Sinto um certo alívio ao assistir Além da Linha Vermelha, já que era o Malick que eu estava devendo e alívio por ter mais um filmaço do diretor para indicar. Terrence Malick não apenas fez uma das maiores críticas à insanidade da guerra como teceu mais uma de suas investigações sobre a alma humana, isso com a trilha sonora de Hans Zimmer em um dos melhores trabalhos de sua carreira e um elenco que qualquer diretor mataria para ter, sendo interessante ver o embate entre a espiritualidade de Jim Caviezel e o cinismo de Sean Penn, que rima com a temática do filme que lida com a questão Homem versus Natureza, dando ainda a entender que mesmo sendo pertencentes à lados opostos, ambos se completam; Nick Nolte também é um show a parte, sendo a escada que Malick utiliza para fazer as mais interessantes críticas à hipocrisia da guerra. Mas vale lembrar que, como todo trabalho do realizador, Além da Linha Vermelha é um filme difícil de se apreciar, seja pela complexidade dos temas abordados ou pela estrutura narrativa, que está mais próxima de uma colcha de retalhos de pensamentos e emoções do que uma narrativa tradicional que serve como entretenimento fácil e rápido.
Como todo filme de Gaspar Noé, Enter The Void é perturbador não apenas em sua temática, mas a nível sensorial. Tanto que o mal-estar sentido com as imagens não se dá apenas na movimentação vertiginosa da câmera, presente também em Irreversível, como no uso de cores berrantes que remetem à uma nada agradável viagem psicodélica, sendo um contraponto interessante à sequência "stargate" de 2001: Uma Odisseia no Espaço, filme que influenciou o argentino a se tornar um cineasta, segundo o mesmo. Fale citar também a imersão causada pelo estilo de filmagem adotado por Noé: uma câmera em primeira pessoa que simula de maneira muito orgânica o olhar de seu protagonista, cuja jornada não revelarei nada sobre para evitar spoilers aos desavisados, apenas que ela tem algumas quebras que a deixam desinteressante do meio para o final. Mas que fique registrado que Enter The Void é uma experiência única no cinema, sendo extremamente incômoda e, para os mais pacientes e atentos espectadores, altamente reflexiva.
Godard. Truffaut. Bergman. Bresson. Antonioni...Bertolucci. Os Sonhadores é um verdadeiro filme de cinéfilos para cinéfilos que evoca o estado de espírito da França à época dos protestos de 68. Como em Último Tango em Paris, Bertolucci constrói uma obra carregada de erotismo alienante em meio a um conturbado contexto sociopolítico, não deixando explícita sua postura sobre este tipo de hedonismo, se deve ser criticado ou exaltado. A diferença é que Os Sonhadores não conta com atuações viscerais de um Marlon Brando ou de uma Maria Schneider. Por enquanto, Os Sonhadores é o último filme relevante de um dos cineastas mais polêmicos da história. PS: Theo está certo, Chaplin é incomparável.
Além de crítica ao conservadorismo religioso, Má Educação é o mais masculino e complexo filme de Pedro Almodóvar, com roteiro labiríntico que faz bom uso de narrativa circular e os tradicionais plot twists almodóvarianos que certamente vão incomodar os espectadores mais reacionários. Mesmo assim, os personagens não têm o mesmo carisma que outras criações do diretor e isso contando com a atuação esforçada de Gael García Bernal. Um excelente Almodóvar, mas longe de ser um dos melhores.
Dos poucos filmes do coreano Kim Ki-Duk que conferi, Pietá é o "pior" deles. Kim Ki-Duk está irreconhecível em sua direção, que não possui o mesmo esmero visual de Primavera, Verão... ou a sensibilidade temática de Casa Vazia. É um filme cru que visa se aproximar da realidade o máximo possível, dado o uso frequente de câmera na mão, com personagens complexos, mas que tem o pecado de utilizar em alguns momentos artifícios tão rasteiros quanto melodrama artificial e violência por vezes injustificada, quase jogando fora a complexidade que o diretor insere em seus personagens para fazer algo maniqueísta. Quase. Sorte de Pietá que mesmo o filme tendo momentos sofríveis, a maior parte da projeção é realmente espetacular. Certamente não mereceu o Leão de Ouro, em Veneza. O Mestre, de Paul Thomas Anderson, é um filme superior à Pietá tanto em relação à forma quanto no conteúdo e deveria ter sido laureado pelo cobiçado prêmio. Mas respeito a decisão do júri, que não fez a melhor escolha, mas ainda assim fez uma boa escolha.
