Não é um filme muito sério. Apesar de tratar de um assunto dramático, a abordagem dele é mais voltada para a comédia e talvez por isso seja agradável.
O cara tem um transtorno que atrapalha sua vida inteira e ninguém sabe como ajudar. Ora, situações desesperadoras exigem medidas desesperadas! Para melhorar, o protagonista tenta DE TUDO, inclusive não fazer nada. Troca de psiquiatra centenas de vezes, até que se apaixona. Aqui entra a parte boba da história: o cara conhece uma mulher e as suas tentativas de melhorar meio que giram em torno do romance.
Acho foda como o roteirista foi capaz de escrever sobre uma experiência própria (diz ele) sem se vitimizar. Matthew Perry NÃO carrega os trejeitos de Chandler e consegue transmitir tanto a apatia quanto a angustia.
A cena em que Hudson tenta culpar a mãe, pra mim, é um destaque. E, ignorando algumas atitudes incoerentes, achei realista o final. Não adiantava nada trazer uma solução miraculosa para o caso, como se houvesse uma receita. O cara simplesmente tem que aceitar o seu problema e viver como pode, com ou sem a garota da sua vida.
Anticristo me gerou um verdadeiro mal-estar com Lars, mas ele se retratou dps. De qualquer forma, não pude deixar de enxergar semelhanças entre a mensagem de Lars, naquele filme, e de Jan, nesse aqui. A sorte é que o segundo se propôs a colocar isso em palavras, e o fez muito bem. O diálogo sobre a natureza e o dogma de Deus é, tipo, sensacional.
Tudo o que já vi nos curtas do diretor está lá: stop motion muito bem feito, trilha sonora exagerada, partes do corpo com vida própria, muito nojo e nenhum pudor.
Achei a caracterização de época super caprichada. O modo como ele aborda a intervenção psiquiátrica e o moralismo, com a figura do marquês, é demais. Tudo isso, mas sem excesso de didatismo. A prova de que dá, sim, para fazer cinema surreal de qualidade, para além de Buñel e Lynch.
Almodóvar sabe tratar de assuntos polêmicos de uma forma quase cômica, satírica; coloca o dedo na ferida e faz com que a gente sinta cócegas, quando deveríamos estar urrando de dor. A situação é tão absurda que a platéia ri de tamanha ironia, mas se imaginar na pele daquela personagem é desesperador.
Apesar de o estilo não me apetecer muito, o filme não ficou devendo nada a 'Fale com ela' ou 'Volver'. É tão ousado e mórbido quanto os outros.
Primeiro, pensei que o foco do filme seria a comunidade científica - errei; depois, pensei que seria um drama familiar – errei; por fim, entendi que se tratava de discutir o papel do masculino/feminino na sociedade, e tudo se encaixou.
Não chega a ser algo vanguardista, mas certamente é um filme original. Nunca consegui enxergar todo esse talento no Bill Murray, apesar de sua parceria com Jarmusch. Dessa vez, no entanto, ele brilhou; não dá pra imaginar o Zissou sem aquela expressão gordinha. E até o Owen Wilson conseguiu, sei lá, não ser tão inconveniente.
Superinteressante foi o uso da metalinguagem pra alfinetar esses documentários enfadonhos que passam em certos canais. TUDO é uma grande piada: o figurino, o cenário, a trilha... Todos esses elementos se combinam para mostrar que a decadência de Zissou só acontece porque sua fama, desde o começo, fundamentou-se em uma grande farsa.
O legal é que o mistério não é descobrir QUEM É o criminoso, mas COMO o crime ocorreu. Parece que Kurosawa quis provar, por A+B, que o prazer de ouvir uma história é o seu desenrolar. A antecipação do desfecho não faz com que o interesse se perca.
Além disso, o filme rende altas reflexões sobre toda essa coisa de como a realidade é socialmente construída e como o relato de testemunhas pode estar equivocado. Ainda levanta questões morais e questiona a confiança entre os homens. Fiquei pensando em como, às vezes, distorcemos lembranças para salvar nosso autoconceito.
Para a condução, só elogios. Ainda mais quando levo em consideração a época. Nessas horas, lembro dos diretores que abusam de canções populares para valorizar o filme. Não que tenha alguma coisa de errado nisso, mas Kurosawa me mostrou que restringir a trilha sonora pode ter um impacto ainda melhor. Os efeitos sonoros, quando surgiam, era penetrantes, certeiros e com o propósito bem definido de dar à cena o tom exato.
