Faz algum tempo que terminei de ver Westworld, e faz algum tempo que a série continua a me confundir. Não pela trama engenhosa e seus quebra-cabeças bem armados, seus mistérios convidativos, mas pelo significado da série enquanto produto mesmo.
Porque, vamo lá? Os segredos da série instigam, mas lá pelo sétimo episódio a audiência mais ou menos atenta já tinha matado as principais questões. Tirando esse mistério, o que sobrou? Personagens que a gente tenta entender melhor (e até consegue), mas que não nos tocam. E olha que há material pra isso:
Bernard descobrindo que é um robô, Maeve descobrindo que sua luta por liberdade foi programada por alguém e não é um ~~desejo próprio~~,
ambos os momentos guardam em si um potencial de choque emocional grande e os intérpretes fizeram bem sua parte. O problema todo é que Westworld é uma série feita para ser mais entendida do que sentida. É uma sci-fi de raíz à moda da família Nolan, em que entender completamente o que está acontecendo é um grande desafio, mas sem o toque humano que o outro irmão costuma dar às suas produções.
A jornada te leva a questionar aspectos da realidade ao redor, dos seus próprios condicionamentos e de suas próprias liberdades, sem dúvida, como toda boa ficção científica. Mas se tratando de uma história que se desenrolou ao longo de dez episódios, as personagens foram muito negligenciadas. À exceção do momento em que
Dolores aprende que William envelheceu para tornar-se o Homem de Preto e do ataque a Elsie (personagem com quem me identifiquei pessoalmente, rs)
, nenhum outro desenrolar me fez sentir propriamente nada por nenhuma daquelas pessoas.
Não me levem a mal, não estou diminuindo a produção: é um puta trabalho, aborda questões filosóficas interessantíssimas tanto direta quanto indiretamente (passeia por vários caminhos da filosofia ocidental nessa temporada, de Epicuro a Haabermas, indo e voltando), tem excelentes interpretações e um conceito estético que reforça sua tese de contraposição complementar entre ficção e não-ficção. É uma grande série de sci-fi que chega pra realmente revolucionar a forma como a TV e o público geral tem encarado o gênero, principalmente depois do boom dos super-heróis. É chocante essa coisa de fazer as pessoas passarem a semana montando as peças deixadas no último episódio exibido, ainda mais com a cada vez maior afirmação de "entretenimento" como uma espécie de fuga estéril de uma realidade acachapante. Mas se a graça da criação de universos são as pessoas que habitam ele, "Westworld" pisou na bola de um modo bem sério - tentando contar uma história de robôs que se humanizam, diminui todas as personagens e personalidades a bonecos de ventríloquo de um universo engenhoso.
É possível que isso seja parte de uma construção maior e que isso seja justamente a base para um mergulho em outra camada da tese que a obra apresenta, é verdade, e é por isso que pretendo assistir a segunda temporada. Mas é possível também que Lisa Joy e Jonathan Nolan não vejam nada disso como um problema, o que seria uma pena.
Sou um fã inverterado da Marvel, mas preciso dizer: todas as séries da Marvel com a Netflix até agora foram séries de uma metade só, aonde você se empolga no começo e nos 5 últimos episódios se desanima completamente e/ou consegue prever exatamente o que vai acontecer. Que bom que Luke Cage veio pra quebrar essa noção completamente.
É a melhor série da Marvel até aqui? É, é sim. Okay, elas são legais por abordarem mais o MCU, mas a história de Luke escancarou o quanto o MCU tem ignorado (ou, no mínimo, negligenciado) o nosso mundo mesmo, fazendo com que as ruas que os personagens andam nem pareçam com as que habitamos. Aqui, não. As ruas do Harlem respiram e sangram e pulsam, as relações entre as pessoas são reais e marcadas tanto pela nostagia comunitária quanto pela correria individualizada das grandes cidades (e as questões de racismos, genocídio da população negra, reconhecimento comunitário, união entre iguais, etc, etc). A dualidade entre o "dentro" e o "fora" do sistema para fazer a coisa certa é muito bem trabalhada justamente por não dar uma resposta
(afinal, se dependesse do sistema Diamondback estaria solto, e foi por uma ação fora dela que Candace morreu)
. Trilha sonora sensacional, dilemas éticos revigorantes e os três últimos episódios construíram um ato final digno de uma HQ clássica da Marvel. Só que melhor, pois o sabor na boca é amargo:
vemos Maria e Shades impunes, Diamondback prestes a ser usado em novos experimentos do Dr. Burnstein, Luke preso e Misty caminhando de modo tenaz sobre a linha tênue do sistema -
o que reforça a realidade, a verossimilhança de tudo isso, ao mesmo tempo que fisga a gente pela boca pra esperar ansiosamente pela próxima temporada.
Muito bom, MESMO. Obrigado mil vezes por isso, Marvel <3
Depois de ver episódios esporádicos na infância, resolvi procurar e assistir cronologicamente. Foi curioso perceber quer a maior parte do que me lembrava da série era justamente dessa primeira temporada: as Sentinelas, o futuro alternativo e tudo mais. O roteiro é muito bom, bate bastante no lance da discriminação que é o eixo central dos X-Men. Acredito que se fosse feita hoje desenvolveria melhor a carga dramática, mas dentro do que se esperava desse tipo de animação nos anos 90 se trata de um produto de altíssima qualidade. Muito bom, ansioso pelo Sinistro na 2ª temporada <3
Childhood's End me surpreendeu, em todos os sentidos. Esperei algo mais galhofeiro, como é comum às produções originais do SyFy, mas encontrei uma ficção científica de raíz, que bota quem assiste pra pensar sobre os limites da humanidade e, também, o quanto do que consideramos "humano" pode ser, de fato, uma característica exclusiva dos seres humanos. E nessa jornada utópico/distópica futurista, quem me chamou mais atenção foram as duas personagens que, ao meu ver, são as protagonistas de toda essa história. E parecem tão próximas ainda que tão distantes.
Ricky ganha os holofotes sendo o escolhido pelo "supervisor da Terra" como porta-voz. E com toda aquela pecha de líder, é, faz sentido. Mas, vamo lá: a primeira imagem que vemos do cara é de um average joe que mora no campo e mente pra esposa fingindo que superou a ex. E, ainda, a posição em que fica diante do mundo? Ele tá lá convencendo o planeta inteiro a seguir recomendações de uma nave especial, sem ter a mínima ideia de aonde isso vai dar.
O que pode ser mais humano e real do que uma pessoa cheia de traumas e que acredita com todas as forças que determina escolha é a melhor, mesmo sem conseguir medir as consequências dessa escolha?
Já Karellen é, de longe, a personagem mais tocante, desde sua primeira aparição. O olhar perdido e cheio de dor intriga - afinal, ele é um ser poderoso, o único que sabe exatamente qual caminho as coisas estão tomando, emana toda aquela expectativa sobre ser um mocinho ou um vilão... e, no final das contas, é o personagem mais próximo de uma pessoa comum.
Porque ele tá ali somente ~~fazendo seu trabalho~~. E nessa labuta, ele se afeiçoa por toda a humanidade, e aí a dor no seu olhar ganha um sentido - ele sabe o que vai acontecer no fim. Ele é tão ~~gente como a gente~~ que até subverte o que pode: esteriliza Ricky pra que ele não conheça a dor de ver sua criança sendo tirada de si, o mata antes do fim da Utopia para que não veja o caos em que a humanidade irá se atirar após o fim da tutela dos Overlords, sugere que Milo permaneça na nave após a extinção da humanidade alegando que é a oportunidade do jovem cientista conhecer tudo que sempre quis mas no fundo desejando apenas a companhia de alguém que o fascina tanto.
Milo é bem interessante, também. A representação de uma curiosidade idealizada, que seria a grande essência da humanidade desde o mito cristão que a culpa pela expulsão dos primeiros humanos do Jardim do Éden.
E que diante da possibilidade de poder conhecer coisas que sequer havia imaginado, escolhe ver o fim do planeta. Afinal, o tal mito fala sobre um conhecimento acerca de "todas as coisas entre o céu e a terra", não é verdade? Até mesmo o fim desse céu e dessa terra.
Não sei o quanto a minisérie se aproxima ou se afasta da obra original. Me incomodou o lance do gênero nas personagens, como as personagens femininas estão sempre associadas a padrões bem rígidos e machistas: são sempre a mãe, a filha, a namorada ou interesse romântico de alguém, nenhuma delas tem uma história própria, a não ser a psicóloga que ~~trata~~ do guri Greggson. Enquanto história de sci-fi, olha, convence e vale a pena.
Depois de duas temporadas funcionando como desbravadora dos acontecimentos do MCU, Agents of S.H.I.E.L.D. finalmente caminha com suas próprias pernas: trama própria, clima próprio e com os acontecimentos de "Guerra Civil" sendo apenas referenciados e influenciando muito pouco o rumo dos eventos da série. É irônico isso acontecendo justamente depois que Joss Whedon saiu das produções da Marvel, uma vez que ele sempre foi voz dissonante a respeito da série - a Marvel dizia que estava "tudo conectado", ele queria que a série fosse independente... e, no final, das contas, acabaram indo pelo caminho que ele queria (o que caga MUITO o MCU, porque é ridículo ver os heróis se degladiando por conta do Tratado de Sokovia e nada ser mencionado sobre a epidemia de Inumanos, principalmente quando a série já havia mostrado o quanto a comoção positiva e negativa diante deles era generalizada, assim como o discurso de ódio dos Watchdogs).
Esse arco de epidemia Inumana, busca por Inumanos, retorno de Hive, luta contra Hive me satisfez muito como fã de quadrinhos. Não por uma fidelidade ao argumento original das HQs (que não inexiste), mas pela estrutura da narrativa: essa coisa linear, de começo-meio-fim, tudo cheio de reviravoltas e com finais pelos menos aparentemente definitivos são exatamente o tipo de coisa que a Marvel sempre fez. A forma como os episódios passeiam por diversos estilos narrativos são um ponto alto dessa temporada: tem aqui o clássico episódio de séries de espiões dos anos 70, cheios de personagens aparecendo e reaparecendo para ajudar a descobrir os mistérios e lidar com as consequências; tem episódio a la McGyver, em que as personagens tiram coelhos da cartola pra resolver as situação; tem episódios cheios de ação e lutas, como manda a bíblia das séries de sci-fi com superpoderes; e tem espisódios de partir o coração.
Todas essas diferentes experiências tornam o desenvolvimento das personagens ainda mais imprevisível nesta s03, e por isso mesmo mais verossímel. Porque por mais que conhecêssemos as personagens da equipe de Coulson, as situações enfrentadas aqui são do tipo que mexem com as pessoas pra sempre. Super poderes everywhere, gente mandada pra outro planeta, encontro cara-a-cara com o bicho que inspirou quase toda representação mitológica de mal que o ser humano já inventou, ver um amigo se transformando em um monstro azul de 2 metros, ver a amiga quase assassinando seu parceiro... fala sério, por menos que isso a gente perde a sanidade e vira uma pessoa completamente diferente. Então é foda ver o pessoal passando por isso tudo e tendo que dar um jeito de segurar a marimba.
Lincoln vinha me chateando em alguns momentos, achava ele um personagem bem contraditório, e por isso mesmo ele me parecia tão necessário. Seu sacrifício foi uma puta demonstração de amor. E o seu diálogo com Hive esfregou na cara de todo mundo aquela que vem sendo a grande tônica de AoS desde o começo: pessoas são só pessoas. À primeira vista, o Quinjet levou pra fora da Terra o primeiro Inumano, aquele que tem o poder de controlar todos os outros e pretendia extinguir a humanidade da Terra, e um Agente da S.H.I.E.L.D, que acontece de ser Inumano também. Pessoas totalmente opostas? Não tanto. O diálogo final revelou o quanto ambos buscavam a mesma coisa, o mesmo pertencimento. O sofrimento, a experiência de descarte, e a própria finalidade bélica de sua criação fizeram de Hive um assassino megalomaníaco que diante da impossibilidade de se conectar de verdade com alguém, forçava essas conexões; a vivência em Afterlife, a escolha de dedicar sua vida a ajudar os outros através da Medicina e a culpa pelos momentos de descontrole faziam de Lincoln alguém que conhece o que é de fato pertencer a algo e alguém e buscava desesperadamente a oportunidade de viver aquilo de novo. E lá no espaço, no último momento, antes de morrerem, eles se conectaram. De modo genuíno, como nunca antes na vida da Hive. Afinal, eles eram também humanos.
O embate que essa temporada apresenta inicialmente é mais do que apenas Demolidor contra Justiceiro. É a disputa entre suas formas de ver o mundo, entre duas trajetórias de vida completamente diferentes que levaram a posições quase opostas, não fosse pelo ~~simples~~ detalhe de que, no fundo, os dois querem evitar que outras pessoas passem pelo sofrimento que enfrentaram.
