Pare o que você estiver fazendo e vá ver Nanette, o stand-up de Hannah Gadsby. O show com pouco mais de uma hora não é "apenas" brilhante. Alguns críticos estão chamando de game changer. E eu concordo. Gadsby faz uma comédia afiadíssima, hilária, mas sem o ranço do humor tradicional, sem depreciar minorias, atacando os poderosos. Nanette também é um depoimento autobiográfico. Gadsby é lésbica, mas ela não se encaixa em classificações fáceis ou esperadas, nem mesmo entre a comunidade LGBT. Ela conta sua história de vida ora com humor, ora com seriedade, ora com raiva, muita raiva. O roteiro é genial. Ao final do show, você vai ficar besta ao perceber como Gadsby te manipulou para revelar algo tão importante sobre relações humanas, sobre entender o outro. Um microfone, um banquinho, um copo de água e alguns painéis no fundo do palco. Isso foi o suficiente para Hannah Gadsby revolucionar a comédia contemporânea.
Esse filme é uma espécie de fábula sobre quem vive à margem nos EUA. É sobre aqueles que não usufruem da opulência do american way of life. E isso fica bem visível nessa história passada na Flórida, num motel barato, a poucos metros da Disney, um dos maiores símbolos de consumo do sonho americano. A força desse filme está em mostrar uma realidade cruel sob o ponto de vista, principalmente, de crianças. Elas são livres, soltas, rebeldes, de certa maneira independentes. Já deixaram a inocência para trás, mas ainda se encantam com as pequenas maravilhas do mundo, como compartilhar um sorvete de casquinha, apreciar um show de fogos de artifício e correr na chuva. O naturalismo da proposta é quebrado pela atmosfera de faz-de-conta, como se o filme fosse uma incansável brincadeira, cheia de cores, cheiros, texturas e possibilidades. Mesmo que não haja elementos fantásticos. Mesmo quando a violência física e psicológica invadem o cotidiano dessas pessoas. Os personagens são marcantes, sustentados por interpretações incríveis. Willem Dafoe faz o papel do discreto e bondoso gerente do motel, alguém que você sempre espera aflorar o lado sombrio, mas que continua mantendo-se firme. Dafoe teve uma merecida indicação ao Oscar este ano. Outro destaque é a estreante Bria Vinaite, que faz a jovem mãe da garotinha Moonee. Uma pessoa difícil, sem juízo, mas que luta como uma leoa para sustentar a filha. E temos a própria Moonee, o charme do filme. A atriz mirim Brooklynn Prince arrasa fazendo uma menina incontrolável e tagarela, com suas tiradas desconcertantes. Esta não é uma fábula da Disney, amenizada para não chocar. É uma fábula sem moral no fim.
Este filme vai te deixar, ao mesmo tempo, fascinado e puto da vida. No seu filme anterior, The Lobster (2015), o diretor criou uma comédia do absurdo cruel, mas com uma possibilidade de reconforto. O Sacrifício é mais vago e aberto, porém não deixa dúvidas sobre a intenção de tirar o chão do espectador. Aos poucos, a superfície de normalidade e tédio vai dando lugar a um incômodo crescente, chegando ao seu final de puro desespero. E a atmosfera de terror psicológico funciona tão bem devido a evolução de Lanthimos como diretor. Sua maneira de filmar e de editar som e imagem estão mais arrojadas e precisas. Não que haja tomadas extravagantes ou cena grandiosas. Alguns críticos apontaram semelhanças com o estilo de Kubrick, algo de O Iluminado. As tomadas abertas, os travellings, a simetria. Mas ouso dizer que O Sacrifício é mais perturbador do que O Iluminado, por ser um filme mais simples e por utilizar o inexplicável de maneira menos convencional. A estranhíssima trilha sonora passa muito bem o clima de perplexidade e impotência dos personagens. Aliás, outra força de O Sacrifício são as atuações. Ultimamente, Nicole Kidman tem voltado a fazer papéis mais desafiadores, lembrando os tempos de Dogville. Assim como Colin Farrell, que sabiamente está se descolando de seu passado de galã e mostrando mais coragem como ator. Agora quem rouba o filme é o jovem Barry Keoghan. O seu personagem, aparentemente, mostra-se um garoto carente e meio bobo. Mas, na verdade, ele é misterioso e complexo. Se você quiser apenas se divertir, fuja desse filme. Agora se você quiser ser desafiado a pensar, esse filme é uma ótima pedida.
Só agora fui ver Anomalisa (2015), o filme em stop-motion de Charlie Kauffman, co-dirigido pelo animador Duke Johnson. Outros diretores já mostraram o potencial da animação como um meio narrativo complexo e inovador. Kauffman dá a contribuição dele, num filme com bonecos melancólico, tenso e, acima de tudo, bastante humano. Acompanhamos o protagonista, um palestrante motivacional, que se hospeda em um hotel para uma apresentação. Inicialmente, parece que ele tem a vida sob controle, um homem de sucesso. Mas, aos poucos, somos apresentados ao seu desespero interior. Não é exatamente simpatia o que sentimos por ele. O cara é falho. Tem gente que o chamaria de escroto. Mas seu desespero é bastante real. Kauffman mistura o registro da vida comum com delírios kdickianos para falar sobre conexão e desconexão com o mundo, o que nos deprime e nos encanta. É um filme ora tocante, como um sincero drama romântico. Ora assustador, com um claustrofóbico clima de pesadelo. Sem dúvida, a co-direção de Duke Johnson serviu para dar fluidez à narrativa. A produção da animação é de encher os olhos. O fascinante no filme é ver uma história tão profunda numa atmosfera tão artificial, tão fake. Esse contraste torna Anomalisa algo único.
Sair da zona de conforto do machismo é algo inconcebível para muitos homens. Mas continuar a ser machista não prejudica só as mulheres. Entender o lado delas não é algo legal a se fazer, é algo necessário, para que todos possam ter uma convivência mais saudável, produtiva e feliz. Deixar de ser machista é um exercício cotidiano, nunca acaba. Isso não é papo de auto-ajuda rs. No filme "Eu não sou um homem fácil", a diretora e roteirista francesa Éléonore Pourriat faz uma divertida troca de papéis. O conquistador Damien sofre um acidente e acorda numa Paris em que as mulheres dominam o mundo, os cargos e as posições de poder. E se comportam com uma feminilidade agressiva. Enquanto que os homens são o sexo frágil. São eles que têm de ficar bonitos para elas. O machão Damien sofre com assédios, cantadas, humilhações, a objetificação de seu corpo e a desvalorização de seus sentimentos. Em termos de produção, o filme não é nada excepcional, mas nos leva a pensar mais sobre certas concepções em nossa sociedade, que muitos consideram como uma verdade praticamente imutável.
Começo logo dizendo que Vingadores: Guerra Infinita é inferior ao primeiro filme e muito superior a Era de Ultron. Em Guerra Infinita, falta a coesão e desenvolvimento de personagens do primeiro. E está longe de ser a bagunça que foi Era de Ultron. Como já apontaram, Guerra Infinita é mais um evento (na verdade, a parte 1 desse evento) do que um filme propriamente dito. Uma saga de quadrinhos no cinema. E como os leitores de HQs bem sabem, dificilmente as sagas mostram o melhor de um universo de super-heróis. Acontece o mesmo com o MCU. Os melhores filmes são aqueles auto-contidos, que contam uma história sem muita ou nenhuma conexão com as outras produções do universo compartilhado.
O inchaço era inevitável em um filme como Guerra Infinita. Mas aqui a Marvel soube entregar um entretenimento que empolgasse. Ao contrário de Era de Ultron, tão preocupado em servir de plataforma para apresentar os novos rumos do MCU em futuros filmes, em Guerra Infinita há apenas um “novo” personagem a ser apresentado e desenvolvido de fato: Thanos. Chega a impressionar a decisão da Marvel em tornar o vilão a coisa mais importante do filme. Thanos não é uma figura caricata. Ele mal levanta a voz. Mas sua tranquilidade é assustadora. E suas motivações, por mais questionáveis que sejam, seguem uma lógica verossímil. Podemos dizer que Thanos acredita nas ideias de Malthus, de que a superpopulação é o motivo de todas as mazelas sociais, no caso, em todo o Universo. Thanos se considera um herói, equivocado, mas herói. O fascinante é ver sua convicção desapaixonada, lutando contra seus mais profundos sentimentos pessoais. Thanos é um vilão atormentado. E tem presença, é miserável e vai fazer você sentir muita raiva.
Passada a montanha russa de emoções de Guerra Infinita, analisando a coisa friamente, constata-se que é um dos melhores filmes do MCU. Mesmo com seus problemas. A presença dos super-heróis é irregular, e em alguns casos decepciona (heróis fundamentais ficam meio de escanteio). Só uns poucos que fazem a trama avançar têm mais tempo de tela. Por isso, ganharam um bom desenvolvimento e falas marcantes. O que faz Guerra Infinita funcionar são as partes e não o todo, os melhores momentos de cada núcleo de heróis. O bom é que a constante troca de cenários e de times de heróis acelera a trama. O humor geralmente funciona. A ação, no estilo irmãos Russo, é muito competente. E os efeitos especiais são bem convincentes em mostrar a ambição épica desse filme.
A Marvel nunca teve muita coragem em arriscar no MCU. Em termos de mudanças de rumo. Mas há sérias consequências em Guerra Infinita. Houve choro, espanto, silêncio e revolta nos cinemas. Resta saber se a Marvel, daqui para a frente, vai respeitar o investimento emocional do público em relação a algumas das decisões tomadas.
Comédia romântica que foge dos clichês do gênero. Roteiro muito bem escrito, com ótimos diálogos e soluções narrativas maduras. Nem todas as piadas funcionam, mas é divertido. E também muito verdadeiro nos momentos de drama, sem apelar. A indicação ao Oscar de melhor roteiro original deste ano foi merecida. Os atores estão muito bem. As participações de Holly Hunter e Ray Romano elevam bastante a qualidade do filme.