Casa Vazia é entre outras coisas, uma fábula sobre o amor. Amor que dispensa completamente o uso de palavras, manifestando-se através de gestos e ações, ou seja através de imagens. Imagens que ilustram, num primeiro momento o vazio na vida dos personagens e em outro, sentimento de encontro à felicidade dos personagens através do já citado amor silencioso que vivem. E interessante notar como os dois amantes se completam: ela, prisioneira em sua própria casa, deseja se libertar desta condição de dona-de-casa imposta por seu autoritário marido, ela quer ser independente; ele, solitário em sua liberdade, deseja compartilhar esta liberdade com alguém, se tornando mais que um mero fantasma invasor de domicílios e se tornando um ser humano capaz de amar e ser amado. Só não entendi muito bem o envolvimento do golfe na narrativa, não faço ideia do que Kim Ki-Duk quis dizer com estas sequências.
Concluindo a Trilogia da Vingança, Lady Vingança é um espetáculo visual, facilmente o filme de Park Chan-wook que mais preza pela estética com planos muito bem arquitetados que contam toda uma narrativa por trás deles, narrativa que se não fosse pela direção do coreano, Lady Vingança seria apenas um filme medíocre, já que o roteiro não é tão bem trabalhado quanto em Oldboy, embora as motivação para a vingança seja a mais interessante de se acompanhar dos três filmes, seja pela já citada estética ou pela atuação marcante da protagonista. Um final antológico para uma das mais antológicas trilogias do cinema.
Mesmo sendo o elo mais fraco da Trilogia da Vingança de Park Chan-wook, Mr. Vingança ainda tem muito a oferecer enquanto obra cinematográfica com uma narrativa repleta de violência, seja psicológica ou física, mas que conta com uma estética muito bem desenvolvida com planos surpreendentemente belos, apesar da violência presente nos mesmos, sendo ainda mais suavizados por um humor negro que ocasionalmente dá as caras, conseguindo o efeito desejado em alguns momentos e em outros apenas deixando a situação ainda mais perturbadora, o que de certa forma também foi intenção do diretor. Enfim, um filme que merecidamente faz parte de uma das maiores trilogias da história do cinema.
Da última leva de filmes do Woody Allen, eis o seu maior êxito. Paris é uma das poucas substitutas dignas de NY como palco das desventuras seu alter-ego neurótico. Alter-ego interpretado por Owen Wilson, que consegue emular todos os trejeitos da neurose judaica alleniana, embora esteja longe de ser mais carismático que o próprio Allen quando ainda atuava nas douradas décadas de 70 e 80 (que irônico eu comentar isso logo aqui, não?). Mas o que mais chama a atenção em Meia-Noite em Paris são as figuras artísticas que permeiam a obra, Hemingway, Fitzgerald, Picasso, Dalí e até Buñuel estão presentes em uma obra repleta de piadas inteligentes como todo bom filme do diretor.
A Rosa Púrpura do Cairo é nada mais que nostalgia e simpatia em forma de filme. Nostalgia por homenagear um tipo de cinema que nunca mais veremos novamente. Simpatia por exemplificar para nós quão intenso pode ser o amor de um indivíduo por esta maravilhosa arte que é o cinema, tão intenso que ultrapassa literalmente as barreiras entre realidade e ficção. E interessante notar que a própria arte, personificada na figura do personagem de Jeff Daniels, retribui este amor de maneira tão fascinante, como se aquele novo mundo a ser desbravado com a sua amada admiradora, que nada mais é do que a cinefilia em forma de Mia Farrow, fosse a mais desafiadora de suas aventuras fílmicas. Em suma, é um filme escrito por um Woody Allen leve e sincero, com trilha sonora apaixonante e casal de protagonistas improvável, cuja dinâmica entre ambos rendem momentos belíssimos que garantem ao espectador um inabalável sorriso de satisfação durante a projeção e um certo sentimento de melancolia pelo fim da sessão.
A Pele que Habito é diferente de tudo que Pedro Almodóvar havia feito até então. As cores vivas e quentes características de sua obra são substituídas por uma fotografia monocromática remetendo à frieza de seu peculiar protagonista, interpretado de maneira competente por Antonio Banderas. Falando em personagens peculiares, a construção de personagens também acaba sendo peculiar; não há Agrados, Benignos ou Raimundas aqui, os personagens foram construídos com carisma zero, algo feito propositalmente, já que os rumos que a trama toma não permite tal aproximação com os mesmos. Ainda assim, é um dos filmes mais profundos de Almodóvar, que disserta sobre a questão da identidade e como nós temos a tendência de ligar este tipo de questão com o aspecto físico. E um plot twist quase que imprevisível se não fosse por algumas pistas do diretor.
