Um filminho de 2.000 com ar de anos 90. É tão ingênuo, que parece filme pra criança às vezes, o que faz sentido, já que veio depois de o querido do Brendan fazer George, o Rei da Floresta. Aliás, a versatilidade dele aqui impressiona. O filme pra quando você só quer uma Sessão da Tarde sem compromisso num domingo.
O filme faz tudo o que precisa fazer. Não abusa da sensualidade, não se perde em explicações, não pede que os personagens evidenciem o tempo todo o que sentem.
O Juan Pablo manda muito bem como Ezequiel, mudando sua postura e olhar radicalmente dependendo do alterego que seu personagem adota.
Vi pessoas aqui reclamando de o “tema principal” não ser abordado, mas é porque entenderam que o filme fosse sobre pornografia infantil, e não é. É sobre a experiência do Ezequiel — sobre as escolhas que ele pode fazer e faz.
Outros reclamam do final, mas ele também dá o bastante. Como a pergunta do filme é o que Eze vai fazer, a cena em que ele conversa com seu pai é suficiente pra entender que ele desistiu de prosseguir com seu plano. E a cena final, na piscina, mostra que ele está marcado pra sempre pelas suas experiências, independentemente de não ter dado sequência ao que tinha em mente. Isso é simbolizado pela piscina à noite, em que ele mergulha de roupa, contrastando com a cena ensolarada em que ele, ainda inocente e descamisado, nada com Mono.
Por aqui a gente percebe que a franquia Invocação do Mal não é pioneira em fazer propaganda cristã através do terror. Frank, afinal, foi um cara que buscou prazer acima de tudo, sem se importar se isso o levaria ao céu ou ao inferno. Então, criancinhas, não busquem tanto o prazer. Muito menos o sexual, como a safada da dona Julia, que se tornou uma serial killer de tanto tesão.
Agora, falando sério, Hellraiser hoje é mais asqueroso do que assustador, mas faz o que se propõe a fazer. Gera tensão e angústia apesar dos péssimos enquadramentos, diálogos, e atuações.
Maquiagens realmente impressionantes. Mas o mesmo não se pode dizer do verme gigante. Além de ser muito difícil fazê-lo contracenar com os atores por causa das limitações mecânicas do robô, dá pra ver claramente o maquinário por trás dele logo em sua primeira aparição. Chega a ser mais cômico que os efeitos de raios e luzes “cósmicos”.
De qualquer modo, terror tem que incomodar, e achei esse bem mais legal, nesse sentido, dos que filmes do gênero mais atuais.
Acho hilário que essa franquia anuncia entidades muito poderosas, mas que são sempre meio lerdas, esperando as pessoas se safarem, e sempre meio burras, pegas de surpresa pelas estratégias humanas mais óbvias.
O padre, que tem carreira em eventos místicos, não parece nada experiente. E o Frenchie, que deveria ser um ogro cru do campo que não teve acesso a muita educação, tem a sagacidade, a habilidade social e o charme de um Indiana Jones, o que também se reflete no seu visual com lencinho no pescoço — muito Brendan Fraser em A Múmia.
Frenchie pertence a uma aventura/comédia. Por isso o diálogo mais engraçado do filme é entre ele e o padre: — Holy shit! — The holiest.
Se não era pra ser engraçado, foi uma péssima escolha, porque é impossível não rir.
Não preciso elogiar o filme. Então vou registrar que quem vê O Poderoso Chefão jamais imagina que o Marlon Brando pudesse atuar tão mal como Jor-El. Curiosidade: ele se recusava a decorar as falas para ter uma performance mais espontânea, forçando a produção a segurar as falas em cartazes. Nas primeiras cenas do filme, é fácil notar que o Marlon estava lendo. Sofrível e cômico ao mesmo tempo.
É claro que, com os recursos da época pra algo tão ousado, não assusta tanto hoje em dia. Mas é fácil sacar porque foi fenomenal. Os eventos sobrenaturais são realmente assustadores e, nesse sentido, o filme traz muito mais do que obras de terror mais recentes. Uma superprodução digna do autor da história, com efeitos práticos audaciosos e jumpscares que ainda funcionam. Nem as tomadas que hoje parecem cômicas podem tirar o mérito desse clássico.
O filme tá com nota baixa pelos motivos errados. Porque você esperava uma comédia pastelão e encontrou outra coisa, não é motivo pra dar nota baixa. Você tem que avaliar o filme pelo que ele é, e não pelo que você esperava que ele fosse.
Enfim, não é uma comédia pastelão e não foca em provocar risadas. É mais uma reflexão sobre encontrar caminhos para reconciliação num mundo polarizado. Super necessário.
Uma boa premissa, mas mal escrito e mal executado. Acaba que é bem fraquinho e sem personalidade. Nenhum dos personagens cativa. A coisa mais interessante do filme é o apartamento de Hall ser o mesmo do detetive Deckard, do clássico Blade Runner.
Chapelle sempre extremamente inteligente. Boa parte de sua controvérsia está no fato de as pessoas ouvirem seus textos, mas não o que está intrínseco neles. Ouvem as palavras, mas não o conteúdo. Falha típica de quem não entende sarcasmo nem tem senso de humor. Claro, além de as pessoas acreditarem que existe uma maneira de censurar o que seja potencialmente ofensivo para alguém, o que é incoerência pura, já que tudo tem o potencial de ser ofensivo para alguém — especialmente pessoas propensas a levar as coisas para o pessoal. Chapelle faz comédia para inteligentes. Ele é necessário, incorporando o poder do humor de abrir linhas para o diálogo e para o respeito mesmo onde há discordância.
Não entende o filme quem tem as seguintes reclamações:
1. Não troca de cenário; 2. Não explica a história de fundo do protagonista.
Sobre o ponto um:
Filmes como este, com basicamente um personagem e um cenário apenas, formam seu próprio nicho, onde o desafio é exatamente sustentar a atmosfera que se pretende sem depender de muitos artifícios visuais. Chegar a um bom resultado, como "prender do começo ao fim", que é o que todo mundo alega ter sentido, é uma responsabilidade que recai sobre o texto, a edição, e um protagonista muito forte, que precisa ocupar bem mais tempo de tela do que na maioria dos filmes que costumamos ver. Esse tipo de filme exige uma série de soluções criativas com demanda muito mais intensa do que teríamos em filmes visualmente mais dinâmicos.
Sem falar, é claro, que um filme que faz você se sentir confinado por não usar muitos cenários tinha exatamente essa intenção — que você experimentasse a claustrofobia e monotonia que cercam o protagonista. Ou seja, quem reclama de sentir emoções negativas em decorrência da não variação de cenários apenas atesta que o filme acertou.
O filme não oferece mais detalhes sobre a vida pessoal do personagem central de propósito, porque são irrelevantes para o que o filme propõe. Ele não está ali para contar uma historinha sobre esse Joe e sua família. Ele vem retratar a universalidade do sofrimento de Joe. Seja qual for a história dele, e seja qual for a sua, ambos fazem escolhas duvidosas motivadas por culpa. Para gerar essa identificação, é irrelevante se a culpa de Joe é por X ou Y. O importante é que ela existe e que, enquanto não é aceita, fode seu mundo interior de maneira que isso se desdobra em todas as suas relações interpessoais, prejudica sua saúde, atrapalha drasticamente sua vida profissional, e assim por diante.
