz comida, lava a louça e a roupa, cuida da casa... faz tudo que seu objeto de desejo aparenta querer e precisar, então, POR QUE ele não é correspondido, por que não é desejado, por que não é enxergado da mesma forma? De maneira simples, eu respondo: porque as outras pessoas têm mais o que fazer.
Elas não foram criadas de modo a servir a um único objetivo: amar livros e o seu mestre que as salvou da eterna danação que é viver de forma aculturada e desprovida de figuras de poder. Beck teve uma vida difícil. O pai sumiu logo no início da adolescência, a deixou desamparada e tendo de lidar com uma mãe problemática e, pelo que parece, irmão (e irmã? Não lembro) distante, que não compartilha muito em comum com ela. Assim, ela passou os anos seguintes procurando seu lugar no mundo e tentando entender a si mesma. Isso se desdobrou num círculo social amplo e ativo, numa vontade irrefreável de escrever e ser reconhecida pelo seu trabalho e de, ainda, compreender quem ela é: a última coisa que passa na cabeça dela é se envolver romanticamente com alguém de forma tão categórica que torne sua existência mero satélite de macho.
Já Joe, infelizmente, teve suas oportunidades de desenvolvimento cortadas e diminuídas ao máximo. Ele PRECISA servir a alguém, ele PRECISA ter sua subserviência reconhecida e, portanto, PRECISA ser admirado. A admiração de que inconscientemente require não vem de grandes feitos ou de ser mega incrível em alguma coisa, mas, sim, paradoxalmente, de ser o cachorrinho de bolsa de outro alguém. Como ele não reconhece isso, ele trata essa sua necessidade como algo que o infla e que, na visão dele, o torna poderoso. Seu poder se manifesta em tornar gente incrível miserável para que ele, miserável, se torne incrível. É, se não ficou claro até o episódio final, ele é bem babaca.
Eu demorei um tempo até conseguir superar os diálogos cheios de referência e de pomposidade pseudoerudita, a insistência da atriz da Guinevere em adornar cada palavra com um sorriso desproposital e a voz monotônica do Joe, mas consegui, e valeu a pena. A partir do quinto episódio é quando a coisa deslancha mesmo e fica muito, muito, muito bom. Eu aguentei até lá pela construção psicológica de Joe e continuei além pela trama. Ah, porra, ficou muito bom. As intrigas entre atores que possuem no currículo Pretty Little Liars e Gossip Girl deixaram patente seus trabalhos anteriores. Muito "disse-não me disse", muito exagero nas expressões e na fala e muita frase de efeito. Dá pra escrever um novo Rebelde só com a meiuca de episódios da temporada.
Sem sombra de dúvidas, o ponto alto de You surgiu nesse período. Era ao mesmo tempo desesperador e engraçadíssimo como o Joe não se reconhecia nas ações da Peach. Ambos stalkers obcecados e paranoicos, com uma extensa coleção de artefatos da vítima, possuidores de um histórico social e sentimental digno de pena e de uma lábia, uma desenvoltura manipulativa invejável. Caí muito na gargalhada quando o Joe insistentemente se enchia todo feito um pombo e soltava 'HOW DARE SHE" sempre que a Peach fazia exatamente a mesma coisa que ele em qualquer contexto. Muito bom, porra.
You termina com mais um ciclo sociopático fechado. Joe, que tanto se via no Paco e que tanto tentava inconscientemente ajudar ele a não se tornar mais um perturbado, acabou cumprindo as profecias Freudianas e converteu o moleque em mais uma variação do Mooney. É triste como Joe sucumbiu profundamente aos seus impulsos mais nefastos e perversos e levou o menino consigo :/
Eu realmente esperava que You se contentasse com uma temporada, porque não imagino como pode se tornar um procedural não redundante, seguindo os passos de Joe em achar sua prometida. Aliás, achei de uma falta de imaginação porca enfiar a Candace ali. Já deu pra entender que ela não tava morta. Esse cliffhanger foi bemmmmm preguiçoso. Seria mais interessante ver o Joe numa segunda temporada fazendo de tudo pra tirar a polícia de seu encalço. Afinal, ainda temos o pote de mijo que foi pra análise e o buick marcado no caderninho do policial. Dava pra tirar uma boa trama disso, no melhor estilo Sneaky Pete.
Eu acho impressionante como Seinfeld é basicamente uma sitcom sobre quatro pessoas insuportáveis, egoístas, mesquinhas, desagradáveis e inconveniente que não pensam em nada nem ninguém além do próprio umbigo e de suas próprias vontades. Nenhum deles é fofinho, bonitinho, gentil ou meigo, mas todos eles fingem ser para alcançar seus objetivos mais nefastos e asquerosos. Jerry é insensível e narcisista, Elaine é vaidosa e aproveitadora, Kramer é invasivo e sem noção alguma de nada e George é um covarde miserável que não tem a pachorra de assumir pra si seus erros, um ignorante de ego inflado sem perspectiva alguma de vida e que tá destinado a se tornar o próprio pai. Esses adjetivos que dei para cada um são intercambiáveis -- eles não compreendem nem dão total escopo do quão escrotos e babacas os protagonistas conseguem ser... e isso é genial.
Onde já se viu uma série de comédia ser permeada de personagens tão deploráveis? Eles não são escritos para serem gostados ou idolatrados. Mas eles são humanos o suficiente para rolar a típica identificação público-personagem, o bastante para que a audiência se veja representada nas falhas de caráter e erros mundanos que eles cometem. Jerry, Elaine, Kramer e George são como janelas que possibilitam aos espectadores olharem profundamente dentro de suas almas e refletirem sobre seus hábitos, crenças e comportamentos diários. São avatares de nossos pecados e vergonhas.
Talvez por esses motivos, Seinfeld, apesar de ser evidentemente noventista e exalar a cultura dessa época, é absolutamente atemporal: assim como os personagens, os seres humanos não tendem a aprender com seus erros.
Eu tô impressionado que Riverdale me segurou do início ao fim; cambaleando em alguns momentos, mas conseguiu prender meu interesse.
Comecei a ver por causa de Sabrina, série que, apesar dos apesares, curti bastante. Então, foi só uma questão de tempo até pegar essa daqui pra dar uma olhada. Fiquei completamente absorto nos primeiros episódios, com toda a áurea de mistério envolvendo o assassinato e a cidade, me deixando bem interessado em como tudo se sucedeu, auxiliado pela narração agourenta do Jughead. Parecia um conto neonoir banhado em neon e drama oco adolescente. Adoro.
Contudo, eu comecei a achar um porre conforme os roteiristas insistiram em se aprofundar nas intrigas fajutas dos jovens protagonistas, incendiando traumas passados dos adultos e enrolando mais e mais com becos sem saída narrativos. Achei um PORRE Archie Andrews e seu draminha de “ai mej deus nao sei se jogo bola se toco violao se comstruo casas ou se beijo na boca”. Ai, na moral, me poupa. Sem dúvidas, o personagem mais lenga lenga, o que é engraçado, já que ele dá título ao material fonte do seriado. Veronica Lodge tinha tanto potencial, mas caiu na punheta estereotípica da queen bee tentando se redimir. Jesus, o que foi aquela forçasão de barra com a ruivinha de Stranger Things? Vergonha alheia. O Kevin nem existe, as Pussycats menos ainda.
Dos dramas pessoais, o que me surpreendeu positivamente foi a evolução da construção do personagem do Cole Sprouse, saindo do arquétipo de adolescente chato, enfadonho e mau humorado por ser tãaaaao diferentão e inflando ele com problemas reais, paupáveis, como uma família desastrosamente desestruturada, um pai beberrão e criminoso, levando a um jovem inteligente sem muita perspectiva de vida. ISSO é tangível, tridimensional e interessante.
Outra personagem que me cativou foi a Betty. Desde o início, ela se destaca por obviamente ser bem interpretada. Tirando o ator do Fred Andrews e o do FP (toca aqueeeeeeeela), somente a Lili Reinhart não parece estar interpretando — ela veste a sua personagem e VIVE na pele daquela garota. Dá gosto ver uma atriz tão genuína, consciente e desenvolta. Me lembra muito uma jovem Emma Stone em início de carreira. Eu realmente espero que ela não se resuma a Riverdale e busque trabalhos mais elaborados, seja na TV ou no Cinema. Enfim, voltando à Betty. Me admira muito ela ser relativamente sã na medida do possível tendo de lidar com aquela mãe completamente despirocada da cabeça que, inclusive, deveria ser internada. Ela cresce aos longos dos episódios. Além de filha rebelde e romântica frustrada, ela vira quase a líder do grupo e assume o papel de voz da verdade. Baita desenvolvimento foda.
Cheryl Blossom é um fenômeno minimamente curioso. Apesar de mal escrita e pessimamente interpretada, ela tem camadas. Ela está num profundo processo de luto. Ela é famosinha e endinheirada. Ela é ridiculamente bonita. Ela tem graves problemas familiares. Sobretudo, ela quer sair dessa situação miserável, nem que seja fazendo atrocidades com colegas de turma ou causando escândalos em casa. O que me deixou encucado, além do cabelo impecavelmente arrumado (honestamente, quem faz o cabelo dela, gente? Não é ela) e de se vestir como uma femme fatale até mesmo pra dormir, são as SÚBITAS e ARREBATADORAS mudanças de humor dela. Bem, ela cresceu num lar hostil e perdeu o único amigo real dela. Faz sentido ela sucumbir a um desequilíbrio emocional. Mas, infelizmente, dá pra perceber que é só fruto de uma péssima e caricatural interpretação e de descaso dos roteiristas, mesmo. Potencial desperdiçado.
Pouco a pouco, fui percebendo que Riverdale é uma novela camuflada com linguagem cinematográfica, uma bela fotografia e várias firulas visuais — o que é bom: dá pra ver que a galera tá pelo menos tentando fazer algumas coisas diferentes com o texto que receberam. Riverdale se sai muito bem como um mistério de assassinato e tem peculiares personagens que, se dados um desenvolvimento caprichado e, mais importante, BONS ATORES, coisa que tá faltando, pode resultar em frutos melhores futuramente. Já quanto aos dramas pessoais, às intrigas adolescentes e às mil reviravoltas envolvendo o núcleo adulto, Riverdale se sai pessimamente mal. O ideal é que abandonem essa cisma que vira e mexe surge aleatoriamente de se tornar um estudo de 20 personagens ao mesmo tempo. Prfvr, se atenha aos mistérios. Meu novo guilty pleasure, tava precisando já que tô sem Hemlock Grove há anos.
Há uns tempos atrás, surgiu um pequeno filme independente mas estrelado por grandes nomes como Ethan Hawke e Lena Headey, com a simples premissa, num futuro bem próximo, de um casal tentando sobreviver a uma noite em sua casa em meio a uma nova proposta do governo de legalizar todos os crimes por 12 horas. Assim, James DeMonaco fez surgir Uma Noite de Crime.
Embora tenha tido uma recepção morna por parte da crítica, foi um inesperado sucesso de bilheteria, tendo superado em quase 30 vezes o baixo orçamento. Obviamente, cativou o público por meio de sua claustrofóbica atmosfera e atrativa trama, mas, sobretudo, por meio de seu tema, tão relevante nos dias atuais, gerando uma imediata identificação entre audiência e produto.