Almodóvar é um dos poucos cineastas que consegue filmar de maneira tão sensível situações moralmente complexas, fazendo com que o público se compadeça pelos problemas de seus personagens sem qualquer tipo de julgamento, algo que certamente aconteceria nas mãos de um diretor que não tem o mesmo talento ou paixão pelo cinema que o espanhol tem. Belo filme que dá um novo olhar à valores preciosos para a humanidade como o amor e a amizade com uma fotografia marcante pelas cores vivas que parecem pulsar para fora da tela e trilha sonora que complementa muito bem os já belíssimos planos encontrados em toda a película.
Amor...Vingança...Culpa...Vida. Dos filmes da trilogia de Iñarritu, eis o mais pesado, já que diferente dos outros dois, não há um momento de afago para os personagens, fato corroborado pela fotografia onde as cores frias predominam. E também as atuações. Se olharmos com mais cuidado para os semblantes de Penn, Del Toro e Watts, é possível ver expressões de dor e perda irreparáveis em busca de redenção, ou pelo menos de um simples conforto que eles e o espectador sabem que dificilmente vai vir, mas que ainda assim é do senso comum de todos preservar esta tola esperança. Mesmo eu não tendo caído em lágrimas, 21 Gramas foi uma experiência emocional dolorosa e que certamente pesou muito mais que uma barra de chocolate ou um beija-flor. Foi o peso de uma vida inteira. PS: Arriaga, faça as pazes com Iñárriru, o cinema agradece.
São poucos os cineastas que em sua estreia conseguem mostrar a que vieram. Não apenas isso como, por bem ou por mal, Amores Brutos é o melhor filme do mexicano Alejandro G. Iñárritu. Atuações que chegam ao ápice dramático somente quando o filme pede isso (diferente do megalomaníaco Babel, que em certos momentos "força a amizade"); roteiro de Guillermo Arriaga que utiliza de narrativa tanto polifônica quanto circular de maneira muito bem estruturada; montagem espetacular que faz total diferença nas cenas das rinhas caninas e fotografia não tão marcante em relação à palheta de cores, mas que faz rimas visuais que complementam muito bem os planos.
Emocionalmente devastador e visualmente arrebatador, Valsa com Bashir é um documento histórico em forma de animação de narrativa imersiva, não só fazendo o espectador mergulhar de cabeça em seu universo como compartilhando imagens do horror da guerra que dificilmente vão sair de sua cabeça tão cedo.
O Demônio das Onze Horas pode ser definido como o primeiro ponto de ruptura na carreira de Jean-Luc Godard, onde as "brincadeiras" com os aspectos técnicos como montagem e fotografia (realizada por Raoul Coutard, parceiro de longa data de Godard em um trabalho que economiza na variedade de cores, mas de maneira funcional para a narrativa) não só permeiam toda a obra como são mais importantes que a própria trama inspirada como sempre no cinema policial americano. Do pouco que se é possível compreender de maneira lógica da narrativa, vemos uma crítica à burguesia literalmente monocromática e ao imperialismo americano (temática que se repete em obras posteriores como 2 ou 3 Coisas que Eu Sei Dela) utilizando do principal acontecimento político da época: a Guerra do Vietnã, satirizada em uma das cenas mais geniais que JLG pode nos proporcionar.
"O encontro entre Alice e Franz Kafka". É assim que Godard descreve sua própria obra. Descrição que faz sentido pela temática que Bande à Part carrega sobre um indivíduo (no caso, a maravilhosa Anna Karina) que repentinamente é inserido em um contexto opressor e absurdo, embora Bande à Parte não chegue a ser uma obra surrealista como A Metamorfose ou lisérgica como Alice. Além de ter algumas das cenas mais icônicas da filmografia do diretor: a corrida no Louvre, o "minuto" de silêncio, a dança; todas referenciadas em filmes posteriores de nomes de peso como Bertolucci e Tarantino, fazendo deste filme uma das obras essenciais para o currículo de qualquer cinéfilo.