Quem pede por explicações sobre o caso pessoal de Joe não entende que, quanto mais explorássemos o que aconteceu, mais propensos seríamos a atuar como juízes, decidindo a respeito da inocência ou culpabilidade do protagonista. Mas Joe é justamente o retrato de que nossos julgamentos sobre culpa e inocência são falhos. Pedir por esclarecimentos é denunciar que a mensagem do filme se perdeu.
Enfim, o filme é genial ao mostrar como nós todos (e não apenas Joe) tendemos a projetar nossas experiências nos outros para decidir quem é vítima e quem é vilão. Como fugimos da nossa culpa por meio do ódio, do sarcasmo, da impaciência, e adotando a ideia de que necessariamente somos os heróis de alguma história, pois precisamos sê-lo para aliviar nossa consciência. Joe corre atrás do vento, não tentando salvar Emily, mas tentando salvar sua mente, porque ele enxerga nela um cônjuge incompreendido e vitimado, que precisa de toda forma voltar à sua filha. Mas Emily não é exatamente isso. Joe é, aos seus próprios olhos.
Um dos principais motivos de querer se safar no tribunal é voltar a sua filha. Joe sabe que, se for para a cadeia, estará longe dela, o que pensa ser injusto. Decidir, no final, admitir sua culpa no tribunal, implica admitir também sua parcela de culpa pelas circunstâncias que o afastam de sua ex-esposa e filha.
Quanto ao Jake, que todo mundo elogia com razão, destaco o modo como pronuncia o nome do seu personagem. Sempre que menciona que seu nome é Joe, algo soa falso, raso, como se não fosse seu nome real. A única vez em que é possível acreditar que o nome dele é Joe é no final, quando a sua última fala é a mesma de tantas vezes, ao telefone: Aqui é o Joe. Dessa vez, essa declaração parece profunda, e é possível sentir que aquele é o nome real do personagem. Porque ele finalmente admitiu quem é para si mesmo; admitiu sua culpa.
Para quem só agora reconsiderou quanto o filme foi brilhante, recomendo Dúvida, com Meryl Streep, Philip Seymour Hoffman, e Amy Adams.
Dificilmente uma continuação que vem tanto tempo depois de um clássico se sustenta. Não é o caso de Doutor Sono.
Na melhor das hipóteses, as sequências tardias funcionam como homenagens e, muito frequentemente, são atestados de que não deveriam ter sido produzidas, fazendo um desfavor ao universo que retratam.
Talvez Doutor Sono não agrade todo mundo por funcionar mais como Suspense/Fantasia do que como terror. E por esperarem que fosse possível recriar a mesma atmosfera do clássico de Kubrick, o que, sinceramente, é uma expectativa absurda, e claramente não era a intenção do projeto.
Doutor Sono amplia o universo de O Iluminado sem estragar nada. Além de resolver muitas questões incertas do primeiro filme, dando uma sensação de maior clareza sobre a realidade dos iluminados, respondendo a várias perguntas que os fãs do primeiro filme se faziam chegando a muitas interpretações diferentes.
No primeiro filme, embora os iluminados já sejam os heróis — Dick salva Dan, que, por sua vez, salva sua mãe — nem sempre é claro se o shining, a "iluminação", é um dom ou uma maldição, porque Dan é muito novo para lidar com suas habilidades. Em Doutor Sono, o potencial heróico dos iluminados fica muito mais evidente, facilitando a identificação com esses personagens.
Em O Iluminado, é mais fácil se identificar com Jack e Wendy — com os adultos atormentados pela realidade cotidiana. Os medos banais que eles têm se desdobram, e o que mexe com nosso psicológico é ver tais medos, tão identificáveis em nós mesmos, crescerem ao ponto de se tornarem monstros invencíveis.
Em Doutor Sono, ao nos identificarmos com os iluminados, vemos como nossos traumas podem ser superados, e que é possível não sucumbir a nossos vícios e à repetição dos erros dos nossos pais conforme crescemos. Como Dan, aprendemos a enfrentar nossos medos e derrotá-los. Como Abra, aprendemos que não precisamos esconder nossos talentos, por mais estranhos, só por medo de não sermos compreendidos.
Jack Torrance fugia da sua rotina no álcool; uma que ele nunca aceitou ou superou. Permitindo que seus medos o arrastassem, se tornou uma força destruidora para sua família. Dan, que passou a vida entorpecido para não dar vazão ao shining nem às cicatrizes causadas por seus pais e pelo Hotel, aprende a superar seu passado e lidar com seu presente, a ponto de se tornar uma ajuda essencial para Abra e tantas futuras vítimas do Nó.
O Iluminado explora o medo de ser engolido pela banalidade da vida, por ciclos de violência que parecem inevitáveis — talvez, inclusive, por termos certa violência como parte da nossa natureza. Mas Doutor Sono afirma que, com ajuda de Dans, Abras, Dicks, e Billies, podemos escapar dos ciclos aos quais estaríamos fadados se nos tornássemos isolados como Jack, e podemos até descobrir que as qualidades que temíamos em nós mesmos podem ajudar outras pessoas.
A riqueza desta animação, na minha opinião, é que o Batman não é o herói invencível da história. Ele passa o filme todo correndo de um lado para o outro como uma barata tonta sem nem saber atrás de quem.
É irônico que Andy, o Fantasma, diga para Bruce que ele finalmente está agindo como o melhor detetive do mundo. Porque ele não se dá conta de que a pessoa fazendo a limpa entre os mafiosos de Gotham estava na cara dele o tempo todo até o último momento, quando o plano de vingança da Femme Fatale já está praticamente concluído.
Esse é o tipo de coisa que o Batman farejaria mais cedo, como acontece no caso do Capuz Vermelho. Mas dessa vez Wayne está cego pelo amor.
Outra coisa interessante é que o Bruce menciona que a última coisa que seu pai lhe disse foi que um vigilante mascarado não seria bem recebido em Gotham, mas provavelmente colocado em Arkham. Ele, ainda assombrado pelo fantasma dos pais, sofre mais um trauma, que é ter seu coração quebrado novamente, não apenas por uma mulher, mas por uma que aprendeu a vingança mascarada na intimidade com ele mesmo, e ainda o superou. Esta é mais uma história sobre como Bruce se aproxima de ter seu nome no quadro de internos do Asilo.
Nesta animação, vemos quebrado o mundo interior de Wayne, que já sabemos que é atormentado pelo passado, mas que agora desce a um novo nível justamente quando cogitava que seria capaz de romper o laço nocivo com seus pais e, pela primeira vez na vida, ser feliz.
Isso introduz maior clareza sobre os motivos de Batman sempre mergulhar na escuridão implacavelmente, mesmo quando está a solto pela cidade como um maníaco, sem ideia do que está acontecendo, e causando mais estragos do que soluções.
Básico não é o mesmo que raso. O grande público cristão e não cristão que ainda acredita em terapia de reversão precisa de informação básica.
Só não dei cinco estrelas porque o documentário poderia ter apresentado pelo menos uns três testemunhos de especialistas da saúde oferecendo dados sobre depressão, ansiedade, transtorno de estresse pós-traumático, automutilação e suicídio.
Fora isso, é necessário entender que este é o primeiro documentário tão explícito sobre o tema numa grande plataforma de streaming popular, e que a importância disso é inegável e imensurável. O fato de o documentário não ser ácido e oferecer o ponto de vista de pessoas religiosas sem atacar ninguém ou polemizar o assunto é o que o torna acessível para o maior número de pessoas.