Num país em que a posse e o porte de armas são legalizados e de tão fácil acesso e no qual é comum a ocorrência de extermínios em massa, tanto em escolas quanto em shoppings, é completamente compreensível que a narrativa tenha ressonado no público americano. Como rápido relato pessoal, me lembro de ter visto uma submetralhadora sendo vendida próxima à seção de filmes num Walmart quando viajei para os EUA. Para um moleque de 13 anos que nasceu e vive numa das cidades mais violentas do mundo, isso foi uma baita choque. Fiquei umas semanas perturbado com aquilo.
Devido ao sucesso estrondoso, o filme rapidamente entrou no imaginário popular, dando origem a uma franquia de filmes e a um fiel grupo de fãs ao redor do mundo. As pessoas mascaradas vagando pelas cidades casualmente portando armas e matando tudo e todos ao seu redor é uma aterrorizante mas cativante imagem. Assim, mais dois filmes foram lançados e, com o sucesso de ambos, os produtores resolveram transformar a história num seriado, em forma de derivado.
Contando com uma série de personagens cujas histórias pessoais se entrelaçam com o passar dos episódios, a série segue a premissa básica dos filmes: mostrar pessoas sobrevivendo ao caos que são 12 horas de gente liberando seus mais nefastos demônios. Infelizmente, o tempo extra para construir uma narrativa mais elaborada e com maior número de personagens não foi bem aproveitado, havendo diversas quebras de ritmo além de, honestamente, histórias muito desinteressantes.
Temos uma mulher de negócios querendo se vingar de seu chefe assediador, um jovem militar tendo salvar sua irmã mais nova de uma seita suicída, um casal de empreendedores tentando parceria com um empresário com claras tendências sociopatas ao mesmo tempo que evitam transar novamente com a filha dele, um aposentado policial “intocável” por conta de glórias do passado e um mercenário mascarado tentando bancar o Justiceiro. Todos com personalidades e backgrounds relacionáveis, contudo com um potencial não atingido. Não souberam contar a noite deles de forma satisfatoriamente interessante.
Ignorando por um momento a trama mal contada, a série, assim como os filmes, possui subtextos relevantes para nossa sociedade, ainda mais pós vitória presidencial de Bolororo. Um ex militar com ardente discurso pró violência, pró machismo, pró racismo, pró segregação, anti pobres, anti direitos humanos, anti direitos trabalhistas e anti mulheres, nos faz indagar ao que sua fala pode levar seus eleitores a fazerem, sobretudo querendo a redução da maioridade penal e a proliferação do porte de armas. Talvez seja por isso que The Purge seja tão fascinante para mim: coloca na minha frente, em imagem e som, um dos meus maiores temores. Se o povo americano, vivendo num dos países mais desenvolvidos economica e politicamente se encontram num cenário análogo ao da franquia, imagina o que poderia acontecer aqui em nossa terra brasilis, na qual tem palmeiras, onde canta o sabiá?
Relembrando uma obra prima em forma de seriado. The Leftovers abarca temas filosóficos e teológicos, passando pelo existencialismo, absurdismo, niilismo, pessimismo e pelo questionamento cristão. Nos indaga se temos algum propósito sem nos dar qualquer tipo de resposta. Desenvolve uma série de personagens com personalidades e características psicológicas de forma crível e lacônica, deixando todo seu esplendor para abarcar o interior mental profundamente fragmentado de seu protagonista, Kevin Garvey. Faz isso com uma narrativa não linear, muitas vezes onírica e poética, com sequências de sonhos e alucinações que fazem com que a audiência questione a todo momento o que faz e o que não faz parte da história principal, se é que há uma, além de se estender por diversos gêneros, como drama, suspense, horror, ação, aventura, romance..., sem se limitar a nenhum deles e ao mesmo tempo conseguindo estabelecer coerência e coesão narrativa de maneira contundente -- isso tudo em cerca de 30 episódios. É fenomenal e dificilmente será esquecida.
Eternamente grato à Gillian Jacobs e à equipe criativa por trás do seriado por terem dado vida à uma personagem tão complexa, rica em detalhes, crível e tri dimensional como a Mickey Dobbs. É muito reconfortante (e, às vezes, assustador) se ver num personagem que exterioriza e que compartilha tão similares questões, medos, angústias, sonhos, desejos, problemas, vícios, hábitos e comportamentos. Não consigo colocar em palavras o quanto essa personagem me ajudou a lidar com meus próprios demônios e a dar luz às minhas soterradas qualidades. Obrigado ❤️
Nossa, faz um tempo que eu não choro tanto assim. Essa série, ao menos nessa primeira temporada, deixa claro que não se trata da sagacidade característica da escrita do Ricky Gervais, apesar de ela dar pinta em alguns momentos. Mesmo apelando às vezes pra clichês, Derek é sobre os sentimentos que compartilhamos como seres humanos e como eles se manifestam nas relações que estabelecemos entre nós. É uma tirada diferente na carreira do Ricky Gervais, certamente uma inesperada e perspicaz. Talvez, seja mesmo sagaz, só uma manifestação diferente de sua sagacidade.
Creio que "instável" seria um bom termo para resumir essa série, ao menos nessa primeira temporada. Weeds perde muito tempo com humor barato -- Doug e Andy -- e insiste em inserir uma sitcom em todo episódio toda vez que a Nancy vai se abastecer de erva -- a traficante zoa a Nancy seja pela roupa, pelo modo de falar ou pela ingenuidade dela, faz meia dúzia de piadas sobre como a família dela é imprestável e como o dinheiro não tá entrando, meu deus, até o cenário é reminiscente de sitcom, o teto não aparece, a câmera só faz travelings, como se estivessem numa animação 2D e os personagens ficam estáticos pra não aparecer o interior do soundstage.
A família da Nancy é um puta tiro que saiu pela culatra. Temos um adolescente traumatizado por testemunhar a morte do próprio pai e que afoga as mágoas em drogas e em relacionamentos sem nexo algum -- me dá vontade de me jogar pela janela toda vez que a Megan aparece, a direção claramente não descobriu ainda que surdos são gente e não robôs que ainda estão aprendendo o convívio humano --, uma criança que não se encaixa socialmente, que se sente abandonada pela família e que claramente possui comportamentos para chamar atenção para ela -- o Shanne sente falta do carinho do pai -- e que é tratada como alívio cômico por causa dos interesses e gostos não usuais e uma viúva que têm que bancar dois filhos e manter um alto estilo de vida mesmo sem trabalho regular e que claramente possui dificuldades em se relacionar com pessoas do sexo oposto porque ainda não se desvencilhou da presença terna e reconfortante do falecido marido, possuindo algumas poucas brechas pra demonstrar a dor que sente e o luto que teve de ser rapidamente encerrado pelas circunstâncias. Todas oportunidades perdidas com um ator pro Silas que não sabe se comportar ou entregar as emoções do personagem com confiança, dramas mal aproveitados em detrimento de encontros e desencontros com personagens desnecessários, como o Doug, Andy e Megan, e, meu deus, o que foi aquela cena de sexo totalmente fora de tom que a Nancy teve com um cara que tava ameaçando a família dela?????
Em geral há muita bola fora, mas acho que a Celia é a personagem mais consistente. Apesar de não ir com a cara dela, o drama pessoal da personagem, sua depressão pelo câncer e o vazio existencial por causa de uma vida suburbana desprovida de significado e auto realização descontados em um comportamento passivo agressivo, frio e egocêntrico é muito bem construído. Palmas pra atriz que encara o papel com afinco e destila veneno ao abrir a boca.
Ainda não entendi a utilidade do Doug pra trama. Ele não precisava existir pra padaria ser feita, ainda mais se levar em conta que ela não será mais utilizada, pelo que deu a entender. O Andy é absolutamente insuportável e desnecessário, não há somente um conflito interno dele sobre ele estar falido e morando de favor, por ter perdido o irmão e por não ter perspectiva de vida além de bancar um parasita social. No máximo, essas questões são abordadas com piadinhas e tiradas de sarro, num tom irônico sem profundidade.
Eu realmente espero que se siga o rumo que tomou ao final, a série tomaria uma guinada se a Nancy se relacionar com o Peter, possivelmente se esquivando de possíveis investigações. Seria realmente uma boa se o plano do Conrad fosse levado a sério -- aquela padaria e o Sanjay não têm futuro narrativo -- e, finalmente, não haveria a sitcom intrometida. Talvez eu dê uma chance pra segunda temporada futuramente. Por favor, abandone o humor barato e foque no tímido drama.
Eu tenho um sentimento muito agridoce em relação a essa temporada. Por mais que tenha tido ((((((INÚMEROS))))) momentos para agradar nós fãs, eu não conseguia afastar a derradeira e inevitável sensação de previsibilidade. Sim, infelizmente, a série mais surpreendente e inovadora em termos de narrativa e descaso com as expectativas alheias se tornou terrivelmente previsível.
Jon (((((Aegon Targaryen é o caralho))))) e Daenerys viraram um casal para o meu mais profundo desgosto — a expressão de pesar na cara do Tyrion sou eu todinho. A Cersei planeja enfiar uma faca nas costas de todo mundo em detrimento de seu enaltecimento egoico. O Inverno finalmente chegou e a Muralha caiu, como todos antecipávamos. Personagens desnecessários continuam vivos a troco de nada (((((((ALÔ INÚTIL ESTUPRADOR INCESTUOSO JAIME LANNISTER)))))), outros queridíssimos morreram também a troco de nada — coitado do meu precioso Tormund, nunca vai ter filhos gigantes com a Brienne. Deixo claro que enquanto a Muralha caía eu só conseguia pensar no selvagem ruivo e no quanto ele poderia ajudar o Jon nas batalhas vindouras. Theon Greyjoy continua pagando de vira casaca indeciso sem vontade própria alguma, sempre tentando corresponder às expectativas alheias. Bran teve o diálogo expositivo mais desnecessário da temporada, ainda mais do que aquele do Tyrion explicando a invasiva dos Imaculados em Casterly Rock — essa conversa deveria, em termos de coerência narrativa, ter sido deixada para ter com o Jon, ainda que eu fique me perguntando qual a utilidade disso, já que não seria feitio dele assumir o Trono — fora que ninguém aguenta mais essa postura pretensiosa e comunicação metafórica (((((PORRA SE VC TUDO VÊ COMO VC AINDA FICA SURPRESO COM O QUE O SAM TINHA A DIZER?????)))))). Apesar de todas essas cagadas, fiquei extremamente grato com os diversos reencontros, a conciliação final entre a Sansa e a Arya (((((SISTER POWER PORRA)))) e, claro, com morte do pífio e miserável Mindinho. Foi tarde, querido. De qualquer forma, por mais que eu fique contente com diversos personagens queridos ainda, milagrosa e forçosamente vivos, sinto que para honrar tudo o que foi estabelecido nas temporadas anteriores, uma galera aí já deveria ter ido pra cova, facilmente incluindo Pod, Bronn, Yara, Cão, Bran, Beric, Jorah e, sim, Jon Snow, meu personagem preferido — ele já tá imortal.
Arlequina (1ª Temporada)
4.4 68 Assista AgoraQue porra de série caótica do caralho. Eu AMO!!!
Halston
3.9 67 Assista AgoraEwan McGregor interpretando um viadão afetado bem gostoso, estiloso, posudo e exagerado é tudo de que eu precisava.
