Basicamente a máxima nem tão hipotética, distante ou distópica assim de quando você deixa de ler os termos de condição e uso de um aplicativo ou site, e isso se acumula por anos e anos e milhões de pessoas apenas marcando o “Li e concordo”, somado ao terror do “Por favor, espere. Um atendente humano estará com você em breve” como musiquinhas animadas intermináveis e desesperadoras, como ficar preso num loop. Aqui, o protagonista é preso por uma razão jamais dita numa sociedade em que tudo, tudo mesmo, é feito por drones, que procuram, prendem, levam à prisão, algoritmos, até de advogados e simulações de julgamentos, e vozes digitais na TV. Quase como um “15 Milhões de Méritos” de Black Mirror ainda mais “próximo” e com um toque assustador pela estética menos “limpa” e com tecnologias e ativos que temos hoje em dia. Pontua bem como até mesmo quando se excluem os humanos da equação policial-prisional “erros” seguem acontecendo contra pessoas não-brancas como continuidade da sistematização do racismo estadunidense (mostrado no documentário “Time” indicado ao Oscar passado) e das falhas/omissões de tratamento, funcionalidade, informação e culpabilização do/no sistema prisional (em várias vertentes, até na exploração laboral, como em que ele faz peças de bordado por apenas 1 centavo cada). É a desumanização da automação na digitalização societal. E estamos acompanhando esse processo a cada dia. Bem que poderia virar um longa, porque parece curto (e inconclusivo) demais para o tema.
“Sobre o seu filme, acho que ninguém vai querer vê-lo. Possivelmente, poderá ser muito tedioso de assistir.” Senhora Bromberg, a única sensata aqui, só faltou falar que também seria muito egocêntrico, autoindulgente e muitíssimo pouco interessante. Apenas um conjunto de (vagas e repetitivas) relembranças sobre um episódio de bullying cometido por um grupo crianças (ou “animais) nos anos 50, contra o último Richard na “hierarquia escolar” (dentre 4 xarás, era o “Dick), sem muito propósito para existir. E muito menos ser indicado ao Oscar, uma vez que soa até bem amador em que sequer a vítima tem voz (“Não é realmente sobre você, é sobre nós”). Falando de voz, o cara não gosta da própria voz, mas prefere narrar isso por 32 minutos... Era melhor ter ido fazer terapia para tratar as “vulnerabilidades emocionais do fazer bullying”.
O documentário, que usa, em grande parte dos seus 38 minutos, a linguagem de sinais (nas entrevistas, treinamentos e rotina dos adolescentes) e uma linguagem cinematográfica de fotografia, trilha sonora e montagens intensas que parece mais um filme de ficção e que me engajaram profundamente, trata sobre a força, os desafios, a vida, o esporte e a união de uma escola para surdos em Maryland. Especificamente focado em sua equipe de Futebol Americano, que teve uma sequência de vitórias de 42 jogos, perdeu o mais recente, se prepara (física, mental e psicologicamente) para uma última partida com uma equipe de ouvintes (para eles, uma forma de mostrar ao mundo o que podem fazer para além dos estigmas) e relembra o que a descriminação (presente em todos os lados e mais ainda “fora da bolha”) pode fazer com uma pessoa, um jovem amigo que se suicidou por conta do Bullying (ao qual dedicam todo jogo e esforço). É um curta sobre determinação, luta, inspiração, sobre sentir as vibrações do campo, do peito, da torcida e da música para seguir em frente e vencer num mundo naturalmente isolador para quem não ouve (ou tem quaisquer deficiências). Até mesmo dentro da própria família, como um pai que se amedrontou com a doença do filho de 2 anos, Meningite, que o levou à surdez, e abandonou a família, retornando anos depois, como pastor, para tentar se reconectar. Bem mais forte e emocionante que achava que seria. Meu favorito na categoria junto a “The Queen of Basketball”.
O documentário, de apenas 22 minutos, se passa num acampamento para refugiados do Afeganistão (sendo dedicado ao país e ao seu povo) em meio à crise que apenas escalonou até chegar ao momento atual de domínio do Talibã. Mas, aqui, o foco é mais íntimo no relacionamento de 2 jovens que se casam e formam uma família enquanto o marido canta para sua esposa e tenta balancear seus desejos de arrumar um emprego (se alistando no Exército para estudar e crescer ou em plantações de papoula) para melhorar de vida, e as pressões, negativas e responsabilidades familiares que lhe recaem dado o perigo iminente. Talvez fosse mesmo o objetivo apenas mostrar a rotina complicada dos refugiados naquele contexto, mas, além de ser um tanto raso e mal montado, desperdiça oportunidades de aprofundamento ao apenas passar por todo o drama da situação micro e macro sem querer se comprometer com muita coisa além da tristeza evidente dos arredores diminuída em momentos raros de cantoria, dança e comunhão.
Um daqueles documentários sobre figuras desconhecidas e que merecem toda reverência e apreciação. Dessa vez, Lusia Mae Harris, contando vida e enterradas em suas próprias palavras e grande personalidade, ao longo de 22 minutos que vão direto ao ponto da melhor maneira possível. Lusia foi a primeira mulher negra a ingressar num dos primeiros times de basquete feminino dos EUA após anos de sua infância numa comunidade de catadores de algodão assistindo aos jogos pela TV. Lusia foi campeã nacional 3 vezes nesse mesmo time apenas 4 anos depois de ele ser criado. Lusia fez a primeira cesta nos primeiros Jogos Olímpicos em que a modalidade foi incluída (Montreal, 1976). Luisa conseguiu a Medalha de Prata na oportunidade. Luisa voltou para os EUA e decidiu parar de jogar porque não havia uma liga para mulheres. Lusia foi diagnosticada com Bipolaridade e, depois de um tempo, virou técnica para criar sua família, com filhos que cresceriam para ser jogadores, mestres e doutores. Lusia foi a primeira mulher atleta a entrar pro Hall da Fama. Foi chamada para a NBA, mas recusou. Diferentemente dos homens, não teve chances de se tornar famosa, milionária, e fazer o que pretendia para o esporte e para as mulheres, mas carrega nas mãos o poder e toda a sua história e importância como a Rainha do Basquete. Muito bom conhecer uma mulher incrível assim, meu favorito até agora na categoria.