Só porque a comunidade LGBTQIA+ sabe que há muito mais a explorar sobre o assunto, não significa que o grande público não precise urgentemente de acesso a informações básicas sobre o assunto. Básico não é o mesmo que raso.
Tinha dado quatro estrelas anos atrás, quando vi pela primeira vez. Hoje revi e favoritei com cinco estrelas. Se você não entendeu nada, mas continua curioso, vou dar a minha opinião sobre o que aconteceu. Minha interpretação.
Gretchen diz para Donnie que seu nome parece de super herói, ao que ele responde: Quem disse que eu não sou um?
A marca de um herói é o sacrifício e, para ser super, ele precisa de habilidades sobre-humanas.
Os superpoderes do Donnie são pelo menos três. Ele consegue enxergar o vetor pelo qual se guiar através do tempo e os raros portais que tornam isso possível. Ele consegue receber mensagens acerca do futuro. Ele consegue se comunicar com outras pessoas com habilidades similares através do tempo. Essas são as que a gente pode observar, porque ele é capaz de mais, já que Frank lhe diz "Eu posso fazer qualquer coisa, e você também pode".
As mensagens sobre o futuro, Donnie costuma receber enquanto dorme. Ele até escreve para a Vovó Morte: Só posso esperar que as repostas venham a mim durante o meu sono. Faz muito sentido que a última música do filme diga "Eu acho curioso que os sonhos em que estou morrendo sejam os melhores que já tive". O heroísmo de Darko cresce conforme suas premonições noturnas anunciam seu triste futuro, que ele aprende a aceitar e ver como algo bom — tanto porque vai salvar outras pessoas como, provavelmente, por causa de seu deslocamento e descontentamento no mundo.
Acordado, Donnie parece sofrer de alucinações com o coelho, já que o rapaz tem problemas psiquiátricos. Mas, na verdade, as visitas de Frank acontecem quando Donnie está sob medicação. São experiências reais.
Quando Darko inunda a escola, sabemos apenas que Frank se comunica com ele incitando certas coisas. Mas Donnie não picha "Ele me obrigou", e sim "Eles me obrigaram", reforçando a ideia de que mais pessoas possuem habilidades similares às dele.
Outras pessoas com habilidades similares são a Vovó Morte e o próprio Frank, ainda que sejam de naturezas diferentes das que Donnie possui. Afinal, Frank viaja o tempo todo ao passado para se comunicar com Darko. Provavelmente por ter morrido no futuro e, portanto, não estar preso ao espaço-tempo como conhecemos. Por isso Donnie e ele não podem se tocar, e vemos uma barreira invisível que separa os dois: Darko num plano atual e vivo, e Frank viajando por diferentes planos, morto.
Vovó Morte, por sua vez, entende a filosofia da viagem no tempo como ninguém na história, e sabe que vai receber uma correspondência de Darko, a qual ela aguarda ansiosamente como um sinal para ela ajudar a evitar um acidente se estiver no lugar certo e na hora certa: o atropelamento. Por isso ela costuma parar no meio da estrada: ela sabe que Frank ainda vai desviar um carro bem diante dela em algum momento no futuro, e que esse incidente mata Gretchen e culmina no assassinato de Frank, que é um momento decisivo para Darko decidir voltar no tempo. A velha escritora sabe que Frank precisa morrer para viajar no tempo e guiar Donnie.
Frank está se comunicando com Donnie para evitar seu futuro assassinato. Dona Morte está torcendo para Donnie entender seu papel na mudança da linha do tempo do seu universo e até lhe entrega uma chave ao pé do ouvido para encorajar seu sacrifício: "Todos morrem sozinhos". Essa frase é fundamental para Darko resolver se sacrificar, porque a solidão era seu maior medo, como ele revela em suas sessões de terapia. Fica mais fácil se entregar ao seu destino quando ele entende que não é o único que enfrenta a morte sozinho, mas que todos fazemos isso.
Durante o filme, Darko está tentando entender sua realidade e seu papel, até que tudo se encaixa numa noite de Halloween, quando se dá conta de que precisa seguir sua intuição até o lugar onde todos os eventos culminam —a porta de celeiro da Vovó Morte. Ali, Frank acidentalmente, desviando da velha, mata Gretchen, pelo que Donnie se vinga, matando Frank, em retribuição, mas também se dando conta de que é tal morte que permite que o coelho o guie até esse cenário. Donnie então percebe que, se voltar no tempo, pode evitar a morte da garota que ama e o assassinato de Frank.
No começo da história, o quarto de Donnie é destruído por uma turbina de avião que ninguém sabe de onde veio. É porque ela veio do futuro. No final do filme, podemos ver que a turbina do voo de Rose Darko se perde do avião e toma uma rota diferente da dele, através do portal, que surge de um fenômeno aleatório. A turbina volta para o passado, caindo sobre a casa da família Darko.
Donnie, quando percebe tudo isso, decide voltar no tempo antes da queda da turbina. Afinal, quando ela caiu pela primeira vez, ele não estava em casa, mas acordando no meio de um campo de golfe. Agora, ele sabe que, se a turbina o matar, ele não vai poder levar Gretchen até o lugar onde ela seria atropelada no futuro. Portanto, também não vai matar Frank, que era, basicamente, seu único amigo.
Com Donnie morto, o incêndio da casa de Jim nunca ocorre, então a mãe dele não precisará mais substituir a professora Kitty na viagem que causaria a sua morte, ficando também a salvo.
É assim que Donnie se torna um super herói — usando seus poderes para viajar no tempo e evitar mortes desnecessárias. Isso dentre outras coisas, como, por exemplo, a demissão de sua professora.
Estou falando o tempo todo de Darko viajar no tempo para facilitar as coisas, colocando tudo da perspectiva do herói. Mas o superpoder de Donnie, na verdade, não se parece com as viagem de Marty McFly em De Volta para o Futuro. O que ele faz parece mais com reiniciar sua realidade inteira a partir do momento em que o universo falhou abrindo uma fenda problemática. (Aquela por onde a turbina passa.) Uma possível prova de que essas pessoas estavam vivendo em um tipo de loop desde que a fenda surgiu é o livro da Vovó Morte. Donnie diz que coisas que ele está experimentando já estavam escritas no livro antes de ele as experimentar.
Quando Donnie morre, é como se a realidade dos demais personagens fosse resetada. Você pode vê-los acordando de madrugada, com as lembranças do que poderia ter acontecido no futuro se Donnie não tivesse sido esmagado pela turbina. Karen teria sido demitida, Jim teria sido preso, e assim por diante. Gretchen e Mary acenam uma para a outra, confirmando que, apesar de nunca terem se conhecido nessa realidade reiniciada, sentem que se conheceram. No futuro. Sentem uma conexão entre si, que provavelmente deriva do amor por Donnie.
Manter suas lembranças do futuro caótico que Darko criaria se não fosse atingido pela turbina é muito importante para as pessoas que ele afeta. Caso contrário, o incêndio da casa de Jim teria sido em vão, pois o criminoso sairia impune depois do reinício. Mas as pessoas que tiveram suas realidades resetadas podem lembrar do que Darko expôs sobre Jim com ajuda de Frank, por meio do incêndio. Ainda que suas lembranças sejam fragmentadas, como as de quem acorda e tenta lembrar de um sonho.