O Grito: Origens (1ª Temporada)
2.7 111Sem sombra de dúvidas, o seriado tem momentos apavorantes (e outros pavorosos). Como exercício de incutir inquietação e angústia no espectador, possui sequências que fazem isso de forma super eficiente e outras tantas de forma bem gratuita. Contudo, infelizmente, parece que a trama vai do nada para lugar nenhum. Não sou conhecedor da franquia e creio eu que só vi o primeiro O Grito e há muuuuito tempo atrás, mas a impressão que me fica é que os realizadores levaram o subtítulo demasiadamente ao pé da letra e só se preocuparam em realizar conexões com os filmes, deixando de dar uma história própria a isso daqui.
Mr. Robot (3ª Temporada)
4.5 256Acho que uma das muitas temáticas que Mr Robot aborda (e, nossa, são MUITAS) é a da autosabotagem e me parece que nessa temporada isso se tornou o tema central. Como de costume, me doeu na alma ver o Elliot falar comigo e não ter como responder o pobre coitado de volta. Ele, desesperado por qualquer tipo de amparo, sem poder confiar em si, recorre completamente aterrorizado pra essa figura que ele criou na própria cabeça -- a audiência de seu seriado --, numa última tentativa frustrada de ter com quem se comunicar e, mais importante, de ter como ser reconfortado.
O temor nos olhos do Elliot, passando pra mais pura confusão e então de volta ao medo é de cortar o coração. É bizarro pensar como nosso maior inimigo somos nós próprios. Gosto de como a série retrata isso das maneiras mais literais e também metafóricas possíveis. Elliot enquanto Elliot quer algo, Elliot como a projeção do algoz de sua infância quer outra coisa e é apavorante vê-lo falar de si mesmo como se fosse outra pessoa de modo tão vívido. A cisão psicológica do Elliot é tão crível e palpável que em nenhum momento questionamos se Elliot e Mr Robot são pessoas distintas, mas é quando se pára pra pensar no quão fodido mentalmente é nosso protagonista que bate aquela insidiosa realização de que é um homem desesperado agindo contra si mesmo, e na maioria das vezes sem nem sequer saber disso.
É impressionante como Mr Robot sempre se reinventa, graças à mente brilhante de Sam Esmail e à sua incrível equipe. Esse sujeito encontra meios novos de retratar algo que, se não dada a devida atenção, ficaria rapidamente exaustivo, que é justamente a dinâmica das múltiplas personalidades do Elliot. Desde o primeiro episódio vemos o Rami Malek e o Christian Slater interpretando o mesmo personagem e é reverenciável que mesmo após tanto tempo ainda somos surpreendidos pelo batido fato de que o Elliot é absolutamente maluco. Assim, me parece ter sido certeira a decisão de "separar" ainda mais essas pessoas que vivem no interior mental do protagonista, raramente as colocando em tela juntas, diminuindo sua interação mútua e aumentando o escopo de suas diferentes ações na vida alheia.
Acho que isso contribuiu pra essa impressão de que a autosabotagem, mais do que nunca, é o alvo central do que o Sam Esmail quer falar aqui. A todo instante destruímos nossos sonhos, censuramos nossos desejos, amplificamos nossos medos, duvidamos de nossas capacidades, não confiamos em nossas decisões, nos julgamos por nossos traumas e no geral achamos que somos péssimas pessoas que não merecem qualquer tipo de compreensão ou afeto.
Pra melhor ou pra pior, me vejo muito nessas questões privadas do Elliot consigo mesmo, do Elliot com sua figura paterna e do Elliot com sua total inabilidade de lidar com seus traumas. Os esbugalhados olhos do sujeito são uma janela não pra alma dele, mas pra minha. O episódio em que ele tenta desesperadamente desativar aquela programação dentro do prédio, se batendo, se chocando contra as coisas, apagando sem lembrar do que fez há apenas 5 minutos... o estrago físico como uma manifestação total do estrago mental que o Elliot carrega dentro de si 24/7 me causou uma agonia, me deixou num nível de pânico tão grande. O tragicômico daquela situação encheu meus olhos de lágrimas.
O Elliot precisa urgentemente se deixar ser cuidado, se deixar ser compreendido, deixar as pessoas entrarem em sua vida... se deixar ser amado. Suas paranóias só pioram, não parece haver qualquer tipo de solução pra como o Elliot se enxerga e se tornou incontornável o fato de que ele coloca no pai tudo aquilo que ele rejeita dentro de si. O que o Elliot carrega em seu âmago me angustia.
Euphoria (1ª Temporada)
4.3 893Obra prima inquestionável caralho
Big Little Lies (1ª Temporada)
4.6 1,1K Assista AgoraAbsolutamente sem defeitos. Big Little Lies é um retrato cru e hiper realista de uma espiada no idílico retrato da vida perfeita. Casas de veraneio, mulheres bem casadas em seus 40 anos, casais ridiculamente ricos e bonitos, com a adição de crianças sorridentes permeando o clima de Monterey, que chega a exalar cheiro de maresia pela tv. Mas quando David E. Kelley e Jean Marc Vallée se juntam pra colocar uma lente de aumento nessa rotina, a grave condição humana se revela, escancarada, sem pudores, nos seus mais pungentes e aterradores impulsos. É repulsivo, mas humanamente sedutor.
Eu me senti absolutamente fascinado pela construção da narrativa desse seriado, como roteirista e diretor não têm papas na língua pra revelar as intricadas personalidades de nossas protagonistas. Elas são incríveis, corajosas, obstinadas, frágeis, sensíveis, inseguras — são humanas. Por detrás de toda a banca que colocam, escondem-se pessoas profundamente afetadas por traumas da vida. Madeline, Celeste e Jane poderiam facilmente cruzar meu caminho na rua, e eu nem me daria conta.
Madeline, muito mais do que as outras, busca ativamente a vida perfeita. Se casou com mais um cara rico, se orgulha do tempo que dedica à família, possui um trabalho não tão importante mas muito significativo à parte, é danada das ideias, engraçada e possui a boca maior que a própria cabeça. Dentro desse mulherão, há um ser terrivelmente egoísta e ingrato, que gostaria de dar mais voz aos seus desejos irrefreáveis do que sustentar essa falsa imagem que passa aos outros. Por conta disso, nem percebe o mal que inconscientemente causa àqueles que lhes são mais queridos, através da traição ao marido e da negligência quanto à filha. Tragicômico, coitada.
Celeste hits really close to home. Me compadeço e me identifico com essa giganta esguia que, ao mesmo tempo que exala uma nobreza intimidadora, é frágil e quebradiça como porcelana, se entregando de corpo e alma ao seu mefistófeles. Seria muito fácil fazer com que ela caísse num estereótipo da coitada abusada, coisa que felizmente não acontece aqui. Celeste é violentada das mais variadas formas, sofre abuso emocional e físico, é cobrada e controlada, mas ela não se aliena ao que lhe é feito e ao que faz. Sim, ela é uma vítima e ela possui profunda ciência disso. Ela se culpa, acredita piamente que merece o abuso que lhe é causado, mas, à sua maneira sutil e às vezes até mesmo atrapalhada, ela revida as agressões, derrama veneno na própria língua e o destila ao falar com o marido. Ela sabe que vive uma situação errada, mas o sentimento de gratidão ao homem que lhe ajudou no pior momento de sua vida fala mais alto, na maioria das vezes. Ela é forte, determinada e inteligente. Os momentos de confissão com a terapeuta são um assalto aos sentidos, uma verdadeira ostentação do poder de atuação da Nicole Kidman. O que senti para com essa personagem é extremamente pessoal.
Apesar da identificação com a Celeste e do quanto ela me cativou, a personagem que mais me intrigou e capturou meu interesse foi a Jane. Ela é simplória, gente como a gente, uma plebéia perdida no salão da realeza. Ela não se revela ao mundo, muito pelo contrário: sempre se encontra soterrada sob as volumosas roupas escuras com as quais se veste quando se encontra com outras pessoas. Ela é quieta, mas não sossegada. Ela é invisível, mas não inexistente. Ela vive nas sombras e só consegue ser ela mesma quando sozinha. As suas corridas, muito reveladoras por sinal, são os momentos que mais me pregaram à tela. Ela corre, corre e CORRE, fugindo de seus demônios, fugindo de seu passado, fugindo de seu estupro... diria até que foge de si mesma, justamente para encontrar a si própria, só que num futuro distante, numa outra realidade, uma Jane que não viveu aqueles traumas ou que, ao menos, tenha a audácia de destruí-los. A Jane é uma crua manifestação de Eros e Tânatos, dos impulsos de vida e morte, e ela constantemente busca a destruição de quem a violou, mesmo que pra isso ela precise se obliterar no caminho. Assustadoramente fascinante.
Para contar suas histórias e desnudar suas emoções, Jean Marc Vallée mais uma vez recorre ao uso de músicas e de metaforas visuais. Felizmente ele é inteligente o suficiente para não escolher canções que “cantam” as situações das personagens, mas, sim, composições que ECOAM seus sentimentos, que EXPANDEM o contexto de seus dramas. Com isso, sua maior aliada nessa tentativa de mostrar sem falar é a montagem, que alterna entre futuro, presente e passado de uma maneira tão suave e imperceptível, como fragmentos de lembranças que acometem as personagens em momentos de emoções mais fortes. Além disso, há o uso de tomadas de apoio que constroem metáforas, tal qual nos momentos finais do último episódio, em que diversas “Davis” destroem Golias com entrecortes de violentas ondas atacando grandes rochas, tudo isso acontecendo ao som de uma paradoxal tranquilizante música. Elas encontraram paz no caos da violência, como verdadeiras forças da natureza. É de uma sutileza simplesmente genial.
Big Little Lies me acometeu instantaneamente, como um tiro no peito. Fui fisgado por completo. É costume meu tentar solucionar quebra cabeças antes do mistério ser revelado, muitas das vezes com acertos. Eu fiquei profundamente satisfeito em ter errado em todas minhas suposições, tendo tudo sido uma grande surpresa a cada novo andar da história. Senti as mais diversas emoções: revolta, tristeza, euforia, ódio, medo e alegria; são algumas das emoções básicas do ser humano. Com uma série tão visceral, é compreensível eu ter sentido tanto ao ver ela. Honestamente? É uma daquelas experiências estéticas que me faz me sentir grato por ter tido.
Sneaky Pete (3ª Temporada)
3.7 13Poxa, eu só queria uma quarta temporada :(
BoJack Horseman (4ª Temporada)
4.5 240 Assista AgoraTem algo de especial nesse seriado.
Amizade Dolorida (1ª Temporada)
3.6 134 Assista AgoraMeu deus, alguém ensina a esse diretor de fotografia que existe algo além de primeiro plano, além outras distâncias focais de lente aaaaaaa absolutamente EM NADA ajuda, em termos de narrativa, a linguagem fotográfica se manter a mesma, tão fechadinha e com fundo desfocado o tempo inteiro. Além disso, o Pete é indescritivelmente insuportável, ô personagem enjoado e sem personalidade, mero cachorrinho de bolsa da Tiff. Engraçado pensar como o Pete nos é introduzido como o protagonista, e se mantém assim por boa parte da série, sendo que ele não tem backstory próprio e todas as ações dele acontecem em função de outra personagem. A Tiff é o estereótipo da mulher escrota e babaca que mantém uma armadura a sua volta por traumas do passado, mas que secretamente é uma flor indefesa em busca de alguém que a entenda. Levando em conta a temática central da série, não achei que fossem enveredar por tantos clichês de comédia romântica e que pecariam tanto em ambientação e construção de personagem. Não parece que eles vivem num mundo orgânico, vivo — do jeito como as situações são introduzidas, parece que o contexto das cenas fica “pausado” esperando nossa dupla aparecer, como um videogame de mundo aberto vagabundo. Fora que há umas situações forçadas, sem pé nem cabeça, como o episódio final. Esses roteiros precisam passar por uma revisão que não inclua o tendencioso olhar do criador do seriado. Bonding tem algo de especial, mas tá rapidamente se tornando uma merda em apenas uma temporada de sete episódios curtíssimos.