Segue o script das comédias românticas de antigamente: garota sem sorte na vida conhece rapaz com coração de ouro. O roteiro não é exatamente inovador, mas diverte. Não cai no besteirol, não idealiza o amor e, diferente das comédias românticas atuais, você não prevê o final já na primeira cena.
Shirley MacLaine é uma atriz ímpar, dona de um visual inconfundível. Não conheço ninguém que tenha ousado imitá-la. E, por mais que eu goste dos dramas, é inegável que seu talento se sobressai nessa fase mais broadway. As coreografias são alegres, longas e exageradas, bem naquela onda burlesca. Como o forte de Bob Fosse era o espetáculo, sobram elogios para a direção. Destaque para a cena do culto religioso. Vale ressaltar, também, que curti a jogada de paralisar algumas cenas, como se os momentos da personagem estivessem sendo documentados. Muito bom.
É um filme muito seco. Captura a monotonia da vida e suas repercursões sobre os relacionamentos. O escritor é um exemplo de homem fútil e insensível. Preenche todo o vazio com mulheres e festas. O único ser vivo por quem ele demonstra uma gota de respeito é a irmã. Baita atuação da Gena, aliás! É ela quem parece mais desesperada na busca por um sentido e, por isso, mais próxima de uma resolução.
Enfim. Muito bom no que se propõe, mas não é meu tipo de filme. Aquela parte mais "lúdica" acabou sendo mais instigante que tudo (além de ser, visualmente, muito linda).
Se eu puder chamar de bom um filme simplesmente por me fazer pensar, então Preciosa é ótimo.
Preciosa é mais um desses filmes pra norteamericano ver. Pegam uma personagem que compõe diversas minorias, colocam no cinema e, pronto, sei-lá-quantas indicações ao Oscar. Claro que é bom ver uma protagonista mais humana, pra variar. Mas cansei desses estereótipos sempre presentes sobre o negro: aquele que fala errado, sonha em ser loiro dos olhos azuis, vive nos guetos e só sai por caridade. Cansei, porque eles exibem tudo isso e, convenientemente, sempre esquecem de mostrar os culpados. Em todos os filmes, como em Preciosa, a culpa é sempre da mãe mal educada ou do padrasto pedófilo.
Apesar de não concordar com toda essa ideologia embutida, acho que vale a pena ser visto. A Preciosa é bastante carismática e a história é muito, muito cruel.
O mais legal é que o suspense continua durante o filme inteiro, mas, em dado momento, a história ganha um tom bem dramático. A questão central do filme deixa de ser descobrir quem é o autor das fitas. Na verdade, a filmagem é apenas o gancho para que um grande conflito venha à tona.
É uma história, principalmente, sobre culpa. E também sobre revanche, redenção, rancor, perdão e até infantilidade. Georges chega na casa do Majid com uma atitude tão agressiva e xenofóbica, que a gente acredita na defesa do rapaz.
Gostei muito do preconceito contra imigrantes não ser denunciado com tanto alarde. Desconfio desses filmes que dão pauladas explícitas contra a sociedade; parece desespero para ganhar o certificado de "consciência social". Além disso, gostei de não ser feito nenhum julgamento moralista dos personagens.
Se fosse um desses filmes comuns, haveria um final feliz do tipo "fizeram as pazes e viraram amigos para sempre". Ainda bem que foi diferente.
Juro que acho legal a proposta de misturar realidade e ficção. Juro também que entendi a premissa da "ausência que move ações". Mas desconfio que pessoas capazes de enxergar vazio existencial neste filme, são as mesmas que crêem no Big Brother como uma ferramenta útil para a compreensão do comportamento humano. Pra mim, 'A falta que nos move' é isso: um produto direto da obsessão que este país tem por reality shows.
[TENTATIVA DE SER] Um Esperando Godot tupiniquim. [2]
Documentário que é A CARA do Lynch. Tá tudo lá: a fábrica, as cenas aparentemente desestruturadas, a arquitetura sonora... e algo de estranho.