Essa história é complicada o suficiente, mas se torna ainda mais bonita porque, durante seus curtos dias, Donnie também está numa jornada pela adolescência, tentando entender sexo, solidão, e o significado de ser humano. Ou seja, ele é um adolescente normal, nesse sentido. Mas, porque está em contato com suas questões mais íntimas, é percebido por todos como um garoto perturbado.
De fato, o filme tenta mostrar que as pessoas vistas como loucas pela maioria são as mais sãs. Darko, Gretchen, Cherita, Roberta — são as pessoas que vivem solitárias por serem incompreendidas, seja por sua autenticidade, traumas ou percepção aguçada da realidade. É o que se evidencia pela letra da última música, que toca enquanto olhamos os rostos surpresos de todos os personagens que foram impactados pela escolha de Donnie, Mad World. Ela menciona rostos familiares e cansados correndo em círculos num mundo enlouquecido. Na letra da música, as pessoas "normais" não se dão conta da loucura do mundo. Quem percebe é o narrador, o cantor, que observa de fora. Assim como Darko, que não aceita a abordagem simplista que as pessoas têm do mundo, como a professora Kiitty, Jim, e até sua psiquiatra. Ele sempre questiona e zomba das visões de mundo "normais".
As pessoas solitárias e esquisitas do filme despertam medo nos "normais" assim como Darko nos incomoda quando sorri diante de suas visões ou fica com um olhar alucinado quando comete um ato de vandalismo. Essas personagens bizarras são pessoas socialmente deslocadas por sua personalidade, dor ou trauma. Gretchen teve a mãe esfaqueada pelo padrasto; Cherita não é apreciada por causa de sua aparência; Darko pode ser depressivo ou outra coisa, já que toma medicamentos controlados.
Por último, é possível que Donnie não faça sua escolha crucial apenas uma vez. Daí a letra de Mad World, novamente fazendo sentido, quando menciona caminhar em círculos.
No começo do filme, Darko está exatamente onde o portal se abriu e absorveu a turbina. Ele provavelmente poderia ter entrado no portal, mas preferiu não fazê-lo, e isso piorou as coisas para ele e as pessoas que ele amava.
Ou pode ser que ele tenha acabado de reiniciar outra realidade. Ele acabou de se sacrificar tomando um portal, que o trouxe de volta aonde ele precisará escolher se sacrificar novamente.
Essa possibilidade de Darko repetir um ciclo e sempre se tornar um herói se confirma pelo fato de a Vovó Morte sempre checar a caixa de correspondências. Como ela sabe que uma correspondência vai chegar? Talvez porque já tenha recebido essa carta em outro reboot da sua linha do tempo.
Darko também justifica sua tentativa de seguir o plano de Frank dizendo "Ele salvou a minha vida", coisa que não vemos acontecer em nenhum momento do filme. Frank pode ter salvado Donnie em outro recomeço daquela realidade.
Donnie também explica a Gretchen que seus "problemas" começaram quando ele incendiou um prédio abandonado. Isso antes de ele incendiar a casa de Jim. Talvez, ele já tenha incendiado a casa de vários Jims em vários reboots, anteriormente àquela conversa, sem nunca resolver o problema da fenda.
Donnie ainda revela não reconhecer Frank quando tira a máscara pela primeira vez, mas sua irmã, durante a festa de Halloween, menciona um amigo Frank, que foi buscar cervejas, coisa que também está anotada e assinada por Frank num bilhete na geladeira. Como ele não conhece alguém tão próximo a ele? Talvez não o reconheça apenas nessa versão reiniciada de sua realidade.
Os pais de Darko, numa conversa em seu quarto, relembram também um Frank como sendo seu amigo do passado, que morreu na noite de sua formatura. Como o coelho Frank diz que esse era o nome de seu pai e avô, é possível que o pai dele tenha morrido de forma trágica, e agora seria a vez dele, repetindo um ciclo e confirmando a ideia de Gretchen de que "Algumas pessoas nascem com a tragédia no sangue".
O filme fica ainda melhor por conseguir contar uma história tão complexa tendo como pano de fundo uma crítica ao conservadorismo, à sociedade americana e ao seu sistema educacional, e ao modo como os adolescentes podem ser invisíveis para os adultos.
Essa relação entre adultos e jovens é um tema muito importante para a história, representada principalmente no discurso da professora Karen ao ser demitida, levando consigo, para fora do prédio, a bandeira americana. Mas ela também surge na terapeuta com sentimentos ambíguos por Darko, que não conquista sua confiança e se revela uma delatora; no pai de Donine, que só faz rir diante dos problemas escolares do filho; na mãe que sofre sozinha como um dos poucos adultos a se conectar com Donnie; no professor Keneth, que sugere que conversas mais profundas com alunos podem resultar em sua demissão; numa mulher gorda aleatória na plateia durante a noite de talentos, que poderia se enxergar em Cherita, mas valoriza mais o conjunto de crianças magrinhas que fazem o esperado; na professora Kitty projetando seus desejos de glória na filha, e assim por diante.
Kitty, aliás, é uma personagem muito comovente, porque, embora pregue uma vida de fé, tradição, e de escolha entre medo e amor, não é amorosa e tem pavor de ver seu sistema de crença desmoronar. Ela é o retrato das pessoas que se apegam ao status quo e ao banal como se disso dependessem suas vidas porque, de fato, não saberiam o que fazer se precisassem encarar uma realidade com nuances mais complexas do que aquelas às quais estão acostumadas.
Essa é a minha interpretação da coisa toda, mas sugiro que ouça outras pessoas também, porque existem diversas teorias sobre o filme, tão complicadas quanto a minha, e provavelmente até mais.
Endiabrado
3.0 353 Assista AgoraUm filminho de 2.000 com ar de anos 90. É tão ingênuo, que parece filme pra criança às vezes, o que faz sentido, já que veio depois de o querido do Brendan fazer George, o Rei da Floresta. Aliás, a versatilidade dele aqui impressiona. O filme pra quando você só quer uma Sessão da Tarde sem compromisso num domingo.
O Caçador
3.0 60 Assista AgoraO filme faz tudo o que precisa fazer. Não abusa da sensualidade, não se perde em explicações, não pede que os personagens evidenciem o tempo todo o que sentem.
O Juan Pablo manda muito bem como Ezequiel, mudando sua postura e olhar radicalmente dependendo do alterego que seu personagem adota.
Vi pessoas aqui reclamando de o “tema principal” não ser abordado, mas é porque entenderam que o filme fosse sobre pornografia infantil, e não é. É sobre a experiência do Ezequiel — sobre as escolhas que ele pode fazer e faz.
Outros reclamam do final, mas ele também dá o bastante. Como a pergunta do filme é o que Eze vai fazer, a cena em que ele conversa com seu pai é suficiente pra entender que ele desistiu de prosseguir com seu plano. E a cena final, na piscina, mostra que ele está marcado pra sempre pelas suas experiências, independentemente de não ter dado sequência ao que tinha em mente. Isso é simbolizado pela piscina à noite, em que ele mergulha de roupa, contrastando com a cena ensolarada em que ele, ainda inocente e descamisado, nada com Mono.