True Detective (3ª Temporada)
4.0 285Ah, expectativas altas são uma foda, né. Desde que anunciaram a volta definitiva de True Detective, lá atrás, com a adição do Mahershala Ali ao elenco, eu fiquei o queEUFÓRICO
Dois anos se passaram e eu FINALMENTE pus minhas mãos na temporada nova e, oooolha, não é isso tudo ahauhuahha :(
É ridiculamente evidente o desespero da produção e do roteiro em tentar emular a fórmula da primeira temporada. Flashbacks e flashforwards alternados em entrevistas, dois investigadores conflituosos, um crime hediondo que assombra a galera envolvida por décadas e um público quebrando a cabeça pra entender o que caralhos aconteceu. Funcionou uma vez, isso não quer dizer que funcionaria uma segunda. Não mesmo.
Num texto afiadíssimo mas repetitivo, aliado a direções (sim, três marmanjos) duras, às vezes inventivas, mas redundantes em seu outlook pessimista e agourento, a força motriz da narrativa se encontra sem dúvidas na performace MONUMENTAL e HERCÚLEA de Mahershala Ali. O cara atua com os OLHOS. Ah, os olhos de Mahershala Ali. Neles, eu vi confusão, melancolia, fúria, remorso, paixão, esperança, amor e ternura. É um talento ímpar.
Nosso protagonista, (((na inflexão de Hendricks))), PURPLE HAZE, é um cara maculado pelas experiências da guerra que travou no Vietnã, com o sistema de polícia e consigo mesmo. Ele definitivamente não se conhece, e como ele mesmo diz, não dispende muito tempo pensando "nessas coisas", e pouco sabe do que quer, apesar da determinação sem par que investe em seu trabalho e no carinho com o qual trata sua família. Infelizmente, um cara comum se viu preso numa teia de crimes e conspirações que estão completamente além do ordinário.
Assim, ao longo de uns 30 anos, vemos Hays se afundar mais e mais numa investigação imprudente, irresponsável, infrutífera e completamente incompetente, tanto por parte dos investigadores, quanto da promotoria. É tanto despreparo metido com corrupção que o caso dos Purcell tava fadado ao fracasso antes mesmo de acontecer. As falhas são ensurdecedoras.
Com isso, Mahershala Ali abraçou com tudo que podia seu papel complexo e repleto das mais imperceptíveis camadas. Ele não se limita somente a entregar um bom texto de maneira satisfatória, ele vai ALÉM, construindo uma postura específica para cada época, assim como especificidades no discurso, na cadência da fala, no timbre de voz, se preocupando com os maneirismos de seu personagem, vícios de expressão e olhares. Mais uma vez, os OLHOS de Mahershala Ali. Esse cara ainda tem muito Emmy, Globo de Ouro e Oscar pra ganhar, amém.
Ademais, temos nosso outro investigador que se meteu nessa maracutaia, o parceiro de Hays. Rapaz, esse daí eu vi por 8 episódios e não aprendi ABSOLUTAMENTE NADA sobre ele. Sim, ele é meio rude e grosseiro, fala merda sem olhar a quem, e, com o passar dos anos, vai se tornando um velho frágil e solitário. Muitas foram as chances perdidas para dar um desenvolvimento decente a esse personagem, tais como quando ele menciona suas questões pessoais com religião e segregação social, mas tudo soa superficial, sem preocupação em fazer do Roland um cara crível. Nem mesmo deram chance a uma possível "amizade" com o pai das crianças perdidas.
Por falar em superficial, também soa oco e pretensioso o momento quando, num episódio avulso, Pizzolato tenta enfiar uma crítica descarada ao racismo institucional nos EUA. Não vou me estender aqui, mas é muito mais eficiente demonstrar repetidas situações de invalidez de opiniões e atitudes dos personagens negros da história do que colocarem eles pra falar "Ó ESTOU SOFRENDO RACISMO". Não subestime a audiência.
Isso me leva a outro ponto. Na minha resenha ridiculamente minuciosa e longa sobre a primeira temporada (se quiser, é só procurar no meu perfil), eu elogio repetidas vezes a ousadia do texto de Pizzolato e da direção do Fukunaga em entregarem as mais diversas perspectivas filosóficas sobre a existência e as mais vastas suspeitas sobre os crimes sem, em nenhum momento, explicar ou dar de mão beijada pra audiência explicações exageradas sobre as atitudes dos personagens. Dá pra entender e, se não der, dá pra pesquisar. Eu gostava de como o público tinha de fato que engajar na história com os personagens e participar ativamente, ao invés de se abstrair dos fatos como um observador. Tentou emular a fórmula, mas a substância ficou faltando, hein.
Há muito simulacro da primeira temporada e, talvez, este seja o grande problema. Não senti ousadia, coragem e inovação aqui, somente mais do mesmo. Claro, há um apreço pela história e pela forma como a narrativa a guia. Nem tudo são maçãs podres aqui.
Nessa temporada, Pizzolato e diretores se aprofundaram muito mais no que chamei de "fluxo de consciência" na minha resenha sobre a primeira temporada; as linhas de tempo se entrelaçam com muito mais frequência e com menos avisos, me lembrando, de certa forma, da montagem de Sharp Objects. Junto com Hays, vagamos por sua memória enevoada e incerta, nos perguntando, junto a ele, sobre a relevância e, ainda, sobre a validade de certos momentos. Os relatos das bocas dos personagens vão se perdendo completamente com as suas rememorações avulsas.
Junto a isso, há algumas sacadas de gênio que nos fazem pensar em temas da primeira temporada, tais como a persistência do tempo e outras nem tanto sobre a falsa dicotomia entre "bem vs mal". Sobre este último, com o passar dos episódios, voltamos a nos indagar sobre os rótulos que colocamos em certos personagens, contudo, a maneira didática com a qual é feita me fez revirar os olhos, porque nos foi colocado um sujeito para nos EXPLICAR que, poxa, as coisas não são bem assim como imaginastes. Ridículo, poderiam ter deixado a preguiça e os diálogos expositivos de lado.
De qualquer forma, quanto à questão da temporalidade, com a narrativa indo e voltando nas linhas de tempo de Wayne Hays, notamos algumas coisinhas singelas que, de soslaio, passam batido, mas que reforçam uma perspectiva que volta lá nas falas emblemáticas de Rust Cohle. Umas duas vezes, notei, Hays fala sobre "a little clip on it", além da GENIAL escolha da direção em refletir, no corpo de um jovem Hays, um senil Hays.
Junto a isso, há alguns precisos matching cuts que, ao cortar, numa determinada cena, de um Hays para outro Hays, nos entrega uma maior profundidade temática sobre que situação ou que diálogo terá certa ressonância emocional para o personagem no futuro. A isso, adicione algumas quebras de quarta parede e alucinações mnemônicas, que, em retrospecto, dão insights sobre momentos das investigações.
É como Rust Cohle dizia, "all right, all right, all right", opa, "time is a flat circle". De fato, nos damos conta que nossos personagens seguem dando murro em ponta de faca, com parcos resultados positivos, sempre dando de cara com uma rua sem saída.
Senti falta, cara, de um maior aprofundamento filosófico nessa narrativa. Algo que nos faça pensar nesses personagens como algo além de meros homens falhos investigando um crime, algo que os ETERNIZE. Rust Cohle é quase uma figura mítica e Marty segue ali no panteão dos semideuses, como uma figura barroca, em busca do eterno e do divino, mas mergulhado até o talo no mundano e no profano.
Ways é um veterano melancólico e com problemas de memória e Roland, bem, o Roland fala uns palavrões. É isso. Ah, tem a escritora, mas ela me é uma figura tão ambígua que mostra mais um defeito de escrita do que uma personalidade bem construída. Acho ela oca. E tem o pai das crianças, numa interpretação agonizante de Scoot McNairy, mas não é nada além de alguém em profunda dor. Ele é raso.
Acabei sendo mais desfavorável a essa temporada do que achei que seria hauahuuah Enfim, True Detective sairia muito melhor como uma minisérie do que como uma interminável amostra de oportunidades desperdiçadas.
Breaking Bad (1ª Temporada)
4.5 1,4K Assista AgoraO quão improvável é a história central desse seriado? O quão improvável é que um pacato professor de química de ensino médio, em meio às atribulações da vida, decida que não há mais jeito de seguir com seu cotidiano sem graça, que é hora de se tornar um "chefão do crime"? Não sei, caguei, pouco me importa, Breaking Bad me convenceu.
Walter White, de certa maneira, me lembra o Neil Armstrong de O Primeiro Homem, um dos filmes que tava nessa leva do último Oscar. Um homem pacato, sem grandes ambições e em contento com uma vidinha meia boca, apesar do intelecto ímpar que carrega. Ele deixou sua existência passar por si como vento e nem sequer esticou a mão para sentir a brisa dentre os dedos. Contudo, em algum momento, a vida chama. O dever bate na porta e, muitas vezes, é muito próximo da morte.
Quando descobre que está com câncer inoperável no pulmão, Walter é atingido como que por um tiro. O impacto é tão forte que ele olha ao seu entorno e finalmente percebe que não alcançou nenhum dos seus sonhos. Não casou com a mulher que queria, não construiu a empresa que queria, e, sobretudo, não se tornou quem queria. Um dos monólogos mais pungentes que já vi é quando Walt discorre para sua família que nunca conseguiu realmente tomar as rédeas de sua vida: ele não é o protagonista da própria existência.
Desse solilóquio belamente trágico, surge o entendimento sobre as atitudes de nosso personagem. Ele acha que se entregando à vida do crime, poderá finalmente ser alguma coisa, e não apenas habitar uma concha vazia dada a ele pelas circunstâncias ou pelas pessoas à sua volta. É irônico pensar nisso, já que ele continua vivendo em função dos outros: Walter apenas trocou de emprego e de nome.
Sendo assim, temos um personagem que facilmente poderia cair na caricatura de um velho chato e desinteressante que decidiu dar a louca. Mas, graças à uma feliz decisão de casting, não foi isso que aconteceu. Bryan Cranston abraça seu papel de tal forma que não parece estarmos vendo uma atuação, estamos sendo observadores da vida de alguém.
Isso se dá por dois fatores primordiais, o ator e a fotografia. A performance de Bryan Cranston é holística. Ele não se contenta apenas em entregar diálogos com bom timing e entonação. Há um trabalho de inflexão vocal -- o grave da voz de Walt se acentua em momentos de estresse e de conflito --, uma elaboração de trejeitos e maneirismos -- Walt gesticula demais quando ansioso, esbugalha os olhos ao explicar coisas óbvias e se esperneia todo quando tem de aturar a burrice alheia.