Não é uma biografia nem uma análise de sua obra, mas um registro da experiência que foi "Império dos Sonhos". Em alguns momentos, David apenas conta histórias para a câmera; em outros, ele aparece com a mão na massa. O filme também mescla momentos mais íntimos, filmados de forma amadora, com cenas de qualidade profissional.
É uma delícia vê-lo se dedicando a outras formas de arte!!! Mas é muito chato ouvir o diretor atribuir toda sua criatividade à meditação. Felizmente, mesmo pagando de zen, Lynch continua com o poder de transformar o simples em absurdo, fazendo todo mundo questionar a própria lucidez.
Eu vi a versão de 3 horas. É longa demais, não recomendo. Ainda assim, para o nível dos franceses que eu conheço, é ótimo. Só o fato de não ser arrastadíssimo e presunçoso, já me surpreendeu. O casal tem química, a tensão sexual é genuína e, poxa, tem alguma coisa de muito perturbadora nesse filme: a Betty, claro. Mesmo sendo um pé no saco, a petulância da garota leva a primeira parte nas costas. A segunda parte, porém, é muito mais interessante.
No começo, a relação dos dois parecia, pra mim, algo mais... carnal. Pensava que a Betty ia ficar obsessiva e que ele ia traí-la, qualquer coisa fatal assim. (Eu viajo). Chega a segunda parte, Betty surta de vez e o Zorg me surpreendeu totalmente, pelo apoio, pela dor. Pena que o tema 'saúde mental' não foi tão bem desenvolvido (a eutanásia, então, nem se fala). Mas, sei lá, acho que não era o ojetivo tb.
Sou meio chata com filmes sobre loucos. Acho desagradável vê-los como motivo de piada, mas também não simpatizo com filmes que exibem a loucura como algo grave, imobilizante, sinônimo de decadência.
Eis por que o filme me surpreendeu. De forma descontraída, ele mostra como o trabalho também pode ter efeito terapêutico, ajudando a reinserir o sujeito na sociedade. Indo além, ele rompe com essa idéia de que os loucos só servem pra trabalhos simples, que não podem ter uma profissão séria, economicamente produtiva, valorizada socialmente. O psiquiatra aparece pouco, mas representa a loucura maior: permitir que essas pessoas tenham suas habilidades tolhidas por uma instituição que superestima o poder de medicamentos e subestima as capacidades individuais.
Maior anti-spoiler de todos: o cara tem uma missão que nunca é revelada. Pronto. Assista sabendo disso e evite decepções. Se você só gosta de filmes em que, no final, aparece um personagem semiDeus pra explicar tudo, passe longe.
No mais, todo o enquadramento do Jim é uma obra de arte e deve ser apreciado como tal. Exige contemplação e concentração. Caso contrário, vai realmente parecer um tédio. Eu gostaria de tê-lo visto no cinema, sem pausas e sem telefone tocando.
O filme só não é ruim, porque a história é ótima. Acho inaceitável que um cineasta se aproprie de uma vida como a do Pollock para retratá-la de modo tão insípido.
Tem umas imagens muito lindas, mesmo. Também preciso falar que amo esse piano à la Michael Nyman. AMO!
Com relação à trama, a tensão entre o casal mais velho me causou grande desconforto. Todo fim de um relacionamento envolve muito silêncio; o silêncio, por sua vez, é um indicador de que há coisas mais graves encobertas. Os personagens passaram isso muito bem. À medida que a relação conjugal ia se tornando insustentável, eu quase desmoronei junto.
Quem gosta da Psicanálise vai considerar super freudiano, mas achei o suspense meio insosso. Sou medrosa por demais e não senti sequer um fio de cabelo tremendo.
A única coisa que não me agradou foi a câmera. Ele podia ter maneirado na tremedeira, né, gente. Depois de 2 horas vendo a tela girar, fiquei tontinha.
Tirando isso, a fotografia é magnífica. Só ela já pagou meu ingresso. Quanto ao tema, eu sei que há inúmeros filmes abordando o fim do mundo. Mas a maioria deles mostra a tentativa desesperada de se evitar a catástrofe. O caso deste aqui é bem diferente. Lars está mais interessado em psicologia do que em ficção científica.
Nenhum personagem se aventura a bancar o herói e impedir a colisão iminente; o drama se passa dentro de casa, durante a espera. E aquele final com Wagner, hein?
