Quando vi o primeiro filme, o que mais me agradou foi a expansão do universo de Rowling para além dos muros se Hogwarts. Depois, a franquia se revelou uma expansão para além dos continentes. Após ambientações nos Estados Unidos e na França, este, o melhor e mais cosmopolita dos filmes até então, se passa na Alemanha, no Butão (que rende alguns dos cenários mais fascinantes do filme) e conta com um elenco de bruxos multicultural, ao qual se insere inclusive uma brasileira.
E como está linda Maria Fernanda Cândido! Apesar de ter apenas uma fala, sua importância é indiscutível, e sua figura é quase onipresente: durante toda a narrativa ela está posandoo em público ou cartazes com seu rosto são expostos. Nas cenas finais, com sua imagem estampada nas transmissões, sua figura já é um ícone e uma das imagens mais inesquecíveis do filme. Isso é de um valor imenso.
Por fim, a história parece ter encontrado seu tom. Ela avança demais, os arcos se fecham (estendendo-se mais um pouco, poderia ter sido o desfecho de uma trilogia) e a quantidade menor de narrativas paralelas possibilita que os personagens, já mais maduros, consigam se relacionar melhor (a transformação de Queenie e um Jacob mais reativo são alguns dos pontos que mais aprecio). Além disso, Mads Mikelsen é o vilão que faltava, trazendo toda a classe e ameaça que Depp, perdido, não conseguia.
Não posso deixar de comentar minha sequências favoritas do filme: a cena do resgate a Teseu na prisão (ridiculamente divertida), o jantar (cruzamento tenso de conflitos com direito a uma fuga visualmente linda de Jacob e Lally Hicks) e as perseguições labirínticas pelas ruas encantadoras do Butão.
Mais interessante e completo que o filme de 1979 em todos os aspectos. Passada a responsabilidade de apresentar "o primeiro filme dos Muppets", que, explorando sua zona de conforto, apostou em uma espécie de prequel, aqui a proposta é totalmente outra: eles estão imersos em um filme de investigação.
O gênero não poderia ter sido melhor escolhido. Tal como em A Pantera Cor-de-Rosa, de Blake Edwards (meu favorito do estilo), vemos se desenrolar uma trama policial que articula o humor a um leve clima de mistério e desconfiança.
Os círculos sociais da aristocracia inglesa e do mundo da moda, nos quais a trama se sustenta, além de charmosos por si só (o que são a presença magnética de Diana Higgs ou a cena na casa de John Cleese?), são cenários perfeitos para que os personagens se insiram causando estranheza e desequilíbrio. É como o humor do show business americano, que os Muppets representam, visitando a singularidade do humor inglês.
Os números musicais são mais ousados que os do primeiro filme, com coreografias bem trabalhadas e efeitos visuais questionáveis (tudo que envolve o protagonismo da Miss Piggy é, felizmente, muito brega). E a metalinguagem segue funcionando a todo vapor, tendo início já nos primeiros minutos, quando os personagens comentam os créditos iniciais e apresentam as regras do enredo.
Como muitos já comentaram, este filme não diz muito coisa, não tem aquele ar clássico de aventura do primeiro filme e, por isso, aposta na ramificação das tramas, trazendo muitos personagens e conflitos paralelos. Isso não me incomoda, muito pelo contrário: fiquei muito mais interessado nas novas relações entre os personagens do que na trama besta de procurar Creedence por Paris.
Repito aqui o que digo sobre o primeiro filme: este também nos pega muito mais pela expansão do fascinante mundo de J.K. Rowling do que pelo desenvolvimento da trama. Os cenários seguem lindos, os figurinos são finíssimos e as cenas especificamente no Ministério da Magia - tal qual no primeiro filme e também como eu já havia notado em As Relíquias da Morte - Parte I -, são deliciosas, unindo magia, formalidade e burocracia em sequências de fuga sempre muito bem executadas. Nunca vou esquecer de Harry e Hermione em trajes sociais correndo pelos corredores do ministério e espalhando papéis por onde passavam; aqui, somos agraciados com Newt, Tina e Leta em uma espécie de dança acidental com armários e arquivos móveis, seguidos de um embate com cães de guarda do ministério. Muita classe!
E por falar em sequências lindas, o primeiro momento em que Hogwarts surge na tela, ao som da clássica trilha sonora de Harry Potter, seguido da imagens dos alunos amontoados à janela em seus já conhecidos uniformes, são um presente.
O clímax deste também é superior ao do primeiro filme, bem mais cauteloso e silencioso do que aquela destruição desgovernada na estação de metrô. O que continua me incomodando é a presença de Johnny Depp como o grande vilão. Ele não consegue trazer ao personagem um ar de ameaça e imponência, tampouco consegue atacar o espectador por meio da classe e do carisma, como alguns vilões, mais descontraídos, o fazem. Enfim, um personagem desorientado.
Não escondo de ninguém que amo os Muppets. E passei a amá-los quando vi o filme de 2011. Eles entregam tanto carisma e entretenimento... cantam, performam, contam piadas, como grandes estrelas do show business.
Esta primeira incursão dos personagens no cinema é perfeita para introduzir os espectadores a esse universo. Não só por contar como eles se conheceram, permitindo que cada um deles se acrescente de forma individual e única à narrativa, mas também por ter início com uma das canções-símbolo dos Muppets: Kermit à beira do lago tocando banjo e cantando The Rainbow Connection, com seu reflexo refletido na água, é uma cena lindíssima de abertura.
A trilha sonora, aliás, é sempre um dos pontos altos dos Muppets. As canções aqui são bonitas e bem interpretadas. E não só de musical vive a obra: há influências de road movies e até de faroestes, em uma brincadeira gostosa com gêneros e referências.