A fisicalidade é notável quando a postura mais relaxada de Walt se apresenta frente à família, enquanto seu andar e movimentação ficam mais rígidos frente a assuntos escusos. Além disso, o OLHAR de Walter White transmite muita coisa. Não há dúvidas sobre as emoções de nosso personagem. Sabemos quando está empolgado ou angustiado, permeado de fúria ou de remorso. O mais brilhante é quando Bryan Cranston tem de interpretar seu personagem mentindo. Os olhos dele também entregam uma emoção no intuito de camuflar outra. Não tenho palavras pra esse tipo de coisa.
Já a fotografia se responsabiliza em ditar esse "realismo" pelo aspecto visual. É muito evidente como a série é fotografada, sobretudo no episódio piloto, como um simulacro de cinema verdade. Há muito uso de câmera na mão -- mesmo quando não há necessidade alguma, como, por exemplo, quando o Walt se senta à mesa pra comer aquele bacon vegetariano -- e utilização frequente de longos takes -- como se a ação fosse contínua e apenas tivesse sido capturada durante aqueles instantes.
Entretanto, o "ficcional" vai, pouco a pouco, sendo mais incorporado ao seriado, ficando patente quando os diretores recorrem a steadycams ou mesmo ao tripé, deixando a imagem mais "estática", balanceada, e com movimentação mais suave. Ademais, a fotografia vai se tornando mais autoral, não por iluminação, filtros ou tratamento de cor, mas pelas incomuns escolhas de planos ou posicionamento de câmera, como supostamente "dentro" de objetos, nos tornando "parte" da cenografia ao, por exemplo, nos fazer ver os personagens pelo ponto de vista do chão ou de uma banheira.
Autoral também se mostra o roteiro, ao escolher tratar de uma história tão incomum e improvável, mas, ao mesmo tempo, tão mundana e pé no chão. Não estamos acostumados com esse tipo de coisa em nosso dia a dia, mas a abordagem dada à narrativa, fazendo com que continuamente vejamos os personagens em conversas cotidianas ou fazendo tarefas privadas, como limpar o chão, comprar roupas, falar no telefone durante uma apreensão policial, nos faz enxergar aquele mundo como algo vivo e tangível.
Assim, se torna genial o tratamento dado aos personagens e à trama, quando os roteiristas permeiam os episódios de sujeira e dúvidas mundanas, mas, mais importante, de HUMOR. Seria muito conveniente e lugar-comum abordar essa história de maneira taciturna e sombria, como um conto noir ou se aproveitando da estrutura de filmes de máfia, colorindo as imagens com tons escuros e sombras. Mas não aqui. Breaking Bad nos faz GARGALHAR.
O último episódio é um ótimo arquétipo da estrutura narrativa da série. Nossos personagens se encontram numa quina de sinuca, com poucas opções para conseguir se safar de uma situação inóspita. Walter surge com uma ideia mirabolante, suportada por seu batcinto de química para solucionar o conflito. Assim, com muito humor situacional e satírico, rimos de nossos protagonistas roubando um galpão, vestidos com roupa chamativa e amarrando um guarda num banheiro químico -- chega ao limiar da galhofa. E, em meio às nossas risadas e à ridicularização dos personagens, quando menos esperamos, vemos um drogado ensandecido murrar o crânio de alguém até a morte.
Genialmente, a trama e os temas lúgubres são salpicados com humor para que haja um baque que faça tanto audiência quanto personagens colocarem seus pés no chão e se tocarem que, sim, eles estão metidos com assuntos muito pesados.
Quanto a isso, o personagem do Jesse Pinkman não me é satisfatório. Ele não funciona em seus momentos solo, sendo apenas um drogado imbecil com um sideplot muito do desinteressante e comum. Wow, a família dele não vai com a cara dele porque ele nunca demonstrou potencial suficiente como ser humano. Meh. De qualquer forma, a química entre ele e o Mr White é invejável, fazendo com que Pinkman, ainda, seja muito mais eficaz somente como um sidekick.
Por mais que eu já tenha tentado ver Breaking Bad umas cinco vezes, nunca conseguindo ir até o final, estou finalmente ansiosíssimo para ver até onde esses dois patetas vão. Eu lembro mais ou menos, mas, nossa, como tá sendo gostoso redescobrir isso daqui.
True Detective (1ª Temporada)
4.7 1,6K Assista AgoraTrue Detective foi uma das primeiras séries que peguei pra ver quando comecei a levar Cinema (e produções audiovisuais por extensão) a sério e, em meio à minha arrogância adolescente de quem finge que sabe alguma coisa sobre alguma coisa, não demorou pra se tornar uma das minhas favoritas e continuar nesse posto até hoje. Possivelmente foi o que ajudou a cimentar meu gosto por mistérios policiais envolvendo crimes hediondos e temas existencialistas, uma mescla que, felizmente, anda tendo a rodo, amém.
Nic Pizzolatto claramente tava MUITO mais preocupado em desenvolver seus subtemas adjacentes à trama do que tornar a resolução dos crimes como uma prioridade, o que geralmente prejudica o enredo, mas, genialmente, neste caso, não houve esse problema. A força motriz de True Detective se encontra nas crenças e valores de seus protagonistas e no embate existencial inerente às suas personalidades tão díspares e é tão lírico ver isso acontecendo <3
Assim, possuímos um grande tema geral clássico e comumente batido em produções culturais há milênios, desde Caos e Ordem na mitologia grega, envolvendo Luz vs Escuridão, que se desdobra em subtemas bem específicos e que alimentam a série, tais como livre arbítrio vs determinismo, Homem vs Natureza, e em outros que fogem a dicotomias, como responsabilidade, integridade, religião, deus, relacionamentos, e tocando em questões inerentes à natureza humana, como para onde vamos? o que somos? há algo além daqui?
Para um drama policial, esse aqui vai muito além do que qualquer um esperava.
Rust é um cara cínico, maculado por experiências brutais da vida, sem perspectiva de futuro e com crenças firmadas em pedra sobre o gênero humano e o mundo ao seu redor. A realidade é pintada em tons de cinza e chumbo, as pessoas são cruéis e egoístas, todo mundo vai morrer e que se foda suas boas intenções. Para alguém tão mergulhado num niilismo, ele enxerga bem além das aparências que veste nas coisas ao seu redor, sendo íntegro e verdadeiro ao que considera certo.
Marty é um pai de família, cheio de vida e otimista quanto à sua existência, sobre a qual não delonga muito e deixa pra deus resolver; talvez se pensasse mais sobre quem é e sobre o que quer não seria tão babaca com todo mundo que o ama. Apesar de tanto falar sobre VALORES, CRENÇAS e FAMÍLIA, é o primeiro a ficar doidão e colocar um par de chifres na esposa e a esnobar suas filhas. Fala tanto sobre a preciosidade do casamento e como compromisso dita o valor de um homem, mas não enxerga as merdas que faz, uma atrás da outra.
É como se o véu da ignorância tivesse sido retirado dos olhos do Cohle e amarrado feito uma venda na cara do Hart, cegando um eternamente para suas ações e jogando o outro na boca do demônio pra ser devorado. Não é a toa que somente depois de experienciarem muita merda juntos é que começam a se entender, um pouco.
Há um diálogo emblemático, tanto da personalidade de cada um, quanto da relação dos dois, e que diz muito sobre o que a série busca tratar logo na meia hora inicial do primeiro episódio. Não dura mais do que cinco minutos e, numa exposição singela da mais pura habilidade de escrita e de síntese, Nic consegue abordar isso tudo e ainda tocar brevemente, não didaticamente, não expositivamente, mas de forma orgânica e essencial à natureza de nossos dois personagens, em assuntos concernentes a Camus, Unamuno e Hume.
Faz Rust divagar sobre a ausência de pessoalidade, como se o "eu" fosse apenas uma junção randômica de matéria reunida que possui ímpetos e impulsos arbitrários e naturais que, devido a uma falsa noção de "consciência", nos faz entendê-los como desejos, sonhos e vontades. Não há de fato um "eu" consciente que controla minhas ações, mas muito mais uma amálgama de estímulo-resposta senciente do que há à volta que se transveste num falso ego. E, apesar dessa constatação, seguimos nossas vidas com essa mentira tornada verdade por puro efeito de uma "programação", ou como Sísifo com sua pedra, eternamente seguindo em frente alheios à "verdade" porque a existência nos obriga. É, é bem cerebral.
Assim, nos damos com um Marty claramente confuso mas implicitamente admirado por seu parceiro, mandando-o calar a boca, estabelecendo que o trajeto no carro é um momento de reflexão silenciosa. Em sua ignorância, Hart se vê incapaz de tentar dar continuidade à conversa e aprender mais não somente pelo que há ao seu redor, mas no seu interior. É uma constatação vergonhosa de que ignorância é uma benção e, quanto menos perceber a si, mais feliz será -- à custa dos outros.
Ademais, vamos entrar em contato com a hipocrisia emblemática do Marty, cego demais pra evidenciar que não vive de acordo com nenhum de seus lemas, que suas frases são ocas e suas ações traiçoeiras daquilo que tanto diz buscar. Trai sua esposa, trai suas filhas, trai sua religião, trai até mesmo sua noção do que são as pessoas, mas, sobretudo, trai sua falsa concepção de si mesmo. Ele não quer ser um pai de família, provedor, religioso e íntegro. Ele quer se entregar à gandaia e viver como um Baco. Mas sua criação e os valores que adotou ao longo do caminho para ser aceito o impedem de perceber quem realmente é.
Já Rust, ah, Rust diz em algum momento aí que lutou muito para descobrir quem realmente é e que não abrirá mão de finalmente ter se encontrado. Tiro meu chapéu pra quem, no auge de seus 50 anos, se entupindo de cerveja, cigarro, maculado por tanta droga e experiências atrozes, com a aparência estragada e vivendo num casebre atrás de um barzinho meia boca, diz isso pra uma câmera num interrogatório. Ah, ele tá realmente pouco se fodendo pra tudo e todos. Esse daí não se esconde atrás de nada nem ninguém, não age em nome de coisa alguma, não dá graças de sua vida a absolutamente nada. Ele é. Íntegro, verdadeiro a si mesmo e honesto. É isso.
Por falar em interrogatórios, são nessas "entrevistas" que nossos personagens se apresentam a nós, público. Por meio de suas falas, ora contraditórias, ora absurdamente fora da realidade, ora cruas e honestas, é que vemos o que relatam e o que viveram em tal período.
Muito do que aprendemos sobre eles não é propriamente dito, deixando para a edição, através de montagem paralela, matching cut ou comparações temáticas, nos revelar suas vidas, tais como num fluxo de consciência em que, ao contar sobre algum evento, você, pouco a pouco, vai lembrando de acontecimentos correlatos que, por mais que acabem não entrando em seu discurso, permeiam sua memória e imaginação da mesma maneira.
Assim, visualmente, entramos na mente de Rust e Cohle, misturando relatos com vivências não contadas, apenas rememoradas, tal como os escritos de Dostoiévski, que discorre sem fim sobre as experiências de seus personagens com uma naturalidade tal como o próprio funcionamento dos pensamentos e lembranças. Mais uma vez, é lírico.
Por meio dessas rememorações, acompanhamos pessoalmente o caminhar de suas vidas e, portanto, de suas investigações. Um dos problemas principais, se não o problema-mor, de produções de cunho investigativo é que a audiência é alienada do processo investigativo propriamente dito. Vemos pessoas, lugares, crimes e atos, mas não nos é oferecida a oportunidade de justamente investigar; simplesmente temos de acatar as decisões dos investigadores que, por meio de inexplicáveis insights, descobrem a causa disso, o responsável daquilo ou o que aconteceu com fulaninho. Somos passivos à investigação e não agentes ativos do procedimento de conclusão do crime. E, amém, isso não acontece aqui.