O Desprezo talvez seja a mais metalinguística obra de JLG, evocando as glórias do passado cinematográfico-artístico refletido nas figuras da cultura greco-romana que permeiam todo o filme e também em Fritz Lang, lenda do cinema alemão que interpreta a si mesmo. Também ilustra o presente, sugerindo uma espécie de crise criativa de Paul Javal (alter-ego de Godard e ao mesmo tempo personificação do cinema europeu) e da indústria cinematográfica; tendo ainda falta de comunicação entre Paul e o carismático ególatra e megalomaníaco Jeremy Prokosch (representação da indústria hollywoodiana), considerando que a comunicação entre eles se dá através de uma tradutora. Falar sobre a beleza de Bardot é redundante e sua atuação é competente, embora Anna Karina faça falta em uma produção de Godard. Para finalizar, gostaria de destacar a fotografia de Raoul Coutard, que consegue ser funcional à sua narrativa e esteticamente fascinante.
A câmera de mão vertiginosa utilizada em Festa de Família conforme regrado no Manifesto Dogma 95 encaixa como uma luva para criar o clima de tensão e desestruturação familiar. Vinterberg utiliza de ângulos inusitados para compensar o amadorismo e o baixo orçamento da produção, tecendo críticas inteligentes à hipocrisia burguesa europeia remetendo ao saudoso mestre Buñuel.
Uma mãe e uma filha. Duas almas angustiadas aguardando perdão mútuo. E Bergman. Bergman aqui não só realiza o habitual estudo sobre a natureza humana como também levanta questões sobre a instituição familiar e sobre até que ponto ela não passa apenas de uma convenção social fadada ao fracasso. Destaque para o trio de atrizes que dão um show de atuação, fazendo-se uso exemplar de olhares e gestos que aparentam carregar um turbilhão de sentimentos reprimidos e para o trabalho de fotografia de Sven Nykvist, que concede ao expectador diversos planos dignos de serem emoldurados.
Assistindo novamente esta maravilha, percebo que este filme é melhor do que eu lembrava, porém um questionamento me veio à tona. Não seria hipocrisia do diretor (que anteriormente trabalhou em comerciais, videoclipes e afins) e do próprio filme em si fazer todas estas críticas ao sistema, sendo que ambos não só estão inseridos no sistema que eles tanto criticam como podem ser vistos como engrenagem que auxilia na manutenção do mesmo; afinal, Clube da Luta não é um filme independente (custou 60 milhões e arrecadou 100) e foi distribuído pela 20th Century Fox, um dos maiores estúdios de Hollywood.
O esoterismo e o exploitation característicos de Jodorowsky aqui estão mais visualmente arrebatadores que nunca, muito por conta das mise-èn-scene construída de maneira muito criativa e inusitada, que reflete diretamente em sua narrativa. Narrativa esta que como em outras obras do chileno é carregada de críticas ao pensamento conservador e às instituições religiosas e estatais, mas sendo acima de tudo uma obra sobre libertação espiritual com uma conclusão antológica. O melhor filme do Jodorowsky? Com certeza.
Milos Forman já havia dado sua contribuição para a contracultura com Um Estranho no Ninho. Em Hair, esta contribuição não só é mais explícita como ocorre de maneira mais leve e divertida, afinal estamos falando de um musical. E que musical! Não só as músicas são muito bem executadas (Aquarius leva certa vantagem) como pontuam o teor político da obra, que critica com todas as letras o absurdo que foi a Guerra do Vietnã e ressalta as qualidades (e alguns defeitos) da ideologia hippie. Destaque para a atuação do Treat Williams como o hippie mais carismático da história do cinema que aparentemente não fez mais nada de relevante depois, uma pena.
Finalizando a Trilogia do Apartamento, O Inquilino cria seu clima paranoico dissertando sobre a condição do imigrante chegando em território hostil, diferente dos filmes anteriores da trilogia que abordam a histeria feminina em meio ao machismo. Em suma, é um excelente thriller polanskiano que consegue fechar bem a trilogia, embora seja o menos interessante dela.
Além da Linha Vermelha
3.9 382 Assista AgoraSinto um certo alívio ao assistir Além da Linha Vermelha, já que era o Malick que eu estava devendo e alívio por ter mais um filmaço do diretor para indicar. Terrence Malick não apenas fez uma das maiores críticas à insanidade da guerra como teceu mais uma de suas investigações sobre a alma humana, isso com a trilha sonora de Hans Zimmer em um dos melhores trabalhos de sua carreira e um elenco que qualquer diretor mataria para ter, sendo interessante ver o embate entre a espiritualidade de Jim Caviezel e o cinismo de Sean Penn, que rima com a temática do filme que lida com a questão Homem versus Natureza, dando ainda a entender que mesmo sendo pertencentes à lados opostos, ambos se completam; Nick Nolte também é um show a parte, sendo a escada que Malick utiliza para fazer as mais interessantes críticas à hipocrisia da guerra. Mas vale lembrar que, como todo trabalho do realizador, Além da Linha Vermelha é um filme difícil de se apreciar, seja pela complexidade dos temas abordados ou pela estrutura narrativa, que está mais próxima de uma colcha de retalhos de pensamentos e emoções do que uma narrativa tradicional que serve como entretenimento fácil e rápido.