“Eu queria crescer e ter a minha própria família. E eu queria lançar aquela bola assim como os homens da TV lançavam. Só isso. E eu fiz.”
“- Quais os seus planos para moradia? - Eu planejo ter uma casa e ficar dentro dela.”
Acompanhando os relatos e rotinas em busca de sobrevivência, emprego, moradia e dignidade de algumas pessoas sem-teto de Oakland, Seattle e Los Angeles, o documentário faz um recorte até bem emocionante (em entrevistas íntimas e acompanhamento) sobre os mais de 500 mil indivíduos que, nos EUA, toda noite (e todo o dia) batalham para conseguir um lugar para dormir e não serem espancados, abusados ou morrerem nas calçadas das grandes cidades. Vai a fundo nos dramas pessoais pesados e diversos que levaram essas pessoas àquela situação: se assumir transgênero e perder o apoio da família, uma prisão, os altos custos de vida, a perda de um emprego, uma depressão, a Pandemia... Isso enquanto os gestores começam a enxergar o problema como ele é: uma emergência de Saúde Pública, e que precisa de um olhar especial entre as necessidades desses grupos e os “preconceitos” dos moradores que não querem em seus bairros os projetos e abrigos pois idealizam em rejeição como locais de violência e consumo de drogas. Há aqui, também, a tentativa de mostrar as contradições de como centros de poder capitalistas sempre crescem à medida que desamparam milhares. Interessante como os diretores fazem paralelos constantes entre o tráfego, sempre passando rápido, os necessitados, sempre vagarosos, as luzes e as janelas dos apartamentos, sempre impessoais e distantes, e as máquinas construindo prédios ao redor, mas nenhum para eles. É basicamente um documentário-expositivo, sem conclusões ou associações mais claras no que tange às razões no plano mais amplo (permeando especulação imobiliária, dentre outros), e por isso perde-se um pouco. Mas é bom o suficiente para a “denúncia”, apesar de o tema ter base para render muito mais.
“As situações vão se tornando extremas e nem percebemos. O que é uma preocupação mais imediata? Minha filha faminta ou o aluguel que vence em duas semanas? Eu vou alimentar minha filha, claro. Porque tento manter nossa família, mesmo sendo uma sem-teto. Tipo: ‘Apesar da situação, mamãe vai cuidar de vocês’.”
Uma pista de decolagem, aviões partindo, é domingo e uma criança vê uma mulher pensativa, a morte de um homem e o fim da paz com o implodir da Terceira Guerra Mundial. O mundo morre na superfície, pela radioatividade; o resto da humanidade vive em subterrâneos, onde experimentos são feitos para enviar pessoas, por entre “buracos no tempo”, a convocar o passado e o futuro por ajuda. Cabe à nossa criança, agora um sobrevivente e ex-soldado da guerra, voltar àquela imagem fixa em suas lembranças e salvar o mundo.
“No 10º dia de experiências, as imagens começaram a surgir como confissões. Uma manhã do tempo de paz. Um quarto do tempo de paz; um quarto de verdade. Crianças de verdade. Pássaros de verdade. Gatos de verdade. Túmulos de verdade. No 16º dia, ele estava sobre o molhe. Vazio. Às vezes ele encontra um momento de felicidade, mas diferente. Um rosto de felicidade, mas diferente. Ruínas. Uma moça que podia ser aquela que ele procura. Ele cruza com ela sobre o molhe. De um carro, ele a vê sorrir...”
Filme francês de narrativa experimental pacas. Usa uma montagem em sobreposições de fotografias narradas (e sussurradas) para construir uma trama de ficção científica percursora e profunda sobre apego, memórias (por isso o formato é tão foda, com o vai e vem constante e confuso) e morte (o plot-twist no final é basilar). Isso numa época em que o mundo saíra de seu conflito mais mortal e prosperava, de certa forma; mas ainda temia as tensões reverberadas. Em 28 minutos, inspirou Os 12 Macacos, e isso fica claro assistindo.
O curta tem 16 minutos e, mesmo sem diálogo algum, constrói toda a história com a atmosfera e o estilo de direção (aqui num quê vintage, mas atual, bonito, mas sombrio) que Ari viria a explorar bem mais 5 anos depois, em Hereditário, exultando a ótima cinematografia de seu já parceiro de longa data, Pawel Pogorzelski e uma trilha sonora precisa. A presença de Bonnie Bedelia, como a mãe “superprotetora” (e bem egoísta) que faz de tudo para que seu filho (Liam Aiken, grande Klaus Baudelaire) não saia de casa para a Faculdade é tão forte quanto a montagem super fluida e surpreendente de Aster. Assisti aleatoriamente no YouTube e quando vi o nome do diretor tudo fez sentido. Brabo desde cedo.
O curta, último dos indicados ao Oscar que assisti, segue o casal Noor e Yusef (Mariam Basha e Saleh Bakri) em seu aniversário de casamento, quando o primeiro e sua filha, Yasmine (Mariam Kanj) saem para ir ao supermercado e comprar um presente na Cisjordânia. Mas, para isso, eles têm de passar por uma barricada com soldados que divide as regiões de Belém e Jerusalém. Há um contexto sócio-histórico super profundo aqui para um curta tratar, no conflito ideológico e religioso entre Israel e os Palestinos, mas a diretora consegue trabalhar isso com precisão ao expor algo que seria corriqueiro se transformando em momentos inquietantes de opressão e humilhação.
“Por que você comprou uma geladeira?”, perguntam quando ele retorna com o presente e não consegue encaixá-lo na passagem (único lugar por onde os “árabes” podem passar), implorando para irem pela estrada só dessa vez. “O que vocês querem de mim? É só uma geladeira! Vocês não têm geladeiras?”, diz Yusef num rompante de fúria. E, enquanto gritam para ele ficar de pé e obedecer ao sistema, Yasmine segue sozinha pela estrada com a geladeira, num gesto de rompimento simbólico que envelopa esse bom curta.