Enfim. Embora a primeira parte seja uma doença e a segunda tenha me deixado sufocada, não é nada tão traumatizante quanto Anticristo. Eu adorei.
Um dos mais fáceis e menos enigmáticos do Lars. Além da crítica ao próprio cinema e às artes cênicas de modo geral, me fez pensar muito na questão da terceirização e na relação patrão/funcionário. Aliás, quanta semelhança com 1984! Tal qual 'O Grande Chefe', o 'Big Brother' é obedecido cegamente pelos trabalhadores, mesmo sem nunca ter sido visto.
Um pianista conduzido por um maestro, deu nisso: obra-prima. Tocante em todos os sentidos. Até porque a história é cruel, rende cenas fortes.
Não tenho muito a acrescentar. A gente passa a vida discutindo sobre o holocausto, ouvindo professores, lendo livros. Aí vem um filme desses e diz: "Quer saber? Pare de falar. Veja. Sinta. Ouça". Pra mim, é uma obra que envolve muito silêncio.
O final rende uma reflexão doida, sobre a nossa eterna busca por um vilão.
Scorsese é mestre em demonstrar o prestígio social e a ruína nas cidades. Aqui, no entanto, ele mantém o foco num período de prosperidade para os EUA. Pra gente, que assiste a tudo isso com quase um século e meio de distância, trata-se de uma classe tola. Mas, naquele contexto, a única pessoa que representa a decadência é a personagem de Michelle Pfeiffer - e, mesmo assim, não é uma perda financeira e sim moral. Talvez por isso a maioria das pessoas tenha achado o filme fraco. O argumento histórico e produções de época saem mesmo do lugar-comum do diretor.
Eu, no entanto, amei o filme. Não vi problema algum na trama. O figurino é charmoso e a direção magnifíca, como era de se esperar.
Só mudaria uma coisa: embora tenha achado interessante ver o futuro da família Archer, acho que o final seria mais reflexivo se encerrasse no momento em que o protagonista conclui que todos desconfiam do seu romance, antes da May engravidar.
Só pra corrigir a sinopse: ele não é jovem. Mas não faz tanta diferença.
Assim: comédia não é o meu gênero preferido, pois acho que a maioria peca por mau gosto, ridicularizando a vida alheia e apostando na mediocridade do público. "Rapaz Solitário" não foge à regra, tanto que em algumas cenas eu senti vergonha alheia. No entanto, não foi o suficiente pra me fazer perder a paciência, pois o filme, em geral, é bom. Acho que é preciso olhar através do verniz cômico e perceber que ele usa o humor para falar de algo sério: vidas vazias. Por isso, não nego que também houve cenas em que cheguei a pensar: "cara, isso é genial" (a do restaurante e a da TV, especialmente). Vários aspectos da solidão são satirizados e muita gente pode se identificar. A cena do protagonista namorando o travesseiro, por exemplo, é hilária.
Enfim. Achei o saldo final do filme positivo, apesar dos excessos.
Sensacional! A narração dá um tom de fábula, mas de fairytale o filme não tem nada. Pelo contrário. Ele mostra a podridão de cada ser humano. O pedófilo é um personagem-chave neste sentido. A comunidade joga pedras, mas quem ali está livre de pecados? Outros personagens também têm atitudes terrivelmente escrotas (eu queria estrangular o Patrick Wilson, na boa!). Kate é a mulher que tenta não se conformar com a infelicidade conjugal, mas faz isso da maneira mais torta possível, às escondidas. Basicamente, os protagonistas simplesmente não querem assumir responsabilidades, tomar as rédeas da vida, crescer. Enfim, um filme cheio de sutilezas. A alusão à Mme Bovary foi a cereja no bolo.
Insensível
3.6 48 Assista AgoraNão é um filme muito sério. Apesar de tratar de um assunto dramático, a abordagem dele é mais voltada para a comédia e talvez por isso seja agradável.
O cara tem um transtorno que atrapalha sua vida inteira e ninguém sabe como ajudar. Ora, situações desesperadoras exigem medidas desesperadas!
Para melhorar, o protagonista tenta DE TUDO, inclusive não fazer nada. Troca de psiquiatra centenas de vezes, até que se apaixona. Aqui entra a parte boba da história: o cara conhece uma mulher e as suas tentativas de melhorar meio que giram em torno do romance.