É difícil tomar partido, também. Porque Frank Castle representa perfeitamente aquele ditado, "quem foi ferido vai ferir": sua vida foi destroçada, o furo no crânio é a evidência de que o cara chegou bem perto de seu suspiro final... e voltou, pra encarar o vazio que havia ao redor de si depois do atentado que destruiu sua família. E perceber que treinamento nenhum, guerra nenhuma, porra de medalha nenhuma valiam aquilo ali. Era o inferno, puro, quente e, putaquepariu, doía. Diante daquilo só lhe restava a a ideia de vingança. E à medida que etapa dela ia sendo completada, ele fazia questão de alargar seus horizontes - primeiro, os assassinos de sua família; depois, os outros grupos criminosos associados a ele; por fim, todo e qualquer grupo criminoso potencialmente envolvido em toda e qualquer atividade criminosa que pudesse mesmo que hipoteticamente causar uma dor qualquer que mesmo que de longe se assemelhe ao buraco existencial que o mutilou pra sempre. Era tanta dor que não bastava pra Frank só se vingar. Ele tinha que vingar o mundo.
Do outro lado, Matt foi criado tendo que aprender a lidar com sua cegueira, a falta do pai e os sentidos aguçados que ninguém tinha real noção do que se tratava até Stick aparecer em sua vida. Ele, o menino que ficou cego pra evitar que pessoas morressem em um acidente, filho do boxeador que foi assassinado por se negar a entregar uma luta. Fibra moral nessa família é item de série. E por isso que mesmo enterrado até o último fio de cabelo na merda, Matt consegue abrir a boca, engolir, e cuspir um diamente. Ele sabe quantas pessoas já quis matar, quantas pessoas já odiou, quanto dano irreversível já quis causar. Mas sua fé o ajudou a lidar com isso. Hoje ele salva vidas, de dia e de noite. Diante de tanta crueldade e sofrimento, Matt tem que consertar o mundo de algum jeito.
Lidar com esse confronto de mindsets, perceber também como todo mundo desenvolve seu jeito de lidar com toda a merda ao mesmo tempo que tenta conseguir um pouco de paz pra fechar os olhos quando bota a cabeça no travesseiro... não sou nenhum herói, mas consigo me relacionar demais com isso. Foggy engrossando com Reyes e segurando a onda no escritório enquanto Matt some, Claire tendo que salvar vidas E TAMBÉM lutar para não deixar as pessoas morrerem em vão (enquanto se protege dentro de um ambiente tóxico pra caralho), Karen peitando cachorros bem maiores do que ela do jeito que dá pra manter aquilo que acredita existindo... mesmo sem perceber, a esperança que move Matt criou uma equipe em torno dele. Mesmo ele insistindo em ~~agir sozinho~~ como Daredevil. E o final indica que ele tomou consciência disso, né? Contando a verdade pra Karen depois de ter trabalhado junto com Elektra e Castle pra derrubar o Tentáculo. Legal, porque já deixa ele preparado pros defensores.
Se na primeira temporada vimos o nascimento do Demolidor, aqui vimos definitivamente sua consolidação. Tô ansioso pra continuação dessa história, rs.
O que acontece quando uma força imparável encontra um objeto irremovível? Essa é a verdadeira pergunta que fica pendurada ao fim dessa temporada de The Walking Dead.
Ao longo desses 16 episódios o foco da história foi em tudo que é necessário pra que uma comunidade e seus integrantes sejam parte fundamental da reconstrução da civilização nesse mundo pós-apocalíptico, coletiva e individualmente. Pro grupo de Rick esse processo tem se mostrado mais brutal e doloroso desde a queda da prisão (e que não parou por lá, é só ver todo o sofrimento de Carol agora), e pra galera de Alexandria foi um baita choque de realidade que ficou evidente na temporada passada. Desde o começo desse casamento todos sabiam do risco que corriam, de como existem perigos lá fora. A confiança nas habilidades de sobrevivência de Michone e cia foi alta, e os habitantes da comunidade foram bem treinados pra lidar com ameaças. Mas talvez não com uma desse tamanho.
A jogada do último episódio, a armadilha perfeitamente arquitetada e executada pelos Saviors mostra que esses maníacos psicopatas são bons no que fazem. Que finalmente os sobreviventes encontraram, de fato, assassinos profissionais. Não à toa Rick ficou em choque na clareira, e já estava desesperado no trailer quando percebeu que estava na verdade sendo conduzido pra uma cilada. Mas, naquela situação, o que dava pra fazer, hein?
Do ponto de vista "técnico", diria que a temporada foi soberba mas me decepcionou no season finale
, seja numa direção que não soube explorar todo o drama das situações, seja pelo cliffhanging barato do final. Se o lance era brincar com os clichês, seria mais divertido terminar com Negan (maravilhosamente interpretado por Jeffrey Dean Morgan, diga-se de passagem) escolhendo sua potencial vítima e deixando pra próxima temporada a esperança sobre ele mudar de ideia. E, meu deus, esse Negan que não diz "fuck" é como baiano que não diz "oxe": você sente que a essência tá lá, não dá pra negar, mas falta algo
.
Esse percurso narrativo, de todo modo, foi bem construtivo. Resolver sair de casa de guarda-chuva e galocha porque vê a tempestade chegando é uma decisão esperta, mas é preciso ter em mente que mesmo com proteção algo em você vai molhar, e que nada vai impedir os raios e trovões. Isso vale pro nosso mundo pré-apocalíptico também.
Comecei a ver como comédia de fim de noite, porque é isso que a série que é - uma comédia legal, divertida, que faz piada com o cotidiano de uma repartição pública e sua ~~fauna peculiar~~. Num mundo em que toda comédia parece ser tão pretensiosa, algo tão tranquilo e natural como Parks & Recreations é um achado. E todo mundo do elenco manda muito bem, hahaha.
Minha meta de vida é encarar a realidade com a mesma tenacidade e otimismo da Leslie, por sinal.
Porque a maior parte da série mostra o cotidiano, os altos e baixos de uma relação amorosa... mas os dois pés fincados em um romantismo essencialista impede que a o roteiro de fato toque nesses problemas e sugira soluções pra eles. A solução para os problemas seria... acreditar que o amor vai resolver? Isso é irreal. O amor move as pessoas, sim, e motiva ações, sim. Mas um sentimento pessoal e interno não resolve sozinho problemas práticos e coletivos. E a alimentação de uma idealização a esse nível, que chega a paralisar pessoas, mantendo-as à espera de soluções mágicas, isso não é algo que eu consiga gostar.
Fora isso, a história parece se passar em um universo alternativo.
Lena, por exemplo: sabemos pouco sobre quem ela é, o que pretende, quais suas ambições acadêmicos. Sabemos, sim, que ela teve uma relação abusiva com Tomás (afinal, ele traía, mentia e ainda explorava ele financeira e no trabalho doméstico). Ao perceber o tamanho do abuso que sofria, ela termina com ele e sofre, muito. E aí ao descobrir que está grávida dele, ela... simplesmente fica feliz? Vejam, é compreensível que alguém fique feliz ao decidir ter uma criança. O que é incompreensível é isso não ter levado Lena a pensar sobre tudo que sofreu nem por um segundo. O que é mais incompreensível ainda é, nesse contexto, Lena não cogitar abortar nem por um segundo.
O único ponto mais ou menos realista do roteiro é a confusão mental e emocional da maior parte das personagens durante a maior parte do tempo.
Mas, ainda assim, o enredo mais usa essas sensações como alívios cômicos do que como oportunidade de aprofundar as personagens (os erros de Pio e Lulu durante a relação, serviram pra quê mesmo?). O que só corrobora a irrealidade da história, e a incoerência entre a premissa (romântica) e a história que a série entrega (que, na tentativa de fazer uma ponte entre o amor idealizado e o amor vivido, não amarra as pontas e mantém os dois distantes de si e do produto desenvolvido).
Pra não dizer que não falei das flores: os aspectos de realização técnica da série são ótimos. A direção, a edição, a cinematografia, a trilha sonora... faz tempo que não vejo uma produção tão bonita. Queria eu que o conteúdo entregue tivesse sido também tratado com o mesmo cuidado.
O conselho sensato pra qualquer jogador no auge de uma maré de sorte é "saia da mesa antes que a sorte acabe", certo? Certo. Mas e quando sair é perder? Daí só resta manter o jogo em alto nível. O dobro ou nada.
No começo da temporada a gente vê o casamento dos Underwood quase acabando. Frank tá apertado, contra a parede, e faz o que pelo visto é algo que une os dois candidatos à presidência dos EUA em House of Cards: desconta na mulher. A diferença é que o trabalho de Claire não é alimentar uma conta de Instagram, não. A verdade, minha gente, é que sem Claire, não haveriam Unoderwoods na Casa Branca. E não falo isso porque foi o pai dela que primeiro financiou a carreira de Frank. Falo porque o season finale da s04 nos colocou diante de uma situação que já havia acontecido diversas vezes nas outras 3 temporadas - Frank desesperado porque as coisas estão saindo de controle e Claire entra em cena para acalmá-lo, levando-o até a resposta ideal para a situação. A diferença desse momento pros outros é que até então ela agia como um catalisador, acelerando o processo mas sem necessariamente ser parte dele. Agora, ela é o próprio processo. O final, com os dois olhando pra gente, é a prova cabal. Aquela parceria ali virou simbiose. Foi uma pena que Frank tenha necessitado ver de perto o anjo da morte pra permitir que isso acontecesse de fato, mas, né, antes tarde do que nunca.
A questão da verdade foi bem forte nessa temporada
: os Thomas e sua inquisição em torno dos Underwood (Yates querendo descobrir o que há no coração deles, Hammerschmidt tentando desvendar de onde vem o sangue que pinga de suas mãos), Doug se aproximando da viúva (cuja morte do marido contou com sua participação), toda a corrida em torno das primárias e das eleições...
só reafirma o quanto a verdade é uma história. Não que não haja uma verdade verdadeira das coisas, não é isso. Mas a transcorrência dos fatos em HoC plantou a dúvida: o que tomamos como verdade, será que é de fato real ou são só histórias bem contadas?
E, meu deus, Conway. Sabe o que Francis Underwood, Tyler Durden e eu temos em comum? Sempre que aparece uma cara bonita demais com um sorriso brilhante demais, nós ficamos cheios de vontade de dar joelhada na bendita até ela virar uma poça de sangue tridimensional.
Conway representa bem o que pode fazer os Republicanos ganharem as eleições, na série e na vida: cara nova, apelo a um público jovem e potencialmente apolítico, utilização das ferramentas que esse público usa, modernização do velho discurso de "menos-Estado-mais-guerra". E se só a suposta posição ideológica dele já não me causasse gastrite (suposta, porque como todo mundo ali o ideal dele é o poder mesmo e não um projeto político), vamo combinar? Aquele começo do s04e07, com o casal Conway apaixonado, se pegando no banheiro e parando a foda pra ir brincar o filhinho? Will, querido, senta aqui pra gente conversar, porque na real politik não tem espaço pra pai zeloso e marido amoroso não. Aliás, até tem, mas perdendo eleição pra casais como Frank e Claire, uma dupla de dois que bota muitas quadrilhas de 500 no bolso. Uma família de comercial de margarina pode te render um punhado de sorrisos e umas toneladas de votos, mas poder é mais que isso, cara. Bem mais.
HoC como sempre mestre em abordar a realidade da política estadunidense e conectá-lá bem. Frank podia evitar a tragédia do crescimento do ICO se realmente se preocupasse com o bem-estar do seu povo mais do que com a eleição e arranjar uma desculpa legal pra usar a NSA pra vigiar a população. Optou por abortar a missão, e assinar o atestado de óbito de todo mundo que a gente sabe que vai morrer, além de jogar uma pá de cal na alma de todas as famílias que vão ter seus jovens assediados pelo grupo, assim como rola com o Daesh na vida real. E, transplantando pro lado de cá da tela: se o governo dos EUA conseguiu monitorar tanta coisa ilegalmente pela NSA quando houve aquele escândalo, em 2014, como não conseguiu identificar e agir a respeito do Daesh? No final das contas, a segurança nacional era só uma desculpa. HoC bate na tecla eleitoreira, mas eu tenho certeza que na real o grande ponto aí eram as corporações financiadoras de campanha. Não deixa de ser eleitoreiro, claro, mas fica um pouquinho mais distópico.
Por falar em distopia, essa foi a primeira temporada em que o caminho do enredo não parece trazer pra dentro da gente a culpa por torcer pelos Underwood. Nas outras temporadas, haviam sempre opositores que se não eram grandes paladinos da integridade, pelo menos eram nitidamente mais honestos que Francis. Aqui, não. A lama é funda e bate no queixo de todo mundo
- Dunbar era correta mas ajudou a afogar Lucas Goodwin em seu próprio desespero, Remy e Jackie parecem estar dispostos a ~~fazer a coisa certa~~ mas aparentemente é só porque estão cansados de carregar o peso de tudo que fizeram, Hammerschmidt tá cavando bem fundo pra alcançar a verdade sobre o golpe orquestrado pelos Underwood mas pouco se importou com a possibilidade de sua jogada influenciar na morte de uma família inteira. Eu ainda quero que a verdade sobre os Underwood seja revelada, mas já me vem à mente perguntas sobre o quanto essa verdade é de fato capaz de melhorar o mundo ou de só, na verdade, otimizar a capacidade que pessoas como eles tem de mentir.
De todo modo, o artigo saiu.