O roteiro sagaz e a direção meticulosa não se deixam utilizar de diálogos expositivos e inflamados para nos esclarecer sobre os acontecimentos, A NÃO SER QUANDO NÃO ESTIVEMOS PRESENTES COM NOSSOS PERSONAGENS. Em suas lembranças, vemos seus olhares examinadores nas cenas dos crimes, aos elementos que atentam, os documentos que estudam, os ambientes bem adereçados que visitam, as pessoas esquisitas que investigam.
Reparem, cada papel tem detalhes reveladores, cada parede e mesa entregam uma informação, seja por um quadro, um objeto largado... Nós somos incentivados a investigar e a criar nossas próprias teorias. Isso é ótimo, porque experimentamos exatamente o que nossos personagens experimentaram e nada além do que eles sabem nós sabemos, por isso o twist é tão frustrante, mas tão revelador. Nós também fomos ludibriados pelas pistas a seguir um caminho e a não enxergar aquilo que estava tão patente à nossa frente. Não soa forçado, não soa como um coelho tirado da cartola. Assim como o Cohle não viu aquilo e foi enganado por todo um sistema opressor, nós também fomos.
Assim, a reunião fatídica e reveladora que os dois têm tantos anos depois, com Rust explicando seus achados faz sentido e não soa facilitadora, porque ninguém sabe o que ele fez nesse ínterim e tampouco ele faz questão de contar, até determinado ponto. Até nisso, a exposição foi calculada e bem pensada. Poxa, nenhum defeito.
Com isso, fica evidente que a série não tá fazendo a mínima questão de esperar pelo telespectador. Ela respira por conta própria e ai de você se não acompanhar. Isso torna a experiência muito mais recompensadora e pessoal, porque não te trata como um traste desprovido de capacidade cognitiva, mas, sim, como um ser inteligente e ávido por entender aquela história. É fantástico.
Dessa maneira, pode-se inferir que a absolutamente impecável obra prima visual que é a abertura dessa primeira temporada também cumpre seu trabalho de instigadora do mistério e de reconhecedora da inteligência do espectador. Ao som de uma pesada música country, somos imersos numa atmosfera taciturna e lúgubre, cheia de mistérios, lascívia e escroques, acompanhada de imagens chave, que nos entregam sem esclarecer absolutamente nada justaposições de corpos, natureza, elementos urbanos e rostos. A highway que encobre a cara do Marty, o fogo que abraça um recém amanhecido Rust e o gordinho de óculos que é abatido não se sabe se por uma bala ou por um estado de nirvana religioso. É genial, genial.
Por conta dessa genialidade em tantos aspectos, seja no design de produção, na direção, no roteiro, na fotografia, nas performances ou na montagem e articulados em conjunto de uma maneira única, tornam True Detective a nata de investigações policiais, ditando estilo e prosa pra produções subsequentes que aspiram ao nível de profundidade temática e complexidade narrativa, como The Sinner, Parfum, Ozark, The Alienist, Borderliner, dentre outras, demonstrando sua relevância como um marco histórico na história da televisão.
Kingdom (1ª Temporada)
4.2 214Só percebi o quanto que eu precisava de um seriado sobre zumbis ambientado na “idade média” coreana depois de ver isso aqui. Adorei!
O Perfume (1ª Temporada)
3.4 131"Parfum" é o tipo de série que meu ego inflado diz que foi ~~~feita para mim. Européia -- em termos de construção da narrativa diz muita coisa--, cínica, permeada de personagens não confiáveis e quebrados, com uma atmosfera agourenta e muito mais preocupada em desenvolver seus temas principais que agem como subtexto do que em de fato resolver o mistério -- o que, muitas vezes, um em detrimento do outro, acaba por penalizar a resolução da trama. E é o que acontece aqui.
Fiquei muito encucado tentando ligar um ponto ao outro conforme o passar dos episódios. Rememorando aqui, achei ousado a série já ter entregado de cara os envolvidos em alguns dos assassinatos e, não obstante, os motivos para tais. Logo de início, o Roman inquire a Elena, insiste em reunir o grupinho da escola e a esfregar na cara deles o acontecido, etc. O seriado já nos faz desconfiar de antemão de seus protagonistas, sem nem ao menos sabermos os nomes deles.
Eu curti MUITO cada um deles. Os desenvolvimentos, os arcos e os motivos de cada um deles são minuciosamente construídos, mas isso não significa que as informações nos são dadas de mão beijada -- pelo menos não na maioria das vezes, somente quando a série falhou em algum ponto e, no intuito de avançar a trama, nos revela algum dado pela boca de alguém. De qualquer forma, todos os personagens me pareceram tangíveis e com potencial de existência, até mesmo os terciários.
Roman é um pai de família insatisfeito com sua ausência de virilidade e desconta sua insatisfação em sua mulher e, sob o olhar do Outro, age como um santo por vergonha e covardia, se mostrando um verdadeiro frouxo sempre que se encontra em cena com Butsche.
Elena é completamente perturbada das ideias, muito por causa dos traumas causados pelos homens de sua vida: seja seu pai que odeia mulheres por um término conturbado com a esposa, seu marido violento e covarde ou seu amigo estuprador que a usou como objeto de vingança. Em Perfume, Elena é exatamente isso: um objeto que passa nas mãos dos homens. Por falta de amparo emocional, ela não sabe lidar com o que sente, causando uma inabilidade de compreender suas emoções. Assim, ela mal entende a tamanha crueldade do que faz quando criança.
Banguela é absolutamente patético. Cresceu como alvo de risadas e assim permaneceu. Não sabe socializar e vê tudo ao seu redor como uma ameaça a si. Para lidar com sua imensa inutilidade como ser humano, desenvolve apego estranhos por mulheres que não dão a mínima para ele -- na verdade, quanto mais elas o humilham, melhor ele se sente. Freud nunca esteve tão certo.
Moritz é um charme de tão misterioso. Sempre com aquele olhar de "eu sei MUITO mais do que você, o que me torna MUITO melhor do que você". Confesso que por gostar dos trabalhos anteriores de August Diehl, não foi nada difícil ir com a cara do personagem dele. Infelizmente, o perfumista sempre parece estar estranhamente deslocado na trama, independente de que cena ele esteja. Isso que acontece quando o casting é feito para atrair público e não há preocupação em desenvolver o personagem depois do ator escolhido. De qualquer forma, ele serve como o instigador intelectual da série, estabelecendo o tom de cada episódio com suas divagações e reflexões acerca da natureza humana. Um espetáculo.
Butsche é um dos personagens mais palatáveis. Ele possui infinitas camadas. É um brutamontes. É um cafetão. É duro como pedra. É um estuprador. Ele cobiça as mulheres como um sommelier degusta vinhos. Ele também é uma vítima sexual que já cogitou virar padre. Ele possui diversas questões mal resolvidas dentro de si, descontando nos outros à sua volta através de grosserias e violência. Mas ele também é sensível e carrega em si uma ingenuidade infantil quanto a relações afetivas. Sua personalidade é, no mínimo, curiosa.
A investigadora é uma das mais instigantes aqui e definitivamente sem maturidade emocional alguma pra ser policial. Ela possui uma questão notavelmente latente dentro de si quanto a apego e confiança, se deixando ser um bichinho indefeso nas mãos de quem a oprime. Ela é completamente voraz, impiedosa, volátil e sem um pingo de autocontrole. Por ter sido desamparada quando criança, ela anseia desesperadamente pela mínima noção de família -- e quanto esta surge, não há nada que a faça parar para atingí-la.
Representada aqui pela terapeuta, se fazem presente as noções de psicanálise e outras tantas dentro da psicologia de que o passado do indivíduo, sobretudo suas experiências na infância, voltam com tudo para assombrá-lo no tempo futuro.
Afinal, para o inconsciente não há temporalidade, há apenas um "plano" onde tudo se desenrola. Lembranças passadas agem como se ainda estivessem acontecendo. E isso é genialmente ligado ao olfato e à sua relação com a memória: é um sentido muito forte na infância, agregando muito afeto ao fato estocado. Assim, é comum que quando sintamos o cheiro de algo familiar, nossas lembranças nos remetam a eventos passados de maneira arrebatadora.
Essa perspectiva de completa ausência de livre arbítrio e que somos somente peões do mundo físico, agindo em funções intermináveis de ação e reação, se torna patente aqui. Não temos qualquer controle sobre nossos atos, não entendemos nossos motivos, não somos nem sequer um "eu": somos apenas uma coleção em constante mudança de coisas que acontecem a um conglomerado de matéria em movimento. Nem sequer sentimentos existem.
Há diversas inspirações filosóficas e psicológicas agindo como subtexto de Parfum, algo notavelmente laborioso de se construir em narrativas coesas e instigantes. Por um lado, isso a torna genial e, por outro, a faz falhar na resolução de seu mistério.
Não há indícios suficientes para fazerem a audiência engolir que a psicóloga é a assassina, somente jogam diversos diálogos expositivos tirados da cartola nos últimos minutos. A série terminaria de maneira muito mais satisfatória em se contentar em não ter um final definitivo, nos deixando com os diversos plot twists para concluirmos a trama por conta própria. De uma maneira ou de outra, fui deixado perturbado e reflexivo. Pelo menos as intenções foram alcançadas.
Você (1ª Temporada)
3.7 916 Assista AgoraComecei a ver You por recomendações de uns amigos que andam trabalhando comigo num curta que escrevi, pensando que o Joe poderia servir de referência pra construção do protagonista. Acabou que Joe não bate com meu personagem, mas, de qualquer forma, segui assistindo, porque fiquei definitivamente intrigado pelo sujeito.
Logo de início, percebi que Joe não é um psicopata. Ele SENTE as coisas e se esforça ao máximo para se colocar no lugar de seus alvos, por mais que falhe miseravelmente nisso. Ademais, os flashbacks sabiamente nos indicam que Joe nem sempre foi perturbado do jeito como nos é mostrado: ele teve um passado conturbado, os pais foram ausentes, houve uma supressão de contato social e, ao que tudo indica, a única relação interpessoal próxima foi com um velho amargo, abusivo, tóxico e com delírios de grandeza. Joe não nasceu assim: Joe foi criado.
O que me leva a outro ponto: Joe é um sociopata ou apenas um egomaníaco narcisista que passou muito tempo sem contato humano? Ele obviamente funciona à base de obsessões e paranoias envolvendo sentimentos. Por traumas do passado envolvendo nunca ter tido afeto e cuidado de verdade, com afeição e ternura substituídos por possessividade e submissão, ele busca amor, ou sua visão deturpada de amor, nas mulheres que permeiam seu dia a dia pacato. O modus operandi dele é função de sua necessidade de se sentir preenchido por outra pessoa e, sobretudo, de ser admirado.
Coitado, ele se esforça TANTO, ele se presta a TANTO, ele faz, isso, faz aquilo, leva pra passear, faz comida, lava a louça e a roupa, cuida da casa... faz tudo que seu objeto de desejo aparenta querer e precisar, então, POR QUE ele não é correspondido, por que não é desejado, por que não é enxergado da mesma forma? De maneira simples, eu respondo: porque as outras pessoas têm mais o que fazer.