Aniquilação é mais um caso em que o livro é melhor do que o filme. Mas isso não quer dizer que o filme seja ruim. Alex Garland dirigiu e escreveu uma adaptação do primeiro volume da trilogia Comando Sul, de Jeff Vandermeer. O livro traz um desenvolvimento mais aprofundado dos personagens, principalmente, da protagonista. Há pequenos detalhes bem interessantes na personalidade de cada cientista da expedição e na trama que foram cortados do filme. Mesmo assim, as atrizes e o roteiro de Garland fazem um ótimo trabalho em mostrar mulheres complexas, reagindo como gente de carne e osso numa situação-limite, com altos e baixos. A grande atração do filme é a solução visual encontrada para mostrar o que imaginamos no livro. O desenho de produção é incrível. E a partir daí, Garland triunfa em entregar uma ficção científica relevante. Quanto mais adentramos naquela zona estranha, o terror aumenta, mas também a beleza e o fascínio. Questionamentos sobre propósito, acaso, preservação da vida e autodestruição são levantados de maneira incomum para um filme de grande estúdio. Se fosse mais fiel ao livro, seria ainda melhor, mais maduro e menos hollywoodiano.
Comédia policial sul-coreana que merece uma conferida. Tem momentos mais sérios e tensos, porém, no geral, o tom é mais leve. Apesar da trama meio forçada, com furos e coincidências demais, o suspense é competente. Agora o que garante a diversão é a dupla de protagonistas. Um mal-humorado chaveiro e um despachado policial, ambos idosos, numa caça a um serial killer. O interessante é que o filme pega como tema de fundo a velhice, mostrando, ao mesmo tempo, o drama do desgaste do corpo e da mente, e um lado mais ativo dessa parcela crescente da população.
É mais um suspense psicológico do que um terror de sustos baratos. Não é um filme para assistir comendo pipoca, e sim para ficar grudado na cadeira, bem atento. Num mundo pós-apocalíptico, estilo The Walking Dead, uma família (pai, mãe e filho adolescente) tenta sobreviver, isolada numa casa de campo, a uma doença desconhecida que está matando geral. Certo dia, outra família (um casal jovem com o filho pequeno) aparece. Estes são recebidos em troca de ajuda e mantimentos. A dinâmica da casa se torna mais leve, um sopro de esperança, em meio ao caos silencioso. Mas a atmosfera opressiva retorna, por causa da ameaça externa indefinida. E, principalmente, pelo clima de paranoia e tensão, dentro da casa, com os personagens guardando segredos um dos outros. O astro do filme é Joel Edgerton, mas quem rouba a cena é o jovem Kelvin Harrison Jr, que faz o filho adolescente. Um garoto de dezessete anos que tenta lidar com dilemas dessa fase (ânsia sexual, incerteza do futuro, perda da inocência) num contexto extremo. Psicologicamente, ele sofre pra burro, e o ator entrega uma performance cativante. É um filme pequeno, mas muito competente em criar uma atmosfera de terror social. Uma metáfora política afiada sobre intolerância, sobre ver o outro sempre como um inimigo.
O hype é real! O aguardadíssimo filme do Pantera Negra chegou para abalar as estruturas. Não é um filme perfeito. Mas é algo que você nunca viu antes.
O diretor e roteirista Ryan Coogler se firmou como um dos mais interessantes cineastas dos últimos tempos com seus dois filmes anteriores, o poderoso drama Fruitvale Station e Creed, a incrível reinvenção da franquia Rocky, com Stallone.
O grande talento de Coogler é criar personagens tridimensionais, escolhendo os atores certos para interpretá-los, acertando em cheio em suas motivações e entregando-lhes falas inteligentes, seja para o drama ou o humor.
O que fica evidente em Pantera Negra é que Coogler ainda está aprendendo a lidar com uma grande produção. Seus dois filmes anteriores eram bem menores. Por isso, ele tinha maior controle sobre a narrativa deles. Sem dúvida, são filmes mais coesos. Creed mostra mais arrojo, com momentos em que o trio fotografia-montagem-trilha sonora entrega cenas muito elegantes e cheias de energia.
Em Pantera Negra, Coogler tenta se encontrar, fazer, na medida do possível, algo com a marca dele, tanto nos detalhes (oi, Oakland!) quanto nas grandes decisões (worldbuilding, conotação política, ligação com o MCU). Para um filme que é parte de uma linha de montagem, podemos dizer que ele se saiu muito bem.
Pantera Negra consegue se sustentar como entretenimento, indo além. Agora ele faz parte do seleto clube de filmes populares e relevantes, como Soldado Invernal e Mad Max, Estrada da Fúria. E, como todo blockbuster, Pantera Negra tem suas falhas.
Fruivale Station e Creed são filmes muito físicos, com uma pegada realista. Uma fantasia tão colorida e ambiciosa como Pantera Negra exigiu bastante do uso de CGI. E nem sempre a coisa dá certo, principalmente, em cenas em que o herói é mais exigido, em suas acrobacias e golpes espetaculares. Também houve problemas nas coreografias das lutas como um todo. A comparação com Soldado Invernal é inevitável. E Pantera Negra sai perdendo. Mesmo que algumas cenas de ação sejam alguns dos melhores momentos do filme. Além disso, conhecemos pouco do cotidiano, das ruas e do povo de Wakanda.
Como todo roteiro de uma grande produção, há furos e equívocos. O maior deles foi não dar ao vilão principal, Killmonger, ainda mais espaço. Ele aparece e some na primeira metade do filme. Para voltar com tudo e desestabilizar as certezas do herói. Mas o roteiro também tem suas qualidades. E que qualidades! Desenvolve muito bem os personagens, tem um humor inteligente e pontual, e reviravoltas corajosas para um filme pipoca. Alguns personagens ficam sem chão, assim como o espectador.
E que elenco! Que personagens! A combinação perfeita entre talento e avatar. Os personagens masculinos são homens negros que fogem dos estereótipos em que a sociedade geralmente os enquadra. São líderes, pessoas inteligentes, cultas, preparadas. E também complexas, tridimensionais, contraditórias. Mas meu destaque mesmo vai para a representação feminina. A mulher negra sempre foi colocada de escanteio em filmes de ação e aventura, porque a mulher negra sofre um duplo preconceito. Em Pantera Negra, vemos que elas podem ser até mais interessantes como personagens de ação do que os homens. E não é só isso. Há uma variedade de personalidades que mostra o potencial dessas mulheres. Há a badass general Okoye com sua lança de vibranium, a divertida cientista Shuri, a determinada espiã Nakia e muitas outras.
Killmonger se firma como um dos melhores vilões do MCU, talvez o melhor, por suas motivações serem tão convincentes. Michael B. Jordan o interpreta com uma presença física ameaçadora e falas desconcertantes. Ele é um vilão trágico.
Não podemos esquecer o impagável Claw de Andy Serkis. É um delicioso vilão cartunesco.
A trilha sonora é empolgante, misturando rap, hip-hop, rock, ritmos africanos, música sinfônica e sintetizadores. O design de produção mostra cenários, figurinos e objetos incomuns para um filme de super-herói. O afrofuturismo se torna mainstream.
O teor político é bem trabalhado. A denúncia contra o racismo histórico é passada muito mais pela interação entre os personagens, dentro da narrativa, e não com tanta exposição ou monólogos. A Marvel está de parabéns. Mesmo dentro da fórmula do estúdio, deram liberdade criativa e de expressão para Ryan Coogler. Agora a Marvel está colhendo os frutos, pela repercussão do filme e pela perspectiva de uma bilheteria avassaladora.
Para uns, Pantera Negra é diversão garantida. Para outros, um sonho que se torna realidade.
É um filme simples. Mas o diretor teve muita habilidade em conectar os personagens com o espectador. Ele constrói aos poucos o drama do protagonista. Por isso, a gente fica tão abalado na meia hora final. Mesmo sabendo o que vai acontecer.
O Matador, o primeiro filme nacional produzido pela Netflix, não faz feio. Eu adoro westerns. Nos anos 60, os italianos revolucionaram o gênero, tornando-o mais sujo, irônico e cruel, ou seja, mais próximo de qualquer recriação histórica (lembrando que Kurowasa fez Os Setes Samurais nos anos 50). Há décadas, produções de todo o mundo fazem homenagens e experimentações com esse gênero tão americano. No cinema nacional, há filmes que podem ser considerados faroestes, inclusive reconhecidos internacionalmente, como os de Glauber, O Cangaceiro, de Lima Barreto, O Tronco, de João Batista de Andrade, Abril Despedaçado, de Walter Salles, e outros. Em termos de ambição estética, O Matador é inferior a todos estes. De maneira esforçada, com momentos inspirados no roteiro e fotografia, o filme conta a história do matador Cabeleira, que nada tem a ver com o romance de Franklin Távora. O maior mérito de O Matador é evitar maniqueísmos. Não há atores globais de destaque nem qualquer ranço romântico que possa vir da emissora. O protagonista está longe de ser um herói. É um filme que começa bem, fica disperso e arrastado no segundo ato, mas que termina de maneira digna.
Novamente, o roteiro não faz o menor sentido. O que importa mesmo é a pancadaria. É ver Keannu Reeves em ação. John Wick 2 é uma produção mais caprichada e ambiciosa. Porém, o filme anterior era mais coeso. Um erro recorrente cometido por muitas franquias em Hollywood é começar de maneira simples e eficiente e depois crescer por crescer, aumentando a pirotecnia por um cacoete e não por ter algo realmente de novo a mostrar. John Wick 2 é divertido. Tem ótimas cenas de ação. O que John Wick faz com um lápis deixaria o Coringa de O Cavaleiro das Trevas besta. Espero que essa franquia não perca o foco. Não quero ver John Wick salvando o mundo no próximo filme.