Se a verdade sobre eles é assustadora demais pra que consigam se defender dela... bom, hora de esfregar na cara das pessoas que O MUNDO é pior ainda, e os ~~average joes~~ precisam desses monstros à frente pra lidar com a bagaceira da realidade no lugar das ~~pessoas de bem~~.
Não acredito que ainda não tinha marcado "Dead Set" aqui. Que série! Muito antes de "The Walking Dead" essa galera repaginou o conceito de ataque zumbi, atualizou a crítica original do gênero à massificação das pessoas na sociedade do consumo (e aqui expandiu bem a metáfora pra contar o consumo cultural como parte central da mensagem) e manteve a conclusão pessismista inerente ao gênero. Afinal, estamos todos fudidos mesmo. Preciso rever!
Comédias românticas são meu guilty pleasure. Essa coisa de ver um casal louco dando certo, ou até não dando certo mas contribuindo pro crescimento pessoal de ambos, isso faz meu dia. E fiquei super empolgado pra ver o que Judd Apatow iria fazer com mais tempo de tela. Não decepcionou, até surpreendeu, mas fica aquela sensação de que podia ser melhor.
A ideia de esmiuçar o que de fato acontece nos bastidores daquilo que chamamos de amor é ótima, e uma série original da Netflix parece o formato ideal pra isso.
Pegar duas pessoas com compulsão por relacionamentos e colocá-las no centro dessa história, então, é uma grande sacada. Mickey e Gus compartilham a compulsão, mas não a forma de lidar com ela: enquanto ela pula de um relacionamento curto pra outro como uma maneira de colocar em prática seu aguçado instinto autodestrutivo, ele alterna entre relacionamentos longos. Mas o que mais dóis é que ela tem consciência de seus problemas e termina a temporada disposta e enfrentá-los (tanto que vai lá, falar com ele, pedir que espere a cabeça dela ficar ~~menos errada~~ pra que tentem algo), e ele sequer admite seus problemas. Gus é um pseudo "nice guy" que se acha especial e espera que uma maravilha caia no seu colo a qualquer momento, incapaz de reconhecer seus erros, que sempre atribui a responsabilidade de seus vacilos a outros (ela leva Mickey pra um encontro num clube de algo que ela não gosta e fica chateado por ela não se entreter, ele prefere brigar no estúdio em que trabalha em vez de chamá-la pra conversar depois, ele atribui seu fracasso como roteirista ao gênio de sua chefe em vez de reconhecer que devia ter questionado melhor os detalhes da venda do roteiro). Ele está tão acostumado a abrir mão de si em prol de outras pessoas que nem se importam com ele que espera que as pessoas que lhe são íntimas façam o mesmo por ele. Por não saber se impor na vida, busca formas de se impor nas relações íntimas, como levando a ficante num lugar que fala sobre ELE, mesmo tendo dúvidas de que isso vai ser divertido pra ele. E, no final, mesmo ouvindo a moça falar que precisa de um tempo pra ficar só e lidar com sua forma tóxica de se lançar em relacionamentos pra fugir de si, ele a beija pra tentar fugir do caos da sua vida através daquela relação.
Veja, eu realmente acredito que eles tem sentimentos um pelo outro. Mas pra qualquer relação funcionar é preciso maturidade e diálogo, coisa que ambos demonstram não saber do que se trata. No final da temporada, Mickey levou um choque: tomou na cara, reconheceu que é viciada em relações tanto quanto em drogas e alcool, e tava tentando resolver. Gus não, ele ainda acredita que foi demitido inicialmente porque sua chefe é uma escrota, ignorando completamente o chilique desrespeitoso que deu dentro da sala de criação.
Mas sabe o que é foda? Todos nós temos um pouco de Mickey e de Gus dentro da gente. A insegurança, a impulsividade, a autoindulgência e autodestruição... tá tudo aqui. Na série incomoda o caráter misógino que isso toma, em que Mickey chega a pedir desculpas por posturas que sequer deveriam ser consideradas erros, como o lance do Castelo, e Gus ignora todas as vezes em que pessoas esfregam na sua cara o quanto ele usa a máscara de bonzinho como desculpa pras escrotidões que faz (transar com a Heidi depois de pagar de namoradinho de Mickey, ficar bolado pelo simples fato dela usar um vibrador, e criar um ambiente tão tóxico e sufocante que sua ex não conseguia terminar sem mentir pra ele sobre a traição).
Essa temporada foi legal pra passar um pano com água sanitária na ideia romântica e idealizada de amor, apresentar as personagens e levar a Mickey pra portinha da solução pra vida dela. Espero que a segunda faça coisa parecida pelo Gus. E, porra, incomoda PRA CARALHO a alta concentração de gente branca e hétero numa série que se passa em uma das cidades mais multiraciais e multiculturais dos EUA. Bora, Netflix, você é melhor que isso ;)
Tinha feito um comentário sobre a série, mas só quando publiquei percebi que não cabe a mim analisar ela de verdade, não é pra mim que a mensagem principal fala, e por isso vou pontuar outras coisas. O argumento é ótimo, a diversidade do elenco é maravilhosa e um grande trunfo da obra ao apresentar variadas situações de abuso em sua narrativa
Indas e vindas, reviravoltas que mais diluem do que aumentam a tensão e, pra completar, uma das season finales menos empolgantes que já vi. Nem digo isso da season finale pela morte rápida e anticlimática do Killgrave (é ótimo que ele tenha morrido assim, só reforça o fato de que a verdadeira superação do trauma de Jessica se deu ao longo do processo e a execução dele teve a ver com proteger o mundo, não com vingança - ou seja, a superação está ao alcance das vítimas e não depende dos agressores), mas da previsibilidade mesmo, além do apelo emocional barato da luta contra Luke.
Algo que com certeza vou levar pra sempre comigo da série é o foco dado em recomeços.
Jessica, Trish, Malcolm, Luke... todas as personagens centrais estão em busca de uma possibilidade de recomeçar, levar a vida em frente, expurgar culpas e dores, redimir-se do passado. E aí as coisas ganham uma outra conotação quando vemos Jeri Hogarth (que foi escrota ao trair/trocar sua ex-esposa por uma de suas funcionárias mais jovens) adotando uma nova postura profissional, e também quando Dorothy busca Trish para ajudar com as investigações sobre Simpson (ok, os métodos dela são egocêntricos e interesseiros, ela parece sequer ter noção do dano que causou à Trish, mas acredito que isso vai ser melhor explorado nas próximas temporadas].
E, pfvr, não falem que Killgrave foi uma personagem legal, gente.
Ele é uma boa representação do homem controlador que é tão auto-centrado que distorce o mundo ao seu redor pra se perceber como vítima, sim, mas sua personalidade é tão rasa que não tem como gostar dele (até porque ele não tem graça, suas linhas cômicas são péssimas). Fiquei triste de ver a Marvel gastando um ator tão bom quanto Tennant em um personagem tão fraco, apesar dele entregar uma boa atuação.
Levei tempo pra digerir essa temporada, porque ela traz mudanças significarivas pro panorama das personagens: até então, Claire e Frank são os franco-atiradores, mirando em quem está acima, sedentos por poder... mas a partir daqui são eles que estão no topo, e com poder o suficiente pra que quem está abaixo deles jamais tenha a ousadia de fazer o tipo de jogada arriscada que eles fizeram nas duas outras temporadas.
O fato de Frank ser agora presidente fez com que a série abordasse uma série de problemas que fazem parte da política estadunidense - como a relação com a Rússia, a crise econômica, a política internacional de guerra ao terror - e que inflaram o leque temático da série. O mais legal: esse alargamento temático não se deu às custas de superficialização das personagens, muito pelo contrário. Claire, Frank, Doug, Remy, Jackie... todas estão mais complexas que nunca aqui, no auge de suas contradições, às voltas com as consequências de suas escolhas, e isso é simplesmente sensacional.
Francis e Claire, inclusive, viram o centro de tudo.
Pra mim, ficou cada vez mais evidente o quanto eles precisam um do outro, mas aquele final demonstrou que Frank é o cego do momento que não consegue ver isso. Isso tem a ver a arrogância decorrente do poder. Como a Kate Baldwin fala em certo momento, Frank é um tirano. O único motivo pelo qual ele ainda goza de apoio junto à população é a sensação que transmire de que "existem coisas a serem feitas que ele é capaz de fazer, mas outros teriam medo". Ele é o monstro que preferem colocar no comando do que numa jaula, porque daria mais trabalho de se manter seguro, sabe? E isso é assustador. Só reforça a ideia de que não adianta nada ter uma democracia se a maior parte da população não tem condições de participar ativamente dela, só restando a opção de delegar a capacidade de decisão e torcer pelo melhor.
Mas Claire tá ciente do quanto Frank precisa dela. Por isso partiu, porque não tá ali pra ser colocada pra baixo. Jogou duro.
A questão que fica pra quarta temporada é: será que Francis vai se tocar e conseguir consertar a parada?
A primeira temporada termina deixando a gente com gostinho de quero mais, mas juro que fiquei preocupado, com receio de que a segunda deixasse a peteca cair, principalmente pelo recurso do Frank dirigir a palavra diretamente à audiência não ser mais uma novidade. Que bom que isso não aconteceu.
A posição de Frank na Casa Branca, a necessidade de amarrar as pontas soltas nos esquemas anteriores pra que nada respingue em seu novo cargo, Claire assumindo de vez a carreira política, tudo isso já era novidade suficiente pra garantir que mesmo os recursos já utilizados tivessem novos conteúdos na s02. Mas House of Cards foi mais além, quando tira as rasteiras dadas do nível da política e coloca no nível pessoal: Zoe, Adam, Freddie, Megan foram pessoas que se relacionaram emocionalmente com os Underwood... mas nem por isso foram poupados. Só serviria pra aumentar a certeza do quão incorrigíveis são e fazer aumentar o ódio por eles, certo? Errado, erradíssimo. A trajetória de Frank continua alimentando o diabo que existe dentro de todo ser humano, quem sabe até ajudando a mantê-lo sob controle.
Uma coisa encheu meus olhos de lágrimas: apesar de ambos serem adeptos do "never regret", a cena em que Claire cai no choro nas escadas de casa, ao ouvir da Tricia que é ~~uma boa pessoa~~ logo depois de voltar da viagem que a fez perceber o tamanho do estrago irreparável que fez à Megan... caralho. Vi gente dizendo que aquilo foi uma demonstração da fraqueza dela, que Francis jamais fraquejaria daquele jeito, e só acho isso de uma ignorância (e misoginia) absurda. É nítido pra mim que o que quebrou Claire por dentro ali foi o fato que, de todas as pessoas que ela tratorou pra chegar aonde queria, Megan foi a única que esteve exatamente aonde ela esteve e por quem ela pôde fazer o que gostaria que tivessem feito por ela no passado. E ela preferiu destruir a vida daquela jovem em prol de realizações pessoais. Ela não traiu somente a Megan, mas também a Claire caloura da faculdade que foi estuprada bloqueou as memórias por tanto quanto pôde porque sabia que não teria apoio de ninguém. Doeu nela, e doeu em mim também.
Pra fazer um castelo de cartas é preciso ter atenção, sempre. Qualquer vacilo, qualquer discpliscência na forma como maneja uma carta pode por fim à construção, seja derrubando tudo com um movimento muito brusco, seja criando uma base muito frácil pras próximas cartas que você vai por acima. É por isso que Frank Underwood não comete erros: ele tá nesse jogo há tempo suficiente pra saber que é fácil jogar tudo fora, e quase impossível começar do zero, principalmente na política.
Ninguém precisa falar de como as personagens aqui são maravilhosas. Frank e Claire são um casal incrível, que se apóia e se desafia o tempo todo, forçando o outro a ser sempre a melhor versão possível de si, forte o suficiente pra não permitirem ser usados um pelo outro,
como Claire fez questão de lembrar na jogada envolvendo os filtros no Sudão e a Sancorp. E isso é ótimo pra entender porque eles não fazem sexo em momento nenhuma da primeira temporada - não, não tem a ver com Frank ser ~~gay~~ (ele é bissexual, na verdade, não precisa ser nenhum gênio pra perceber isso) ou com a Claire anseiar uma vida mais livre das obrigações diárias que enfrenta, o lance todo é o que Francis fala pra Zoe, "sexo é sobre poder" e, como dá pra ver, ninguém DETÉM poder sobre ninguém nessa relação (o casamento deles, na verdade, é uma ótima aula da noção foucaltiana de poder, aquela história de que "poder não se possuí, se exerce de modo dinâmico" e blablabla - uma hora é Francis forçando Claire a deixar a CWI de lado pra esboçar uma legislação pro Russo aprovar, outra hora é a Claire sabotando essa mesma legislação em prol da sua própria ONG)
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Francis merece uma reflexão especial. Ele é um escroto, ponto. Ele tem noção do nojo das coisas que faz, não sente nem um pingo de remorse e sente prazer genuíno em manipular as pessoas. E quando fala com quem assiste a série ele leva a quebra brechtiana da quarta parede a um outro nível que eu, particularmente, nunca tinha visto - ao mesmo tempo que aproxima a personagem da audiência, revelando a ela coisas que ele jamais revelaria a outras personagens (até porque eles poderiam usar isso contra ele no futuro), torna as perssoas cúmplices de suas imoralidades... e, mais do que isso, alimenta o lobo que todos temos dentro de nós. Frank cativa porque é um ser humano horrível e dialoga diretamente com o que tem de pior dentro de nós.