''Não é Deus que mata as crianças. Não é a sina que as esquarteja ou o destino que as dá de comer aos cães. Somos nós. Apenas nós.''
É com essa citação de Alam Moore que o curta mais longo deste Oscar começa. Essencialmente, temos aqui um documentário-denúncia. Não seguimos apenas uma pessoa, mas uma situação em comum que acomete a todo um país: a guerra entre Iêmen e Arábia Saudita, que criou a maior crise humanitária do planeta, pois este último, além de ataques aéreos, criou barreiras que impediam alimentos e medicamentos de chegar outro. E como os EUA, principalmente, foram/são cúmplices dela, ao suprir armamento, inteligência e suporte operacional.
“Todo caso é diferente, mas o que todos eles têm em comum é má nutrição, é a desolação.” Sob duas visões, igualmente tristes, de duas profissionais de saúde em dois hospitais, recebendo os casos severos de inanição, seguimos suas rotinas tentando o que podem pra salvar as crianças da fome, enquanto ela cresce, dia após dia, ao passo que a guerra avança.
Como Abeer, de 6 anos, sem ter forças para sorrir ou para brincar com uma bola inflada. Ela não frequenta a escola, pois “as fundações da nossa sociedade foram todas destruídas. São só pilares fracos. Educação, Saúde, Água. Você vai encontrar muitos lares sem pai, sem mãe. Se não perdemos crianças por má nutrição, as perdemos para os bombardeios.” O terrível ápice é quando eles ocorrem até em um funeral... Algumas conseguem se recuperar, outras, infelizmente, morrem. E é aqui que vemos a parte mais crua e pesada disso tudo: quando uma criança, bem magra, tem uma parada cardíaca e tentam reanimá-la sem sucesso. A dor se espalha em gritos, choros contidos e em olhares perdidos em corredores...
“Não importa quem ganha ou quem perde. Guerra + crianças = a privação. Privadas de tudo. Nós não podemos dizer que estamos acostumados com isso, acostumados às mortes. Nunca.”
O curta, indicado ao Oscar, utiliza do recurso temporal de ficar preso num mesmo dia, numa mesma situação, que acaba e recomeça quando o protagonista é morto, para discorrer de maneira criativa, fortíssima e super interessante a violência policial americana. É intenso como Carter (Joey Bada$$) tenta escapar 100 vezes, sem sucesso, desse loop, praticamente uma alegoria à escravatura, sendo estrangulado, espancado, e morto a tiros, gritando e ninguém o ajudando. Retornando sempre ao apartamento da garota com quem dormiu na noite anterior. Ele tenta quebrar essa trama circular da maneira “tradicional”: evocando seus direitos, sendo logo revogado; fugindo, logo alvejado à arma de fogo; reagindo e lutando, logo cercado e morto. Então ele apela ao diálogo pacifista, quase como Martin Luther King, conseguindo discutir, a princípio sem impedimentos e no banco de trás da viatura, sua visão (e a de toda a comunidade) honesta sobre os fatos, aos quais “concordam em discordar”. Mas era apenas uma atuação do “lado humano” de seu algoz, policial Merk (Andrew Howard), e percebendo, da forma mais dolorosa, que tal problema parece não ter fim, resolução. E o ciclo recomeça, um ciclo estrutural e desumano de medo (até de sair à rua), de violência e assassinatos.
A música de Bruce Hornsby, “The Way It Is”, acompanha os “créditos finais”, em que são listados nomes de vítimas de violência policial (alguns entre tantos), pessoas que estavam fazendo coisas rotineiras como estacionar um carro, tomar um sorvete, dormir ou ir ao mercado (como George Floyd), e que não tiveram nem uma chance de defesa ou de simplesmente viver suas vidas num país enraizado e aterrado em ideais racistas. Então, como o curta encerra: Diga seus nomes. Lembrem-se dos nomes deles. E quer mais simbolismo que uma poça de sangue no formato do Continente Africano? Powerful. Foda. Merece o Oscar.
Nas vésperas de aniversário dos Julgamentos de Nuremberg, vemos Colette Marin-Catherine, uma mulher de 90 anos, que teve avô e 2 tios (Oficiais do Exército) mortos na Primeira Guerra Mundial, carregando, com sua mãe e irmãos, um sentimento anti-alemanha até a Segunda Guerra Mundial, quando ela e sua família foram membros da Resistência Francesa (coletando armas, passando informação). Isto ocasionou em 2 de seus irmãos serem levados pela Gestapo ao Campo de Concentração Mittelbau-Dora. Desde então, ela se recusava a pisar na Alemanha pelos tantos traumas que seus antigos residentes a causaram. O que muda quando ela conhece Lucie Fouble, uma estudante de História e docente de um Museu (que estava a criar um Dicionário Biográfico dos deportados franceses dos mesmos Campos Nazistas), com a qual relembra de suas cicatrizes e terrores do passado (após tentar esquecê-los), indo a Nordhausen pela primeira vez, onde Jean-Pierre, um dos dois deportados (o preferido de sua mãe, não o mais próximo de Colette), morreu (um dos 20 mil), sem levar flores. “Se esses morros pudessem falar, acho que ouviríamos gritos.”, fala Colette, lamentosa, ao entrar num dos túneis, onde construíam bombas e mísseis, ou no crematório, o local final daquele “jovem alto, genial e lindo”, seu irmão.
É um documentário mais tradicional, naturalmente delicado e forte, como as conversas interessantes e sinceras entre duas (“Você fala de heroísmo, mas foi minha bunda sentada na pedra, anotando placas. Nós estávamos jogando gato e rato, brincando com o fogo. Ou melhor, o fogo estava brincando conosco.”), com imagens do passado se ligando tanto às falas quanto aos lugares. Além das lições, mostrando os alemães em seu arrependimento e condenação total aos crimes de Hitler. Garantindo que isso “jamais volte a acontecer”...
“Quem sabe se o canto dos pássaros não são uma coleção de todas as nossas lamentações? Talvez Jean-Pierre esteja nos dizendo que ele está feliz.”