Já começo dizendo que o mangá é incrível, e que essa versão para anime explorou pouco o clima sombrio e a trama complexa do material de origem. Deviam ter feito uma série e não um filme. Muita coisa ficou de fora. Na verdade, os criadores disseram que o anime não é exatamente uma adaptação, e sim uma história totalmente nova dentro do universo de Blame! Não me parece. O maior problema foi o exagero no uso de computação gráfica. Existem bons momentos de ação, mas, no geral, o filme ficou devendo.
(Sem spoilers) Os Últimos Jedi é um filme que está longe de ser perfeito, mas foi uma das mais vibrantes experiências cinematográficas que tive recentemente, ao lado de Mad Max - Estrada da Fúria e Mulher Maravilha. Estrada da Fúria é um filme praticamente perfeito. E Mulher Maravilha é superior a Os Últimos Jedi. Mas, quando o episódio VIII acerta pra valer, ele vai na sua jugular sem pena. Escrito e dirigido por Rian Johnson, do ótimo Looper, Os Últimos Jedi trata, acima de tudo, do conflito de gerações entre a trilogia original e o novo cânone. Mostra que nem sempre os jovens estão com a razão, que há uma sabedoria mais velha que precisa ser ouvida. Mas, ao mesmo tempo, mostra como gerações anteriores têm dificuldade em mudar de ideia, de pensamento. Visualmente, é o filme mais bonito já realizado na franquia. O uso da cor vermelha tem uma carga dramática só vista no trabalho de autores arrojados, como Tarantino, Kubrick e Takeshi Kitano. Os personagens são, em sua maioria, heróis carismáticos ou vilões convincentes. É interessante ver como alguns personagens importantes evoluíram. Mas outros não saíram do lugar. Um aspecto notável no filme é quantidade de personagens femininas relevantes! Uma coisa que ficou bem clara é que, pela primeira vez, estamos vendo um filme de Star Wars do jeito que a Disney quer. Ou seja, entretenimento para crianças e adultos. Só que isso é feito da maneira mais orgânica possível. A inclusão dos porgs, por exemplo, não é feita apenas para vender brinquedos e produtos licenciados. Como fã de anime, de Miyazaki, posso dizer que os bichinhos funcionam como excelente alívio cômico, ainda mais na relação deles com Chewie. E surpresa: Os Últimos Jedi é muito engraçado. O grande problema do filme é o ritmo, consequência da estrutura do roteiro. Há histórias paralelas demais. Uma delas bem irrelevante, envolvendo Finn e Rose, que só atrasa o desenrolar dos acontecimentos que realmente importam. Os Últimos Jedi começa de maneira empolgante, cai de qualidade lá pelo meio e depois volta a engrenar, mostrando o seu melhor. O terceiro ato é de tirar o fôlego, do ponto de vista visual e emocional. O episódio VIII responde alguns mistérios de O Despertar da Força, mas outros ficam em aberto; deixando uma sensação incômoda de que certas coisas fundamentais não serão explicadas nos filmes, talvez no universo expandido. Pra compensar, há momentos WTF, de explodir a cabeça! E precisamos falar de Luke e Leia. Mark Hammil e Carrie Fischer destroem. Ambos com um desenvolvimento de personagem nunca antes visto na franquia. Esse Luke é ranzinza, amargurado, mas também zoeiro, com um humor afiado, que só pessoas vividas possuem, longe daquele menino fazendeiro de A Nova Esperança. E a Leia general tenta manter os rebeldes unidos com sabedoria, generosidade e mão firme. Já tem fã de Star Wars torcendo o nariz pra esse episódio VIII, chamando de fanfic. A questão é que a franquia não vai andar para trás. Acertando e errando, A Disney vai manter os conceitos icônicos de Star Wars, só que ela usará essa mitologia em novos contextos. Não adianta chorar. E que comece a caça aos furos do roteiro!
Finalmente pude ver o anime Your Name, mais de um ano depois de seu lançamento no Japão. Aqui no Brasil, passou em poucas salas em 2017 e agora chegou à Netflix. Sou fanzaço do diretor e roteirista Makoto Shinkai. Em Your Name, ele está no auge do seu talento. Não por acaso, o filme foi um gigantesco sucesso de bilheteria no Japão e pode ganhar uma versão live-action americana em breve. A obra de Shinkai fascina pela junção poderosa entre visual e emoção. Fãs de anime e apreciadores da cultura japonesa vão perceber as várias camadas do filme, indo além do melodrama juvenil. É uma constante no trabalho de Shinkai a discussão sobre pertencimento, o lugar de cada um no mundo, o vazio existencial, solidão, encontros e desencontros, tradição e o futuro. Em Your Name, os contrastes e conexões entre o Japão do passado e o atual são magistralmente mostrados, tornando-se um recurso fundamental na trama. Os elementos de fantasia e de crônica da vida moderna trazem algo bem original na maneira de contar uma história de amor entre adolescentes. Há o humor pateta e momentos mais tristes e tensos, embalados por uma trilha sonora filhadaputamente tocante. O filme tem uma dinâmica incrível, com viradas de roteiro imprevisíveis. O elenco de personagens é muito carismático. E a mistura de animação tradicional e computação gráfica é a mais deslumbrante já vista numa obra de Shinkai. A melancolia de Your Name é romântica, mas nunca é desonesta. É uma animação belíssima, triste, sem respostas fáceis. Mas que, no final, deixa na gente uma sensação boa de aprendizado.
Você pode resumir o filme da Liga da Justiça numa palavra: decepção. Tem uns 30 minutos muitos bons (a abertura com o Batman, a sequência em Temiscira, o flashback da luta de um monte de gente bacana contra o Lobo da Estepe, o despertar do Superman e alguns pouquíssimos momentos cômicos que funcionam). Outros 30 minutos enchem linguiça com dignidade, com momentos mais calmos ou de transição. Mas o resto, ou seja, 61 minutos, pode jogar no lixo. São sequências de ação com CGI pesado e com uma dinâmica confusa. O humor do Flash erra muito mais do que acerta. A boca digital do Superman tá bizarra mesmo. Há uma obsessão em filmar a bunda da Mulher Maravilha. O Batman é um tiozão. O Aquaman é o mesmo Jason Momoa de sempre (não acho que ele tem carisma e talento pra sustentar um filme solo). Para minha surpresa, gostei do Superman, apesar do bigodegate. Há uma fagulha do ícone ético que conhecemos, e não aquele jesus cristo atormentado de BvS. E o Ciborgue tem uma sabedoria tranquila, fundamental para a trama. Só que os problemas continuam: 80% dos diálogos são ruins (expositivos demais, piegas, sem-graça). O Lobo da Estepe é um vilão fraquíssimo com um CGI muito fake pra se levar a sério e com motivações muito bidimensionais (ele só quer destruir, destruir, destruir). A mitologia cósmica da DC foi totalmente cagada. Outro crime foi pegar atores excelentes, até ganhadores do Oscar, e colocar praticamente como figurantes de luxo, aparecendo em tão poucas cenas. A primeira metade tem momentos de tédio brabo, tipo "fazer listinha de compras mental". E a segunda metade é uma correria só, tipo "temos que acabar esse negócio antes que o povo comece a sair da sessão". As cenas pós-créditos não acrescentam nada, ainda mais agora que o futuro da DC no cinema está zoado, a Warner sem saber direito o que vai fazer daqui pra frente. Você procura os 300 milhões de dólares gastos no filme e vê que tem coisa faltando. A Liga da Justiça merecia algo épico, e não uma mistura de Transformers com Power Rangers.
Thor: Ragnarok é uma delícia de filme. Depois de ver o mockumentary sobre vampiros na Nova Zelândia What We Do in The Shadows e a comédia dramática Hunt for the Wilderpeople, virei fanzaço do diretor, roteirista, ator e comediante Taika Waititi. Minha expectativa para o terceiro filme do Deus do Trovão estava alta. E fui correspondido mais do que me decepcionei. A Marvel está de parabéns por entregar o primeiro filme de autor do MCU. Edgar Wright teve tantos problemas na produção de Homem-Formiga que acabou saindo do projeto. E por que Wright, também um diretor com assinatura, fracassou onde Waititi trinfou? Para mim, isso tem a ver com o tipo de cinema dos dois. Os filmes de Wright são conhecidos por ter uma montagem menos convencional, com cortes rápidos e movimentos de câmara inusitados, inspirados nos filmes trash dos anos 70 e 80. Ou seja, são paródias de luxo. Provavelmente, a Marvel queria um filme engraçado, mas que não desse dor de cabeça para o espectador acompanhar. A questão com Wright era de forma. No caso de Waititi, a Marvel deu liberdade para ele fazer uma paródia, sim, mas mexendo apenas no conteúdo. A forma não é muito diferente da maioria dos filmes do estúdio. O triunfo de Thor: Ragnarok está no worldbuilding, nas atuações, nos diálogos cômicos e na trilha sonora. A produção é de primeira. O CGI é mais do que convincente. E o desenho de produção cheio de cores, esquisitices e sujeira me lembrou de tanta coisa dos anos 80: os formatinhos da Abril, Flash Gordon, He-man, Atari, John Carpenter, animações como Heavy Metal, além dos mestres Jack Kirby e Walt Simonson. As atuações são certeiras, as piadas físicas e verbais hilárias, a ação empolgante. Finalmente, Thor rouba a cena, sendo mais carismático do que outros personagens, como Loki. A dupla Thor/Hulk é a melhor relação já feita entre heróis no MCU. Tiram sarro um do outro, brigam feio, mas também um tenta entender o problema do outro e cuidar um do outro. A Hela de Cate Blachett está fantástica. Mas infelizmente ela é subaproveitada. Em Vingadores 2, o insuportável Ultron aparecia toda hora. Blachett tem pouco tempo de tela, ficando sem muito o que fazer, enquanto o melhor do filme acontece em outro lugar. Isso por causa da estrutura bizarra do roteiro. A subtrama no planeta dos gladiadores, Sakaar, é muito mais divertida e interessante do que o draminha da trama principal, que dá título ao filme, em Asgard. Mas as qualidades de Thor: Ragnarok superam seus defeitos, nessa que é a melhor comédia da Marvel.