Vi o pessoal reclamando da ~~falta de erros~~ das personagens. Na verdade, vi muitos erros acontecendo
: o affair da Claire com o Adam pode vir à tona e jogar abaixo tudo que construíram (mesmo depois de ter terminado), a confiança do Francis em usar APENAS A Zoe pra plantar histórias foi a faísca inicial pra toda desconfiança dela (é apoiar muitas cartas em uma base só),
e acredito que as consequências desses e outros erros que tô ignorando vão vir à tona na segunda temporada.
Agents of SHIELD me conquistou na primeira temporada com a proposta de mostrar a importância do trabalho de pessoas comuns nesses universo repleto de super-pessoas. A segunda me fez ver que veio pra ficar ao lembrar que as pessoas com poderes são, antes de tudo, pessoas.
O mais foda e admirável é que todas as narrativas aqui são compreensíveis, e possíveis de despertar empatia. Todas as personagens tem um desenvolvimento formidável, e se eu tivesse que apontar aprendizados que essa história traz podia passar a tarde toda nisso. Confiança, transparência, coragem e responsabilidade são os grandes eixos de tudo que acontece, e é sensacional ver esses 4 valores sendo tratados em toda sua complexidade, não em uma perspectiva maniqueísta como é comum em produtos de grandes franquias.
Isso permite que no final dessa temporada as pessoas consigam compreender absolutamente todas as personagens, inclusive quem foi um entrave no caminho do time de Coulson - Cal enlouqueceu tentando lidar com a dor de perder tudo que considerava importante, Jiaying na real se fecha dentro de um casulo de ódio e faz o que considera importante pra proteger a si e seu povo, e o pessoal da SHIELD que acabou duvidando de Coulson e trabalhando contra ele só tava consumido pelo medo.
Diria, inclusive, que o medo é o grande vilão da história. Seja a forma como a SHIELD despertou o pior nas pessoas poderosas que teve sob custódia, seja na crença de Jiaying de que só uma guerra poderia salvar os Inumanos, foi o medo que guiou essas ações e traçou o destino de tanta gente. E, numa escala individual, foi o medo de Simmons que a transformou numa pessoa tão diferente e insensível, afastando Fit... assim como é o medo de encarar as reais dimensões dos seus atos que impede que Ward realmente os encare. Ele lida com a culpa e reponsabilidade sobre eles de modo parecido com o que Skye lidou com seus poderes logo que os descobriu: direcionando pra outras coisas e ignorando o fato de que isso nem de longe é uma forma de controle. A diferença é que enquanto Skye caminha pra ser uma grande heroína, e por isso mesmo direcionava as coisas pra dentro, pra se machucar e manter as pessoas ao redor vivas, Ward direciona sua culpa pra pra fora, e atribui a outras pessoas a sua parcela de responsabilidade nas coisas.
Eu havia gostado da primeira temporada, bastante. Mas nessa segunda, AoS pegou pesado na sua real função dentro do Marvel Cinematic Universe: mostrar os pontos soltos que existem dentro dele e costurar, mostrar como tudo é parte da mesma história. Se a s01 acaba deixando a impressão de que os filmes vão influenciar diretamente os acontecimentos da série, a s02 entrega que na real é a série que vai desvendar as causas e consequências do que vimos e veremos nos filmes.
Logo quando soube da série, torci o nariz: tinha o Whedon à frente e todo o clima infantilóide que me encheu o saco no primeiro filme dos Vingadores. Depois de assistir o segundo e o terceiro ciclo de filmes da Marvel, entretanto, bateu à vontade - até pra ver de perto o desenrolar da maior parte dos eventos mostrados nos filmes. E, olha, vale a pena.
Pelo espaço de tempo maior, a parte ~~boba~~ da série é melhor desenvolvida do que em todos os filmes. As personagens são bem desenvolvidas, vão além dos estereótipos iniciais e lidam com suas histórias de um modo bem humano e tocante (terminei de assistir com os olhos marejados em mais da metade da temporada, rs).
E, no final, os acontecimentos que tomam lugar perto de "Capitão América 2" mudam COMPLETAMENTE o tom da trama. É como se as ~~férias~~ de Coulson e sua equipe acabassem.
No fim das contas, o mais fascinante de Agents of SHIELD e do que a Marvel vem fazendo com seus filmes é mostrar que mesmo em situações absurdamente inimagináveis, pessoas vão sempre ser pessoas, cheias de esperanças, medos, ambições, culpas e "momentos definitivos", como bem diz o Agente Coulson. E isso abre um universo infinito de possibilidades, pro bem e pro mal.
Sensação de segurança: é em torno disso que nossas vidas se organiza. É o que precisamos acreditar pra fazer a rotina seguir, que se sairmos da cama de manhã a maior parte das probabilidades aponta que voltaremos a ela no fim do dia. E essa temporada fez com que as personagens e expectadores encarassem de frente o quão frágil e ilusória essa segurança é, ao mesmo tempo que é sedutora.
Terminus e o Hospital, eram casas. Quatro paredes e um teto, algo pra manter os demônios exteriores longe...e proteger direitinho os diabos de dentro. Em Alexandria, as coisas agora vão tomar outro caminho. No Hospital, assim como havia sido em Woodbury, a autoridade da figura de liderança vinha do fato de que nem todo mundo ali conseguia se virar sozinho. Em Terminus, a galera havia sido consumida pelo sofrimento que havia passado, e a única sobrevivência que importava era a deles. O grupo de Rick viveu o suficiente pra aprender o que Aaron fala desde que os encontrou, "pessoas são o recuso mais valioso". Mas não para dar poder a alguém, não é isso que eles querem. Eles querem salvar as pessoas, ensinar elas a sobreviver. Eles começaram a temporada desiludidos com a ideia de existir um lugar sagrado em que todo mundo pode viver em paz, e terminaram decididos a preparar as pessoas de Alexandria para a guerra que é o mundo lá fora. E, sejamos sinceros: esse é o mais próximo de paz que a humanidade é capaz de chegar.
O que essa temporada mostrou muito bem é como encarar a merda que domina o mundo é difícil, mas te prepara pra lidar com ela. E é isso que faz com que os fantasmas de dentro da gente até perturbem, mas nunca derrubem a porta.
"True Detective" é sobre verdade. A primeira temporada já escancarou isso, Rust e Martin se recusaram a abandonar a busca pelo que realmente aconteceu depois que novos fatos vieram à tona, mesmo o caso já estando encerrado. Mas nessa aqui, a dose é mais forte. Do tipo que um golinho dela já deixa aquele gosto de bota de sargento na boca e te manda direto pra ressaca.
A verdade nessa segunda temporada tá bem sintetizada na frase que a moça ~~desaparecida~~ diz pra Ani: "Everything is fucking". Toda a sujeira que pinga das mãos que tem poder pra controlar os grandes aspectos práticos das nossas vidas, isso nos afoga. A relação entre política e crime organizado foi MUITO BEM trabalhada aqui - importante ver como os principais criminosos não são os que estão nas portas dos bares à noite, mas sim se organizando pra meter a mão em dinheiro público (e, claro, sendo os chefes do pessoal dos bares).
A relação entre Ray e Frank foi algo muito interessante, não apenas por colocar um pouco de humanidade em algo que nasce no lixo da corrupção, mas porque o que os tornava tão iguais foi o fato de seguirem sempre em frente nos caminhos que escolheram na vida, nunca se permitindo olhar pra trás. E aí a morte deles passa a ter um significado até motivacional: eles perceberam o tamanho do mal que faziam ao mundo, e não viam forma de consertar o dano. Se nós temos o mundo que merecemos, Velcoro e Semyon encontraram o fim que já haviam apresentado a tanta gente ao longo de suas histórias.
Uma parada que me incomodou na primeira temporada foi a falta de diversidade no elenco. Isso mudou nessa temporada, com a Bezzerides tendo um papel central na história, desafiando um monte de clichê e permitindo uma abordagem realista e sériea sobre abusos sexuais infantis, e com o Paul trazendo a discussão da homofobia internalizada. Agora, o final que impuseram ao Woodrugh não é nada incomum - no documentário "O Outro Lado de Hollywood" (http://filmow.com/o-outro-lado-de-hollywood-t9020), eles falam de como é comum que o ~~preço~~ da presença de um personagem não-hétero na trama seja a morte do mesmo. Se fosse um caso aqui e outro ali, ok, mas não é. Nesse caso, impor a morte é uma forma de reafirmar que o mundo não foi feito pra galera LGBT, então mais cedo ou mais tarde vão mostrar a porta de saída pra eles. Dentro da história do Woodrugh senti falta de problematizarem melhor também a Black Mountain, que representa a privatização da segurança pública nos EUA (pra quem não sabe, os EUA contrata empresas de mercenários pra trabalhar ~~~lado a lado~~ com o exército no Iraque e no Afeganistão, e evidências apontam que os crimes cometidos por essas empresas são inúmeros, de crimes de guerra até violações de direitos humanos que impõem a seus funcionários).
No final das contas, Ani e Jordan terminando a série na Venezuela, saindo depois de jogarem a merda no ventilador do jornalista é uma mensagem, tímida, de que enquanto a gente tiver noção de que merecemos um mundo melhor, temos trabalho a fazer.
Muito boa a forma como aborda o recurso de bloqueio. E a crítica feita à ressocialização de pessoas com histórico criminal é um dos pontos altos da série, sem sombra de dúvida: se você vai ser visto como uma ameaça, mesmo por quem não sabe o que aconteceu com você, será que está mesmo "livre pra ir"?
Você vê a primeira temporada e pensa "é, vai ser difícil manter esse nível na segunda". E é mesmo. Mas Black Mirror aproveita toda a versatilidade que a ficção científica tem enquanto gênero pra garantir que não vai perder o jogo.
O ponto dessa segunda temporada se mantém em torno da onipresença da tecnologia no nosso cotidiano, mas dá um foco mais específico, ao mesmo tempo individual e social:
que tipo de comportamento imprimimos nas telas escuras de nossos celulares, tablets e computadores? Seja no prolongamento de um luto, na prática de crimes em nome da ideia de ~~justiça~~ ou criando mensagens irresponsáveis com impacto muito maior do que podemos administrar, o gostinho que fica dessa temporada é que "tava tudo aí o tempo todo".
É só abrir o Facebook que você vai ver as 3 situações abordadas nos episódios acontecendo no seu feed. Yay for that.
A parada mais sensacional da ficção científica sempre foi a sua capacidade hiperbólica de abordar até onde a realidade contemporânea nos leva, através de sonhos e pesadelos. Black Mirror é uma série de e para quem entende esse jogo, mata a bola no peito e sai distribuindo.
Nessa primeira temporada, todos os episódios giram em torno da onipresença tecnológica, da vivência em rede os limites da exposição pessoal e, nossa, todos os pontos importantes estão aí: a redução da famigerada opinião pública à uma orda de urubus esperando por presas a serem devoradas, o sacrifício de vocações admiráveis em nome da rentabilidade do entretenimento, o culto egoíco narcisístico e autossabotador criado a partir do momento em uma capacidade de registrar todos os nossos passos encontra as relações opressivas de poder em que estamos emersos.
Mas o que mais quebrou minhas pernas nessa série é como somos nós que estamos lá, em todos os episódios, passando por tudo aquilo. The joke is on us.
Comecei a sentir a idade pesando no lombo quando comecei a me sentir entediado depois de alguns episódios sempre que assistia algum desenho animado. Algumas pessoas conhecidas passaram por coisa parecida e sempre apareciam com desculpas - "ah, é que isso é feito pra outra geração, não pra gente", "nossas capacidades de analisar o discurso midiático faz com que a gente note e se incomode com certas coisas", etc - pra algo que ao meu ver era simples: eu tava velho, já manjava a velha fórmula de piada-desafio-piada-tensão-piada-sucesso-piada que a maior parte das séries animadas infantis trazia e o desafio de ver através dessa fórmula para entender e me relacionar com a história contada ali já não valia o esforço depois de dois ou três episódios assistidos em sequência. (Isso somado ao que as pessoas diziam também, né).
Mas isso foi ANTES de Steven Universe. A série me pegou, assisti todos os episódios lançados até agora e estou ansiosíssimo para os episódios da semana que vem. História bem contada, personagens carismáticas E SUPER COMPLEXAS além do SHOW de representatividade. É incrível! Todas as personagens são, ao mesmo tempo, estereotipadas e multifacetadas... exatamente como as pessoas.
Sendo bem sincero, acho que estamos diante d'O Pequeno Príncipe do século XXI: é uma obra de arte voltada para o público infantil, com uma linguagem familiar pra ele, com características que esse público admira e passando em cada episódio de 11 minutos mensagens como ser uma boa pessoa. Outros desenhos dessa geração são ótimos em termo de criatividade e narrativa, mas este ponto da ~formação de valores~ costuma ser menos importante do que em Steven Universe. E é justamente por ser uma série tão fofa, criativa e com essa capacidade de nos tornar pessoas melhores a cada episódio que a série ganhou meu coração <3
Westworld (1ª Temporada)
4.5 1,3KFaz algum tempo que terminei de ver Westworld, e faz algum tempo que a série continua a me confundir. Não pela trama engenhosa e seus quebra-cabeças bem armados, seus mistérios convidativos, mas pelo significado da série enquanto produto mesmo.