Enter The Void: Viagem Alucinante
4.0 870Como todo filme de Gaspar Noé, Enter The Void é perturbador não apenas em sua temática, mas a nível sensorial. Tanto que o mal-estar sentido com as imagens não se dá apenas na movimentação vertiginosa da câmera, presente também em Irreversível, como no uso de cores berrantes que remetem à uma nada agradável viagem psicodélica, sendo um contraponto interessante à sequência "stargate" de 2001: Uma Odisseia no Espaço, filme que influenciou o argentino a se tornar um cineasta, segundo o mesmo. Fale citar também a imersão causada pelo estilo de filmagem adotado por Noé: uma câmera em primeira pessoa que simula de maneira muito orgânica o olhar de seu protagonista, cuja jornada não revelarei nada sobre para evitar spoilers aos desavisados, apenas que ela tem algumas quebras que a deixam desinteressante do meio para o final. Mas que fique registrado que Enter The Void é uma experiência única no cinema, sendo extremamente incômoda e, para os mais pacientes e atentos espectadores, altamente reflexiva.
Os Sonhadores
4.1 2,0K Assista AgoraGodard. Truffaut. Bergman. Bresson. Antonioni...Bertolucci. Os Sonhadores é um verdadeiro filme de cinéfilos para cinéfilos que evoca o estado de espírito da França à época dos protestos de 68. Como em Último Tango em Paris, Bertolucci constrói uma obra carregada de erotismo alienante em meio a um conturbado contexto sociopolítico, não deixando explícita sua postura sobre este tipo de hedonismo, se deve ser criticado ou exaltado. A diferença é que Os Sonhadores não conta com atuações viscerais de um Marlon Brando ou de uma Maria Schneider. Por enquanto, Os Sonhadores é o último filme relevante de um dos cineastas mais polêmicos da história.
PS: Theo está certo, Chaplin é incomparável.
Má Educação
4.2 1,1K Assista AgoraAlém de crítica ao conservadorismo religioso, Má Educação é o mais masculino e complexo filme de Pedro Almodóvar, com roteiro labiríntico que faz bom uso de narrativa circular e os tradicionais plot twists almodóvarianos que certamente vão incomodar os espectadores mais reacionários. Mesmo assim, os personagens não têm o mesmo carisma que outras criações do diretor e isso contando com a atuação esforçada de Gael García Bernal. Um excelente Almodóvar, mas longe de ser um dos melhores.
Pietá
3.8 199 Assista AgoraDos poucos filmes do coreano Kim Ki-Duk que conferi, Pietá é o "pior" deles. Kim Ki-Duk está irreconhecível em sua direção, que não possui o mesmo esmero visual de Primavera, Verão... ou a sensibilidade temática de Casa Vazia. É um filme cru que visa se aproximar da realidade o máximo possível, dado o uso frequente de câmera na mão, com personagens complexos, mas que tem o pecado de utilizar em alguns momentos artifícios tão rasteiros quanto melodrama artificial e violência por vezes injustificada, quase jogando fora a complexidade que o diretor insere em seus personagens para fazer algo maniqueísta. Quase. Sorte de Pietá que mesmo o filme tendo momentos sofríveis, a maior parte da projeção é realmente espetacular. Certamente não mereceu o Leão de Ouro, em Veneza. O Mestre, de Paul Thomas Anderson, é um filme superior à Pietá tanto em relação à forma quanto no conteúdo e deveria ter sido laureado pelo cobiçado prêmio. Mas respeito a decisão do júri, que não fez a melhor escolha, mas ainda assim fez uma boa escolha.