Raw. Que filme tenso. Produção franco-belga, estreia da diretora e roteirista Julia Ducournau. Acompanhamos Justine, uma caloura de veterinária. Criada numa família de vegetarianos, ela experimenta carne crua num trote da faculdade. E isso transforma sua vida. É um filme de terror que evita clichês. É discreto, porém cheio de energia. Mostra uma juventude sem glamour, cheia de liberdades, mas também cheia de cobranças. O gore nunca é gratuito. Os elementos de horror perturbam porque o que vemos pode acontecer de fato. Não temos aqui zumbis ou entidades sobrenaturais. É a vida real levada ao extremo. É muito interessante ver um filme de terror escrito e dirigido por uma mulher, protagonizado por mulheres, mostrando pessoas complexas, difíceis de rotular. A trilha sonora de Jim Williams, ora delicada, ora perversa, entra sempre nos momentos certos para mexer com o espectador. Algumas reviravoltas não funcionam; em retrospectiva, não fazem muito sentido. E o desenvolvimento da protagonista é um pouco apressado. Raw é a história de formação de uma garota, misturando subversão feminina e sátira social.
Eu queria muito estar errado, mas infelizmente minhas previsões se confirmaram. A sequência de Blade Runner é um bom filme com um visual espetacular, mas inferior a outras produções recentes igualmente ambiciosas, como Mad Max – Estrada da Fúria e A Chegada, do próprio Denis Villeneuve.
Quando anunciaram que haveria uma continuação de Blade Runner, a reação de muitos foi de total descrédito. As lacunas do filme original não precisavam ser respondidas. Quer dizer, vamos ter em mente as muitas versões lançadas ao longo dos anos. A versão que foi para o cinema, em 1982, com a narração de Harrison Ford e o final feliz, mora no meu coração por ter sido a que mais revi, ainda em VHS, depois em DVD. A versão considerada por Ridley Scott como definitiva, The Final Cut, de 2007, também me agrada bastante por ser mais madura e subjetiva.
A melhor maneira de apreciar o filme de Villeneuve é ter visto as versões de 1982 e 2007, lido o romance que originou tudo, Androides Sonham com Ovelhas Elétricas?, de Philip K. Dick e ter visto os três curtas lançados antes da estreia do novo Blade Runner, que servem como prelúdios para contextualizar o que aconteceu em Los Angeles (e no mundo) entre 2019 e 2049.
O canadense Denis Villeneuve já se firmou como um dos diretores mais interessantes em atividade, um mestre. Alguém que tem um controle absurdo da mise-en-scène, que sabe deixar o espectador instigado, tenso e mesmerizado. Seus filmes são visualmente desafiadores e provocam a reflexão. Em Blade Runner 2049, um projeto cheio de expectativas e pressões, ele se saiu bem. Entregou uma produção de grande estúdio acima da média, corajosa em bancar uma narrativa mais lenta, em tratar de temas complexos sem muitas concessões.
Não me entendam mal. O filme é bonito e relevante. A fotografia do veterano Roger Deakins é quase indecente de tão esmerada, em tomadas fechadas e abertas, em cores quentes e frias. Os efeitos especiais e sonoros estão totalmente integrados a essa evolução do universo de Blade Runner, com um desenho de produção que soube repaginar o clima noir original para um mundo parte tecnologicamente mais avançado, parte mais apocalíptico. Ryan Gosling carrega o filme nas costas. Seu personagem tem um arco emocional de fundir a cabeça de qualquer um. E ele nos leva junto nessa jornada cheia de dor física e mental. O Deckard coroa de Harrison Ford está ótimo, numa performance muito superior ao Han Solo de O Despertar da Força. Robin Wright, como a chefe do personagem de Gosling na polícia, Ana de Armas, a namorada virtual dele, e Sylvia Hoeks, a braço direito do personagem de Jared Leto, também são presenças marcantes.
Mas o filme tem três problemas: o roteiro, a duração e a trilha sonora. Problemas graves que comprometem as ideias, a coesão e a estética de Blade Runner 2049.
O maior mérito do roteiro foi manter a coisa simples, não investir em grandes conspirações nem em preparar uma futura franquia. Algumas pontas ficam soltas para uma possível sequência, mas isso não compromete a trama. Hampton Fancher (um dos roteiristas do original) e Michael Green (roteirista do ótimo Logan, mas das bombas Lanterna Verde e Alien: Covenant) mantiveram o clima de filme policial, de investigação.
O roteiro aprofunda a questão dos replicantes. Temos aqui um cenário mais complexo e variado, em que temas como preconceito, identidade e escolha são mais urgentes do que no primeiro filme. Mas essa discussão para no meio do caminho pelos equívocos narrativos. Os personagens coadjuvantes são menos interessantes em comparação aos do primeiro filme. A entrada de K, o personagem de Gosling, na história, com a ótima participação de Dave Bautista, é muito conveniente. A subtrama envolvendo a doutora Stelline, a criadora de memórias, me incomodou bastante. Analisando em retrospectiva, não faz muito sentido. E o dilema de ser ou não ser humano foi melhor trabalhado recentemente no filme Ex-Machina e na série Westworld, por exemplo.
Para frustração dos fãs, o aspecto religioso do romance por meio do mercerismo, uma espécie de cristianismo midiático, não foi explorado. Mas talvez a semente tenha sido plantada para ser desenvolvida mais adiante.
Não tenho problema com filmes lentos e longos. Adoro Tarkosvky. Mas, em Blade Runner 2049, 163 minutos se mostraram excessivos. Em certos trechos, os diálogos estão menos inspirados ou o silêncio não causa tanto impacto visual e sonoro.
Depois que Villeneuve foi confirmado como diretor desse filme, fiquei curioso para ver como seu compositor de longa data, o islandês Jóhann Jóhannsson, trabalharia musicalmente o universo de Blade Runner, tendo a icônica trilha sonora de Vangelis para assombrá-lo. Fiquei imaginando o que Jóhannsson poderia criar depois da música assustadora de Sicario e do mistério e da estranheza de A Chegada. Mas, poucos meses antes da estreia, Jóhannsson abandonou o filme, numa história ainda não explicada direito. Então os produtores recorreram ao onipresente Hans Zimmer, às pressas. Ele e seu pupilo Benjamin Wallfisch (responsável pela trilha do novo IT) fizeram uma música que fica entre uma imitação de Vangelis e a trilha do Batman de Nolan, numa pegada eletrônica, investindo mais em sintetizadores. É uma trilha eficiente em seus melhores momentos e irritante em seus piores. Não é memorável. Esse filme precisava de uma trilha sonora memorável.
O Blade Runner de 1982 foi um raro momento do cinema, no qual misturaram sorte e competência para reunir um punhado de pessoas brilhantes na produção de uma obra-prima. Depois o próprio Ridley Scott não conseguiu fazer nada tão bom ou próximo disso.
Blade Runner 2049 mostrou sua razão de ser. O mundo é um lugar melhor com a existência desse filme. E abriu as portas de vez para uma franquia que agora ninguém mais vai torcer o nariz.
Kingsman, O Círculo Dourado, é uma decepção. Gostei muito do primeiro filme por ter trazido de volta a diversão para a espionagem escapista, ao melhor estilo camp do Bond de Roger Moore, mas numa versão 2.0, enquanto o Bond de Daniel Craig vivia deprimido. Mas esse segundo filme tenta ser maior e melhor e geralmente fracassa. Na verdade, assistimos a uma colcha de retalhos. O roteiro é uma bagunça (há informações de que foi reescrito durante as filmagens). A trama não faz o menor sentido. Há planos ou estratégias rocambolescos que cansam o espectador, ou seja, uma barriga totalmente desnecessária. Poucos diálogos são realmente engraçados. O elenco incrível é mal utilizado. É uma pena ver Julianne Moore fazer uma vilã sem tanto brilho. Ela não está se divertindo no papel. Jeff Brigdes faz uma participação bidimensional de luxo, sem nenhuma personalidade. Os outros atores e atrizes se esforçam, cativam a gente em seus melhores momentos e nos irritam em seus piores, em maior número. A misoginia está pior do que no filme anterior. Agora O Círculo Dourado não é uma bomba. A fotografia é bonita. O desenho de produção é caprichado. A montagem, quando funciona, sabe ser paciente e também dinâmica e criativa. Os efeitos especiais e sonoros impressionam (a sequência de ação final é muito divertida), apesar de exagerados nas sequências de ação que não funcionam, ficando com cara de videogame. A unanimidade é o cameo de Elton John, cantando e chutando bundas. Nota 5.
Viagem Para Agartha
4.0 158 Assista AgoraBelíssima animação. Mais um filme incrível de Makoto Shinkai. Mas é triste pra burro.
Hannah Gadsby: Nanette
4.7 207 Assista AgoraPare o que você estiver fazendo e vá ver Nanette, o stand-up de Hannah Gadsby. O show com pouco mais de uma hora não é "apenas" brilhante. Alguns críticos estão chamando de game changer. E eu concordo. Gadsby faz uma comédia afiadíssima, hilária, mas sem o ranço do humor tradicional, sem depreciar minorias, atacando os poderosos. Nanette também é um depoimento autobiográfico. Gadsby é lésbica, mas ela não se encaixa em classificações fáceis ou esperadas, nem mesmo entre a comunidade LGBT. Ela conta sua história de vida ora com humor, ora com seriedade, ora com raiva, muita raiva. O roteiro é genial. Ao final do show, você vai ficar besta ao perceber como Gadsby te manipulou para revelar algo tão importante sobre relações humanas, sobre entender o outro. Um microfone, um banquinho, um copo de água e alguns painéis no fundo do palco. Isso foi o suficiente para Hannah Gadsby revolucionar a comédia contemporânea.