Acho foda como o roteirista foi capaz de escrever sobre uma experiência própria (diz ele) sem se vitimizar.
Matthew Perry NÃO carrega os trejeitos de Chandler e consegue transmitir tanto a apatia quanto a angustia.
A cena em que Hudson tenta culpar a mãe, pra mim, é um destaque. E, ignorando algumas atitudes incoerentes, achei realista o final. Não adiantava nada trazer uma solução miraculosa para o caso, como se houvesse uma receita. O cara simplesmente tem que aceitar o seu problema e viver como pode, com ou sem a garota da sua vida.
Insanidade
4.2 64Anticristo me gerou um verdadeiro mal-estar com Lars, mas ele se retratou dps. De qualquer forma, não pude deixar de enxergar semelhanças entre a mensagem de Lars, naquele filme, e de Jan, nesse aqui. A sorte é que o segundo se propôs a colocar isso em palavras, e o fez muito bem. O diálogo sobre a natureza e o dogma de Deus é, tipo, sensacional.
Tudo o que já vi nos curtas do diretor está lá: stop motion muito bem feito, trilha sonora exagerada, partes do corpo com vida própria, muito nojo e nenhum pudor.
Achei a caracterização de época super caprichada. O modo como ele aborda a intervenção psiquiátrica e o moralismo, com a figura do marquês, é demais.
Tudo isso, mas sem excesso de didatismo. A prova de que dá, sim, para fazer cinema surreal de qualidade, para além de Buñel e Lynch.
A Pele que Habito
4.2 5,1K Assista AgoraAlmodóvar sabe tratar de assuntos polêmicos de uma forma quase cômica, satírica; coloca o dedo na ferida e faz com que a gente sinta cócegas, quando deveríamos estar urrando de dor.
A situação é tão absurda que a platéia ri de tamanha ironia, mas se imaginar na pele daquela personagem é desesperador.
Apesar de o estilo não me apetecer muito, o filme não ficou devendo nada a 'Fale com ela' ou 'Volver'. É tão ousado e mórbido quanto os outros.
Primeiro, pensei que o foco do filme seria a comunidade científica - errei; depois, pensei que seria um drama familiar – errei; por fim, entendi que se tratava de discutir o papel do masculino/feminino na sociedade, e tudo se encaixou.
A Vida Marinha com Steve Zissou
3.8 454 Assista AgoraNão chega a ser algo vanguardista, mas certamente é um filme original.
Nunca consegui enxergar todo esse talento no Bill Murray, apesar de sua parceria com Jarmusch. Dessa vez, no entanto, ele brilhou; não dá pra imaginar o Zissou sem aquela expressão gordinha. E até o Owen Wilson conseguiu, sei lá, não ser tão inconveniente.
Superinteressante foi o uso da metalinguagem pra alfinetar esses documentários enfadonhos que passam em certos canais. TUDO é uma grande piada: o figurino, o cenário, a trilha... Todos esses elementos se combinam para mostrar que a decadência de Zissou só acontece porque sua fama, desde o começo, fundamentou-se em uma grande farsa.
Rashomon
4.4 301 Assista AgoraO legal é que o mistério não é descobrir QUEM É o criminoso, mas COMO o crime ocorreu. Parece que Kurosawa quis provar, por A+B, que o prazer de ouvir uma história é o seu desenrolar. A antecipação do desfecho não faz com que o interesse se perca.
Além disso, o filme rende altas reflexões sobre toda essa coisa de como a realidade é socialmente construída e como o relato de testemunhas pode estar equivocado. Ainda levanta questões morais e questiona a confiança entre os homens. Fiquei pensando em como, às vezes, distorcemos lembranças para salvar nosso autoconceito.
Para a condução, só elogios. Ainda mais quando levo em consideração a época. Nessas horas, lembro dos diretores que abusam de canções populares para valorizar o filme. Não que tenha alguma coisa de errado nisso, mas Kurosawa me mostrou que restringir a trilha sonora pode ter um impacto ainda melhor. Os efeitos sonoros, quando surgiam, era penetrantes, certeiros e com o propósito bem definido de dar à cena o tom exato.
Charity, Meu Amor
3.9 53Segue o script das comédias românticas de antigamente: garota sem sorte na vida conhece rapaz com coração de ouro. O roteiro não é exatamente inovador, mas diverte. Não cai no besteirol, não idealiza o amor e, diferente das comédias românticas atuais, você não prevê o final já na primeira cena.