Casa Vazia
4.2 409Casa Vazia é entre outras coisas, uma fábula sobre o amor. Amor que dispensa completamente o uso de palavras, manifestando-se através de gestos e ações, ou seja através de imagens. Imagens que ilustram, num primeiro momento o vazio na vida dos personagens e em outro, sentimento de encontro à felicidade dos personagens através do já citado amor silencioso que vivem. E interessante notar como os dois amantes se completam: ela, prisioneira em sua própria casa, deseja se libertar desta condição de dona-de-casa imposta por seu autoritário marido, ela quer ser independente; ele, solitário em sua liberdade, deseja compartilhar esta liberdade com alguém, se tornando mais que um mero fantasma invasor de domicílios e se tornando um ser humano capaz de amar e ser amado. Só não entendi muito bem o envolvimento do golfe na narrativa, não faço ideia do que Kim Ki-Duk quis dizer com estas sequências.
Lady Vingança
4.0 456Concluindo a Trilogia da Vingança, Lady Vingança é um espetáculo visual, facilmente o filme de Park Chan-wook que mais preza pela estética com planos muito bem arquitetados que contam toda uma narrativa por trás deles, narrativa que se não fosse pela direção do coreano, Lady Vingança seria apenas um filme medíocre, já que o roteiro não é tão bem trabalhado quanto em Oldboy, embora as motivação para a vingança seja a mais interessante de se acompanhar dos três filmes, seja pela já citada estética ou pela atuação marcante da protagonista. Um final antológico para uma das mais antológicas trilogias do cinema.
Mr. Vingança
4.0 408Mesmo sendo o elo mais fraco da Trilogia da Vingança de Park Chan-wook, Mr. Vingança ainda tem muito a oferecer enquanto obra cinematográfica com uma narrativa repleta de violência, seja psicológica ou física, mas que conta com uma estética muito bem desenvolvida com planos surpreendentemente belos, apesar da violência presente nos mesmos, sendo ainda mais suavizados por um humor negro que ocasionalmente dá as caras, conseguindo o efeito desejado em alguns momentos e em outros apenas deixando a situação ainda mais perturbadora, o que de certa forma também foi intenção do diretor. Enfim, um filme que merecidamente faz parte de uma das maiores trilogias da história do cinema.
Meia-Noite em Paris
4.0 3,8K Assista AgoraDa última leva de filmes do Woody Allen, eis o seu maior êxito. Paris é uma das poucas substitutas dignas de NY como palco das desventuras seu alter-ego neurótico. Alter-ego interpretado por Owen Wilson, que consegue emular todos os trejeitos da neurose judaica alleniana, embora esteja longe de ser mais carismático que o próprio Allen quando ainda atuava nas douradas décadas de 70 e 80 (que irônico eu comentar isso logo aqui, não?). Mas o que mais chama a atenção em Meia-Noite em Paris são as figuras artísticas que permeiam a obra, Hemingway, Fitzgerald, Picasso, Dalí e até Buñuel estão presentes em uma obra repleta de piadas inteligentes como todo bom filme do diretor.
A Rosa Púrpura do Cairo
4.1 590 Assista AgoraA Rosa Púrpura do Cairo é nada mais que nostalgia e simpatia em forma de filme. Nostalgia por homenagear um tipo de cinema que nunca mais veremos novamente. Simpatia por exemplificar para nós quão intenso pode ser o amor de um indivíduo por esta maravilhosa arte que é o cinema, tão intenso que ultrapassa literalmente as barreiras entre realidade e ficção. E interessante notar que a própria arte, personificada na figura do personagem de Jeff Daniels, retribui este amor de maneira tão fascinante, como se aquele novo mundo a ser desbravado com a sua amada admiradora, que nada mais é do que a cinefilia em forma de Mia Farrow, fosse a mais desafiadora de suas aventuras fílmicas. Em suma, é um filme escrito por um Woody Allen leve e sincero, com trilha sonora apaixonante e casal de protagonistas improvável, cuja dinâmica entre ambos rendem momentos belíssimos que garantem ao espectador um inabalável sorriso de satisfação durante a projeção e um certo sentimento de melancolia pelo fim da sessão.
A Pele que Habito
4.2 5,1K Assista AgoraA Pele que Habito é diferente de tudo que Pedro Almodóvar havia feito até então. As cores vivas e quentes características de sua obra são substituídas por uma fotografia monocromática remetendo à frieza de seu peculiar protagonista, interpretado de maneira competente por Antonio Banderas. Falando em personagens peculiares, a construção de personagens também acaba sendo peculiar; não há Agrados, Benignos ou Raimundas aqui, os personagens foram construídos com carisma zero, algo feito propositalmente, já que os rumos que a trama toma não permite tal aproximação com os mesmos. Ainda assim, é um dos filmes mais profundos de Almodóvar, que disserta sobre a questão da identidade e como nós temos a tendência de ligar este tipo de questão com o aspecto físico. E um plot twist quase que imprevisível se não fosse por algumas pistas do diretor.