Projeto Flórida
4.1 1,0KEsse filme é uma espécie de fábula sobre quem vive à margem nos EUA. É sobre aqueles que não usufruem da opulência do american way of life. E isso fica bem visível nessa história passada na Flórida, num motel barato, a poucos metros da Disney, um dos maiores símbolos de consumo do sonho americano. A força desse filme está em mostrar uma realidade cruel sob o ponto de vista, principalmente, de crianças. Elas são livres, soltas, rebeldes, de certa maneira independentes. Já deixaram a inocência para trás, mas ainda se encantam com as pequenas maravilhas do mundo, como compartilhar um sorvete de casquinha, apreciar um show de fogos de artifício e correr na chuva. O naturalismo da proposta é quebrado pela atmosfera de faz-de-conta, como se o filme fosse uma incansável brincadeira, cheia de cores, cheiros, texturas e possibilidades. Mesmo que não haja elementos fantásticos. Mesmo quando a violência física e psicológica invadem o cotidiano dessas pessoas. Os personagens são marcantes, sustentados por interpretações incríveis. Willem Dafoe faz o papel do discreto e bondoso gerente do motel, alguém que você sempre espera aflorar o lado sombrio, mas que continua mantendo-se firme. Dafoe teve uma merecida indicação ao Oscar este ano. Outro destaque é a estreante Bria Vinaite, que faz a jovem mãe da garotinha Moonee. Uma pessoa difícil, sem juízo, mas que luta como uma leoa para sustentar a filha. E temos a própria Moonee, o charme do filme. A atriz mirim Brooklynn Prince arrasa fazendo uma menina incontrolável e tagarela, com suas tiradas desconcertantes. Esta não é uma fábula da Disney, amenizada para não chocar. É uma fábula sem moral no fim.
O Sacrifício do Cervo Sagrado
3.7 1,2K Assista AgoraEste filme vai te deixar, ao mesmo tempo, fascinado e puto da vida. No seu filme anterior, The Lobster (2015), o diretor criou uma comédia do absurdo cruel, mas com uma possibilidade de reconforto. O Sacrifício é mais vago e aberto, porém não deixa dúvidas sobre a intenção de tirar o chão do espectador. Aos poucos, a superfície de normalidade e tédio vai dando lugar a um incômodo crescente, chegando ao seu final de puro desespero. E a atmosfera de terror psicológico funciona tão bem devido a evolução de Lanthimos como diretor. Sua maneira de filmar e de editar som e imagem estão mais arrojadas e precisas. Não que haja tomadas extravagantes ou cena grandiosas. Alguns críticos apontaram semelhanças com o estilo de Kubrick, algo de O Iluminado. As tomadas abertas, os travellings, a simetria. Mas ouso dizer que O Sacrifício é mais perturbador do que O Iluminado, por ser um filme mais simples e por utilizar o inexplicável de maneira menos convencional. A estranhíssima trilha sonora passa muito bem o clima de perplexidade e impotência dos personagens. Aliás, outra força de O Sacrifício são as atuações. Ultimamente, Nicole Kidman tem voltado a fazer papéis mais desafiadores, lembrando os tempos de Dogville. Assim como Colin Farrell, que sabiamente está se descolando de seu passado de galã e mostrando mais coragem como ator. Agora quem rouba o filme é o jovem Barry Keoghan. O seu personagem, aparentemente, mostra-se um garoto carente e meio bobo. Mas, na verdade, ele é misterioso e complexo. Se você quiser apenas se divertir, fuja desse filme. Agora se você quiser ser desafiado a pensar, esse filme é uma ótima pedida.
Anomalisa
3.8 497 Assista AgoraSó agora fui ver Anomalisa (2015), o filme em stop-motion de Charlie Kauffman, co-dirigido pelo animador Duke Johnson. Outros diretores já mostraram o potencial da animação como um meio narrativo complexo e inovador. Kauffman dá a contribuição dele, num filme com bonecos melancólico, tenso e, acima de tudo, bastante humano. Acompanhamos o protagonista, um palestrante motivacional, que se hospeda em um hotel para uma apresentação. Inicialmente, parece que ele tem a vida sob controle, um homem de sucesso. Mas, aos poucos, somos apresentados ao seu desespero interior. Não é exatamente simpatia o que sentimos por ele. O cara é falho. Tem gente que o chamaria de escroto. Mas seu desespero é bastante real. Kauffman mistura o registro da vida comum com delírios kdickianos para falar sobre conexão e desconexão com o mundo, o que nos deprime e nos encanta. É um filme ora tocante, como um sincero drama romântico. Ora assustador, com um claustrofóbico clima de pesadelo. Sem dúvida, a co-direção de Duke Johnson serviu para dar fluidez à narrativa. A produção da animação é de encher os olhos. O fascinante no filme é ver uma história tão profunda numa atmosfera tão artificial, tão fake. Esse contraste torna Anomalisa algo único.
Eu Não Sou um Homem Fácil
3.5 737 Assista AgoraSair da zona de conforto do machismo é algo inconcebível para muitos homens. Mas continuar a ser machista não prejudica só as mulheres. Entender o lado delas não é algo legal a se fazer, é algo necessário, para que todos possam ter uma convivência mais saudável, produtiva e feliz. Deixar de ser machista é um exercício cotidiano, nunca acaba. Isso não é papo de auto-ajuda rs. No filme "Eu não sou um homem fácil", a diretora e roteirista francesa Éléonore Pourriat faz uma divertida troca de papéis. O conquistador Damien sofre um acidente e acorda numa Paris em que as mulheres dominam o mundo, os cargos e as posições de poder. E se comportam com uma feminilidade agressiva. Enquanto que os homens são o sexo frágil. São eles que têm de ficar bonitos para elas. O machão Damien sofre com assédios, cantadas, humilhações, a objetificação de seu corpo e a desvalorização de seus sentimentos. Em termos de produção, o filme não é nada excepcional, mas nos leva a pensar mais sobre certas concepções em nossa sociedade, que muitos consideram como uma verdade praticamente imutável.
Vingadores: Guerra Infinita
4.3 2,6K Assista AgoraComeço logo dizendo que Vingadores: Guerra Infinita é inferior ao primeiro filme e muito superior a Era de Ultron. Em Guerra Infinita, falta a coesão e desenvolvimento de personagens do primeiro. E está longe de ser a bagunça que foi Era de Ultron. Como já apontaram, Guerra Infinita é mais um evento (na verdade, a parte 1 desse evento) do que um filme propriamente dito. Uma saga de quadrinhos no cinema. E como os leitores de HQs bem sabem, dificilmente as sagas mostram o melhor de um universo de super-heróis. Acontece o mesmo com o MCU. Os melhores filmes são aqueles auto-contidos, que contam uma história sem muita ou nenhuma conexão com as outras produções do universo compartilhado.
O inchaço era inevitável em um filme como Guerra Infinita. Mas aqui a Marvel soube entregar um entretenimento que empolgasse. Ao contrário de Era de Ultron, tão preocupado em servir de plataforma para apresentar os novos rumos do MCU em futuros filmes, em Guerra Infinita há apenas um “novo” personagem a ser apresentado e desenvolvido de fato: Thanos. Chega a impressionar a decisão da Marvel em tornar o vilão a coisa mais importante do filme. Thanos não é uma figura caricata. Ele mal levanta a voz. Mas sua tranquilidade é assustadora. E suas motivações, por mais questionáveis que sejam, seguem uma lógica verossímil. Podemos dizer que Thanos acredita nas ideias de Malthus, de que a superpopulação é o motivo de todas as mazelas sociais, no caso, em todo o Universo. Thanos se considera um herói, equivocado, mas herói. O fascinante é ver sua convicção desapaixonada, lutando contra seus mais profundos sentimentos pessoais. Thanos é um vilão atormentado. E tem presença, é miserável e vai fazer você sentir muita raiva.
Passada a montanha russa de emoções de Guerra Infinita, analisando a coisa friamente, constata-se que é um dos melhores filmes do MCU. Mesmo com seus problemas. A presença dos super-heróis é irregular, e em alguns casos decepciona (heróis fundamentais ficam meio de escanteio). Só uns poucos que fazem a trama avançar têm mais tempo de tela. Por isso, ganharam um bom desenvolvimento e falas marcantes. O que faz Guerra Infinita funcionar são as partes e não o todo, os melhores momentos de cada núcleo de heróis. O bom é que a constante troca de cenários e de times de heróis acelera a trama. O humor geralmente funciona. A ação, no estilo irmãos Russo, é muito competente. E os efeitos especiais são bem convincentes em mostrar a ambição épica desse filme.
A Marvel nunca teve muita coragem em arriscar no MCU. Em termos de mudanças de rumo. Mas há sérias consequências em Guerra Infinita. Houve choro, espanto, silêncio e revolta nos cinemas. Resta saber se a Marvel, daqui para a frente, vai respeitar o investimento emocional do público em relação a algumas das decisões tomadas.
Doentes de Amor
3.7 379 Assista AgoraComédia romântica que foge dos clichês do gênero. Roteiro muito bem escrito, com ótimos diálogos e soluções narrativas maduras. Nem todas as piadas funcionam, mas é divertido. E também muito verdadeiro nos momentos de drama, sem apelar. A indicação ao Oscar de melhor roteiro original deste ano foi merecida. Os atores estão muito bem. As participações de Holly Hunter e Ray Romano elevam bastante a qualidade do filme.