Porque, vamo lá? Os segredos da série instigam, mas lá pelo sétimo episódio a audiência mais ou menos atenta já tinha matado as principais questões. Tirando esse mistério, o que sobrou? Personagens que a gente tenta entender melhor (e até consegue), mas que não nos tocam. E olha que há material pra isso:
Bernard descobrindo que é um robô, Maeve descobrindo que sua luta por liberdade foi programada por alguém e não é um ~~desejo próprio~~,
A jornada te leva a questionar aspectos da realidade ao redor, dos seus próprios condicionamentos e de suas próprias liberdades, sem dúvida, como toda boa ficção científica. Mas se tratando de uma história que se desenrolou ao longo de dez episódios, as personagens foram muito negligenciadas. À exceção do momento em que
Dolores aprende que William envelheceu para tornar-se o Homem de Preto e do ataque a Elsie (personagem com quem me identifiquei pessoalmente, rs)
Não me levem a mal, não estou diminuindo a produção: é um puta trabalho, aborda questões filosóficas interessantíssimas tanto direta quanto indiretamente (passeia por vários caminhos da filosofia ocidental nessa temporada, de Epicuro a Haabermas, indo e voltando), tem excelentes interpretações e um conceito estético que reforça sua tese de contraposição complementar entre ficção e não-ficção. É uma grande série de sci-fi que chega pra realmente revolucionar a forma como a TV e o público geral tem encarado o gênero, principalmente depois do boom dos super-heróis. É chocante essa coisa de fazer as pessoas passarem a semana montando as peças deixadas no último episódio exibido, ainda mais com a cada vez maior afirmação de "entretenimento" como uma espécie de fuga estéril de uma realidade acachapante. Mas se a graça da criação de universos são as pessoas que habitam ele, "Westworld" pisou na bola de um modo bem sério - tentando contar uma história de robôs que se humanizam, diminui todas as personagens e personalidades a bonecos de ventríloquo de um universo engenhoso.
É possível que isso seja parte de uma construção maior e que isso seja justamente a base para um mergulho em outra camada da tese que a obra apresenta, é verdade, e é por isso que pretendo assistir a segunda temporada. Mas é possível também que Lisa Joy e Jonathan Nolan não vejam nada disso como um problema, o que seria uma pena.
Luke Cage (1ª Temporada)
3.7 502Sou um fã inverterado da Marvel, mas preciso dizer: todas as séries da Marvel com a Netflix até agora foram séries de uma metade só, aonde você se empolga no começo e nos 5 últimos episódios se desanima completamente e/ou consegue prever exatamente o que vai acontecer. Que bom que Luke Cage veio pra quebrar essa noção completamente.
É a melhor série da Marvel até aqui? É, é sim. Okay, elas são legais por abordarem mais o MCU, mas a história de Luke escancarou o quanto o MCU tem ignorado (ou, no mínimo, negligenciado) o nosso mundo mesmo, fazendo com que as ruas que os personagens andam nem pareçam com as que habitamos. Aqui, não. As ruas do Harlem respiram e sangram e pulsam, as relações entre as pessoas são reais e marcadas tanto pela nostagia comunitária quanto pela correria individualizada das grandes cidades (e as questões de racismos, genocídio da população negra, reconhecimento comunitário, união entre iguais, etc, etc). A dualidade entre o "dentro" e o "fora" do sistema para fazer a coisa certa é muito bem trabalhada justamente por não dar uma resposta
(afinal, se dependesse do sistema Diamondback estaria solto, e foi por uma ação fora dela que Candace morreu)
vemos Maria e Shades impunes, Diamondback prestes a ser usado em novos experimentos do Dr. Burnstein, Luke preso e Misty caminhando de modo tenaz sobre a linha tênue do sistema -
Muito bom, MESMO. Obrigado mil vezes por isso, Marvel <3
[visto em 29/10/16]
X-Men: A Série Animada (1ª Temporada)
4.2 109Depois de ver episódios esporádicos na infância, resolvi procurar e assistir cronologicamente. Foi curioso perceber quer a maior parte do que me lembrava da série era justamente dessa primeira temporada: as Sentinelas, o futuro alternativo e tudo mais. O roteiro é muito bom, bate bastante no lance da discriminação que é o eixo central dos X-Men. Acredito que se fosse feita hoje desenvolveria melhor a carga dramática, mas dentro do que se esperava desse tipo de animação nos anos 90 se trata de um produto de altíssima qualidade. Muito bom, ansioso pelo Sinistro na 2ª temporada <3
[visto em 08/10/16]
O Fim Da Infância
3.5 47Childhood's End me surpreendeu, em todos os sentidos. Esperei algo mais galhofeiro, como é comum às produções originais do SyFy, mas encontrei uma ficção científica de raíz, que bota quem assiste pra pensar sobre os limites da humanidade e, também, o quanto do que consideramos "humano" pode ser, de fato, uma característica exclusiva dos seres humanos. E nessa jornada utópico/distópica futurista, quem me chamou mais atenção foram as duas personagens que, ao meu ver, são as protagonistas de toda essa história. E parecem tão próximas ainda que tão distantes.
Ricky ganha os holofotes sendo o escolhido pelo "supervisor da Terra" como porta-voz. E com toda aquela pecha de líder, é, faz sentido. Mas, vamo lá: a primeira imagem que vemos do cara é de um average joe que mora no campo e mente pra esposa fingindo que superou a ex. E, ainda, a posição em que fica diante do mundo? Ele tá lá convencendo o planeta inteiro a seguir recomendações de uma nave especial, sem ter a mínima ideia de aonde isso vai dar.
Já Karellen é, de longe, a personagem mais tocante, desde sua primeira aparição. O olhar perdido e cheio de dor intriga - afinal, ele é um ser poderoso, o único que sabe exatamente qual caminho as coisas estão tomando, emana toda aquela expectativa sobre ser um mocinho ou um vilão... e, no final das contas, é o personagem mais próximo de uma pessoa comum.
Porque ele tá ali somente ~~fazendo seu trabalho~~. E nessa labuta, ele se afeiçoa por toda a humanidade, e aí a dor no seu olhar ganha um sentido - ele sabe o que vai acontecer no fim. Ele é tão ~~gente como a gente~~ que até subverte o que pode: esteriliza Ricky pra que ele não conheça a dor de ver sua criança sendo tirada de si, o mata antes do fim da Utopia para que não veja o caos em que a humanidade irá se atirar após o fim da tutela dos Overlords, sugere que Milo permaneça na nave após a extinção da humanidade alegando que é a oportunidade do jovem cientista conhecer tudo que sempre quis mas no fundo desejando apenas a companhia de alguém que o fascina tanto.
Milo é bem interessante, também. A representação de uma curiosidade idealizada, que seria a grande essência da humanidade desde o mito cristão que a culpa pela expulsão dos primeiros humanos do Jardim do Éden.
E que diante da possibilidade de poder conhecer coisas que sequer havia imaginado, escolhe ver o fim do planeta. Afinal, o tal mito fala sobre um conhecimento acerca de "todas as coisas entre o céu e a terra", não é verdade? Até mesmo o fim desse céu e dessa terra.
Não sei o quanto a minisérie se aproxima ou se afasta da obra original. Me incomodou o lance do gênero nas personagens, como as personagens femininas estão sempre associadas a padrões bem rígidos e machistas: são sempre a mãe, a filha, a namorada ou interesse romântico de alguém, nenhuma delas tem uma história própria, a não ser a psicóloga que ~~trata~~ do guri Greggson. Enquanto história de sci-fi, olha, convence e vale a pena.
Agentes da S.H.I.E.L.D. (3ª Temporada)
4.1 133 Assista AgoraDepois de duas temporadas funcionando como desbravadora dos acontecimentos do MCU, Agents of S.H.I.E.L.D. finalmente caminha com suas próprias pernas: trama própria, clima próprio e com os acontecimentos de "Guerra Civil" sendo apenas referenciados e influenciando muito pouco o rumo dos eventos da série. É irônico isso acontecendo justamente depois que Joss Whedon saiu das produções da Marvel, uma vez que ele sempre foi voz dissonante a respeito da série - a Marvel dizia que estava "tudo conectado", ele queria que a série fosse independente... e, no final, das contas, acabaram indo pelo caminho que ele queria (o que caga MUITO o MCU, porque é ridículo ver os heróis se degladiando por conta do Tratado de Sokovia e nada ser mencionado sobre a epidemia de Inumanos, principalmente quando a série já havia mostrado o quanto a comoção positiva e negativa diante deles era generalizada, assim como o discurso de ódio dos Watchdogs).
Esse arco de epidemia Inumana, busca por Inumanos, retorno de Hive, luta contra Hive me satisfez muito como fã de quadrinhos. Não por uma fidelidade ao argumento original das HQs (que não inexiste), mas pela estrutura da narrativa: essa coisa linear, de começo-meio-fim, tudo cheio de reviravoltas e com finais pelos menos aparentemente definitivos são exatamente o tipo de coisa que a Marvel sempre fez. A forma como os episódios passeiam por diversos estilos narrativos são um ponto alto dessa temporada: tem aqui o clássico episódio de séries de espiões dos anos 70, cheios de personagens aparecendo e reaparecendo para ajudar a descobrir os mistérios e lidar com as consequências; tem episódio a la McGyver, em que as personagens tiram coelhos da cartola pra resolver as situação; tem episódios cheios de ação e lutas, como manda a bíblia das séries de sci-fi com superpoderes; e tem espisódios de partir o coração.
Todas essas diferentes experiências tornam o desenvolvimento das personagens ainda mais imprevisível nesta s03, e por isso mesmo mais verossímel. Porque por mais que conhecêssemos as personagens da equipe de Coulson, as situações enfrentadas aqui são do tipo que mexem com as pessoas pra sempre. Super poderes everywhere, gente mandada pra outro planeta, encontro cara-a-cara com o bicho que inspirou quase toda representação mitológica de mal que o ser humano já inventou, ver um amigo se transformando em um monstro azul de 2 metros, ver a amiga quase assassinando seu parceiro... fala sério, por menos que isso a gente perde a sanidade e vira uma pessoa completamente diferente. Então é foda ver o pessoal passando por isso tudo e tendo que dar um jeito de segurar a marimba.
O final me quebrou demais.
Lincoln vinha me chateando em alguns momentos, achava ele um personagem bem contraditório, e por isso mesmo ele me parecia tão necessário. Seu sacrifício foi uma puta demonstração de amor. E o seu diálogo com Hive esfregou na cara de todo mundo aquela que vem sendo a grande tônica de AoS desde o começo: pessoas são só pessoas. À primeira vista, o Quinjet levou pra fora da Terra o primeiro Inumano, aquele que tem o poder de controlar todos os outros e pretendia extinguir a humanidade da Terra, e um Agente da S.H.I.E.L.D, que acontece de ser Inumano também. Pessoas totalmente opostas? Não tanto. O diálogo final revelou o quanto ambos buscavam a mesma coisa, o mesmo pertencimento. O sofrimento, a experiência de descarte, e a própria finalidade bélica de sua criação fizeram de Hive um assassino megalomaníaco que diante da impossibilidade de se conectar de verdade com alguém, forçava essas conexões; a vivência em Afterlife, a escolha de dedicar sua vida a ajudar os outros através da Medicina e a culpa pelos momentos de descontrole faziam de Lincoln alguém que conhece o que é de fato pertencer a algo e alguém e buscava desesperadamente a oportunidade de viver aquilo de novo. E lá no espaço, no último momento, antes de morrerem, eles se conectaram. De modo genuíno, como nunca antes na vida da Hive. Afinal, eles eram também humanos.
Demolidor (2ª Temporada)
4.3 967 Assista AgoraO embate que essa temporada apresenta inicialmente é mais do que apenas Demolidor contra Justiceiro. É a disputa entre suas formas de ver o mundo, entre duas trajetórias de vida completamente diferentes que levaram a posições quase opostas, não fosse pelo ~~simples~~ detalhe de que, no fundo, os dois querem evitar que outras pessoas passem pelo sofrimento que enfrentaram.
É difícil tomar partido, também. Porque Frank Castle representa perfeitamente aquele ditado, "quem foi ferido vai ferir": sua vida foi destroçada, o furo no crânio é a evidência de que o cara chegou bem perto de seu suspiro final... e voltou, pra encarar o vazio que havia ao redor de si depois do atentado que destruiu sua família. E perceber que treinamento nenhum, guerra nenhuma, porra de medalha nenhuma valiam aquilo ali. Era o inferno, puro, quente e, putaquepariu, doía. Diante daquilo só lhe restava a a ideia de vingança. E à medida que etapa dela ia sendo completada, ele fazia questão de alargar seus horizontes - primeiro, os assassinos de sua família; depois, os outros grupos criminosos associados a ele; por fim, todo e qualquer grupo criminoso potencialmente envolvido em toda e qualquer atividade criminosa que pudesse mesmo que hipoteticamente causar uma dor qualquer que mesmo que de longe se assemelhe ao buraco existencial que o mutilou pra sempre. Era tanta dor que não bastava pra Frank só se vingar. Ele tinha que vingar o mundo.