Hellraiser: Renascido do Inferno
3.5 857 Assista AgoraPor aqui a gente percebe que a franquia Invocação do Mal não é pioneira em fazer propaganda cristã através do terror. Frank, afinal, foi um cara que buscou prazer acima de tudo, sem se importar se isso o levaria ao céu ou ao inferno. Então, criancinhas, não busquem tanto o prazer. Muito menos o sexual, como a safada da dona Julia, que se tornou uma serial killer de tanto tesão.
Agora, falando sério, Hellraiser hoje é mais asqueroso do que assustador, mas faz o que se propõe a fazer. Gera tensão e angústia apesar dos péssimos enquadramentos, diálogos, e atuações.
Maquiagens realmente impressionantes. Mas o mesmo não se pode dizer do verme gigante. Além de ser muito difícil fazê-lo contracenar com os atores por causa das limitações mecânicas do robô, dá pra ver claramente o maquinário por trás dele logo em sua primeira aparição. Chega a ser mais cômico que os efeitos de raios e luzes “cósmicos”.
De qualquer modo, terror tem que incomodar, e achei esse bem mais legal, nesse sentido, dos que filmes do gênero mais atuais.
A Freira
2.5 1,5K Assista AgoraO melhor do filme são os jumpscares.
Acho hilário que essa franquia anuncia entidades muito poderosas, mas que são sempre meio lerdas, esperando as pessoas se safarem, e sempre meio burras, pegas de surpresa pelas estratégias humanas mais óbvias.
O padre, que tem carreira em eventos místicos, não parece nada experiente. E o Frenchie, que deveria ser um ogro cru do campo que não teve acesso a muita educação, tem a sagacidade, a habilidade social e o charme de um Indiana Jones, o que também se reflete no seu visual com lencinho no pescoço — muito Brendan Fraser em A Múmia.
Frenchie pertence a uma aventura/comédia. Por isso o diálogo mais engraçado do filme é entre ele e o padre:
— Holy shit!
— The holiest.
Se não era pra ser engraçado, foi uma péssima escolha, porque é impossível não rir.
Alerta Vermelho
3.1 528Bonitinho. Pra quando você quer só passar o tempo com algo leve. A Gal numa atuação péssima. Mas o Ryan sempre entrega.
Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos
4.0 550 Assista AgoraHilário. Visual icônico. Atuações excelentes. Original. Irretocável.
Aves de Rapina: Arlequina e sua Emancipação Fantabulosa
3.4 1,4KAchei o desempenho menos convincente do Ewan, o que é uma pena, porque adoro tudo que ele faz.
Mas pelo menos a morte do Sionis foi satisfatória — a única do filme que foi realmente legal de assistir.
Poderiam ter aproveitado mais o Bruce. Raramente um mascote é tão carismático e inusitado.
A cena que deveria revelar a crueldade do Sionis, no clube com a garota sobre a mesa… Faltou uma direção que realmente tornasse a coisa assustadora.
A Harley é sempre divertida e a Margot é perfeita no papel em todos os filmes. Só o longa é fraquinho, mesmo.
Superman: O Filme
3.7 514 Assista AgoraNão preciso elogiar o filme. Então vou registrar que quem vê O Poderoso Chefão jamais imagina que o Marlon Brando pudesse atuar tão mal como Jor-El. Curiosidade: ele se recusava a decorar as falas para ter uma performance mais espontânea, forçando a produção a segurar as falas em cartazes. Nas primeiras cenas do filme, é fácil notar que o Marlon estava lendo. Sofrível e cômico ao mesmo tempo.
A Convenção das Bruxas
3.5 1K Assista AgoraSe eu visse isso quando criança, ficaria apavorado.
Poltergeist: O Fenômeno
3.5 1,1K Assista AgoraÉ claro que, com os recursos da época pra algo tão ousado, não assusta tanto hoje em dia. Mas é fácil sacar porque foi fenomenal. Os eventos sobrenaturais são realmente assustadores e, nesse sentido, o filme traz muito mais do que obras de terror mais recentes. Uma superprodução digna do autor da história, com efeitos práticos audaciosos e jumpscares que ainda funcionam. Nem as tomadas que hoje parecem cômicas podem tirar o mérito desse clássico.
Suspiria
3.8 980 Assista AgoraClássico com motivo. Em vários momentos, mais assustador que a releitura de 2018.
An American Pickle
2.9 51O filme tá com nota baixa pelos motivos errados. Porque você esperava uma comédia pastelão e encontrou outra coisa, não é motivo pra dar nota baixa. Você tem que avaliar o filme pelo que ele é, e não pelo que você esperava que ele fosse.
Enfim, não é uma comédia pastelão e não foca em provocar risadas. É mais uma reflexão sobre encontrar caminhos para reconciliação num mundo polarizado. Super necessário.
13º Andar
3.5 222 Assista AgoraUma boa premissa, mas mal escrito e mal executado. Acaba que é bem fraquinho e sem personalidade. Nenhum dos personagens cativa. A coisa mais interessante do filme é o apartamento de Hall ser o mesmo do detetive Deckard, do clássico Blade Runner.
Observadores
3.0 411 Assista AgoraFraquinho, teria se salvado se soubesse a hora certa de encerrar a história. Mas o final beira o cômico. Só a fotografia é interessante.
Duna: Parte 1
3.8 1,6K Assista AgoraEssa versão conserta vários problemas graves do primeiro filme, tornando a história e os motivos mais fáceis de acompanhar e, o longa, tolerável.
Mas não merece quarto estrelas. É bem chatinho e não tem nada de extraordinário.
Venom: Tempo de Carnificina
2.7 636 Assista AgoraPéssimo. Monótono. Nem as tentativas de comédia ajudam. Achei pior que o primeiro.
Top Gun: Ases Indomáveis
3.5 922 Assista AgoraFilminho bobo com trilha triste. Certo que algumas músicas são épicas. Mas a trilha, como um todo, não salva. Vale a pena pela fotografia, só.
Dave Chappelle: Encerramento
3.6 24 Assista AgoraChapelle sempre extremamente inteligente. Boa parte de sua controvérsia está no fato de as pessoas ouvirem seus textos, mas não o que está intrínseco neles. Ouvem as palavras, mas não o conteúdo. Falha típica de quem não entende sarcasmo nem tem senso de humor. Claro, além de as pessoas acreditarem que existe uma maneira de censurar o que seja potencialmente ofensivo para alguém, o que é incoerência pura, já que tudo tem o potencial de ser ofensivo para alguém — especialmente pessoas propensas a levar as coisas para o pessoal. Chapelle faz comédia para inteligentes. Ele é necessário, incorporando o poder do humor de abrir linhas para o diálogo e para o respeito mesmo onde há discordância.
O Culpado
3.0 453 Assista AgoraNão entende o filme quem tem as seguintes reclamações:
1. Não troca de cenário;
2. Não explica a história de fundo do protagonista.
Sobre o ponto um:
Filmes como este, com basicamente um personagem e um cenário apenas, formam seu próprio nicho, onde o desafio é exatamente sustentar a atmosfera que se pretende sem depender de muitos artifícios visuais. Chegar a um bom resultado, como "prender do começo ao fim", que é o que todo mundo alega ter sentido, é uma responsabilidade que recai sobre o texto, a edição, e um protagonista muito forte, que precisa ocupar bem mais tempo de tela do que na maioria dos filmes que costumamos ver. Esse tipo de filme exige uma série de soluções criativas com demanda muito mais intensa do que teríamos em filmes visualmente mais dinâmicos.