Este documentário segue a maior série de protestos da história do Território Semiautônomo de Hong Kong desde que a Grã-Bretanha o devolveu à China (em 1997), ocorridos em 2019, após a Chefe do Executivo da região e o governo chinês criarem o Projeto de Lei de Extradição, o qual iria permitir extradições para a China Continental, onde a Justiça é controlada pelo Partido Comunista.
Devido aos protestos, tentaram pôr em prática a Lei de Segurança Nacional, com o uso de força policial (que tortura e é corrupta, segundo eles) e censura política. Os protestantes eram/são da camada jovem da sociedade hongkongonesa, enquanto os Pró-China são mais velhos, então há um senso de separação ideológica etária e de hipocrisia contra os “mascarados” interessante. Já que os policiais prendiam/prendem aleatória e arbitrariamente os jovens, seja na rua, numa praça de alimentação, cercando ou invadindo Universidades...
Os “revolucionários”, que enxergavam a Lei como ameaça, ao colocá-los “à mercê do Sistema Judiciário Chinês”, entre máscaras, lágrimas, balas, chamas e guarda-chuvas, demandam/vam, desde sua suspensão em junho, por 5 coisas: a retirada do Projeto (que ocorreu em setembro), o fim da classificação dos atos como revolta, a soltura dos manifestantes presos, um Tribunal Independente para julgar a brutalidade policial e o direito do povo de Hong Kong poder eleger seus líderes ética e democraticamente.
É o documentário “corajoso” e agitado entre os indicados, no sentido de o diretor ter literalmente mergulhado nos protestos, seguindo os participantes, tomando seus depoimentos, correndo da polícia, fugindo de balas de borracha, chutando gás lacrimogêneo, sumindo entre a fumaça, filmando espancamentos e detenções. É um filme um pouco cansativo e “incompleto”, já que a luta também foi interrompida pela Pandemia. Meses depois, a Lei de Segurança Nacional acabou por ser implementada e, desde então, pessoas vêm sendo presas. Então: Do not split!
“Eu não lia esse poema há muito tempo, havia até esquecido que ele estava aqui e que ela o tinha escrito. As pessoas não sabem disso. Só sabem que ela era uma garota negra que valeu U$ 1.79. Não sabem o ser humano que ela era. Ver uma das minhas melhores amigas partir tão cedo foi doloroso. Ela era muito amorosa. Era consciente de sua cor e aceitava. “- Nós somos rainhas. - Não sou rainha. Não tenho uma coroa.” E ela dizia: “Sua besta. Nós somos rainhas. E só iremos ser tratadas como rainhas se agirmos como tal. Posso fazer qualquer coisa que me propuser a fazer. Minha mãe me dizia isso, então eu acredito.”
Não conhecia a história de Latasha, mas esse pequeno documentário de 19 minutos, usando de técnicas híbridas, com desenhos e um filtro quase líquido, além da narração em off, conseguiu deixar sua marca, mesmo o vídeo da situação ter sido mostrado. Ainda mais por Tasha ter sido uma garota cuja mãe tinha morrido 6 anos antes, tão cheia de sonhos, de se tornar uma advogada para servir de "escudo" para as injustiças ilegais que poderiam ocorrer com sua família, de ter um negócio pra chamar de seu sem ser chamada de macaca, expulsa ou ter uma arma apontada pra sua cara. De poder criar um local aonde os jovens de sua comunidade pudessem ir para escapar dos riscos do ócio... Tudo isso foi destruído por uma caixa de suco de laranja. E sua assassina sequer foi presa. Espero que seus primos consigam concretizar suas memórias em ações.
Um jovem compositor negro reflete sobre sua posição atual de escritor de melodias num ambiente antes predominantemente branco, enquanto fala, num quarto de hotel, com seu avô, que enfrenta um câncer.
É Kris Bowers, compositor da trilha sonora de Green Book. Mas, amém, aqui não há nenhum “branco salvador”. Seu avô, Horace Bowers, nascido num Sul racista, numa casa onde sua grande família se espremia em dois quartos e tendo escapado de lá ainda jovem pra ganhar a vida em Los Angeles, se tornando dono de uma lavadora a seco com muita coragem e altruísmo, passa por suas histórias e passados ao lado de seu neto. Este que vislumbra seu futuro, após ser apoiado e financiado por ele e pelo amor à música ditado desde antes de nascer, no concerto de autoria própria: “For a Younger Self”, performado num teatro para centenas de pessoas.
“E gosto de ver meus filhos e netos bem sucedidos. Isso é glória em si mesmo.” Os paralelos entre os pedais da lavadora de roupas e do piano são precisos. E se aquelas melodias são uma conversação, temos todos os aspectos históricos e familiares da construção do relacionamento dos dois nesses 13 minutos bonitos, apesar de ser o mais simples dos 5 indicados.
Há 100 anos, Keaton lançava seu primeiro curta-metragem solo, que se tornou histórico por no mínimo duas cenas: a cena da banheira, em que uma mão cobre a lente da câmera para que a personagem de Sybil Seely pudesse pegar o sabão fora da banheira sem "atentar ao pudor" (metalinguagem clara); e a cena do temporal, em que a casa que o personagem de Keaton construiu de maneira desconjuntada começa a girar. Notoriamente, foi a primeira vez que usaram uma câmera girando em 360° pelo cenário e acompanhando os personagens, aqui desorientados. Com o característico humor visual, a criatividade na direção e bons efeitos práticos, esse curta inovador de 1920 é definitivamente um marco no cinema.