Aniquilação
3.4 1,6K Assista AgoraAniquilação é mais um caso em que o livro é melhor do que o filme. Mas isso não quer dizer que o filme seja ruim. Alex Garland dirigiu e escreveu uma adaptação do primeiro volume da trilogia Comando Sul, de Jeff Vandermeer. O livro traz um desenvolvimento mais aprofundado dos personagens, principalmente, da protagonista. Há pequenos detalhes bem interessantes na personalidade de cada cientista da expedição e na trama que foram cortados do filme. Mesmo assim, as atrizes e o roteiro de Garland fazem um ótimo trabalho em mostrar mulheres complexas, reagindo como gente de carne e osso numa situação-limite, com altos e baixos. A grande atração do filme é a solução visual encontrada para mostrar o que imaginamos no livro. O desenho de produção é incrível. E a partir daí, Garland triunfa em entregar uma ficção científica relevante. Quanto mais adentramos naquela zona estranha, o terror aumenta, mas também a beleza e o fascínio. Questionamentos sobre propósito, acaso, preservação da vida e autodestruição são levantados de maneira incomum para um filme de grande estúdio. Se fosse mais fiel ao livro, seria ainda melhor, mais maduro e menos hollywoodiano.
A Caçada
3.5 30Comédia policial sul-coreana que merece uma conferida. Tem momentos mais sérios e tensos, porém, no geral, o tom é mais leve. Apesar da trama meio forçada, com furos e coincidências demais, o suspense é competente. Agora o que garante a diversão é a dupla de protagonistas. Um mal-humorado chaveiro e um despachado policial, ambos idosos, numa caça a um serial killer. O interessante é que o filme pega como tema de fundo a velhice, mostrando, ao mesmo tempo, o drama do desgaste do corpo e da mente, e um lado mais ativo dessa parcela crescente da população.
Ao Cair da Noite
3.1 977 Assista AgoraÉ mais um suspense psicológico do que um terror de sustos baratos. Não é um filme para assistir comendo pipoca, e sim para ficar grudado na cadeira, bem atento. Num mundo pós-apocalíptico, estilo The Walking Dead, uma família (pai, mãe e filho adolescente) tenta sobreviver, isolada numa casa de campo, a uma doença desconhecida que está matando geral. Certo dia, outra família (um casal jovem com o filho pequeno) aparece. Estes são recebidos em troca de ajuda e mantimentos. A dinâmica da casa se torna mais leve, um sopro de esperança, em meio ao caos silencioso. Mas a atmosfera opressiva retorna, por causa da ameaça externa indefinida. E, principalmente, pelo clima de paranoia e tensão, dentro da casa, com os personagens guardando segredos um dos outros. O astro do filme é Joel Edgerton, mas quem rouba a cena é o jovem Kelvin Harrison Jr, que faz o filho adolescente. Um garoto de dezessete anos que tenta lidar com dilemas dessa fase (ânsia sexual, incerteza do futuro, perda da inocência) num contexto extremo. Psicologicamente, ele sofre pra burro, e o ator entrega uma performance cativante. É um filme pequeno, mas muito competente em criar uma atmosfera de terror social. Uma metáfora política afiada sobre intolerância, sobre ver o outro sempre como um inimigo.
Pantera Negra
4.2 2,3K Assista AgoraO hype é real! O aguardadíssimo filme do Pantera Negra chegou para abalar as estruturas. Não é um filme perfeito. Mas é algo que você nunca viu antes.
O diretor e roteirista Ryan Coogler se firmou como um dos mais interessantes cineastas dos últimos tempos com seus dois filmes anteriores, o poderoso drama Fruitvale Station e Creed, a incrível reinvenção da franquia Rocky, com Stallone.
O grande talento de Coogler é criar personagens tridimensionais, escolhendo os atores certos para interpretá-los, acertando em cheio em suas motivações e entregando-lhes falas inteligentes, seja para o drama ou o humor.
O que fica evidente em Pantera Negra é que Coogler ainda está aprendendo a lidar com uma grande produção. Seus dois filmes anteriores eram bem menores. Por isso, ele tinha maior controle sobre a narrativa deles. Sem dúvida, são filmes mais coesos. Creed mostra mais arrojo, com momentos em que o trio fotografia-montagem-trilha sonora entrega cenas muito elegantes e cheias de energia.
Em Pantera Negra, Coogler tenta se encontrar, fazer, na medida do possível, algo com a marca dele, tanto nos detalhes (oi, Oakland!) quanto nas grandes decisões (worldbuilding, conotação política, ligação com o MCU). Para um filme que é parte de uma linha de montagem, podemos dizer que ele se saiu muito bem.
Pantera Negra consegue se sustentar como entretenimento, indo além. Agora ele faz parte do seleto clube de filmes populares e relevantes, como Soldado Invernal e Mad Max, Estrada da Fúria. E, como todo blockbuster, Pantera Negra tem suas falhas.
Fruivale Station e Creed são filmes muito físicos, com uma pegada realista. Uma fantasia tão colorida e ambiciosa como Pantera Negra exigiu bastante do uso de CGI. E nem sempre a coisa dá certo, principalmente, em cenas em que o herói é mais exigido, em suas acrobacias e golpes espetaculares. Também houve problemas nas coreografias das lutas como um todo. A comparação com Soldado Invernal é inevitável. E Pantera Negra sai perdendo. Mesmo que algumas cenas de ação sejam alguns dos melhores momentos do filme. Além disso, conhecemos pouco do cotidiano, das ruas e do povo de Wakanda.
Como todo roteiro de uma grande produção, há furos e equívocos. O maior deles foi não dar ao vilão principal, Killmonger, ainda mais espaço. Ele aparece e some na primeira metade do filme. Para voltar com tudo e desestabilizar as certezas do herói. Mas o roteiro também tem suas qualidades. E que qualidades! Desenvolve muito bem os personagens, tem um humor inteligente e pontual, e reviravoltas corajosas para um filme pipoca. Alguns personagens ficam sem chão, assim como o espectador.
E que elenco! Que personagens! A combinação perfeita entre talento e avatar. Os personagens masculinos são homens negros que fogem dos estereótipos em que a sociedade geralmente os enquadra. São líderes, pessoas inteligentes, cultas, preparadas. E também complexas, tridimensionais, contraditórias. Mas meu destaque mesmo vai para a representação feminina. A mulher negra sempre foi colocada de escanteio em filmes de ação e aventura, porque a mulher negra sofre um duplo preconceito. Em Pantera Negra, vemos que elas podem ser até mais interessantes como personagens de ação do que os homens. E não é só isso. Há uma variedade de personalidades que mostra o potencial dessas mulheres. Há a badass general Okoye com sua lança de vibranium, a divertida cientista Shuri, a determinada espiã Nakia e muitas outras.
Killmonger se firma como um dos melhores vilões do MCU, talvez o melhor, por suas motivações serem tão convincentes. Michael B. Jordan o interpreta com uma presença física ameaçadora e falas desconcertantes. Ele é um vilão trágico.
Não podemos esquecer o impagável Claw de Andy Serkis. É um delicioso vilão cartunesco.
A trilha sonora é empolgante, misturando rap, hip-hop, rock, ritmos africanos, música sinfônica e sintetizadores. O design de produção mostra cenários, figurinos e objetos incomuns para um filme de super-herói. O afrofuturismo se torna mainstream.
O teor político é bem trabalhado. A denúncia contra o racismo histórico é passada muito mais pela interação entre os personagens, dentro da narrativa, e não com tanta exposição ou monólogos. A Marvel está de parabéns. Mesmo dentro da fórmula do estúdio, deram liberdade criativa e de expressão para Ryan Coogler. Agora a Marvel está colhendo os frutos, pela repercussão do filme e pela perspectiva de uma bilheteria avassaladora.
Para uns, Pantera Negra é diversão garantida. Para outros, um sonho que se torna realidade.
Fruitvale Station - A Última Parada
3.9 332 Assista AgoraÉ um filme simples. Mas o diretor teve muita habilidade em conectar os personagens com o espectador. Ele constrói aos poucos o drama do protagonista. Por isso, a gente fica tão abalado na meia hora final. Mesmo sabendo o que vai acontecer.
O Matador
3.3 222 Assista AgoraO Matador, o primeiro filme nacional produzido pela Netflix, não faz feio. Eu adoro westerns. Nos anos 60, os italianos revolucionaram o gênero, tornando-o mais sujo, irônico e cruel, ou seja, mais próximo de qualquer recriação histórica (lembrando que Kurowasa fez Os Setes Samurais nos anos 50). Há décadas, produções de todo o mundo fazem homenagens e experimentações com esse gênero tão americano. No cinema nacional, há filmes que podem ser considerados faroestes, inclusive reconhecidos internacionalmente, como os de Glauber, O Cangaceiro, de Lima Barreto, O Tronco, de João Batista de Andrade, Abril Despedaçado, de Walter Salles, e outros. Em termos de ambição estética, O Matador é inferior a todos estes. De maneira esforçada, com momentos inspirados no roteiro e fotografia, o filme conta a história do matador Cabeleira, que nada tem a ver com o romance de Franklin Távora. O maior mérito de O Matador é evitar maniqueísmos. Não há atores globais de destaque nem qualquer ranço romântico que possa vir da emissora. O protagonista está longe de ser um herói. É um filme que começa bem, fica disperso e arrastado no segundo ato, mas que termina de maneira digna.
John Wick: Um Novo Dia Para Matar
3.9 1,1K Assista AgoraNovamente, o roteiro não faz o menor sentido. O que importa mesmo é a pancadaria. É ver Keannu Reeves em ação. John Wick 2 é uma produção mais caprichada e ambiciosa. Porém, o filme anterior era mais coeso. Um erro recorrente cometido por muitas franquias em Hollywood é começar de maneira simples e eficiente e depois crescer por crescer, aumentando a pirotecnia por um cacoete e não por ter algo realmente de novo a mostrar. John Wick 2 é divertido. Tem ótimas cenas de ação. O que John Wick faz com um lápis deixaria o Coringa de O Cavaleiro das Trevas besta. Espero que essa franquia não perca o foco. Não quero ver John Wick salvando o mundo no próximo filme.