Do outro lado, Matt foi criado tendo que aprender a lidar com sua cegueira, a falta do pai e os sentidos aguçados que ninguém tinha real noção do que se tratava até Stick aparecer em sua vida. Ele, o menino que ficou cego pra evitar que pessoas morressem em um acidente, filho do boxeador que foi assassinado por se negar a entregar uma luta. Fibra moral nessa família é item de série. E por isso que mesmo enterrado até o último fio de cabelo na merda, Matt consegue abrir a boca, engolir, e cuspir um diamente. Ele sabe quantas pessoas já quis matar, quantas pessoas já odiou, quanto dano irreversível já quis causar. Mas sua fé o ajudou a lidar com isso. Hoje ele salva vidas, de dia e de noite. Diante de tanta crueldade e sofrimento, Matt tem que consertar o mundo de algum jeito.
Lidar com esse confronto de mindsets, perceber também como todo mundo desenvolve seu jeito de lidar com toda a merda ao mesmo tempo que tenta conseguir um pouco de paz pra fechar os olhos quando bota a cabeça no travesseiro... não sou nenhum herói, mas consigo me relacionar demais com isso. Foggy engrossando com Reyes e segurando a onda no escritório enquanto Matt some, Claire tendo que salvar vidas E TAMBÉM lutar para não deixar as pessoas morrerem em vão (enquanto se protege dentro de um ambiente tóxico pra caralho), Karen peitando cachorros bem maiores do que ela do jeito que dá pra manter aquilo que acredita existindo... mesmo sem perceber, a esperança que move Matt criou uma equipe em torno dele. Mesmo ele insistindo em ~~agir sozinho~~ como Daredevil. E o final indica que ele tomou consciência disso, né? Contando a verdade pra Karen depois de ter trabalhado junto com Elektra e Castle pra derrubar o Tentáculo. Legal, porque já deixa ele preparado pros defensores.
Se na primeira temporada vimos o nascimento do Demolidor, aqui vimos definitivamente sua consolidação. Tô ansioso pra continuação dessa história, rs.
[visto em 11/04/16]
The Walking Dead (6ª Temporada)
4.1 1,3K Assista AgoraO que acontece quando uma força imparável encontra um objeto irremovível? Essa é a verdadeira pergunta que fica pendurada ao fim dessa temporada de The Walking Dead.
Ao longo desses 16 episódios o foco da história foi em tudo que é necessário pra que uma comunidade e seus integrantes sejam parte fundamental da reconstrução da civilização nesse mundo pós-apocalíptico, coletiva e individualmente. Pro grupo de Rick esse processo tem se mostrado mais brutal e doloroso desde a queda da prisão (e que não parou por lá, é só ver todo o sofrimento de Carol agora), e pra galera de Alexandria foi um baita choque de realidade que ficou evidente na temporada passada. Desde o começo desse casamento todos sabiam do risco que corriam, de como existem perigos lá fora. A confiança nas habilidades de sobrevivência de Michone e cia foi alta, e os habitantes da comunidade foram bem treinados pra lidar com ameaças. Mas talvez não com uma desse tamanho.
A jogada do último episódio, a armadilha perfeitamente arquitetada e executada pelos Saviors mostra que esses maníacos psicopatas são bons no que fazem. Que finalmente os sobreviventes encontraram, de fato, assassinos profissionais. Não à toa Rick ficou em choque na clareira, e já estava desesperado no trailer quando percebeu que estava na verdade sendo conduzido pra uma cilada. Mas, naquela situação, o que dava pra fazer, hein?
Do ponto de vista "técnico", diria que a temporada foi soberba mas me decepcionou no season finale
, seja numa direção que não soube explorar todo o drama das situações, seja pelo cliffhanging barato do final. Se o lance era brincar com os clichês, seria mais divertido terminar com Negan (maravilhosamente interpretado por Jeffrey Dean Morgan, diga-se de passagem) escolhendo sua potencial vítima e deixando pra próxima temporada a esperança sobre ele mudar de ideia. E, meu deus, esse Negan que não diz "fuck" é como baiano que não diz "oxe": você sente que a essência tá lá, não dá pra negar, mas falta algo
Esse percurso narrativo, de todo modo, foi bem construtivo. Resolver sair de casa de guarda-chuva e galocha porque vê a tempestade chegando é uma decisão esperta, mas é preciso ter em mente que mesmo com proteção algo em você vai molhar, e que nada vai impedir os raios e trovões. Isso vale pro nosso mundo pré-apocalíptico também.
[visto em 04/04/16]
Parks and Recreation (1ª Temporada)
3.8 160 Assista AgoraComecei a ver como comédia de fim de noite, porque é isso que a série que é - uma comédia legal, divertida, que faz piada com o cotidiano de uma repartição pública e sua ~~fauna peculiar~~. Num mundo em que toda comédia parece ser tão pretensiosa, algo tão tranquilo e natural como Parks & Recreations é um achado. E todo mundo do elenco manda muito bem, hahaha.
Minha meta de vida é encarar a realidade com a mesma tenacidade e otimismo da Leslie, por sinal.
[visto em 29/03/16]
Do Amor (1ª Temporada)
4.5 78Arte é criação e coerência, acima de tudo. E por isso me incomodou muito a incoerência em "Do Amor".
Porque a maior parte da série mostra o cotidiano, os altos e baixos de uma relação amorosa... mas os dois pés fincados em um romantismo essencialista impede que a o roteiro de fato toque nesses problemas e sugira soluções pra eles. A solução para os problemas seria... acreditar que o amor vai resolver? Isso é irreal. O amor move as pessoas, sim, e motiva ações, sim. Mas um sentimento pessoal e interno não resolve sozinho problemas práticos e coletivos. E a alimentação de uma idealização a esse nível, que chega a paralisar pessoas, mantendo-as à espera de soluções mágicas, isso não é algo que eu consiga gostar.
Fora isso, a história parece se passar em um universo alternativo.
Lena, por exemplo: sabemos pouco sobre quem ela é, o que pretende, quais suas ambições acadêmicos. Sabemos, sim, que ela teve uma relação abusiva com Tomás (afinal, ele traía, mentia e ainda explorava ele financeira e no trabalho doméstico). Ao perceber o tamanho do abuso que sofria, ela termina com ele e sofre, muito. E aí ao descobrir que está grávida dele, ela... simplesmente fica feliz? Vejam, é compreensível que alguém fique feliz ao decidir ter uma criança. O que é incompreensível é isso não ter levado Lena a pensar sobre tudo que sofreu nem por um segundo. O que é mais incompreensível ainda é, nesse contexto, Lena não cogitar abortar nem por um segundo.
O único ponto mais ou menos realista do roteiro é a confusão mental e emocional da maior parte das personagens durante a maior parte do tempo.
Mas, ainda assim, o enredo mais usa essas sensações como alívios cômicos do que como oportunidade de aprofundar as personagens (os erros de Pio e Lulu durante a relação, serviram pra quê mesmo?). O que só corrobora a irrealidade da história, e a incoerência entre a premissa (romântica) e a história que a série entrega (que, na tentativa de fazer uma ponte entre o amor idealizado e o amor vivido, não amarra as pontas e mantém os dois distantes de si e do produto desenvolvido).
Pra não dizer que não falei das flores: os aspectos de realização técnica da série são ótimos. A direção, a edição, a cinematografia, a trilha sonora... faz tempo que não vejo uma produção tão bonita. Queria eu que o conteúdo entregue tivesse sido também tratado com o mesmo cuidado.
[visto em 25/03/16]
House of Cards (4ª Temporada)
4.5 407 Assista AgoraO conselho sensato pra qualquer jogador no auge de uma maré de sorte é "saia da mesa antes que a sorte acabe", certo? Certo. Mas e quando sair é perder? Daí só resta manter o jogo em alto nível. O dobro ou nada.
No começo da temporada a gente vê o casamento dos Underwood quase acabando. Frank tá apertado, contra a parede, e faz o que pelo visto é algo que une os dois candidatos à presidência dos EUA em House of Cards: desconta na mulher. A diferença é que o trabalho de Claire não é alimentar uma conta de Instagram, não. A verdade, minha gente, é que sem Claire, não haveriam Unoderwoods na Casa Branca. E não falo isso porque foi o pai dela que primeiro financiou a carreira de Frank. Falo porque o season finale da s04 nos colocou diante de uma situação que já havia acontecido diversas vezes nas outras 3 temporadas - Frank desesperado porque as coisas estão saindo de controle e Claire entra em cena para acalmá-lo, levando-o até a resposta ideal para a situação. A diferença desse momento pros outros é que até então ela agia como um catalisador, acelerando o processo mas sem necessariamente ser parte dele. Agora, ela é o próprio processo. O final, com os dois olhando pra gente, é a prova cabal. Aquela parceria ali virou simbiose. Foi uma pena que Frank tenha necessitado ver de perto o anjo da morte pra permitir que isso acontecesse de fato, mas, né, antes tarde do que nunca.
A questão da verdade foi bem forte nessa temporada
: os Thomas e sua inquisição em torno dos Underwood (Yates querendo descobrir o que há no coração deles, Hammerschmidt tentando desvendar de onde vem o sangue que pinga de suas mãos), Doug se aproximando da viúva (cuja morte do marido contou com sua participação), toda a corrida em torno das primárias e das eleições...
E, meu deus, Conway. Sabe o que Francis Underwood, Tyler Durden e eu temos em comum? Sempre que aparece uma cara bonita demais com um sorriso brilhante demais, nós ficamos cheios de vontade de dar joelhada na bendita até ela virar uma poça de sangue tridimensional.
Conway representa bem o que pode fazer os Republicanos ganharem as eleições, na série e na vida: cara nova, apelo a um público jovem e potencialmente apolítico, utilização das ferramentas que esse público usa, modernização do velho discurso de "menos-Estado-mais-guerra". E se só a suposta posição ideológica dele já não me causasse gastrite (suposta, porque como todo mundo ali o ideal dele é o poder mesmo e não um projeto político), vamo combinar? Aquele começo do s04e07, com o casal Conway apaixonado, se pegando no banheiro e parando a foda pra ir brincar o filhinho? Will, querido, senta aqui pra gente conversar, porque na real politik não tem espaço pra pai zeloso e marido amoroso não. Aliás, até tem, mas perdendo eleição pra casais como Frank e Claire, uma dupla de dois que bota muitas quadrilhas de 500 no bolso. Uma família de comercial de margarina pode te render um punhado de sorrisos e umas toneladas de votos, mas poder é mais que isso, cara. Bem mais.
HoC como sempre mestre em abordar a realidade da política estadunidense e conectá-lá bem. Frank podia evitar a tragédia do crescimento do ICO se realmente se preocupasse com o bem-estar do seu povo mais do que com a eleição e arranjar uma desculpa legal pra usar a NSA pra vigiar a população. Optou por abortar a missão, e assinar o atestado de óbito de todo mundo que a gente sabe que vai morrer, além de jogar uma pá de cal na alma de todas as famílias que vão ter seus jovens assediados pelo grupo, assim como rola com o Daesh na vida real. E, transplantando pro lado de cá da tela: se o governo dos EUA conseguiu monitorar tanta coisa ilegalmente pela NSA quando houve aquele escândalo, em 2014, como não conseguiu identificar e agir a respeito do Daesh? No final das contas, a segurança nacional era só uma desculpa. HoC bate na tecla eleitoreira, mas eu tenho certeza que na real o grande ponto aí eram as corporações financiadoras de campanha. Não deixa de ser eleitoreiro, claro, mas fica um pouquinho mais distópico.
Por falar em distopia, essa foi a primeira temporada em que o caminho do enredo não parece trazer pra dentro da gente a culpa por torcer pelos Underwood. Nas outras temporadas, haviam sempre opositores que se não eram grandes paladinos da integridade, pelo menos eram nitidamente mais honestos que Francis. Aqui, não. A lama é funda e bate no queixo de todo mundo
- Dunbar era correta mas ajudou a afogar Lucas Goodwin em seu próprio desespero, Remy e Jackie parecem estar dispostos a ~~fazer a coisa certa~~ mas aparentemente é só porque estão cansados de carregar o peso de tudo que fizeram, Hammerschmidt tá cavando bem fundo pra alcançar a verdade sobre o golpe orquestrado pelos Underwood mas pouco se importou com a possibilidade de sua jogada influenciar na morte de uma família inteira. Eu ainda quero que a verdade sobre os Underwood seja revelada, mas já me vem à mente perguntas sobre o quanto essa verdade é de fato capaz de melhorar o mundo ou de só, na verdade, otimizar a capacidade que pessoas como eles tem de mentir.
De todo modo, o artigo saiu.
Dead Set
3.8 178Não acredito que ainda não tinha marcado "Dead Set" aqui. Que série! Muito antes de "The Walking Dead" essa galera repaginou o conceito de ataque zumbi, atualizou a crítica original do gênero à massificação das pessoas na sociedade do consumo (e aqui expandiu bem a metáfora pra contar o consumo cultural como parte central da mensagem) e manteve a conclusão pessismista inerente ao gênero. Afinal, estamos todos fudidos mesmo. Preciso rever!