Fale com Ela
4.2 1,0K Assista AgoraAlmodóvar é um dos poucos cineastas que consegue filmar de maneira tão sensível situações moralmente complexas, fazendo com que o público se compadeça pelos problemas de seus personagens sem qualquer tipo de julgamento, algo que certamente aconteceria nas mãos de um diretor que não tem o mesmo talento ou paixão pelo cinema que o espanhol tem. Belo filme que dá um novo olhar à valores preciosos para a humanidade como o amor e a amizade com uma fotografia marcante pelas cores vivas que parecem pulsar para fora da tela e trilha sonora que complementa muito bem os já belíssimos planos encontrados em toda a película.
21 Gramas
4.0 888 Assista AgoraAmor...Vingança...Culpa...Vida. Dos filmes da trilogia de Iñarritu, eis o mais pesado, já que diferente dos outros dois, não há um momento de afago para os personagens, fato corroborado pela fotografia onde as cores frias predominam. E também as atuações. Se olharmos com mais cuidado para os semblantes de Penn, Del Toro e Watts, é possível ver expressões de dor e perda irreparáveis em busca de redenção, ou pelo menos de um simples conforto que eles e o espectador sabem que dificilmente vai vir, mas que ainda assim é do senso comum de todos preservar esta tola esperança. Mesmo eu não tendo caído em lágrimas, 21 Gramas foi uma experiência emocional dolorosa e que certamente pesou muito mais que uma barra de chocolate ou um beija-flor. Foi o peso de uma vida inteira.
PS: Arriaga, faça as pazes com Iñárriru, o cinema agradece.
Amores Brutos
4.2 818 Assista AgoraSão poucos os cineastas que em sua estreia conseguem mostrar a que vieram. Não apenas isso como, por bem ou por mal, Amores Brutos é o melhor filme do mexicano Alejandro G. Iñárritu. Atuações que chegam ao ápice dramático somente quando o filme pede isso (diferente do megalomaníaco Babel, que em certos momentos "força a amizade"); roteiro de Guillermo Arriaga que utiliza de narrativa tanto polifônica quanto circular de maneira muito bem estruturada; montagem espetacular que faz total diferença nas cenas das rinhas caninas e fotografia não tão marcante em relação à palheta de cores, mas que faz rimas visuais que complementam muito bem os planos.
Por exemplo, após Valeria ter sua perna amputada, ser mostrado um outdoor da mesma com uma das pernas encoberta por uma árvore. Sutil, mas eficaz.
Valsa com Bashir
4.2 305 Assista AgoraEmocionalmente devastador e visualmente arrebatador, Valsa com Bashir é um documento histórico em forma de animação de narrativa imersiva, não só fazendo o espectador mergulhar de cabeça em seu universo como compartilhando imagens do horror da guerra que dificilmente vão sair de sua cabeça tão cedo.
O Demônio das Onze Horas
4.2 431 Assista AgoraO Demônio das Onze Horas pode ser definido como o primeiro ponto de ruptura na carreira de Jean-Luc Godard, onde as "brincadeiras" com os aspectos técnicos como montagem e fotografia (realizada por Raoul Coutard, parceiro de longa data de Godard em um trabalho que economiza na variedade de cores, mas de maneira funcional para a narrativa) não só permeiam toda a obra como são mais importantes que a própria trama inspirada como sempre no cinema policial americano. Do pouco que se é possível compreender de maneira lógica da narrativa, vemos uma crítica à burguesia literalmente monocromática e ao imperialismo americano (temática que se repete em obras posteriores como 2 ou 3 Coisas que Eu Sei Dela) utilizando do principal acontecimento político da época: a Guerra do Vietnã, satirizada em uma das cenas mais geniais que JLG pode nos proporcionar.
O Bando à Parte
4.1 211"O encontro entre Alice e Franz Kafka". É assim que Godard descreve sua própria obra. Descrição que faz sentido pela temática que Bande à Part carrega sobre um indivíduo (no caso, a maravilhosa Anna Karina) que repentinamente é inserido em um contexto opressor e absurdo, embora Bande à Parte não chegue a ser uma obra surrealista como A Metamorfose ou lisérgica como Alice. Além de ter algumas das cenas mais icônicas da filmografia do diretor: a corrida no Louvre, o "minuto" de silêncio, a dança; todas referenciadas em filmes posteriores de nomes de peso como Bertolucci e Tarantino, fazendo deste filme uma das obras essenciais para o currículo de qualquer cinéfilo.