Shirley MacLaine é uma atriz ímpar, dona de um visual inconfundível. Não conheço ninguém que tenha ousado imitá-la. E, por mais que eu goste dos dramas, é inegável que seu talento se sobressai nessa fase mais broadway.
As coreografias são alegres, longas e exageradas, bem naquela onda burlesca. Como o forte de Bob Fosse era o espetáculo, sobram elogios para a direção. Destaque para a cena do culto religioso. Vale ressaltar, também, que curti a jogada de paralisar algumas cenas, como se os momentos da personagem estivessem sendo documentados.
Muito bom.
Amantes
4.1 25É um filme muito seco. Captura a monotonia da vida e suas repercursões sobre os relacionamentos. O escritor é um exemplo de homem fútil e insensível. Preenche todo o vazio com mulheres e festas. O único ser vivo por quem ele demonstra uma gota de respeito é a irmã. Baita atuação da Gena, aliás! É ela quem parece mais desesperada na busca por um sentido e, por isso, mais próxima de uma resolução.
Enfim. Muito bom no que se propõe, mas não é meu tipo de filme. Aquela parte mais "lúdica" acabou sendo mais instigante que tudo (além de ser, visualmente, muito linda).
Preciosa: Uma História de Esperança
4.0 2,0K Assista AgoraSe eu puder chamar de bom um filme simplesmente por me fazer pensar, então Preciosa é ótimo.
Preciosa é mais um desses filmes pra norteamericano ver. Pegam uma personagem que compõe diversas minorias, colocam no cinema e, pronto, sei-lá-quantas indicações ao Oscar.
Claro que é bom ver uma protagonista mais humana, pra variar. Mas cansei desses estereótipos sempre presentes sobre o negro: aquele que fala errado, sonha em ser loiro dos olhos azuis, vive nos guetos e só sai por caridade.
Cansei, porque eles exibem tudo isso e, convenientemente, sempre esquecem de mostrar os culpados. Em todos os filmes, como em Preciosa, a culpa é sempre da mãe mal educada ou do padrasto pedófilo.
Apesar de não concordar com toda essa ideologia embutida, acho que vale a pena ser visto. A Preciosa é bastante carismática e a história é muito, muito cruel.
Caché
3.8 384 Assista AgoraO mais legal é que o suspense continua durante o filme inteiro, mas, em dado momento, a história ganha um tom bem dramático. A questão central do filme deixa de ser descobrir quem é o autor das fitas. Na verdade, a filmagem é apenas o gancho para que um grande conflito venha à tona.
É uma história, principalmente, sobre culpa. E também sobre revanche, redenção, rancor, perdão e até infantilidade. Georges chega na casa do Majid com uma atitude tão agressiva e xenofóbica, que a gente acredita na defesa do rapaz.
Gostei muito do preconceito contra imigrantes não ser denunciado com tanto alarde. Desconfio desses filmes que dão pauladas explícitas contra a sociedade; parece desespero para ganhar o certificado de "consciência social". Além disso, gostei de não ser feito nenhum julgamento moralista dos personagens.
Se fosse um desses filmes comuns, haveria um final feliz do tipo "fizeram as pazes e viraram amigos para sempre". Ainda bem que foi diferente.
Melhor cena de suicídio que já vi no cinema [2]
A Falta Que Nos Move
3.4 54 Assista AgoraJuro que acho legal a proposta de misturar realidade e ficção. Juro também que entendi a premissa da "ausência que move ações". Mas desconfio que pessoas capazes de enxergar vazio existencial neste filme, são as mesmas que crêem no Big Brother como uma ferramenta útil para a compreensão do comportamento humano.
Pra mim, 'A falta que nos move' é isso: um produto direto da obsessão que este país tem por reality shows.
[TENTATIVA DE SER] Um Esperando Godot tupiniquim. [2]
Lynch (One)
4.0 2Documentário que é A CARA do Lynch. Tá tudo lá: a fábrica, as cenas aparentemente desestruturadas, a arquitetura sonora... e algo de estranho.
Não é uma biografia nem uma análise de sua obra, mas um registro da experiência que foi "Império dos Sonhos". Em alguns momentos, David apenas conta histórias para a câmera; em outros, ele aparece com a mão na massa. O filme também mescla momentos mais íntimos, filmados de forma amadora, com cenas de qualidade profissional.