Elas não foram criadas de modo a servir a um único objetivo: amar livros e o seu mestre que as salvou da eterna danação que é viver de forma aculturada e desprovida de figuras de poder. Beck teve uma vida difícil. O pai sumiu logo no início da adolescência, a deixou desamparada e tendo de lidar com uma mãe problemática e, pelo que parece, irmão (e irmã? Não lembro) distante, que não compartilha muito em comum com ela. Assim, ela passou os anos seguintes procurando seu lugar no mundo e tentando entender a si mesma. Isso se desdobrou num círculo social amplo e ativo, numa vontade irrefreável de escrever e ser reconhecida pelo seu trabalho e de, ainda, compreender quem ela é: a última coisa que passa na cabeça dela é se envolver romanticamente com alguém de forma tão categórica que torne sua existência mero satélite de macho.
Já Joe, infelizmente, teve suas oportunidades de desenvolvimento cortadas e diminuídas ao máximo. Ele PRECISA servir a alguém, ele PRECISA ter sua subserviência reconhecida e, portanto, PRECISA ser admirado. A admiração de que inconscientemente require não vem de grandes feitos ou de ser mega incrível em alguma coisa, mas, sim, paradoxalmente, de ser o cachorrinho de bolsa de outro alguém. Como ele não reconhece isso, ele trata essa sua necessidade como algo que o infla e que, na visão dele, o torna poderoso. Seu poder se manifesta em tornar gente incrível miserável para que ele, miserável, se torne incrível. É, se não ficou claro até o episódio final, ele é bem babaca.
Eu demorei um tempo até conseguir superar os diálogos cheios de referência e de pomposidade pseudoerudita, a insistência da atriz da Guinevere em adornar cada palavra com um sorriso desproposital e a voz monotônica do Joe, mas consegui, e valeu a pena. A partir do quinto episódio é quando a coisa deslancha mesmo e fica muito, muito, muito bom. Eu aguentei até lá pela construção psicológica de Joe e continuei além pela trama. Ah, porra, ficou muito bom. As intrigas entre atores que possuem no currículo Pretty Little Liars e Gossip Girl deixaram patente seus trabalhos anteriores. Muito "disse-não me disse", muito exagero nas expressões e na fala e muita frase de efeito. Dá pra escrever um novo Rebelde só com a meiuca de episódios da temporada.
Sem sombra de dúvidas, o ponto alto de You surgiu nesse período. Era ao mesmo tempo desesperador e engraçadíssimo como o Joe não se reconhecia nas ações da Peach. Ambos stalkers obcecados e paranoicos, com uma extensa coleção de artefatos da vítima, possuidores de um histórico social e sentimental digno de pena e de uma lábia, uma desenvoltura manipulativa invejável. Caí muito na gargalhada quando o Joe insistentemente se enchia todo feito um pombo e soltava 'HOW DARE SHE" sempre que a Peach fazia exatamente a mesma coisa que ele em qualquer contexto. Muito bom, porra.
You termina com mais um ciclo sociopático fechado. Joe, que tanto se via no Paco e que tanto tentava inconscientemente ajudar ele a não se tornar mais um perturbado, acabou cumprindo as profecias Freudianas e converteu o moleque em mais uma variação do Mooney. É triste como Joe sucumbiu profundamente aos seus impulsos mais nefastos e perversos e levou o menino consigo :/
Eu realmente esperava que You se contentasse com uma temporada, porque não imagino como pode se tornar um procedural não redundante, seguindo os passos de Joe em achar sua prometida. Aliás, achei de uma falta de imaginação porca enfiar a Candace ali. Já deu pra entender que ela não tava morta. Esse cliffhanger foi bemmmmm preguiçoso. Seria mais interessante ver o Joe numa segunda temporada fazendo de tudo pra tirar a polícia de seu encalço. Afinal, ainda temos o pote de mijo que foi pra análise e o buick marcado no caderninho do policial. Dava pra tirar uma boa trama disso, no melhor estilo Sneaky Pete.
Seinfeld (7ª Temporada)
4.5 70 Assista AgoraEu acho impressionante como Seinfeld é basicamente uma sitcom sobre quatro pessoas insuportáveis, egoístas, mesquinhas, desagradáveis e inconveniente que não pensam em nada nem ninguém além do próprio umbigo e de suas próprias vontades. Nenhum deles é fofinho, bonitinho, gentil ou meigo, mas todos eles fingem ser para alcançar seus objetivos mais nefastos e asquerosos. Jerry é insensível e narcisista, Elaine é vaidosa e aproveitadora, Kramer é invasivo e sem noção alguma de nada e George é um covarde miserável que não tem a pachorra de assumir pra si seus erros, um ignorante de ego inflado sem perspectiva alguma de vida e que tá destinado a se tornar o próprio pai. Esses adjetivos que dei para cada um são intercambiáveis -- eles não compreendem nem dão total escopo do quão escrotos e babacas os protagonistas conseguem ser... e isso é genial.
Onde já se viu uma série de comédia ser permeada de personagens tão deploráveis? Eles não são escritos para serem gostados ou idolatrados. Mas eles são humanos o suficiente para rolar a típica identificação público-personagem, o bastante para que a audiência se veja representada nas falhas de caráter e erros mundanos que eles cometem. Jerry, Elaine, Kramer e George são como janelas que possibilitam aos espectadores olharem profundamente dentro de suas almas e refletirem sobre seus hábitos, crenças e comportamentos diários. São avatares de nossos pecados e vergonhas.
Talvez por esses motivos, Seinfeld, apesar de ser evidentemente noventista e exalar a cultura dessa época, é absolutamente atemporal: assim como os personagens, os seres humanos não tendem a aprender com seus erros.
Riverdale (1ª Temporada)
3.7 391 Assista AgoraEu tô impressionado que Riverdale me segurou do início ao fim; cambaleando em alguns momentos, mas conseguiu prender meu interesse.
Comecei a ver por causa de Sabrina, série que, apesar dos apesares, curti bastante. Então, foi só uma questão de tempo até pegar essa daqui pra dar uma olhada. Fiquei completamente absorto nos primeiros episódios, com toda a áurea de mistério envolvendo o assassinato e a cidade, me deixando bem interessado em como tudo se sucedeu, auxiliado pela narração agourenta do Jughead. Parecia um conto neonoir banhado em neon e drama oco adolescente. Adoro.
Contudo, eu comecei a achar um porre conforme os roteiristas insistiram em se aprofundar nas intrigas fajutas dos jovens protagonistas, incendiando traumas passados dos adultos e enrolando mais e mais com becos sem saída narrativos. Achei um PORRE Archie Andrews e seu draminha de “ai mej deus nao sei se jogo bola se toco violao se comstruo casas ou se beijo na boca”. Ai, na moral, me poupa. Sem dúvidas, o personagem mais lenga lenga, o que é engraçado, já que ele dá título ao material fonte do seriado. Veronica Lodge tinha tanto potencial, mas caiu na punheta estereotípica da queen bee tentando se redimir. Jesus, o que foi aquela forçasão de barra com a ruivinha de Stranger Things? Vergonha alheia. O Kevin nem existe, as Pussycats menos ainda.
Dos dramas pessoais, o que me surpreendeu positivamente foi a evolução da construção do personagem do Cole Sprouse, saindo do arquétipo de adolescente chato, enfadonho e mau humorado por ser tãaaaao diferentão e inflando ele com problemas reais, paupáveis, como uma família desastrosamente desestruturada, um pai beberrão e criminoso, levando a um jovem inteligente sem muita perspectiva de vida. ISSO é tangível, tridimensional e interessante.
Outra personagem que me cativou foi a Betty. Desde o início, ela se destaca por obviamente ser bem interpretada. Tirando o ator do Fred Andrews e o do FP (toca aqueeeeeeeela), somente a Lili Reinhart não parece estar interpretando — ela veste a sua personagem e VIVE na pele daquela garota. Dá gosto ver uma atriz tão genuína, consciente e desenvolta. Me lembra muito uma jovem Emma Stone em início de carreira. Eu realmente espero que ela não se resuma a Riverdale e busque trabalhos mais elaborados, seja na TV ou no Cinema. Enfim, voltando à Betty. Me admira muito ela ser relativamente sã na medida do possível tendo de lidar com aquela mãe completamente despirocada da cabeça que, inclusive, deveria ser internada. Ela cresce aos longos dos episódios. Além de filha rebelde e romântica frustrada, ela vira quase a líder do grupo e assume o papel de voz da verdade. Baita desenvolvimento foda.
Cheryl Blossom é um fenômeno minimamente curioso. Apesar de mal escrita e pessimamente interpretada, ela tem camadas. Ela está num profundo processo de luto. Ela é famosinha e endinheirada. Ela é ridiculamente bonita. Ela tem graves problemas familiares. Sobretudo, ela quer sair dessa situação miserável, nem que seja fazendo atrocidades com colegas de turma ou causando escândalos em casa. O que me deixou encucado, além do cabelo impecavelmente arrumado (honestamente, quem faz o cabelo dela, gente? Não é ela) e de se vestir como uma femme fatale até mesmo pra dormir, são as SÚBITAS e ARREBATADORAS mudanças de humor dela. Bem, ela cresceu num lar hostil e perdeu o único amigo real dela. Faz sentido ela sucumbir a um desequilíbrio emocional. Mas, infelizmente, dá pra perceber que é só fruto de uma péssima e caricatural interpretação e de descaso dos roteiristas, mesmo. Potencial desperdiçado.
Pouco a pouco, fui percebendo que Riverdale é uma novela camuflada com linguagem cinematográfica, uma bela fotografia e várias firulas visuais — o que é bom: dá pra ver que a galera tá pelo menos tentando fazer algumas coisas diferentes com o texto que receberam. Riverdale se sai muito bem como um mistério de assassinato e tem peculiares personagens que, se dados um desenvolvimento caprichado e, mais importante, BONS ATORES, coisa que tá faltando, pode resultar em frutos melhores futuramente. Já quanto aos dramas pessoais, às intrigas adolescentes e às mil reviravoltas envolvendo o núcleo adulto, Riverdale se sai pessimamente mal. O ideal é que abandonem essa cisma que vira e mexe surge aleatoriamente de se tornar um estudo de 20 personagens ao mesmo tempo. Prfvr, se atenha aos mistérios. Meu novo guilty pleasure, tava precisando já que tô sem Hemlock Grove há anos.
The Purge (1ª Temporada)
3.2 246Há uns tempos atrás, surgiu um pequeno filme independente mas estrelado por grandes nomes como Ethan Hawke e Lena Headey, com a simples premissa, num futuro bem próximo, de um casal tentando sobreviver a uma noite em sua casa em meio a uma nova proposta do governo de legalizar todos os crimes por 12 horas. Assim, James DeMonaco fez surgir Uma Noite de Crime.
Embora tenha tido uma recepção morna por parte da crítica, foi um inesperado sucesso de bilheteria, tendo superado em quase 30 vezes o baixo orçamento. Obviamente, cativou o público por meio de sua claustrofóbica atmosfera e atrativa trama, mas, sobretudo, por meio de seu tema, tão relevante nos dias atuais, gerando uma imediata identificação entre audiência e produto.