O Menino, a Toupeira, a Raposa e o Cavalo
4.0 138O Pequeno Príncipe da nossa geração
Vida Maria
4.3 133Puta crítica social foda
Please Hold
3.6 37Basicamente a máxima nem tão hipotética, distante ou distópica assim de quando você deixa de ler os termos de condição e uso de um aplicativo ou site, e isso se acumula por anos e anos e milhões de pessoas apenas marcando o “Li e concordo”, somado ao terror do “Por favor, espere. Um atendente humano estará com você em breve” como musiquinhas animadas intermináveis e desesperadoras, como ficar preso num loop. Aqui, o protagonista é preso por uma razão jamais dita numa sociedade em que tudo, tudo mesmo, é feito por drones, que procuram, prendem, levam à prisão, algoritmos, até de advogados e simulações de julgamentos, e vozes digitais na TV. Quase como um “15 Milhões de Méritos” de Black Mirror ainda mais “próximo” e com um toque assustador pela estética menos “limpa” e com tecnologias e ativos que temos hoje em dia. Pontua bem como até mesmo quando se excluem os humanos da equação policial-prisional “erros” seguem acontecendo contra pessoas não-brancas como continuidade da sistematização do racismo estadunidense (mostrado no documentário “Time” indicado ao Oscar passado) e das falhas/omissões de tratamento, funcionalidade, informação e culpabilização do/no sistema prisional (em várias vertentes, até na exploração laboral, como em que ele faz peças de bordado por apenas 1 centavo cada). É a desumanização da automação na digitalização societal. E estamos acompanhando esse processo a cada dia. Bem que poderia virar um longa, porque parece curto (e inconclusivo) demais para o tema.
Quando Éramos Bullies
2.3 31 Assista Agora“Sobre o seu filme, acho que ninguém vai querer vê-lo. Possivelmente, poderá ser muito tedioso de assistir.” Senhora Bromberg, a única sensata aqui, só faltou falar que também seria muito egocêntrico, autoindulgente e muitíssimo pouco interessante. Apenas um conjunto de (vagas e repetitivas) relembranças sobre um episódio de bullying cometido por um grupo crianças (ou “animais) nos anos 50, contra o último Richard na “hierarquia escolar” (dentre 4 xarás, era o “Dick), sem muito propósito para existir. E muito menos ser indicado ao Oscar, uma vez que soa até bem amador em que sequer a vítima tem voz (“Não é realmente sobre você, é sobre nós”). Falando de voz, o cara não gosta da própria voz, mas prefere narrar isso por 32 minutos... Era melhor ter ido fazer terapia para tratar as “vulnerabilidades emocionais do fazer bullying”.
Audible
3.5 32O documentário, que usa, em grande parte dos seus 38 minutos, a linguagem de sinais (nas entrevistas, treinamentos e rotina dos adolescentes) e uma linguagem cinematográfica de fotografia, trilha sonora e montagens intensas que parece mais um filme de ficção e que me engajaram profundamente, trata sobre a força, os desafios, a vida, o esporte e a união de uma escola para surdos em Maryland. Especificamente focado em sua equipe de Futebol Americano, que teve uma sequência de vitórias de 42 jogos, perdeu o mais recente, se prepara (física, mental e psicologicamente) para uma última partida com uma equipe de ouvintes (para eles, uma forma de mostrar ao mundo o que podem fazer para além dos estigmas) e relembra o que a descriminação (presente em todos os lados e mais ainda “fora da bolha”) pode fazer com uma pessoa, um jovem amigo que se suicidou por conta do Bullying (ao qual dedicam todo jogo e esforço). É um curta sobre determinação, luta, inspiração, sobre sentir as vibrações do campo, do peito, da torcida e da música para seguir em frente e vencer num mundo naturalmente isolador para quem não ouve (ou tem quaisquer deficiências). Até mesmo dentro da própria família, como um pai que se amedrontou com a doença do filho de 2 anos, Meningite, que o levou à surdez, e abandonou a família, retornando anos depois, como pastor, para tentar se reconectar. Bem mais forte e emocionante que achava que seria. Meu favorito na categoria junto a “The Queen of Basketball”.
Três Canções para Benazir
3.2 48 Assista AgoraO documentário, de apenas 22 minutos, se passa num acampamento para refugiados do Afeganistão (sendo dedicado ao país e ao seu povo) em meio à crise que apenas escalonou até chegar ao momento atual de domínio do Talibã. Mas, aqui, o foco é mais íntimo no relacionamento de 2 jovens que se casam e formam uma família enquanto o marido canta para sua esposa e tenta balancear seus desejos de arrumar um emprego (se alistando no Exército para estudar e crescer ou em plantações de papoula) para melhorar de vida, e as pressões, negativas e responsabilidades familiares que lhe recaem dado o perigo iminente. Talvez fosse mesmo o objetivo apenas mostrar a rotina complicada dos refugiados naquele contexto, mas, além de ser um tanto raso e mal montado, desperdiça oportunidades de aprofundamento ao apenas passar por todo o drama da situação micro e macro sem querer se comprometer com muita coisa além da tristeza evidente dos arredores diminuída em momentos raros de cantoria, dança e comunhão.
The Queen of Basketball
3.8 36Um daqueles documentários sobre figuras desconhecidas e que merecem toda reverência e apreciação. Dessa vez, Lusia Mae Harris, contando vida e enterradas em suas próprias palavras e grande personalidade, ao longo de 22 minutos que vão direto ao ponto da melhor maneira possível. Lusia foi a primeira mulher negra a ingressar num dos primeiros times de basquete feminino dos EUA após anos de sua infância numa comunidade de catadores de algodão assistindo aos jogos pela TV. Lusia foi campeã nacional 3 vezes nesse mesmo time apenas 4 anos depois de ele ser criado. Lusia fez a primeira cesta nos primeiros Jogos Olímpicos em que a modalidade foi incluída (Montreal, 1976). Luisa conseguiu a Medalha de Prata na oportunidade. Luisa voltou para os EUA e decidiu parar de jogar porque não havia uma liga para mulheres. Lusia foi diagnosticada com Bipolaridade e, depois de um tempo, virou técnica para criar sua família, com filhos que cresceriam para ser jogadores, mestres e doutores. Lusia foi a primeira mulher atleta a entrar pro Hall da Fama. Foi chamada para a NBA, mas recusou. Diferentemente dos homens, não teve chances de se tornar famosa, milionária, e fazer o que pretendia para o esporte e para as mulheres, mas carrega nas mãos o poder e toda a sua história e importância como a Rainha do Basquete. Muito bom conhecer uma mulher incrível assim, meu favorito até agora na categoria.
“Eu queria crescer e ter a minha própria família. E eu queria lançar aquela bola assim como os homens da TV lançavam. Só isso. E eu fiz.”
Onde Eu Moro
3.4 71 Assista Agora“- Quais os seus planos para moradia?