BLAME!
3.3 66 Assista AgoraJá começo dizendo que o mangá é incrível, e que essa versão para anime explorou pouco o clima sombrio e a trama complexa do material de origem. Deviam ter feito uma série e não um filme. Muita coisa ficou de fora. Na verdade, os criadores disseram que o anime não é exatamente uma adaptação, e sim uma história totalmente nova dentro do universo de Blame! Não me parece. O maior problema foi o exagero no uso de computação gráfica. Existem bons momentos de ação, mas, no geral, o filme ficou devendo.
Star Wars, Episódio VIII: Os Últimos Jedi
4.1 1,6K Assista Agora(Sem spoilers) Os Últimos Jedi é um filme que está longe de ser perfeito, mas foi uma das mais vibrantes experiências cinematográficas que tive recentemente, ao lado de Mad Max - Estrada da Fúria e Mulher Maravilha. Estrada da Fúria é um filme praticamente perfeito. E Mulher Maravilha é superior a Os Últimos Jedi. Mas, quando o episódio VIII acerta pra valer, ele vai na sua jugular sem pena. Escrito e dirigido por Rian Johnson, do ótimo Looper, Os Últimos Jedi trata, acima de tudo, do conflito de gerações entre a trilogia original e o novo cânone. Mostra que nem sempre os jovens estão com a razão, que há uma sabedoria mais velha que precisa ser ouvida. Mas, ao mesmo tempo, mostra como gerações anteriores têm dificuldade em mudar de ideia, de pensamento. Visualmente, é o filme mais bonito já realizado na franquia. O uso da cor vermelha tem uma carga dramática só vista no trabalho de autores arrojados, como Tarantino, Kubrick e Takeshi Kitano. Os personagens são, em sua maioria, heróis carismáticos ou vilões convincentes. É interessante ver como alguns personagens importantes evoluíram. Mas outros não saíram do lugar. Um aspecto notável no filme é quantidade de personagens femininas relevantes! Uma coisa que ficou bem clara é que, pela primeira vez, estamos vendo um filme de Star Wars do jeito que a Disney quer. Ou seja, entretenimento para crianças e adultos. Só que isso é feito da maneira mais orgânica possível. A inclusão dos porgs, por exemplo, não é feita apenas para vender brinquedos e produtos licenciados. Como fã de anime, de Miyazaki, posso dizer que os bichinhos funcionam como excelente alívio cômico, ainda mais na relação deles com Chewie. E surpresa: Os Últimos Jedi é muito engraçado. O grande problema do filme é o ritmo, consequência da estrutura do roteiro. Há histórias paralelas demais. Uma delas bem irrelevante, envolvendo Finn e Rose, que só atrasa o desenrolar dos acontecimentos que realmente importam. Os Últimos Jedi começa de maneira empolgante, cai de qualidade lá pelo meio e depois volta a engrenar, mostrando o seu melhor. O terceiro ato é de tirar o fôlego, do ponto de vista visual e emocional. O episódio VIII responde alguns mistérios de O Despertar da Força, mas outros ficam em aberto; deixando uma sensação incômoda de que certas coisas fundamentais não serão explicadas nos filmes, talvez no universo expandido. Pra compensar, há momentos WTF, de explodir a cabeça! E precisamos falar de Luke e Leia. Mark Hammil e Carrie Fischer destroem. Ambos com um desenvolvimento de personagem nunca antes visto na franquia. Esse Luke é ranzinza, amargurado, mas também zoeiro, com um humor afiado, que só pessoas vividas possuem, longe daquele menino fazendeiro de A Nova Esperança. E a Leia general tenta manter os rebeldes unidos com sabedoria, generosidade e mão firme. Já tem fã de Star Wars torcendo o nariz pra esse episódio VIII, chamando de fanfic. A questão é que a franquia não vai andar para trás. Acertando e errando, A Disney vai manter os conceitos icônicos de Star Wars, só que ela usará essa mitologia em novos contextos. Não adianta chorar. E que comece a caça aos furos do roteiro!
Seu Nome
4.5 1,4K Assista AgoraFinalmente pude ver o anime Your Name, mais de um ano depois de seu lançamento no Japão. Aqui no Brasil, passou em poucas salas em 2017 e agora chegou à Netflix. Sou fanzaço do diretor e roteirista Makoto Shinkai. Em Your Name, ele está no auge do seu talento. Não por acaso, o filme foi um gigantesco sucesso de bilheteria no Japão e pode ganhar uma versão live-action americana em breve. A obra de Shinkai fascina pela junção poderosa entre visual e emoção. Fãs de anime e apreciadores da cultura japonesa vão perceber as várias camadas do filme, indo além do melodrama juvenil. É uma constante no trabalho de Shinkai a discussão sobre pertencimento, o lugar de cada um no mundo, o vazio existencial, solidão, encontros e desencontros, tradição e o futuro. Em Your Name, os contrastes e conexões entre o Japão do passado e o atual são magistralmente mostrados, tornando-se um recurso fundamental na trama. Os elementos de fantasia e de crônica da vida moderna trazem algo bem original na maneira de contar uma história de amor entre adolescentes. Há o humor pateta e momentos mais tristes e tensos, embalados por uma trilha sonora filhadaputamente tocante. O filme tem uma dinâmica incrível, com viradas de roteiro imprevisíveis. O elenco de personagens é muito carismático. E a mistura de animação tradicional e computação gráfica é a mais deslumbrante já vista numa obra de Shinkai. A melancolia de Your Name é romântica, mas nunca é desonesta. É uma animação belíssima, triste, sem respostas fáceis. Mas que, no final, deixa na gente uma sensação boa de aprendizado.
Liga da Justiça
3.3 2,5K Assista AgoraVocê pode resumir o filme da Liga da Justiça numa palavra: decepção. Tem uns 30 minutos muitos bons (a abertura com o Batman, a sequência em Temiscira, o flashback da luta de um monte de gente bacana contra o Lobo da Estepe, o despertar do Superman e alguns pouquíssimos momentos cômicos que funcionam). Outros 30 minutos enchem linguiça com dignidade, com momentos mais calmos ou de transição. Mas o resto, ou seja, 61 minutos, pode jogar no lixo. São sequências de ação com CGI pesado e com uma dinâmica confusa. O humor do Flash erra muito mais do que acerta. A boca digital do Superman tá bizarra mesmo. Há uma obsessão em filmar a bunda da Mulher Maravilha. O Batman é um tiozão. O Aquaman é o mesmo Jason Momoa de sempre (não acho que ele tem carisma e talento pra sustentar um filme solo). Para minha surpresa, gostei do Superman, apesar do bigodegate. Há uma fagulha do ícone ético que conhecemos, e não aquele jesus cristo atormentado de BvS. E o Ciborgue tem uma sabedoria tranquila, fundamental para a trama. Só que os problemas continuam: 80% dos diálogos são ruins (expositivos demais, piegas, sem-graça). O Lobo da Estepe é um vilão fraquíssimo com um CGI muito fake pra se levar a sério e com motivações muito bidimensionais (ele só quer destruir, destruir, destruir). A mitologia cósmica da DC foi totalmente cagada. Outro crime foi pegar atores excelentes, até ganhadores do Oscar, e colocar praticamente como figurantes de luxo, aparecendo em tão poucas cenas. A primeira metade tem momentos de tédio brabo, tipo "fazer listinha de compras mental". E a segunda metade é uma correria só, tipo "temos que acabar esse negócio antes que o povo comece a sair da sessão". As cenas pós-créditos não acrescentam nada, ainda mais agora que o futuro da DC no cinema está zoado, a Warner sem saber direito o que vai fazer daqui pra frente. Você procura os 300 milhões de dólares gastos no filme e vê que tem coisa faltando. A Liga da Justiça merecia algo épico, e não uma mistura de Transformers com Power Rangers.
Thor: Ragnarok
3.7 1,9K Assista AgoraThor: Ragnarok é uma delícia de filme. Depois de ver o mockumentary sobre vampiros na Nova Zelândia What We Do in The Shadows e a comédia dramática Hunt for the Wilderpeople, virei fanzaço do diretor, roteirista, ator e comediante Taika Waititi. Minha expectativa para o terceiro filme do Deus do Trovão estava alta. E fui correspondido mais do que me decepcionei. A Marvel está de parabéns por entregar o primeiro filme de autor do MCU. Edgar Wright teve tantos problemas na produção de Homem-Formiga que acabou saindo do projeto. E por que Wright, também um diretor com assinatura, fracassou onde Waititi trinfou? Para mim, isso tem a ver com o tipo de cinema dos dois. Os filmes de Wright são conhecidos por ter uma montagem menos convencional, com cortes rápidos e movimentos de câmara inusitados, inspirados nos filmes trash dos anos 70 e 80. Ou seja, são paródias de luxo. Provavelmente, a Marvel queria um filme engraçado, mas que não desse dor de cabeça para o espectador acompanhar. A questão com Wright era de forma. No caso de Waititi, a Marvel deu liberdade para ele fazer uma paródia, sim, mas mexendo apenas no conteúdo. A forma não é muito diferente da maioria dos filmes do estúdio. O triunfo de Thor: Ragnarok está no worldbuilding, nas atuações, nos diálogos cômicos e na trilha sonora. A produção é de primeira. O CGI é mais do que convincente. E o desenho de produção cheio de cores, esquisitices e sujeira me lembrou de tanta coisa dos anos 80: os formatinhos da Abril, Flash Gordon, He-man, Atari, John Carpenter, animações como Heavy Metal, além dos mestres Jack Kirby e Walt Simonson. As atuações são certeiras, as piadas físicas e verbais hilárias, a ação empolgante. Finalmente, Thor rouba a cena, sendo mais carismático do que outros personagens, como Loki. A dupla Thor/Hulk é a melhor relação já feita entre heróis no MCU. Tiram sarro um do outro, brigam feio, mas também um tenta entender o problema do outro e cuidar um do outro. A Hela de Cate Blachett está fantástica. Mas infelizmente ela é subaproveitada. Em Vingadores 2, o insuportável Ultron aparecia toda hora. Blachett tem pouco tempo de tela, ficando sem muito o que fazer, enquanto o melhor do filme acontece em outro lugar. Isso por causa da estrutura bizarra do roteiro. A subtrama no planeta dos gladiadores, Sakaar, é muito mais divertida e interessante do que o draminha da trama principal, que dá título ao filme, em Asgard. Mas as qualidades de Thor: Ragnarok superam seus defeitos, nessa que é a melhor comédia da Marvel.