Num país em que a posse e o porte de armas são legalizados e de tão fácil acesso e no qual é comum a ocorrência de extermínios em massa, tanto em escolas quanto em shoppings, é completamente compreensível que a narrativa tenha ressonado no público americano. Como rápido relato pessoal, me lembro de ter visto uma submetralhadora sendo vendida próxima à seção de filmes num Walmart quando viajei para os EUA. Para um moleque de 13 anos que nasceu e vive numa das cidades mais violentas do mundo, isso foi uma baita choque. Fiquei umas semanas perturbado com aquilo.
Devido ao sucesso estrondoso, o filme rapidamente entrou no imaginário popular, dando origem a uma franquia de filmes e a um fiel grupo de fãs ao redor do mundo. As pessoas mascaradas vagando pelas cidades casualmente portando armas e matando tudo e todos ao seu redor é uma aterrorizante mas cativante imagem. Assim, mais dois filmes foram lançados e, com o sucesso de ambos, os produtores resolveram transformar a história num seriado, em forma de derivado.
Contando com uma série de personagens cujas histórias pessoais se entrelaçam com o passar dos episódios, a série segue a premissa básica dos filmes: mostrar pessoas sobrevivendo ao caos que são 12 horas de gente liberando seus mais nefastos demônios. Infelizmente, o tempo extra para construir uma narrativa mais elaborada e com maior número de personagens não foi bem aproveitado, havendo diversas quebras de ritmo além de, honestamente, histórias muito desinteressantes.
Temos uma mulher de negócios querendo se vingar de seu chefe assediador, um jovem militar tendo salvar sua irmã mais nova de uma seita suicída, um casal de empreendedores tentando parceria com um empresário com claras tendências sociopatas ao mesmo tempo que evitam transar novamente com a filha dele, um aposentado policial “intocável” por conta de glórias do passado e um mercenário mascarado tentando bancar o Justiceiro. Todos com personalidades e backgrounds relacionáveis, contudo com um potencial não atingido. Não souberam contar a noite deles de forma satisfatoriamente interessante.
Ignorando por um momento a trama mal contada, a série, assim como os filmes, possui subtextos relevantes para nossa sociedade, ainda mais pós vitória presidencial de Bolororo. Um ex militar com ardente discurso pró violência, pró machismo, pró racismo, pró segregação, anti pobres, anti direitos humanos, anti direitos trabalhistas e anti mulheres, nos faz indagar ao que sua fala pode levar seus eleitores a fazerem, sobretudo querendo a redução da maioridade penal e a proliferação do porte de armas. Talvez seja por isso que The Purge seja tão fascinante para mim: coloca na minha frente, em imagem e som, um dos meus maiores temores. Se o povo americano, vivendo num dos países mais desenvolvidos economica e politicamente se encontram num cenário análogo ao da franquia, imagina o que poderia acontecer aqui em nossa terra brasilis, na qual tem palmeiras, onde canta o sabiá?
Feliz! (1ª Temporada)
4.1 79 Assista AgoraEU NÃO ACREDITO QUE ELE CITOU A PORRA DO CRIADOR DA BOMBA ATÔMICA AHUAHAUAHAUAUAHAUAU
The Leftovers (1ª Temporada)
4.2 583 Assista AgoraRelembrando uma obra prima em forma de seriado. The Leftovers abarca temas filosóficos e teológicos, passando pelo existencialismo, absurdismo, niilismo, pessimismo e pelo questionamento cristão. Nos indaga se temos algum propósito sem nos dar qualquer tipo de resposta. Desenvolve uma série de personagens com personalidades e características psicológicas de forma crível e lacônica, deixando todo seu esplendor para abarcar o interior mental profundamente fragmentado de seu protagonista, Kevin Garvey. Faz isso com uma narrativa não linear, muitas vezes onírica e poética, com sequências de sonhos e alucinações que fazem com que a audiência questione a todo momento o que faz e o que não faz parte da história principal, se é que há uma, além de se estender por diversos gêneros, como drama, suspense, horror, ação, aventura, romance..., sem se limitar a nenhum deles e ao mesmo tempo conseguindo estabelecer coerência e coesão narrativa de maneira contundente -- isso tudo em cerca de 30 episódios. É fenomenal e dificilmente será esquecida.
Love (3ª Temporada)
4.0 138 Assista AgoraEternamente grato à Gillian Jacobs e à equipe criativa por trás do seriado por terem dado vida à uma personagem tão complexa, rica em detalhes, crível e tri dimensional como a Mickey Dobbs. É muito reconfortante (e, às vezes, assustador) se ver num personagem que exterioriza e que compartilha tão similares questões, medos, angústias, sonhos, desejos, problemas, vícios, hábitos e comportamentos. Não consigo colocar em palavras o quanto essa personagem me ajudou a lidar com meus próprios demônios e a dar luz às minhas soterradas qualidades. Obrigado ❤️
Derek (1ª Temporada)
4.5 103Nossa, faz um tempo que eu não choro tanto assim. Essa série, ao menos nessa primeira temporada, deixa claro que não se trata da sagacidade característica da escrita do Ricky Gervais, apesar de ela dar pinta em alguns momentos. Mesmo apelando às vezes pra clichês, Derek é sobre os sentimentos que compartilhamos como seres humanos e como eles se manifestam nas relações que estabelecemos entre nós. É uma tirada diferente na carreira do Ricky Gervais, certamente uma inesperada e perspicaz. Talvez, seja mesmo sagaz, só uma manifestação diferente de sua sagacidade.
Weeds (1ª Temporada)
4.2 81 Assista AgoraCreio que "instável" seria um bom termo para resumir essa série, ao menos nessa primeira temporada. Weeds perde muito tempo com humor barato -- Doug e Andy -- e insiste em inserir uma sitcom em todo episódio toda vez que a Nancy vai se abastecer de erva -- a traficante zoa a Nancy seja pela roupa, pelo modo de falar ou pela ingenuidade dela, faz meia dúzia de piadas sobre como a família dela é imprestável e como o dinheiro não tá entrando, meu deus, até o cenário é reminiscente de sitcom, o teto não aparece, a câmera só faz travelings, como se estivessem numa animação 2D e os personagens ficam estáticos pra não aparecer o interior do soundstage.
A família da Nancy é um puta tiro que saiu pela culatra. Temos um adolescente traumatizado por testemunhar a morte do próprio pai e que afoga as mágoas em drogas e em relacionamentos sem nexo algum -- me dá vontade de me jogar pela janela toda vez que a Megan aparece, a direção claramente não descobriu ainda que surdos são gente e não robôs que ainda estão aprendendo o convívio humano --, uma criança que não se encaixa socialmente, que se sente abandonada pela família e que claramente possui comportamentos para chamar atenção para ela -- o Shanne sente falta do carinho do pai -- e que é tratada como alívio cômico por causa dos interesses e gostos não usuais e uma viúva que têm que bancar dois filhos e manter um alto estilo de vida mesmo sem trabalho regular e que claramente possui dificuldades em se relacionar com pessoas do sexo oposto porque ainda não se desvencilhou da presença terna e reconfortante do falecido marido, possuindo algumas poucas brechas pra demonstrar a dor que sente e o luto que teve de ser rapidamente encerrado pelas circunstâncias. Todas oportunidades perdidas com um ator pro Silas que não sabe se comportar ou entregar as emoções do personagem com confiança, dramas mal aproveitados em detrimento de encontros e desencontros com personagens desnecessários, como o Doug, Andy e Megan, e, meu deus, o que foi aquela cena de sexo totalmente fora de tom que a Nancy teve com um cara que tava ameaçando a família dela?????
Em geral há muita bola fora, mas acho que a Celia é a personagem mais consistente. Apesar de não ir com a cara dela, o drama pessoal da personagem, sua depressão pelo câncer e o vazio existencial por causa de uma vida suburbana desprovida de significado e auto realização descontados em um comportamento passivo agressivo, frio e egocêntrico é muito bem construído. Palmas pra atriz que encara o papel com afinco e destila veneno ao abrir a boca.
Ainda não entendi a utilidade do Doug pra trama. Ele não precisava existir pra padaria ser feita, ainda mais se levar em conta que ela não será mais utilizada, pelo que deu a entender. O Andy é absolutamente insuportável e desnecessário, não há somente um conflito interno dele sobre ele estar falido e morando de favor, por ter perdido o irmão e por não ter perspectiva de vida além de bancar um parasita social. No máximo, essas questões são abordadas com piadinhas e tiradas de sarro, num tom irônico sem profundidade.
Eu realmente espero que se siga o rumo que tomou ao final, a série tomaria uma guinada se a Nancy se relacionar com o Peter, possivelmente se esquivando de possíveis investigações. Seria realmente uma boa se o plano do Conrad fosse levado a sério -- aquela padaria e o Sanjay não têm futuro narrativo -- e, finalmente, não haveria a sitcom intrometida. Talvez eu dê uma chance pra segunda temporada futuramente. Por favor, abandone o humor barato e foque no tímido drama.
Game of Thrones (7ª Temporada)
4.1 1,2K Assista AgoraEu tenho um sentimento muito agridoce em relação a essa temporada. Por mais que tenha tido ((((((INÚMEROS))))) momentos para agradar nós fãs, eu não conseguia afastar a derradeira e inevitável sensação de previsibilidade. Sim, infelizmente, a série mais surpreendente e inovadora em termos de narrativa e descaso com as expectativas alheias se tornou terrivelmente previsível.
Jon (((((Aegon Targaryen é o caralho))))) e Daenerys viraram um casal para o meu mais profundo desgosto — a expressão de pesar na cara do Tyrion sou eu todinho. A Cersei planeja enfiar uma faca nas costas de todo mundo em detrimento de seu enaltecimento egoico. O Inverno finalmente chegou e a Muralha caiu, como todos antecipávamos. Personagens desnecessários continuam vivos a troco de nada (((((((ALÔ INÚTIL ESTUPRADOR INCESTUOSO JAIME LANNISTER)))))), outros queridíssimos morreram também a troco de nada — coitado do meu precioso Tormund, nunca vai ter filhos gigantes com a Brienne. Deixo claro que enquanto a Muralha caía eu só conseguia pensar no selvagem ruivo e no quanto ele poderia ajudar o Jon nas batalhas vindouras. Theon Greyjoy continua pagando de vira casaca indeciso sem vontade própria alguma, sempre tentando corresponder às expectativas alheias. Bran teve o diálogo expositivo mais desnecessário da temporada, ainda mais do que aquele do Tyrion explicando a invasiva dos Imaculados em Casterly Rock — essa conversa deveria, em termos de coerência narrativa, ter sido deixada para ter com o Jon, ainda que eu fique me perguntando qual a utilidade disso, já que não seria feitio dele assumir o Trono — fora que ninguém aguenta mais essa postura pretensiosa e comunicação metafórica (((((PORRA SE VC TUDO VÊ COMO VC AINDA FICA SURPRESO COM O QUE O SAM TINHA A DIZER?????)))))). Apesar de todas essas cagadas, fiquei extremamente grato com os diversos reencontros, a conciliação final entre a Sansa e a Arya (((((SISTER POWER PORRA)))) e, claro, com morte do pífio e miserável Mindinho. Foi tarde, querido. De qualquer forma, por mais que eu fique contente com diversos personagens queridos ainda, milagrosa e forçosamente vivos, sinto que para honrar tudo o que foi estabelecido nas temporadas anteriores, uma galera aí já deveria ter ido pra cova, facilmente incluindo Pod, Bronn, Yara, Cão, Bran, Beric, Jorah e, sim, Jon Snow, meu personagem preferido — ele já tá imortal.