[visto há-uns-anos, hahahaha]
Love (1ª Temporada)
3.7 367 Assista AgoraComédias românticas são meu guilty pleasure. Essa coisa de ver um casal louco dando certo, ou até não dando certo mas contribuindo pro crescimento pessoal de ambos, isso faz meu dia. E fiquei super empolgado pra ver o que Judd Apatow iria fazer com mais tempo de tela. Não decepcionou, até surpreendeu, mas fica aquela sensação de que podia ser melhor.
A ideia de esmiuçar o que de fato acontece nos bastidores daquilo que chamamos de amor é ótima, e uma série original da Netflix parece o formato ideal pra isso.
Pegar duas pessoas com compulsão por relacionamentos e colocá-las no centro dessa história, então, é uma grande sacada. Mickey e Gus compartilham a compulsão, mas não a forma de lidar com ela: enquanto ela pula de um relacionamento curto pra outro como uma maneira de colocar em prática seu aguçado instinto autodestrutivo, ele alterna entre relacionamentos longos. Mas o que mais dóis é que ela tem consciência de seus problemas e termina a temporada disposta e enfrentá-los (tanto que vai lá, falar com ele, pedir que espere a cabeça dela ficar ~~menos errada~~ pra que tentem algo), e ele sequer admite seus problemas. Gus é um pseudo "nice guy" que se acha especial e espera que uma maravilha caia no seu colo a qualquer momento, incapaz de reconhecer seus erros, que sempre atribui a responsabilidade de seus vacilos a outros (ela leva Mickey pra um encontro num clube de algo que ela não gosta e fica chateado por ela não se entreter, ele prefere brigar no estúdio em que trabalha em vez de chamá-la pra conversar depois, ele atribui seu fracasso como roteirista ao gênio de sua chefe em vez de reconhecer que devia ter questionado melhor os detalhes da venda do roteiro). Ele está tão acostumado a abrir mão de si em prol de outras pessoas que nem se importam com ele que espera que as pessoas que lhe são íntimas façam o mesmo por ele. Por não saber se impor na vida, busca formas de se impor nas relações íntimas, como levando a ficante num lugar que fala sobre ELE, mesmo tendo dúvidas de que isso vai ser divertido pra ele. E, no final, mesmo ouvindo a moça falar que precisa de um tempo pra ficar só e lidar com sua forma tóxica de se lançar em relacionamentos pra fugir de si, ele a beija pra tentar fugir do caos da sua vida através daquela relação.
Veja, eu realmente acredito que eles tem sentimentos um pelo outro. Mas pra qualquer relação funcionar é preciso maturidade e diálogo, coisa que ambos demonstram não saber do que se trata. No final da temporada, Mickey levou um choque: tomou na cara, reconheceu que é viciada em relações tanto quanto em drogas e alcool, e tava tentando resolver. Gus não, ele ainda acredita que foi demitido inicialmente porque sua chefe é uma escrota, ignorando completamente o chilique desrespeitoso que deu dentro da sala de criação.
Mas sabe o que é foda? Todos nós temos um pouco de Mickey e de Gus dentro da gente. A insegurança, a impulsividade, a autoindulgência e autodestruição... tá tudo aqui. Na série incomoda o caráter misógino que isso toma, em que Mickey chega a pedir desculpas por posturas que sequer deveriam ser consideradas erros, como o lance do Castelo, e Gus ignora todas as vezes em que pessoas esfregam na sua cara o quanto ele usa a máscara de bonzinho como desculpa pras escrotidões que faz (transar com a Heidi depois de pagar de namoradinho de Mickey, ficar bolado pelo simples fato dela usar um vibrador, e criar um ambiente tão tóxico e sufocante que sua ex não conseguia terminar sem mentir pra ele sobre a traição).
Essa temporada foi legal pra passar um pano com água sanitária na ideia romântica e idealizada de amor, apresentar as personagens e levar a Mickey pra portinha da solução pra vida dela. Espero que a segunda faça coisa parecida pelo Gus. E, porra, incomoda PRA CARALHO a alta concentração de gente branca e hétero numa série que se passa em uma das cidades mais multiraciais e multiculturais dos EUA. Bora, Netflix, você é melhor que isso ;)
[finalizada em 28/02/16]
Jessica Jones (1ª Temporada)
4.1 1,1K Assista AgoraTinha feito um comentário sobre a série, mas só quando publiquei percebi que não cabe a mim analisar ela de verdade, não é pra mim que a mensagem principal fala, e por isso vou pontuar outras coisas. O argumento é ótimo, a diversidade do elenco é maravilhosa e um grande trunfo da obra ao apresentar variadas situações de abuso em sua narrativa
(Killgrave sobre Jones, claro, mas também Hogarth sobre Wendy, Robyn sobre Ruben, Dorothy sobre Trish)
Mas a partir do episódio 7, a série cansa.
Indas e vindas, reviravoltas que mais diluem do que aumentam a tensão e, pra completar, uma das season finales menos empolgantes que já vi. Nem digo isso da season finale pela morte rápida e anticlimática do Killgrave (é ótimo que ele tenha morrido assim, só reforça o fato de que a verdadeira superação do trauma de Jessica se deu ao longo do processo e a execução dele teve a ver com proteger o mundo, não com vingança - ou seja, a superação está ao alcance das vítimas e não depende dos agressores), mas da previsibilidade mesmo, além do apelo emocional barato da luta contra Luke.
Algo que com certeza vou levar pra sempre comigo da série é o foco dado em recomeços.
Jessica, Trish, Malcolm, Luke... todas as personagens centrais estão em busca de uma possibilidade de recomeçar, levar a vida em frente, expurgar culpas e dores, redimir-se do passado. E aí as coisas ganham uma outra conotação quando vemos Jeri Hogarth (que foi escrota ao trair/trocar sua ex-esposa por uma de suas funcionárias mais jovens) adotando uma nova postura profissional, e também quando Dorothy busca Trish para ajudar com as investigações sobre Simpson (ok, os métodos dela são egocêntricos e interesseiros, ela parece sequer ter noção do dano que causou à Trish, mas acredito que isso vai ser melhor explorado nas próximas temporadas].
E, pfvr, não falem que Killgrave foi uma personagem legal, gente.
Ele é uma boa representação do homem controlador que é tão auto-centrado que distorce o mundo ao seu redor pra se perceber como vítima, sim, mas sua personalidade é tão rasa que não tem como gostar dele (até porque ele não tem graça, suas linhas cômicas são péssimas). Fiquei triste de ver a Marvel gastando um ator tão bom quanto Tennant em um personagem tão fraco, apesar dele entregar uma boa atuação.
A série é legal, mesmo. Mas podia ser melhor.
[visto em 06/02/16]
House of Cards (3ª Temporada)
4.4 413Levei tempo pra digerir essa temporada, porque ela traz mudanças significarivas pro panorama das personagens: até então, Claire e Frank são os franco-atiradores, mirando em quem está acima, sedentos por poder... mas a partir daqui são eles que estão no topo, e com poder o suficiente pra que quem está abaixo deles jamais tenha a ousadia de fazer o tipo de jogada arriscada que eles fizeram nas duas outras temporadas.
O fato de Frank ser agora presidente fez com que a série abordasse uma série de problemas que fazem parte da política estadunidense - como a relação com a Rússia, a crise econômica, a política internacional de guerra ao terror - e que inflaram o leque temático da série. O mais legal: esse alargamento temático não se deu às custas de superficialização das personagens, muito pelo contrário. Claire, Frank, Doug, Remy, Jackie... todas estão mais complexas que nunca aqui, no auge de suas contradições, às voltas com as consequências de suas escolhas, e isso é simplesmente sensacional.
Francis e Claire, inclusive, viram o centro de tudo.
Pra mim, ficou cada vez mais evidente o quanto eles precisam um do outro, mas aquele final demonstrou que Frank é o cego do momento que não consegue ver isso. Isso tem a ver a arrogância decorrente do poder. Como a Kate Baldwin fala em certo momento, Frank é um tirano. O único motivo pelo qual ele ainda goza de apoio junto à população é a sensação que transmire de que "existem coisas a serem feitas que ele é capaz de fazer, mas outros teriam medo". Ele é o monstro que preferem colocar no comando do que numa jaula, porque daria mais trabalho de se manter seguro, sabe? E isso é assustador. Só reforça a ideia de que não adianta nada ter uma democracia se a maior parte da população não tem condições de participar ativamente dela, só restando a opção de delegar a capacidade de decisão e torcer pelo melhor.
Mas Claire tá ciente do quanto Frank precisa dela. Por isso partiu, porque não tá ali pra ser colocada pra baixo. Jogou duro.
House of Cards (2ª Temporada)
4.6 497A primeira temporada termina deixando a gente com gostinho de quero mais, mas juro que fiquei preocupado, com receio de que a segunda deixasse a peteca cair, principalmente pelo recurso do Frank dirigir a palavra diretamente à audiência não ser mais uma novidade. Que bom que isso não aconteceu.
A posição de Frank na Casa Branca, a necessidade de amarrar as pontas soltas nos esquemas anteriores pra que nada respingue em seu novo cargo, Claire assumindo de vez a carreira política, tudo isso já era novidade suficiente pra garantir que mesmo os recursos já utilizados tivessem novos conteúdos na s02. Mas House of Cards foi mais além, quando tira as rasteiras dadas do nível da política e coloca no nível pessoal: Zoe, Adam, Freddie, Megan foram pessoas que se relacionaram emocionalmente com os Underwood... mas nem por isso foram poupados. Só serviria pra aumentar a certeza do quão incorrigíveis são e fazer aumentar o ódio por eles, certo? Errado, erradíssimo. A trajetória de Frank continua alimentando o diabo que existe dentro de todo ser humano, quem sabe até ajudando a mantê-lo sob controle.
E a curiosidade sobre o que vão fazer agora que chegaram ao topo só aumenta.
Uma coisa encheu meus olhos de lágrimas: apesar de ambos serem adeptos do "never regret", a cena em que Claire cai no choro nas escadas de casa, ao ouvir da Tricia que é ~~uma boa pessoa~~ logo depois de voltar da viagem que a fez perceber o tamanho do estrago irreparável que fez à Megan... caralho. Vi gente dizendo que aquilo foi uma demonstração da fraqueza dela, que Francis jamais fraquejaria daquele jeito, e só acho isso de uma ignorância (e misoginia) absurda. É nítido pra mim que o que quebrou Claire por dentro ali foi o fato que, de todas as pessoas que ela tratorou pra chegar aonde queria, Megan foi a única que esteve exatamente aonde ela esteve e por quem ela pôde fazer o que gostaria que tivessem feito por ela no passado. E ela preferiu destruir a vida daquela jovem em prol de realizações pessoais. Ela não traiu somente a Megan, mas também a Claire caloura da faculdade que foi estuprada bloqueou as memórias por tanto quanto pôde porque sabia que não teria apoio de ninguém. Doeu nela, e doeu em mim também.
House of Cards (1ª Temporada)
4.5 611 Assista AgoraPra fazer um castelo de cartas é preciso ter atenção, sempre. Qualquer vacilo, qualquer discpliscência na forma como maneja uma carta pode por fim à construção, seja derrubando tudo com um movimento muito brusco, seja criando uma base muito frácil pras próximas cartas que você vai por acima. É por isso que Frank Underwood não comete erros: ele tá nesse jogo há tempo suficiente pra saber que é fácil jogar tudo fora, e quase impossível começar do zero, principalmente na política.
Ninguém precisa falar de como as personagens aqui são maravilhosas. Frank e Claire são um casal incrível, que se apóia e se desafia o tempo todo, forçando o outro a ser sempre a melhor versão possível de si, forte o suficiente pra não permitirem ser usados um pelo outro,
como Claire fez questão de lembrar na jogada envolvendo os filtros no Sudão e a Sancorp. E isso é ótimo pra entender porque eles não fazem sexo em momento nenhuma da primeira temporada - não, não tem a ver com Frank ser ~~gay~~ (ele é bissexual, na verdade, não precisa ser nenhum gênio pra perceber isso) ou com a Claire anseiar uma vida mais livre das obrigações diárias que enfrenta, o lance todo é o que Francis fala pra Zoe, "sexo é sobre poder" e, como dá pra ver, ninguém DETÉM poder sobre ninguém nessa relação (o casamento deles, na verdade, é uma ótima aula da noção foucaltiana de poder, aquela história de que "poder não se possuí, se exerce de modo dinâmico" e blablabla - uma hora é Francis forçando Claire a deixar a CWI de lado pra esboçar uma legislação pro Russo aprovar, outra hora é a Claire sabotando essa mesma legislação em prol da sua própria ONG)
Francis merece uma reflexão especial. Ele é um escroto, ponto. Ele tem noção do nojo das coisas que faz, não sente nem um pingo de remorse e sente prazer genuíno em manipular as pessoas. E quando fala com quem assiste a série ele leva a quebra brechtiana da quarta parede a um outro nível que eu, particularmente, nunca tinha visto - ao mesmo tempo que aproxima a personagem da audiência, revelando a ela coisas que ele jamais revelaria a outras personagens (até porque eles poderiam usar isso contra ele no futuro), torna as perssoas cúmplices de suas imoralidades... e, mais do que isso, alimenta o lobo que todos temos dentro de nós. Frank cativa porque é um ser humano horrível e dialoga diretamente com o que tem de pior dentro de nós.