A Babá
3.1 960 Assista AgoraQue filminho tosco!
Grave
3.4 1,1KRaw. Que filme tenso. Produção franco-belga, estreia da diretora e roteirista Julia Ducournau. Acompanhamos Justine, uma caloura de veterinária. Criada numa família de vegetarianos, ela experimenta carne crua num trote da faculdade. E isso transforma sua vida. É um filme de terror que evita clichês. É discreto, porém cheio de energia. Mostra uma juventude sem glamour, cheia de liberdades, mas também cheia de cobranças. O gore nunca é gratuito. Os elementos de horror perturbam porque o que vemos pode acontecer de fato. Não temos aqui zumbis ou entidades sobrenaturais. É a vida real levada ao extremo. É muito interessante ver um filme de terror escrito e dirigido por uma mulher, protagonizado por mulheres, mostrando pessoas complexas, difíceis de rotular. A trilha sonora de Jim Williams, ora delicada, ora perversa, entra sempre nos momentos certos para mexer com o espectador. Algumas reviravoltas não funcionam; em retrospectiva, não fazem muito sentido. E o desenvolvimento da protagonista é um pouco apressado. Raw é a história de formação de uma garota, misturando subversão feminina e sátira social.
Blade Runner 2049
4.0 1,7K Assista AgoraEu queria muito estar errado, mas infelizmente minhas previsões se confirmaram. A sequência de Blade Runner é um bom filme com um visual espetacular, mas inferior a outras produções recentes igualmente ambiciosas, como Mad Max – Estrada da Fúria e A Chegada, do próprio Denis Villeneuve.
Quando anunciaram que haveria uma continuação de Blade Runner, a reação de muitos foi de total descrédito. As lacunas do filme original não precisavam ser respondidas. Quer dizer, vamos ter em mente as muitas versões lançadas ao longo dos anos. A versão que foi para o cinema, em 1982, com a narração de Harrison Ford e o final feliz, mora no meu coração por ter sido a que mais revi, ainda em VHS, depois em DVD. A versão considerada por Ridley Scott como definitiva, The Final Cut, de 2007, também me agrada bastante por ser mais madura e subjetiva.
A melhor maneira de apreciar o filme de Villeneuve é ter visto as versões de 1982 e 2007, lido o romance que originou tudo, Androides Sonham com Ovelhas Elétricas?, de Philip K. Dick e ter visto os três curtas lançados antes da estreia do novo Blade Runner, que servem como prelúdios para contextualizar o que aconteceu em Los Angeles (e no mundo) entre 2019 e 2049.
O canadense Denis Villeneuve já se firmou como um dos diretores mais interessantes em atividade, um mestre. Alguém que tem um controle absurdo da mise-en-scène, que sabe deixar o espectador instigado, tenso e mesmerizado. Seus filmes são visualmente desafiadores e provocam a reflexão. Em Blade Runner 2049, um projeto cheio de expectativas e pressões, ele se saiu bem. Entregou uma produção de grande estúdio acima da média, corajosa em bancar uma narrativa mais lenta, em tratar de temas complexos sem muitas concessões.
Não me entendam mal. O filme é bonito e relevante. A fotografia do veterano Roger Deakins é quase indecente de tão esmerada, em tomadas fechadas e abertas, em cores quentes e frias. Os efeitos especiais e sonoros estão totalmente integrados a essa evolução do universo de Blade Runner, com um desenho de produção que soube repaginar o clima noir original para um mundo parte tecnologicamente mais avançado, parte mais apocalíptico. Ryan Gosling carrega o filme nas costas. Seu personagem tem um arco emocional de fundir a cabeça de qualquer um. E ele nos leva junto nessa jornada cheia de dor física e mental. O Deckard coroa de Harrison Ford está ótimo, numa performance muito superior ao Han Solo de O Despertar da Força. Robin Wright, como a chefe do personagem de Gosling na polícia, Ana de Armas, a namorada virtual dele, e Sylvia Hoeks, a braço direito do personagem de Jared Leto, também são presenças marcantes.
Mas o filme tem três problemas: o roteiro, a duração e a trilha sonora. Problemas graves que comprometem as ideias, a coesão e a estética de Blade Runner 2049.
O maior mérito do roteiro foi manter a coisa simples, não investir em grandes conspirações nem em preparar uma futura franquia. Algumas pontas ficam soltas para uma possível sequência, mas isso não compromete a trama. Hampton Fancher (um dos roteiristas do original) e Michael Green (roteirista do ótimo Logan, mas das bombas Lanterna Verde e Alien: Covenant) mantiveram o clima de filme policial, de investigação.
O roteiro aprofunda a questão dos replicantes. Temos aqui um cenário mais complexo e variado, em que temas como preconceito, identidade e escolha são mais urgentes do que no primeiro filme. Mas essa discussão para no meio do caminho pelos equívocos narrativos. Os personagens coadjuvantes são menos interessantes em comparação aos do primeiro filme. A entrada de K, o personagem de Gosling, na história, com a ótima participação de Dave Bautista, é muito conveniente. A subtrama envolvendo a doutora Stelline, a criadora de memórias, me incomodou bastante. Analisando em retrospectiva, não faz muito sentido. E o dilema de ser ou não ser humano foi melhor trabalhado recentemente no filme Ex-Machina e na série Westworld, por exemplo.
Para frustração dos fãs, o aspecto religioso do romance por meio do mercerismo, uma espécie de cristianismo midiático, não foi explorado. Mas talvez a semente tenha sido plantada para ser desenvolvida mais adiante.
Não tenho problema com filmes lentos e longos. Adoro Tarkosvky. Mas, em Blade Runner 2049, 163 minutos se mostraram excessivos. Em certos trechos, os diálogos estão menos inspirados ou o silêncio não causa tanto impacto visual e sonoro.
Depois que Villeneuve foi confirmado como diretor desse filme, fiquei curioso para ver como seu compositor de longa data, o islandês Jóhann Jóhannsson, trabalharia musicalmente o universo de Blade Runner, tendo a icônica trilha sonora de Vangelis para assombrá-lo. Fiquei imaginando o que Jóhannsson poderia criar depois da música assustadora de Sicario e do mistério e da estranheza de A Chegada. Mas, poucos meses antes da estreia, Jóhannsson abandonou o filme, numa história ainda não explicada direito. Então os produtores recorreram ao onipresente Hans Zimmer, às pressas. Ele e seu pupilo Benjamin Wallfisch (responsável pela trilha do novo IT) fizeram uma música que fica entre uma imitação de Vangelis e a trilha do Batman de Nolan, numa pegada eletrônica, investindo mais em sintetizadores. É uma trilha eficiente em seus melhores momentos e irritante em seus piores. Não é memorável. Esse filme precisava de uma trilha sonora memorável.
O Blade Runner de 1982 foi um raro momento do cinema, no qual misturaram sorte e competência para reunir um punhado de pessoas brilhantes na produção de uma obra-prima. Depois o próprio Ridley Scott não conseguiu fazer nada tão bom ou próximo disso.
Blade Runner 2049 mostrou sua razão de ser. O mundo é um lugar melhor com a existência desse filme. E abriu as portas de vez para uma franquia que agora ninguém mais vai torcer o nariz.
Kingsman: O Círculo Dourado
3.5 885 Assista AgoraKingsman, O Círculo Dourado, é uma decepção. Gostei muito do primeiro filme por ter trazido de volta a diversão para a espionagem escapista, ao melhor estilo camp do Bond de Roger Moore, mas numa versão 2.0, enquanto o Bond de Daniel Craig vivia deprimido. Mas esse segundo filme tenta ser maior e melhor e geralmente fracassa. Na verdade, assistimos a uma colcha de retalhos. O roteiro é uma bagunça (há informações de que foi reescrito durante as filmagens). A trama não faz o menor sentido. Há planos ou estratégias rocambolescos que cansam o espectador, ou seja, uma barriga totalmente desnecessária. Poucos diálogos são realmente engraçados. O elenco incrível é mal utilizado. É uma pena ver Julianne Moore fazer uma vilã sem tanto brilho. Ela não está se divertindo no papel. Jeff Brigdes faz uma participação bidimensional de luxo, sem nenhuma personalidade. Os outros atores e atrizes se esforçam, cativam a gente em seus melhores momentos e nos irritam em seus piores, em maior número. A misoginia está pior do que no filme anterior. Agora O Círculo Dourado não é uma bomba. A fotografia é bonita. O desenho de produção é caprichado. A montagem, quando funciona, sabe ser paciente e também dinâmica e criativa. Os efeitos especiais e sonoros impressionam (a sequência de ação final é muito divertida), apesar de exagerados nas sequências de ação que não funcionam, ficando com cara de videogame. A unanimidade é o cameo de Elton John, cantando e chutando bundas. Nota 5.