Sem falar, é claro, que um filme que faz você se sentir confinado por não usar muitos cenários tinha exatamente essa intenção — que você experimentasse a claustrofobia e monotonia que cercam o protagonista. Ou seja, quem reclama de sentir emoções negativas em decorrência da não variação de cenários apenas atesta que o filme acertou.
Sobre o ponto dois:
O filme não oferece mais detalhes sobre a vida pessoal do personagem central de propósito, porque são irrelevantes para o que o filme propõe. Ele não está ali para contar uma historinha sobre esse Joe e sua família. Ele vem retratar a universalidade do sofrimento de Joe. Seja qual for a história dele, e seja qual for a sua, ambos fazem escolhas duvidosas motivadas por culpa. Para gerar essa identificação, é irrelevante se a culpa de Joe é por X ou Y. O importante é que ela existe e que, enquanto não é aceita, fode seu mundo interior de maneira que isso se desdobra em todas as suas relações interpessoais, prejudica sua saúde, atrapalha drasticamente sua vida profissional, e assim por diante.
Quem pede por explicações sobre o caso pessoal de Joe não entende que, quanto mais explorássemos o que aconteceu, mais propensos seríamos a atuar como juízes, decidindo a respeito da inocência ou culpabilidade do protagonista. Mas Joe é justamente o retrato de que nossos julgamentos sobre culpa e inocência são falhos. Pedir por esclarecimentos é denunciar que a mensagem do filme se perdeu.
Enfim, o filme é genial ao mostrar como nós todos (e não apenas Joe) tendemos a projetar nossas experiências nos outros para decidir quem é vítima e quem é vilão. Como fugimos da nossa culpa por meio do ódio, do sarcasmo, da impaciência, e adotando a ideia de que necessariamente somos os heróis de alguma história, pois precisamos sê-lo para aliviar nossa consciência. Joe corre atrás do vento, não tentando salvar Emily, mas tentando salvar sua mente, porque ele enxerga nela um cônjuge incompreendido e vitimado, que precisa de toda forma voltar à sua filha. Mas Emily não é exatamente isso. Joe é, aos seus próprios olhos.
Um dos principais motivos de querer se safar no tribunal é voltar a sua filha. Joe sabe que, se for para a cadeia, estará longe dela, o que pensa ser injusto. Decidir, no final, admitir sua culpa no tribunal, implica admitir também sua parcela de culpa pelas circunstâncias que o afastam de sua ex-esposa e filha.
Quanto ao Jake, que todo mundo elogia com razão, destaco o modo como pronuncia o nome do seu personagem. Sempre que menciona que seu nome é Joe, algo soa falso, raso, como se não fosse seu nome real. A única vez em que é possível acreditar que o nome dele é Joe é no final, quando a sua última fala é a mesma de tantas vezes, ao telefone: Aqui é o Joe. Dessa vez, essa declaração parece profunda, e é possível sentir que aquele é o nome real do personagem. Porque ele finalmente admitiu quem é para si mesmo; admitiu sua culpa.
Para quem só agora reconsiderou quanto o filme foi brilhante, recomendo Dúvida, com Meryl Streep, Philip Seymour Hoffman, e Amy Adams.
Doutor Sono
3.7 1,0K Assista AgoraDificilmente uma continuação que vem tanto tempo depois de um clássico se sustenta. Não é o caso de Doutor Sono.
Na melhor das hipóteses, as sequências tardias funcionam como homenagens e, muito frequentemente, são atestados de que não deveriam ter sido produzidas, fazendo um desfavor ao universo que retratam.
Talvez Doutor Sono não agrade todo mundo por funcionar mais como Suspense/Fantasia do que como terror. E por esperarem que fosse possível recriar a mesma atmosfera do clássico de Kubrick, o que, sinceramente, é uma expectativa absurda, e claramente não era a intenção do projeto.
Doutor Sono amplia o universo de O Iluminado sem estragar nada. Além de resolver muitas questões incertas do primeiro filme, dando uma sensação de maior clareza sobre a realidade dos iluminados, respondendo a várias perguntas que os fãs do primeiro filme se faziam chegando a muitas interpretações diferentes.
Outro fator muito importante:
No primeiro filme, embora os iluminados já sejam os heróis — Dick salva Dan, que, por sua vez, salva sua mãe — nem sempre é claro se o shining, a "iluminação", é um dom ou uma maldição, porque Dan é muito novo para lidar com suas habilidades. Em Doutor Sono, o potencial heróico dos iluminados fica muito mais evidente, facilitando a identificação com esses personagens.
Em O Iluminado, é mais fácil se identificar com Jack e Wendy — com os adultos atormentados pela realidade cotidiana. Os medos banais que eles têm se desdobram, e o que mexe com nosso psicológico é ver tais medos, tão identificáveis em nós mesmos, crescerem ao ponto de se tornarem monstros invencíveis.
Em Doutor Sono, ao nos identificarmos com os iluminados, vemos como nossos traumas podem ser superados, e que é possível não sucumbir a nossos vícios e à repetição dos erros dos nossos pais conforme crescemos. Como Dan, aprendemos a enfrentar nossos medos e derrotá-los. Como Abra, aprendemos que não precisamos esconder nossos talentos, por mais estranhos, só por medo de não sermos compreendidos.
Jack Torrance fugia da sua rotina no álcool; uma que ele nunca aceitou ou superou. Permitindo que seus medos o arrastassem, se tornou uma força destruidora para sua família. Dan, que passou a vida entorpecido para não dar vazão ao shining nem às cicatrizes causadas por seus pais e pelo Hotel, aprende a superar seu passado e lidar com seu presente, a ponto de se tornar uma ajuda essencial para Abra e tantas futuras vítimas do Nó.
O Iluminado explora o medo de ser engolido pela banalidade da vida, por ciclos de violência que parecem inevitáveis — talvez, inclusive, por termos certa violência como parte da nossa natureza. Mas Doutor Sono afirma que, com ajuda de Dans, Abras, Dicks, e Billies, podemos escapar dos ciclos aos quais estaríamos fadados se nos tornássemos isolados como Jack, e podemos até descobrir que as qualidades que temíamos em nós mesmos podem ajudar outras pessoas.
Batman: A Máscara do Fantasma
3.7 143 Assista AgoraEste comentário é especialmente em resposta para quem achou que a história é muito básica.
A riqueza desta animação, na minha opinião, é que o Batman não é o herói invencível da história. Ele passa o filme todo correndo de um lado para o outro como uma barata tonta sem nem saber atrás de quem.
É irônico que Andy, o Fantasma, diga para Bruce que ele finalmente está agindo como o melhor detetive do mundo. Porque ele não se dá conta de que a pessoa fazendo a limpa entre os mafiosos de Gotham estava na cara dele o tempo todo até o último momento, quando o plano de vingança da Femme Fatale já está praticamente concluído.
Esse é o tipo de coisa que o Batman farejaria mais cedo, como acontece no caso do Capuz Vermelho. Mas dessa vez Wayne está cego pelo amor.