Vi o pessoal reclamando da ~~falta de erros~~ das personagens. Na verdade, vi muitos erros acontecendo
: o affair da Claire com o Adam pode vir à tona e jogar abaixo tudo que construíram (mesmo depois de ter terminado), a confiança do Francis em usar APENAS A Zoe pra plantar histórias foi a faísca inicial pra toda desconfiança dela (é apoiar muitas cartas em uma base só),
Agentes da S.H.I.E.L.D. (2ª Temporada)
4.1 226Agents of SHIELD me conquistou na primeira temporada com a proposta de mostrar a importância do trabalho de pessoas comuns nesses universo repleto de super-pessoas. A segunda me fez ver que veio pra ficar ao lembrar que as pessoas com poderes são, antes de tudo, pessoas.
O mais foda e admirável é que todas as narrativas aqui são compreensíveis, e possíveis de despertar empatia. Todas as personagens tem um desenvolvimento formidável, e se eu tivesse que apontar aprendizados que essa história traz podia passar a tarde toda nisso. Confiança, transparência, coragem e responsabilidade são os grandes eixos de tudo que acontece, e é sensacional ver esses 4 valores sendo tratados em toda sua complexidade, não em uma perspectiva maniqueísta como é comum em produtos de grandes franquias.
Isso permite que no final dessa temporada as pessoas consigam compreender absolutamente todas as personagens, inclusive quem foi um entrave no caminho do time de Coulson - Cal enlouqueceu tentando lidar com a dor de perder tudo que considerava importante, Jiaying na real se fecha dentro de um casulo de ódio e faz o que considera importante pra proteger a si e seu povo, e o pessoal da SHIELD que acabou duvidando de Coulson e trabalhando contra ele só tava consumido pelo medo.
Diria, inclusive, que o medo é o grande vilão da história. Seja a forma como a SHIELD despertou o pior nas pessoas poderosas que teve sob custódia, seja na crença de Jiaying de que só uma guerra poderia salvar os Inumanos, foi o medo que guiou essas ações e traçou o destino de tanta gente. E, numa escala individual, foi o medo de Simmons que a transformou numa pessoa tão diferente e insensível, afastando Fit... assim como é o medo de encarar as reais dimensões dos seus atos que impede que Ward realmente os encare. Ele lida com a culpa e reponsabilidade sobre eles de modo parecido com o que Skye lidou com seus poderes logo que os descobriu: direcionando pra outras coisas e ignorando o fato de que isso nem de longe é uma forma de controle. A diferença é que enquanto Skye caminha pra ser uma grande heroína, e por isso mesmo direcionava as coisas pra dentro, pra se machucar e manter as pessoas ao redor vivas, Ward direciona sua culpa pra pra fora, e atribui a outras pessoas a sua parcela de responsabilidade nas coisas.
Eu havia gostado da primeira temporada, bastante. Mas nessa segunda, AoS pegou pesado na sua real função dentro do Marvel Cinematic Universe: mostrar os pontos soltos que existem dentro dele e costurar, mostrar como tudo é parte da mesma história. Se a s01 acaba deixando a impressão de que os filmes vão influenciar diretamente os acontecimentos da série, a s02 entrega que na real é a série que vai desvendar as causas e consequências do que vimos e veremos nos filmes.
Agentes da S.H.I.E.L.D. (1ª Temporada)
3.8 474 Assista AgoraLogo quando soube da série, torci o nariz: tinha o Whedon à frente e todo o clima infantilóide que me encheu o saco no primeiro filme dos Vingadores. Depois de assistir o segundo e o terceiro ciclo de filmes da Marvel, entretanto, bateu à vontade - até pra ver de perto o desenrolar da maior parte dos eventos mostrados nos filmes. E, olha, vale a pena.
Pelo espaço de tempo maior, a parte ~~boba~~ da série é melhor desenvolvida do que em todos os filmes. As personagens são bem desenvolvidas, vão além dos estereótipos iniciais e lidam com suas histórias de um modo bem humano e tocante (terminei de assistir com os olhos marejados em mais da metade da temporada, rs).
E, no final, os acontecimentos que tomam lugar perto de "Capitão América 2" mudam COMPLETAMENTE o tom da trama. É como se as ~~férias~~ de Coulson e sua equipe acabassem.
The Walking Dead (5ª Temporada)
4.2 1,4K Assista AgoraSensação de segurança: é em torno disso que nossas vidas se organiza. É o que precisamos acreditar pra fazer a rotina seguir, que se sairmos da cama de manhã a maior parte das probabilidades aponta que voltaremos a ela no fim do dia. E essa temporada fez com que as personagens e expectadores encarassem de frente o quão frágil e ilusória essa segurança é, ao mesmo tempo que é sedutora.
Terminus e o Hospital, eram casas. Quatro paredes e um teto, algo pra manter os demônios exteriores longe...e proteger direitinho os diabos de dentro. Em Alexandria, as coisas agora vão tomar outro caminho. No Hospital, assim como havia sido em Woodbury, a autoridade da figura de liderança vinha do fato de que nem todo mundo ali conseguia se virar sozinho. Em Terminus, a galera havia sido consumida pelo sofrimento que havia passado, e a única sobrevivência que importava era a deles. O grupo de Rick viveu o suficiente pra aprender o que Aaron fala desde que os encontrou, "pessoas são o recuso mais valioso". Mas não para dar poder a alguém, não é isso que eles querem. Eles querem salvar as pessoas, ensinar elas a sobreviver. Eles começaram a temporada desiludidos com a ideia de existir um lugar sagrado em que todo mundo pode viver em paz, e terminaram decididos a preparar as pessoas de Alexandria para a guerra que é o mundo lá fora. E, sejamos sinceros: esse é o mais próximo de paz que a humanidade é capaz de chegar.
O que essa temporada mostrou muito bem é como encarar a merda que domina o mundo é difícil, mas te prepara pra lidar com ela. E é isso que faz com que os fantasmas de dentro da gente até perturbem, mas nunca derrubem a porta.
True Detective (2ª Temporada)
3.6 772"True Detective" é sobre verdade. A primeira temporada já escancarou isso, Rust e Martin se recusaram a abandonar a busca pelo que realmente aconteceu depois que novos fatos vieram à tona, mesmo o caso já estando encerrado. Mas nessa aqui, a dose é mais forte. Do tipo que um golinho dela já deixa aquele gosto de bota de sargento na boca e te manda direto pra ressaca.
A verdade nessa segunda temporada tá bem sintetizada na frase que a moça ~~desaparecida~~ diz pra Ani: "Everything is fucking". Toda a sujeira que pinga das mãos que tem poder pra controlar os grandes aspectos práticos das nossas vidas, isso nos afoga. A relação entre política e crime organizado foi MUITO BEM trabalhada aqui - importante ver como os principais criminosos não são os que estão nas portas dos bares à noite, mas sim se organizando pra meter a mão em dinheiro público (e, claro, sendo os chefes do pessoal dos bares).
A relação entre Ray e Frank foi algo muito interessante, não apenas por colocar um pouco de humanidade em algo que nasce no lixo da corrupção, mas porque o que os tornava tão iguais foi o fato de seguirem sempre em frente nos caminhos que escolheram na vida, nunca se permitindo olhar pra trás. E aí a morte deles passa a ter um significado até motivacional: eles perceberam o tamanho do mal que faziam ao mundo, e não viam forma de consertar o dano. Se nós temos o mundo que merecemos, Velcoro e Semyon encontraram o fim que já haviam apresentado a tanta gente ao longo de suas histórias.
Uma parada que me incomodou na primeira temporada foi a falta de diversidade no elenco. Isso mudou nessa temporada, com a Bezzerides tendo um papel central na história, desafiando um monte de clichê e permitindo uma abordagem realista e sériea sobre abusos sexuais infantis, e com o Paul trazendo a discussão da homofobia internalizada. Agora, o final que impuseram ao Woodrugh não é nada incomum - no documentário "O Outro Lado de Hollywood" (http://filmow.com/o-outro-lado-de-hollywood-t9020), eles falam de como é comum que o ~~preço~~ da presença de um personagem não-hétero na trama seja a morte do mesmo. Se fosse um caso aqui e outro ali, ok, mas não é. Nesse caso, impor a morte é uma forma de reafirmar que o mundo não foi feito pra galera LGBT, então mais cedo ou mais tarde vão mostrar a porta de saída pra eles. Dentro da história do Woodrugh senti falta de problematizarem melhor também a Black Mountain, que representa a privatização da segurança pública nos EUA (pra quem não sabe, os EUA contrata empresas de mercenários pra trabalhar ~~~lado a lado~~ com o exército no Iraque e no Afeganistão, e evidências apontam que os crimes cometidos por essas empresas são inúmeros, de crimes de guerra até violações de direitos humanos que impõem a seus funcionários).
No final das contas, Ani e Jordan terminando a série na Venezuela, saindo depois de jogarem a merda no ventilador do jornalista é uma mensagem, tímida, de que enquanto a gente tiver noção de que merecemos um mundo melhor, temos trabalho a fazer.
Black Mirror: White Christmas
4.5 452Se me perguntarem, eu sempre vou dizer que esse especial é sobre o esforço inútil de evitar o inevitável.
Muito boa a forma como aborda o recurso de bloqueio. E a crítica feita à ressocialização de pessoas com histórico criminal é um dos pontos altos da série, sem sombra de dúvida: se você vai ser visto como uma ameaça, mesmo por quem não sabe o que aconteceu com você, será que está mesmo "livre pra ir"?
Black Mirror (2ª Temporada)
4.4 753 Assista AgoraVocê vê a primeira temporada e pensa "é, vai ser difícil manter esse nível na segunda". E é mesmo. Mas Black Mirror aproveita toda a versatilidade que a ficção científica tem enquanto gênero pra garantir que não vai perder o jogo.
O ponto dessa segunda temporada se mantém em torno da onipresença da tecnologia no nosso cotidiano, mas dá um foco mais específico, ao mesmo tempo individual e social:
que tipo de comportamento imprimimos nas telas escuras de nossos celulares, tablets e computadores? Seja no prolongamento de um luto, na prática de crimes em nome da ideia de ~~justiça~~ ou criando mensagens irresponsáveis com impacto muito maior do que podemos administrar, o gostinho que fica dessa temporada é que "tava tudo aí o tempo todo".
Black Mirror (1ª Temporada)
4.4 1,3K Assista AgoraA parada mais sensacional da ficção científica sempre foi a sua capacidade hiperbólica de abordar até onde a realidade contemporânea nos leva, através de sonhos e pesadelos. Black Mirror é uma série de e para quem entende esse jogo, mata a bola no peito e sai distribuindo.
Nessa primeira temporada, todos os episódios giram em torno da onipresença tecnológica, da vivência em rede os limites da exposição pessoal e, nossa, todos os pontos importantes estão aí: a redução da famigerada opinião pública à uma orda de urubus esperando por presas a serem devoradas, o sacrifício de vocações admiráveis em nome da rentabilidade do entretenimento, o culto egoíco narcisístico e autossabotador criado a partir do momento em uma capacidade de registrar todos os nossos passos encontra as relações opressivas de poder em que estamos emersos.
Mas o que mais quebrou minhas pernas nessa série é como somos nós que estamos lá, em todos os episódios, passando por tudo aquilo. The joke is on us.
Steven Universo (1ª Temporada)
4.6 95Comecei a sentir a idade pesando no lombo quando comecei a me sentir entediado depois de alguns episódios sempre que assistia algum desenho animado. Algumas pessoas conhecidas passaram por coisa parecida e sempre apareciam com desculpas - "ah, é que isso é feito pra outra geração, não pra gente", "nossas capacidades de analisar o discurso midiático faz com que a gente note e se incomode com certas coisas", etc - pra algo que ao meu ver era simples: eu tava velho, já manjava a velha fórmula de piada-desafio-piada-tensão-piada-sucesso-piada que a maior parte das séries animadas infantis trazia e o desafio de ver através dessa fórmula para entender e me relacionar com a história contada ali já não valia o esforço depois de dois ou três episódios assistidos em sequência. (Isso somado ao que as pessoas diziam também, né).
Mas isso foi ANTES de Steven Universe. A série me pegou, assisti todos os episódios lançados até agora e estou ansiosíssimo para os episódios da semana que vem. História bem contada, personagens carismáticas E SUPER COMPLEXAS além do SHOW de representatividade. É incrível! Todas as personagens são, ao mesmo tempo, estereotipadas e multifacetadas... exatamente como as pessoas.
Sendo bem sincero, acho que estamos diante d'O Pequeno Príncipe do século XXI: é uma obra de arte voltada para o público infantil, com uma linguagem familiar pra ele, com características que esse público admira e passando em cada episódio de 11 minutos mensagens como ser uma boa pessoa. Outros desenhos dessa geração são ótimos em termo de criatividade e narrativa, mas este ponto da ~formação de valores~ costuma ser menos importante do que em Steven Universe. E é justamente por ser uma série tão fofa, criativa e com essa capacidade de nos tornar pessoas melhores a cada episódio que a série ganhou meu coração <3