- Eu planejo ter uma casa e ficar dentro dela.”
Acompanhando os relatos e rotinas em busca de sobrevivência, emprego, moradia e dignidade de algumas pessoas sem-teto de Oakland, Seattle e Los Angeles, o documentário faz um recorte até bem emocionante (em entrevistas íntimas e acompanhamento) sobre os mais de 500 mil indivíduos que, nos EUA, toda noite (e todo o dia) batalham para conseguir um lugar para dormir e não serem espancados, abusados ou morrerem nas calçadas das grandes cidades. Vai a fundo nos dramas pessoais pesados e diversos que levaram essas pessoas àquela situação: se assumir transgênero e perder o apoio da família, uma prisão, os altos custos de vida, a perda de um emprego, uma depressão, a Pandemia... Isso enquanto os gestores começam a enxergar o problema como ele é: uma emergência de Saúde Pública, e que precisa de um olhar especial entre as necessidades desses grupos e os “preconceitos” dos moradores que não querem em seus bairros os projetos e abrigos pois idealizam em rejeição como locais de violência e consumo de drogas. Há aqui, também, a tentativa de mostrar as contradições de como centros de poder capitalistas sempre crescem à medida que desamparam milhares. Interessante como os diretores fazem paralelos constantes entre o tráfego, sempre passando rápido, os necessitados, sempre vagarosos, as luzes e as janelas dos apartamentos, sempre impessoais e distantes, e as máquinas construindo prédios ao redor, mas nenhum para eles. É basicamente um documentário-expositivo, sem conclusões ou associações mais claras no que tange às razões no plano mais amplo (permeando especulação imobiliária, dentre outros), e por isso perde-se um pouco. Mas é bom o suficiente para a “denúncia”, apesar de o tema ter base para render muito mais.
“As situações vão se tornando extremas e nem percebemos. O que é uma preocupação mais imediata? Minha filha faminta ou o aluguel que vence em duas semanas? Eu vou alimentar minha filha, claro. Porque tento manter nossa família, mesmo sendo uma sem-teto. Tipo: ‘Apesar da situação, mamãe vai cuidar de vocês’.”
The Long Goodbye
3.9 39"Minha tribo é uma jornada para uma terra perdida para nós. E seu nome é Dignidade. Então de onde eu vim não é seu problema, mano."
On my Mind
3.3 33"Então voe, meu amor."
Noite e Neblina
4.6 206 Assista AgoraSem palavras...
O Balão Vermelho
4.4 237 Assista AgoraAposto que esse curta inspirou o Pete Docter a dirigir Up - Altas Aventuras. Muito lindinho.
A Pista
4.5 185 Assista AgoraUma pista de decolagem, aviões partindo, é domingo e uma criança vê uma mulher pensativa, a morte de um homem e o fim da paz com o implodir da Terceira Guerra Mundial. O mundo morre na superfície, pela radioatividade; o resto da humanidade vive em subterrâneos, onde experimentos são feitos para enviar pessoas, por entre “buracos no tempo”, a convocar o passado e o futuro por ajuda. Cabe à nossa criança, agora um sobrevivente e ex-soldado da guerra, voltar àquela imagem fixa em suas lembranças e salvar o mundo.
“No 10º dia de experiências, as imagens começaram a surgir como confissões. Uma manhã do tempo de paz. Um quarto do tempo de paz; um quarto de verdade. Crianças de verdade. Pássaros de verdade. Gatos de verdade. Túmulos de verdade. No 16º dia, ele estava sobre o molhe. Vazio. Às vezes ele encontra um momento de felicidade, mas diferente. Um rosto de felicidade, mas diferente. Ruínas. Uma moça que podia ser aquela que ele procura. Ele cruza com ela sobre o molhe. De um carro, ele a vê sorrir...”
Filme francês de narrativa experimental pacas. Usa uma montagem em sobreposições de fotografias narradas (e sussurradas) para construir uma trama de ficção científica percursora e profunda sobre apego, memórias (por isso o formato é tão foda, com o vai e vem constante e confuso) e morte (o plot-twist no final é basilar). Isso numa época em que o mundo saíra de seu conflito mais mortal e prosperava, de certa forma; mas ainda temia as tensões reverberadas. Em 28 minutos, inspirou Os 12 Macacos, e isso fica claro assistindo.
Munchausen
3.6 17O curta tem 16 minutos e, mesmo sem diálogo algum, constrói toda a história com a atmosfera e o estilo de direção (aqui num quê vintage, mas atual, bonito, mas sombrio) que Ari viria a explorar bem mais 5 anos depois, em Hereditário, exultando a ótima cinematografia de seu já parceiro de longa data, Pawel Pogorzelski e uma trilha sonora precisa. A presença de Bonnie Bedelia, como a mãe “superprotetora” (e bem egoísta) que faz de tudo para que seu filho (Liam Aiken, grande Klaus Baudelaire) não saia de casa para a Faculdade é tão forte quanto a montagem super fluida e surpreendente de Aster.
Assisti aleatoriamente no YouTube e quando vi o nome do diretor tudo fez sentido. Brabo desde cedo.
O Presente
4.0 49 Assista AgoraO curta, último dos indicados ao Oscar que assisti, segue o casal Noor e Yusef (Mariam Basha e Saleh Bakri) em seu aniversário de casamento, quando o primeiro e sua filha, Yasmine (Mariam Kanj) saem para ir ao supermercado e comprar um presente na Cisjordânia. Mas, para isso, eles têm de passar por uma barricada com soldados que divide as regiões de Belém e Jerusalém. Há um contexto sócio-histórico super profundo aqui para um curta tratar, no conflito ideológico e religioso entre Israel e os Palestinos, mas a diretora consegue trabalhar isso com precisão ao expor algo que seria corriqueiro se transformando em momentos inquietantes de opressão e humilhação.
“Por que você comprou uma geladeira?”, perguntam quando ele retorna com o presente e não consegue encaixá-lo na passagem (único lugar por onde os “árabes” podem passar), implorando para irem pela estrada só dessa vez. “O que vocês querem de mim? É só uma geladeira! Vocês não têm geladeiras?”, diz Yusef num rompante de fúria. E, enquanto gritam para ele ficar de pé e obedecer ao sistema, Yasmine segue sozinha pela estrada com a geladeira, num gesto de rompimento simbólico que envelopa esse bom curta.