O Desprezo
4.0 266O Desprezo talvez seja a mais metalinguística obra de JLG, evocando as glórias do passado cinematográfico-artístico refletido nas figuras da cultura greco-romana que permeiam todo o filme e também em Fritz Lang, lenda do cinema alemão que interpreta a si mesmo. Também ilustra o presente, sugerindo uma espécie de crise criativa de Paul Javal (alter-ego de Godard e ao mesmo tempo personificação do cinema europeu) e da indústria cinematográfica; tendo ainda falta de comunicação entre Paul e o carismático ególatra e megalomaníaco Jeremy Prokosch (representação da indústria hollywoodiana), considerando que a comunicação entre eles se dá através de uma tradutora. Falar sobre a beleza de Bardot é redundante e sua atuação é competente, embora Anna Karina faça falta em uma produção de Godard. Para finalizar, gostaria de destacar a fotografia de Raoul Coutard, que consegue ser funcional à sua narrativa e esteticamente fascinante.
Festa de Família
4.2 397 Assista AgoraA câmera de mão vertiginosa utilizada em Festa de Família conforme regrado no Manifesto Dogma 95 encaixa como uma luva para criar o clima de tensão e desestruturação familiar. Vinterberg utiliza de ângulos inusitados para compensar o amadorismo e o baixo orçamento da produção, tecendo críticas inteligentes à hipocrisia burguesa europeia remetendo ao saudoso mestre Buñuel.
Sonata de Outono
4.5 492Uma mãe e uma filha. Duas almas angustiadas aguardando perdão mútuo. E Bergman. Bergman aqui não só realiza o habitual estudo sobre a natureza humana como também levanta questões sobre a instituição familiar e sobre até que ponto ela não passa apenas de uma convenção social fadada ao fracasso. Destaque para o trio de atrizes que dão um show de atuação, fazendo-se uso exemplar de olhares e gestos que aparentam carregar um turbilhão de sentimentos reprimidos e para o trabalho de fotografia de Sven Nykvist, que concede ao expectador diversos planos dignos de serem emoldurados.
Clube da Luta
4.5 4,9K Assista AgoraAssistindo novamente esta maravilha, percebo que este filme é melhor do que eu lembrava, porém um questionamento me veio à tona. Não seria hipocrisia do diretor (que anteriormente trabalhou em comerciais, videoclipes e afins) e do próprio filme em si fazer todas estas críticas ao sistema, sendo que ambos não só estão inseridos no sistema que eles tanto criticam como podem ser vistos como engrenagem que auxilia na manutenção do mesmo; afinal, Clube da Luta não é um filme independente (custou 60 milhões e arrecadou 100) e foi distribuído pela 20th Century Fox, um dos maiores estúdios de Hollywood.
A Montanha Sagrada
4.3 467 Assista AgoraO esoterismo e o exploitation característicos de Jodorowsky aqui estão mais visualmente arrebatadores que nunca, muito por conta das mise-èn-scene construída de maneira muito criativa e inusitada, que reflete diretamente em sua narrativa. Narrativa esta que como em outras obras do chileno é carregada de críticas ao pensamento conservador e às instituições religiosas e estatais, mas sendo acima de tudo uma obra sobre libertação espiritual com uma conclusão antológica. O melhor filme do Jodorowsky? Com certeza.
Hair
4.1 526 Assista AgoraMilos Forman já havia dado sua contribuição para a contracultura com Um Estranho no Ninho. Em Hair, esta contribuição não só é mais explícita como ocorre de maneira mais leve e divertida, afinal estamos falando de um musical. E que musical! Não só as músicas são muito bem executadas (Aquarius leva certa vantagem) como pontuam o teor político da obra, que critica com todas as letras o absurdo que foi a Guerra do Vietnã e ressalta as qualidades (e alguns defeitos) da ideologia hippie. Destaque para a atuação do Treat Williams como o hippie mais carismático da história do cinema que aparentemente não fez mais nada de relevante depois, uma pena.
O Inquilino
4.0 292Finalizando a Trilogia do Apartamento, O Inquilino cria seu clima paranoico dissertando sobre a condição do imigrante chegando em território hostil, diferente dos filmes anteriores da trilogia que abordam a histeria feminina em meio ao machismo. Em suma, é um excelente thriller polanskiano que consegue fechar bem a trilogia, embora seja o menos interessante dela.