É uma delícia vê-lo se dedicando a outras formas de arte!!! Mas é muito chato ouvir o diretor atribuir toda sua criatividade à meditação. Felizmente, mesmo pagando de zen, Lynch continua com o poder de transformar o simples em absurdo, fazendo todo mundo questionar a própria lucidez.
Betty Blue
4.1 81Eu vi a versão de 3 horas. É longa demais, não recomendo. Ainda assim, para o nível dos franceses que eu conheço, é ótimo. Só o fato de não ser arrastadíssimo e presunçoso, já me surpreendeu. O casal tem química, a tensão sexual é genuína e, poxa, tem alguma coisa de muito perturbadora nesse filme: a Betty, claro.
Mesmo sendo um pé no saco, a petulância da garota leva a primeira parte nas costas. A segunda parte, porém, é muito mais interessante.
No começo, a relação dos dois parecia, pra mim, algo mais... carnal. Pensava que a Betty ia ficar obsessiva e que ele ia traí-la, qualquer coisa fatal assim. (Eu viajo). Chega a segunda parte, Betty surta de vez e o Zorg me surpreendeu totalmente, pelo apoio, pela dor.
Pena que o tema 'saúde mental' não foi tão bem desenvolvido (a eutanásia, então, nem se fala). Mas, sei lá, acho que não era o ojetivo tb.
Dá Para Fazer
4.4 70Sou meio chata com filmes sobre loucos. Acho desagradável vê-los como motivo de piada, mas também não simpatizo com filmes que exibem a loucura como algo grave, imobilizante, sinônimo de decadência.
Eis por que o filme me surpreendeu. De forma descontraída, ele mostra como o trabalho também pode ter efeito terapêutico, ajudando a reinserir o sujeito na sociedade. Indo além, ele rompe com essa idéia de que os loucos só servem pra trabalhos simples, que não podem ter uma profissão séria, economicamente produtiva, valorizada socialmente.
O psiquiatra aparece pouco, mas representa a loucura maior: permitir que essas pessoas tenham suas habilidades tolhidas por uma instituição que superestima o poder de medicamentos e subestima as capacidades individuais.
Os Limites do Controle
3.6 57 Assista AgoraMaior anti-spoiler de todos: o cara tem uma missão que nunca é revelada. Pronto. Assista sabendo disso e evite decepções. Se você só gosta de filmes em que, no final, aparece um personagem semiDeus pra explicar tudo, passe longe.
No mais, todo o enquadramento do Jim é uma obra de arte e deve ser apreciado como tal. Exige contemplação e concentração. Caso contrário, vai realmente parecer um tédio. Eu gostaria de tê-lo visto no cinema, sem pausas e sem telefone tocando.
E, caramba, quero essa trilha sonora já!
Pollock
3.7 100O filme só não é ruim, porque a história é ótima.
Acho inaceitável que um cineasta se aproprie de uma vida como a do Pollock para retratá-la de modo tão insípido.
À Deriva
3.6 367Tem umas imagens muito lindas, mesmo. Também preciso falar que amo esse piano à la Michael Nyman. AMO!
Com relação à trama, a tensão entre o casal mais velho me causou grande desconforto. Todo fim de um relacionamento envolve muito silêncio; o silêncio, por sua vez, é um indicador de que há coisas mais graves encobertas. Os personagens passaram isso muito bem. À medida que a relação conjugal ia se tornando insustentável, eu quase desmoronei junto.
A Órfã
3.6 3,4K Assista AgoraQuem gosta da Psicanálise vai considerar super freudiano, mas achei o suspense meio insosso. Sou medrosa por demais e não senti sequer um fio de cabelo tremendo.
Melancolia
3.8 3,1K Assista AgoraA única coisa que não me agradou foi a câmera. Ele podia ter maneirado na tremedeira, né, gente. Depois de 2 horas vendo a tela girar, fiquei tontinha.
Tirando isso, a fotografia é magnífica. Só ela já pagou meu ingresso.
Quanto ao tema, eu sei que há inúmeros filmes abordando o fim do mundo. Mas a maioria deles mostra a tentativa desesperada de se evitar a catástrofe. O caso deste aqui é bem diferente. Lars está mais interessado em psicologia do que em ficção científica.