Hunger Ward
3.8 37''Não é Deus que mata as crianças. Não é a sina que as esquarteja ou o destino que as dá de comer aos cães. Somos nós. Apenas nós.''
É com essa citação de Alam Moore que o curta mais longo deste Oscar começa. Essencialmente, temos aqui um documentário-denúncia. Não seguimos apenas uma pessoa, mas uma situação em comum que acomete a todo um país: a guerra entre Iêmen e Arábia Saudita, que criou a maior crise humanitária do planeta, pois este último, além de ataques aéreos, criou barreiras que impediam alimentos e medicamentos de chegar outro. E como os EUA, principalmente, foram/são cúmplices dela, ao suprir armamento, inteligência e suporte operacional.
“Todo caso é diferente, mas o que todos eles têm em comum é má nutrição, é a desolação.” Sob duas visões, igualmente tristes, de duas profissionais de saúde em dois hospitais, recebendo os casos severos de inanição, seguimos suas rotinas tentando o que podem pra salvar as crianças da fome, enquanto ela cresce, dia após dia, ao passo que a guerra avança.
Como Abeer, de 6 anos, sem ter forças para sorrir ou para brincar com uma bola inflada. Ela não frequenta a escola, pois “as fundações da nossa sociedade foram todas destruídas. São só pilares fracos. Educação, Saúde, Água. Você vai encontrar muitos lares sem pai, sem mãe. Se não perdemos crianças por má nutrição, as perdemos para os bombardeios.” O terrível ápice é quando eles ocorrem até em um funeral... Algumas conseguem se recuperar, outras, infelizmente, morrem. E é aqui que vemos a parte mais crua e pesada disso tudo: quando uma criança, bem magra, tem uma parada cardíaca e tentam reanimá-la sem sucesso. A dor se espalha em gritos, choros contidos e em olhares perdidos em corredores...
“Não importa quem ganha ou quem perde. Guerra + crianças = a privação. Privadas de tudo. Nós não podemos dizer que estamos acostumados com isso, acostumados às mortes. Nunca.”
Dois Estranhos
4.2 291 Assista AgoraO curta, indicado ao Oscar, utiliza do recurso temporal de ficar preso num mesmo dia, numa mesma situação, que acaba e recomeça quando o protagonista é morto, para discorrer de maneira criativa, fortíssima e super interessante a violência policial americana. É intenso como Carter (Joey Bada$$) tenta escapar 100 vezes, sem sucesso, desse loop, praticamente uma alegoria à escravatura, sendo estrangulado, espancado, e morto a tiros, gritando e ninguém o ajudando. Retornando sempre ao apartamento da garota com quem dormiu na noite anterior. Ele tenta quebrar essa trama circular da maneira “tradicional”: evocando seus direitos, sendo logo revogado; fugindo, logo alvejado à arma de fogo; reagindo e lutando, logo cercado e morto. Então ele apela ao diálogo pacifista, quase como Martin Luther King, conseguindo discutir, a princípio sem impedimentos e no banco de trás da viatura, sua visão (e a de toda a comunidade) honesta sobre os fatos, aos quais “concordam em discordar”. Mas era apenas uma atuação do “lado humano” de seu algoz, policial Merk (Andrew Howard), e percebendo, da forma mais dolorosa, que tal problema parece não ter fim, resolução. E o ciclo recomeça, um ciclo estrutural e desumano de medo (até de sair à rua), de violência e assassinatos.
A música de Bruce Hornsby, “The Way It Is”, acompanha os “créditos finais”, em que são listados nomes de vítimas de violência policial (alguns entre tantos), pessoas que estavam fazendo coisas rotineiras como estacionar um carro, tomar um sorvete, dormir ou ir ao mercado (como George Floyd), e que não tiveram nem uma chance de defesa ou de simplesmente viver suas vidas num país enraizado e aterrado em ideais racistas.
Então, como o curta encerra: Diga seus nomes. Lembrem-se dos nomes deles. E quer mais simbolismo que uma poça de sangue no formato do Continente Africano? Powerful. Foda. Merece o Oscar.
Colette
3.7 34Nas vésperas de aniversário dos Julgamentos de Nuremberg, vemos Colette Marin-Catherine, uma mulher de 90 anos, que teve avô e 2 tios (Oficiais do Exército) mortos na Primeira Guerra Mundial, carregando, com sua mãe e irmãos, um sentimento anti-alemanha até a Segunda Guerra Mundial, quando ela e sua família foram membros da Resistência Francesa (coletando armas, passando informação). Isto ocasionou em 2 de seus irmãos serem levados pela Gestapo ao Campo de Concentração Mittelbau-Dora. Desde então, ela se recusava a pisar na Alemanha pelos tantos traumas que seus antigos residentes a causaram. O que muda quando ela conhece Lucie Fouble, uma estudante de História e docente de um Museu (que estava a criar um Dicionário Biográfico dos deportados franceses dos mesmos Campos Nazistas), com a qual relembra de suas cicatrizes e terrores do passado (após tentar esquecê-los), indo a Nordhausen pela primeira vez, onde Jean-Pierre, um dos dois deportados (o preferido de sua mãe, não o mais próximo de Colette), morreu (um dos 20 mil), sem levar flores.
“Se esses morros pudessem falar, acho que ouviríamos gritos.”, fala Colette, lamentosa, ao entrar num dos túneis, onde construíam bombas e mísseis, ou no crematório, o local final daquele “jovem alto, genial e lindo”, seu irmão.
É um documentário mais tradicional, naturalmente delicado e forte, como as conversas interessantes e sinceras entre duas (“Você fala de heroísmo, mas foi minha bunda sentada na pedra, anotando placas. Nós estávamos jogando gato e rato, brincando com o fogo. Ou melhor, o fogo estava brincando conosco.”), com imagens do passado se ligando tanto às falas quanto aos lugares. Além das lições, mostrando os alemães em seu arrependimento e condenação total aos crimes de Hitler. Garantindo que isso “jamais volte a acontecer”...