Outra coisa interessante é que o Bruce menciona que a última coisa que seu pai lhe disse foi que um vigilante mascarado não seria bem recebido em Gotham, mas provavelmente colocado em Arkham. Ele, ainda assombrado pelo fantasma dos pais, sofre mais um trauma, que é ter seu coração quebrado novamente, não apenas por uma mulher, mas por uma que aprendeu a vingança mascarada na intimidade com ele mesmo, e ainda o superou. Esta é mais uma história sobre como Bruce se aproxima de ter seu nome no quadro de internos do Asilo.
Nesta animação, vemos quebrado o mundo interior de Wayne, que já sabemos que é atormentado pelo passado, mas que agora desce a um novo nível justamente quando cogitava que seria capaz de romper o laço nocivo com seus pais e, pela primeira vez na vida, ser feliz.
Isso introduz maior clareza sobre os motivos de Batman sempre mergulhar na escuridão implacavelmente, mesmo quando está a solto pela cidade como um maníaco, sem ideia do que está acontecendo, e causando mais estragos do que soluções.
Pray Away
3.5 45 Assista AgoraBásico não é o mesmo que raso. O grande público cristão e não cristão que ainda acredita em terapia de reversão precisa de informação básica.
Só não dei cinco estrelas porque o documentário poderia ter apresentado pelo menos uns três testemunhos de especialistas da saúde oferecendo dados sobre depressão, ansiedade, transtorno de estresse pós-traumático, automutilação e suicídio.
Fora isso, é necessário entender que este é o primeiro documentário tão explícito sobre o tema numa grande plataforma de streaming popular, e que a importância disso é inegável e imensurável. O fato de o documentário não ser ácido e oferecer o ponto de vista de pessoas religiosas sem atacar ninguém ou polemizar o assunto é o que o torna acessível para o maior número de pessoas.
Só porque a comunidade LGBTQIA+ sabe que há muito mais a explorar sobre o assunto, não significa que o grande público não precise urgentemente de acesso a informações básicas sobre o assunto. Básico não é o mesmo que raso.
Asperger's are us
3.8 7Para a temática que tem, imaginei que seria muito mais. Mais engraçado, cativante, esclarecedor, curioso, vibrante... É só OK.
Donnie Darko
4.2 3,8K Assista AgoraTinha dado quatro estrelas anos atrás, quando vi pela primeira vez. Hoje revi e favoritei com cinco estrelas. Se você não entendeu nada, mas continua curioso, vou dar a minha opinião sobre o que aconteceu. Minha interpretação.
Gretchen diz para Donnie que seu nome parece de super herói, ao que ele responde: Quem disse que eu não sou um?
A marca de um herói é o sacrifício e, para ser super, ele precisa de habilidades sobre-humanas.
Os superpoderes do Donnie são pelo menos três. Ele consegue enxergar o vetor pelo qual se guiar através do tempo e os raros portais que tornam isso possível. Ele consegue receber mensagens acerca do futuro. Ele consegue se comunicar com outras pessoas com habilidades similares através do tempo. Essas são as que a gente pode observar, porque ele é capaz de mais, já que Frank lhe diz "Eu posso fazer qualquer coisa, e você também pode".
As mensagens sobre o futuro, Donnie costuma receber enquanto dorme. Ele até escreve para a Vovó Morte: Só posso esperar que as repostas venham a mim durante o meu sono. Faz muito sentido que a última música do filme diga "Eu acho curioso que os sonhos em que estou morrendo sejam os melhores que já tive". O heroísmo de Darko cresce conforme suas premonições noturnas anunciam seu triste futuro, que ele aprende a aceitar e ver como algo bom — tanto porque vai salvar outras pessoas como, provavelmente, por causa de seu deslocamento e descontentamento no mundo.
Acordado, Donnie parece sofrer de alucinações com o coelho, já que o rapaz tem problemas psiquiátricos. Mas, na verdade, as visitas de Frank acontecem quando Donnie está sob medicação. São experiências reais.
Quando Darko inunda a escola, sabemos apenas que Frank se comunica com ele incitando certas coisas. Mas Donnie não picha "Ele me obrigou", e sim "Eles me obrigaram", reforçando a ideia de que mais pessoas possuem habilidades similares às dele.
Outras pessoas com habilidades similares são a Vovó Morte e o próprio Frank, ainda que sejam de naturezas diferentes das que Donnie possui. Afinal, Frank viaja o tempo todo ao passado para se comunicar com Darko. Provavelmente por ter morrido no futuro e, portanto, não estar preso ao espaço-tempo como conhecemos. Por isso Donnie e ele não podem se tocar, e vemos uma barreira invisível que separa os dois: Darko num plano atual e vivo, e Frank viajando por diferentes planos, morto.
Vovó Morte, por sua vez, entende a filosofia da viagem no tempo como ninguém na história, e sabe que vai receber uma correspondência de Darko, a qual ela aguarda ansiosamente como um sinal para ela ajudar a evitar um acidente se estiver no lugar certo e na hora certa: o atropelamento. Por isso ela costuma parar no meio da estrada: ela sabe que Frank ainda vai desviar um carro bem diante dela em algum momento no futuro, e que esse incidente mata Gretchen e culmina no assassinato de Frank, que é um momento decisivo para Darko decidir voltar no tempo. A velha escritora sabe que Frank precisa morrer para viajar no tempo e guiar Donnie.
Frank está se comunicando com Donnie para evitar seu futuro assassinato. Dona Morte está torcendo para Donnie entender seu papel na mudança da linha do tempo do seu universo e até lhe entrega uma chave ao pé do ouvido para encorajar seu sacrifício: "Todos morrem sozinhos". Essa frase é fundamental para Darko resolver se sacrificar, porque a solidão era seu maior medo, como ele revela em suas sessões de terapia. Fica mais fácil se entregar ao seu destino quando ele entende que não é o único que enfrenta a morte sozinho, mas que todos fazemos isso.
Durante o filme, Darko está tentando entender sua realidade e seu papel, até que tudo se encaixa numa noite de Halloween, quando se dá conta de que precisa seguir sua intuição até o lugar onde todos os eventos culminam —a porta de celeiro da Vovó Morte. Ali, Frank acidentalmente, desviando da velha, mata Gretchen, pelo que Donnie se vinga, matando Frank, em retribuição, mas também se dando conta de que é tal morte que permite que o coelho o guie até esse cenário. Donnie então percebe que, se voltar no tempo, pode evitar a morte da garota que ama e o assassinato de Frank.
No começo da história, o quarto de Donnie é destruído por uma turbina de avião que ninguém sabe de onde veio. É porque ela veio do futuro. No final do filme, podemos ver que a turbina do voo de Rose Darko se perde do avião e toma uma rota diferente da dele, através do portal, que surge de um fenômeno aleatório. A turbina volta para o passado, caindo sobre a casa da família Darko.
Donnie, quando percebe tudo isso, decide voltar no tempo antes da queda da turbina. Afinal, quando ela caiu pela primeira vez, ele não estava em casa, mas acordando no meio de um campo de golfe. Agora, ele sabe que, se a turbina o matar, ele não vai poder levar Gretchen até o lugar onde ela seria atropelada no futuro. Portanto, também não vai matar Frank, que era, basicamente, seu único amigo.
Com Donnie morto, o incêndio da casa de Jim nunca ocorre, então a mãe dele não precisará mais substituir a professora Kitty na viagem que causaria a sua morte, ficando também a salvo.
É assim que Donnie se torna um super herói — usando seus poderes para viajar no tempo e evitar mortes desnecessárias. Isso dentre outras coisas, como, por exemplo, a demissão de sua professora.