Nenhum personagem se aventura a bancar o herói e impedir a colisão iminente; o drama se passa dentro de casa, durante a espera. E aquele final com Wagner, hein?
Enfim. Embora a primeira parte seja uma doença e a segunda tenha me deixado sufocada, não é nada tão traumatizante quanto Anticristo. Eu adorei.
O Grande Chefe
3.4 63 Assista AgoraUm dos mais fáceis e menos enigmáticos do Lars.
Além da crítica ao próprio cinema e às artes cênicas de modo geral, me fez pensar muito na questão da terceirização e na relação patrão/funcionário.
Aliás, quanta semelhança com 1984! Tal qual 'O Grande Chefe', o 'Big Brother' é obedecido cegamente pelos trabalhadores, mesmo sem nunca ter sido visto.
Um Filme sobre o Amor
3.7 3Fiquei com muita vontade de ver. Espero que seja tão bom quanto a sinopse =)
O Pianista
4.4 1,8K Assista AgoraUm pianista conduzido por um maestro, deu nisso: obra-prima. Tocante em todos os sentidos. Até porque a história é cruel, rende cenas fortes.
Não tenho muito a acrescentar.
A gente passa a vida discutindo sobre o holocausto, ouvindo professores, lendo livros. Aí vem um filme desses e diz: "Quer saber? Pare de falar. Veja. Sinta. Ouça". Pra mim, é uma obra que envolve muito silêncio.
O final rende uma reflexão doida, sobre a nossa eterna busca por um vilão.
A Época da Inocência
3.5 249 Assista AgoraScorsese é mestre em demonstrar o prestígio social e a ruína nas cidades. Aqui, no entanto, ele mantém o foco num período de prosperidade para os EUA. Pra gente, que assiste a tudo isso com quase um século e meio de distância, trata-se de uma classe tola. Mas, naquele contexto, a única pessoa que representa a decadência é a personagem de Michelle Pfeiffer - e, mesmo assim, não é uma perda financeira e sim moral.
Talvez por isso a maioria das pessoas tenha achado o filme fraco. O argumento histórico e produções de época saem mesmo do lugar-comum do diretor.
Eu, no entanto, amei o filme. Não vi problema algum na trama. O figurino é charmoso e a direção magnifíca, como era de se esperar.
Só mudaria uma coisa: embora tenha achado interessante ver o futuro da família Archer, acho que o final seria mais reflexivo se encerrasse no momento em que o protagonista conclui que todos desconfiam do seu romance, antes da May engravidar.
Rapaz Solitário
3.4 49Só pra corrigir a sinopse: ele não é jovem.
Mas não faz tanta diferença.
Assim: comédia não é o meu gênero preferido, pois acho que a maioria peca por mau gosto, ridicularizando a vida alheia e apostando na mediocridade do público. "Rapaz Solitário" não foge à regra, tanto que em algumas cenas eu senti vergonha alheia. No entanto, não foi o suficiente pra me fazer perder a paciência, pois o filme, em geral, é bom. Acho que é preciso olhar através do verniz cômico e perceber que ele usa o humor para falar de algo sério: vidas vazias.
Por isso, não nego que também houve cenas em que cheguei a pensar: "cara, isso é genial" (a do restaurante e a da TV, especialmente). Vários aspectos da solidão são satirizados e muita gente pode se identificar. A cena do protagonista namorando o travesseiro, por exemplo, é hilária.
Enfim. Achei o saldo final do filme positivo, apesar dos excessos.
Pecados Íntimos
3.8 569 Assista AgoraSensacional! A narração dá um tom de fábula, mas de fairytale o filme não tem nada. Pelo contrário. Ele mostra a podridão de cada ser humano. O pedófilo é um personagem-chave neste sentido. A comunidade joga pedras, mas quem ali está livre de pecados? Outros personagens também têm atitudes terrivelmente escrotas (eu queria estrangular o Patrick Wilson, na boa!). Kate é a mulher que tenta não se conformar com a infelicidade conjugal, mas faz isso da maneira mais torta possível, às escondidas. Basicamente, os protagonistas simplesmente não querem assumir responsabilidades, tomar as rédeas da vida, crescer.
Enfim, um filme cheio de sutilezas. A alusão à Mme Bovary foi a cereja no bolo.