“Quem sabe se o canto dos pássaros não são uma coleção de todas as nossas lamentações? Talvez Jean-Pierre esteja nos dizendo que ele está feliz.”
Do Not Split
3.6 36Este documentário segue a maior série de protestos da história do Território Semiautônomo de Hong Kong desde que a Grã-Bretanha o devolveu à China (em 1997), ocorridos em 2019, após a Chefe do Executivo da região e o governo chinês criarem o Projeto de Lei de Extradição, o qual iria permitir extradições para a China Continental, onde a Justiça é controlada pelo Partido Comunista.
Devido aos protestos, tentaram pôr em prática a Lei de Segurança Nacional, com o uso de força policial (que tortura e é corrupta, segundo eles) e censura política. Os protestantes eram/são da camada jovem da sociedade hongkongonesa, enquanto os Pró-China são mais velhos, então há um senso de separação ideológica etária e de hipocrisia contra os “mascarados” interessante. Já que os policiais prendiam/prendem aleatória e arbitrariamente os jovens, seja na rua, numa praça de alimentação, cercando ou invadindo Universidades...
Os “revolucionários”, que enxergavam a Lei como ameaça, ao colocá-los “à mercê do Sistema Judiciário Chinês”, entre máscaras, lágrimas, balas, chamas e guarda-chuvas, demandam/vam, desde sua suspensão em junho, por 5 coisas: a retirada do Projeto (que ocorreu em setembro), o fim da classificação dos atos como revolta, a soltura dos manifestantes presos, um Tribunal Independente para julgar a brutalidade policial e o direito do povo de Hong Kong poder eleger seus líderes ética e democraticamente.
É o documentário “corajoso” e agitado entre os indicados, no sentido de o diretor ter literalmente mergulhado nos protestos, seguindo os participantes, tomando seus depoimentos, correndo da polícia, fugindo de balas de borracha, chutando gás lacrimogêneo, sumindo entre a fumaça, filmando espancamentos e detenções. É um filme um pouco cansativo e “incompleto”, já que a luta também foi interrompida pela Pandemia. Meses depois, a Lei de Segurança Nacional acabou por ser implementada e, desde então, pessoas vêm sendo presas. Então: Do not split!
Uma Canção para Latasha
3.9 62 Assista Agora“Eu não lia esse poema há muito tempo, havia até esquecido que ele estava aqui e que ela o tinha escrito. As pessoas não sabem disso. Só sabem que ela era uma garota negra que valeu U$ 1.79. Não sabem o ser humano que ela era. Ver uma das minhas melhores amigas partir tão cedo foi doloroso. Ela era muito amorosa. Era consciente de sua cor e aceitava. “- Nós somos rainhas. - Não sou rainha. Não tenho uma coroa.” E ela dizia: “Sua besta. Nós somos rainhas. E só iremos ser tratadas como rainhas se agirmos como tal. Posso fazer qualquer coisa que me propuser a fazer. Minha mãe me dizia isso, então eu acredito.”
Não conhecia a história de Latasha, mas esse pequeno documentário de 19 minutos, usando de técnicas híbridas, com desenhos e um filtro quase líquido, além da narração em off, conseguiu deixar sua marca, mesmo o vídeo da situação ter sido mostrado. Ainda mais por Tasha ter sido uma garota cuja mãe tinha morrido 6 anos antes, tão cheia de sonhos, de se tornar uma advogada para servir de "escudo" para as injustiças ilegais que poderiam ocorrer com sua família, de ter um negócio pra chamar de seu sem ser chamada de macaca, expulsa ou ter uma arma apontada pra sua cara. De poder criar um local aonde os jovens de sua comunidade pudessem ir para escapar dos riscos do ócio... Tudo isso foi destruído por uma caixa de suco de laranja. E sua assassina sequer foi presa. Espero que seus primos consigam concretizar suas memórias em ações.
A Concerto Is a Conversation
3.6 29Um jovem compositor negro reflete sobre sua posição atual de escritor de melodias num ambiente antes predominantemente branco, enquanto fala, num quarto de hotel, com seu avô, que enfrenta um câncer.
É Kris Bowers, compositor da trilha sonora de Green Book. Mas, amém, aqui não há nenhum “branco salvador”. Seu avô, Horace Bowers, nascido num Sul racista, numa casa onde sua grande família se espremia em dois quartos e tendo escapado de lá ainda jovem pra ganhar a vida em Los Angeles, se tornando dono de uma lavadora a seco com muita coragem e altruísmo, passa por suas histórias e passados ao lado de seu neto. Este que vislumbra seu futuro, após ser apoiado e financiado por ele e pelo amor à música ditado desde antes de nascer, no concerto de autoria própria: “For a Younger Self”, performado num teatro para centenas de pessoas.
“E gosto de ver meus filhos e netos bem sucedidos. Isso é glória em si mesmo.” Os paralelos entre os pedais da lavadora de roupas e do piano são precisos. E se aquelas melodias são uma conversação, temos todos os aspectos históricos e familiares da construção do relacionamento dos dois nesses 13 minutos bonitos, apesar de ser o mais simples dos 5 indicados.
Uma Semana
4.4 46Há 100 anos, Keaton lançava seu primeiro curta-metragem solo, que se tornou histórico por no mínimo duas cenas: a cena da banheira, em que uma mão cobre a lente da câmera para que a personagem de Sybil Seely pudesse pegar o sabão fora da banheira sem "atentar ao pudor" (metalinguagem clara); e a cena do temporal, em que a casa que o personagem de Keaton construiu de maneira desconjuntada começa a girar.
Notoriamente, foi a primeira vez que usaram uma câmera girando em 360° pelo cenário e acompanhando os personagens, aqui desorientados.
Com o característico humor visual, a criatividade na direção e bons efeitos práticos, esse curta inovador de 1920 é definitivamente um marco no cinema.
08042019: O Granulado
2.4 4Pareceu bem mais uma visão pessoal para si de que para os outros, mas tem potencial.
Percepção Sobre a Experiência Humana
2.9 3Tão curto quanto a própria vida.