Estou falando o tempo todo de Darko viajar no tempo para facilitar as coisas, colocando tudo da perspectiva do herói. Mas o superpoder de Donnie, na verdade, não se parece com as viagem de Marty McFly em De Volta para o Futuro. O que ele faz parece mais com reiniciar sua realidade inteira a partir do momento em que o universo falhou abrindo uma fenda problemática. (Aquela por onde a turbina passa.) Uma possível prova de que essas pessoas estavam vivendo em um tipo de loop desde que a fenda surgiu é o livro da Vovó Morte. Donnie diz que coisas que ele está experimentando já estavam escritas no livro antes de ele as experimentar.
Quando Donnie morre, é como se a realidade dos demais personagens fosse resetada. Você pode vê-los acordando de madrugada, com as lembranças do que poderia ter acontecido no futuro se Donnie não tivesse sido esmagado pela turbina. Karen teria sido demitida, Jim teria sido preso, e assim por diante. Gretchen e Mary acenam uma para a outra, confirmando que, apesar de nunca terem se conhecido nessa realidade reiniciada, sentem que se conheceram. No futuro. Sentem uma conexão entre si, que provavelmente deriva do amor por Donnie.
Manter suas lembranças do futuro caótico que Darko criaria se não fosse atingido pela turbina é muito importante para as pessoas que ele afeta. Caso contrário, o incêndio da casa de Jim teria sido em vão, pois o criminoso sairia impune depois do reinício. Mas as pessoas que tiveram suas realidades resetadas podem lembrar do que Darko expôs sobre Jim com ajuda de Frank, por meio do incêndio. Ainda que suas lembranças sejam fragmentadas, como as de quem acorda e tenta lembrar de um sonho.
Essa história é complicada o suficiente, mas se torna ainda mais bonita porque, durante seus curtos dias, Donnie também está numa jornada pela adolescência, tentando entender sexo, solidão, e o significado de ser humano. Ou seja, ele é um adolescente normal, nesse sentido. Mas, porque está em contato com suas questões mais íntimas, é percebido por todos como um garoto perturbado.
De fato, o filme tenta mostrar que as pessoas vistas como loucas pela maioria são as mais sãs. Darko, Gretchen, Cherita, Roberta — são as pessoas que vivem solitárias por serem incompreendidas, seja por sua autenticidade, traumas ou percepção aguçada da realidade. É o que se evidencia pela letra da última música, que toca enquanto olhamos os rostos surpresos de todos os personagens que foram impactados pela escolha de Donnie, Mad World. Ela menciona rostos familiares e cansados correndo em círculos num mundo enlouquecido. Na letra da música, as pessoas "normais" não se dão conta da loucura do mundo. Quem percebe é o narrador, o cantor, que observa de fora. Assim como Darko, que não aceita a abordagem simplista que as pessoas têm do mundo, como a professora Kiitty, Jim, e até sua psiquiatra. Ele sempre questiona e zomba das visões de mundo "normais".
As pessoas solitárias e esquisitas do filme despertam medo nos "normais" assim como Darko nos incomoda quando sorri diante de suas visões ou fica com um olhar alucinado quando comete um ato de vandalismo. Essas personagens bizarras são pessoas socialmente deslocadas por sua personalidade, dor ou trauma. Gretchen teve a mãe esfaqueada pelo padrasto; Cherita não é apreciada por causa de sua aparência; Darko pode ser depressivo ou outra coisa, já que toma medicamentos controlados.
Por último, é possível que Donnie não faça sua escolha crucial apenas uma vez. Daí a letra de Mad World, novamente fazendo sentido, quando menciona caminhar em círculos.
No começo do filme, Darko está exatamente onde o portal se abriu e absorveu a turbina. Ele provavelmente poderia ter entrado no portal, mas preferiu não fazê-lo, e isso piorou as coisas para ele e as pessoas que ele amava.
Ou pode ser que ele tenha acabado de reiniciar outra realidade. Ele acabou de se sacrificar tomando um portal, que o trouxe de volta aonde ele precisará escolher se sacrificar novamente.
Essa possibilidade de Darko repetir um ciclo e sempre se tornar um herói se confirma pelo fato de a Vovó Morte sempre checar a caixa de correspondências. Como ela sabe que uma correspondência vai chegar? Talvez porque já tenha recebido essa carta em outro reboot da sua linha do tempo.
Darko também justifica sua tentativa de seguir o plano de Frank dizendo "Ele salvou a minha vida", coisa que não vemos acontecer em nenhum momento do filme. Frank pode ter salvado Donnie em outro recomeço daquela realidade.
Donnie também explica a Gretchen que seus "problemas" começaram quando ele incendiou um prédio abandonado. Isso antes de ele incendiar a casa de Jim. Talvez, ele já tenha incendiado a casa de vários Jims em vários reboots, anteriormente àquela conversa, sem nunca resolver o problema da fenda.
Donnie ainda revela não reconhecer Frank quando tira a máscara pela primeira vez, mas sua irmã, durante a festa de Halloween, menciona um amigo Frank, que foi buscar cervejas, coisa que também está anotada e assinada por Frank num bilhete na geladeira. Como ele não conhece alguém tão próximo a ele? Talvez não o reconheça apenas nessa versão reiniciada de sua realidade.
Os pais de Darko, numa conversa em seu quarto, relembram também um Frank como sendo seu amigo do passado, que morreu na noite de sua formatura. Como o coelho Frank diz que esse era o nome de seu pai e avô, é possível que o pai dele tenha morrido de forma trágica, e agora seria a vez dele, repetindo um ciclo e confirmando a ideia de Gretchen de que "Algumas pessoas nascem com a tragédia no sangue".
O filme fica ainda melhor por conseguir contar uma história tão complexa tendo como pano de fundo uma crítica ao conservadorismo, à sociedade americana e ao seu sistema educacional, e ao modo como os adolescentes podem ser invisíveis para os adultos.
Essa relação entre adultos e jovens é um tema muito importante para a história, representada principalmente no discurso da professora Karen ao ser demitida, levando consigo, para fora do prédio, a bandeira americana. Mas ela também surge na terapeuta com sentimentos ambíguos por Darko, que não conquista sua confiança e se revela uma delatora; no pai de Donine, que só faz rir diante dos problemas escolares do filho; na mãe que sofre sozinha como um dos poucos adultos a se conectar com Donnie; no professor Keneth, que sugere que conversas mais profundas com alunos podem resultar em sua demissão; numa mulher gorda aleatória na plateia durante a noite de talentos, que poderia se enxergar em Cherita, mas valoriza mais o conjunto de crianças magrinhas que fazem o esperado; na professora Kitty projetando seus desejos de glória na filha, e assim por diante.
Kitty, aliás, é uma personagem muito comovente, porque, embora pregue uma vida de fé, tradição, e de escolha entre medo e amor, não é amorosa e tem pavor de ver seu sistema de crença desmoronar. Ela é o retrato das pessoas que se apegam ao status quo e ao banal como se disso dependessem suas vidas porque, de fato, não saberiam o que fazer se precisassem encarar uma realidade com nuances mais complexas do que aquelas às quais estão acostumadas.
Essa é a minha interpretação da coisa toda, mas sugiro que ouça outras pessoas também, porque existem diversas teorias sobre o filme, tão complicadas quanto a minha, e provavelmente até mais.