O enredo em si não é tão fascinante. Resume-se no movimento narrativo de uma viagem pelo país até Hollywood, durante a qual mais personagens vão se juntando, enquanto tentam fugir do vilão. Mas ao longo dessa viagem, há momentos inspirados de humor, exagero (meu momento favorito talvez seja o do Animal em sua forma gigante, ridículo e grotesco) e metalinguagem - as piadas envolvendo a leitura do roteiro do filme são demais.
Esse é mais um dos filmes recentes da Pixar em que o protagonista se vê submetido ao processo de transformação a alguma outra coisa. As caveiras de Viva - A vida é uma festa, as almas abstratas de Soul, a passagem de peixe para humano em Luca e, aqui, de humano para panda, revelam uma tendência já marcada nas obras recentes do estúdio, ainda que servindo a propósitos diferentes. Parece que, independente do assunto que se queira tratar e da mensagem a ser alcançada, uma certa dinâmica para o desenrolar do roteiro já está debaixo das mangas.
Outra repetição encontrada aqui é a exploração da essência e do autodescobrimento do protagonista por meio de sua fuga à rigidez familiar. Em Coco e em Luca, o personagem passa grande parte escapando de sua família, em um enredo de fuga e perseguição, enquanto descobre seu próprio potencial. Em Encanto, da Disney, a personagem não é perseguida fisicamente, mas banida da família pela avó, em uma atitude mais radical e opressiva do que nos casos anteriores - tudo em nome da segurança da família. Aqui, um novo passo é dado: mãe e filha chegam a duelar corporalmente, em uma rivalidade física de proporções grandes, que até então eu não tinha visto em animações norte-americanas. A cena é cafonérrima, mas tem seu valor.
Feitos esses comentários sobre os lugares-comuns da esteira de ideias do universo Disney-Pixar, cabe comentar que este filme é sim divertido, ágil e visualmente bonito. O exagero nas reações lembra muito o estilo mangá, que combina com o toque japonês presente na história. Aliás, achei muito bem construída essa questão de um templo e de uma tradição familiar preservados no centro de Toronto.
Outra coisa que acho interessante é o modo como diferentes gerações tratam de questões de ordem familiar. Enquanto as mais velhas reservam isso ao foro íntimo, com discrição e até repressão, as gerações mais novas ousam, tratando alguns problemas e dilemas como assuntos públicos, chegando a torná-los entretenimento e recursos de autopromoção, algo comum nas redes sociais.
Enfim, há muito dos ingredientes típicos das animações recentes, mas tem seu espaço de originalidade e autoria.
Não sei dizer algo que já não tenha sido dito por todo mundo. O que posso reafirmar é que é, sim, sim um filme doido, criativo, livre, plástico, excessivo, que assume várias formas, como os multiversos que visitamos.
Assim, a ideia principal da narrativa, de universos diferentes, mas semelhantes em suas essências, se entrelaçando e se influenciando, se imprime na própria forma do filme, em como ele conta tudo isso. É como se estivéssemos vendo vários filmes ao mesmo tempo, que repete de diferentes formas os mesmos conflitos e resoluções.
Gosto muito do fato de Evelyn ser uma mulher completamente imperfeita. Cheia de questões mal resolvidas, arrependimentos e ressentimentos. Ou, como é mencionado no filme, a pior versão de si mesma. É essa imperfeição que permite a viagem ao fundo de si proporcionada pelo filme, durante a qual ela busca forças nas figuras que ela nunca conseguiu ser - mas que, de alguma forma, é.
Também acho incrível como a montagem e o roteiro privilegiam o entrelaçamento dos universos diante de nossos olhos. Chega um momento em que o movimento narrativo de um universo ecoa simultaneamente em acontecimentos análogos em todos os universos paralelos. Esses pedaços interuniversais de narrativa se completam de tal forma, que uma mesma ação é apresentada a nós em sua completude devido a sua recorrência dentro do funcionamento das regras dos outros mundos. Como Evelyn, nos sentimos também em todo lugar, vendo tudo ocorrer ao mesmo tempo.
E que performance entrega Michelle Yeoh! Ela, como Jamie Lee Curtis e Ke Huy Quan, se fragmenta em diversas variantes de si mesma, como se pincelasse um mosaico de interpretações. Isso é belo!
Ainda bem que não me deixei desencorajar pelo péssimo título nacional. Mais genérico, impossível. E isso não condiz com o que encontrei quando assisti esse filme.
A obra já me ganhou na primeira cena. O prólogo em tom de conto de fadas e a lindíssima Brittany Murphy saindo de seu luxuoso prédio e pegando um táxi aos assovios é uma graça.
E essa graça perdura durante todo o filme. A atriz, além de linda, é extremamente carismática, elegante, magnética. E a personagem, uma perua alienada tendo que enfrentar a vida adulta, traz consigo um universo próprio, lúdico, infantil e misterioso. Murphy se encaixa bem dentro dessa mitologia.
Dakota Fanning mantém o nível trazido pela sua parceira de cena. Eu, particularmente, me canso rápido de crianças super inteligentes. Mas a personagem de Dakota não é somente inteligente. Ela é grossa, arrogante, dramática e amargurada. Suas respostas são rápidas, seus comentários são ácidos. O encontro entre as duas é bastante agradável, não só pelo choque de mentalidades, mas porque ambas, dentro de seus espectros, são igualmente exageradas e dramáticas. Isso dá origem a momentos bem divertidos.
Aliás, o filme não economiza em exageros. Muitos podem se irritar com os excessos e a infantilidade da protagonista. Esse exagero, porém, pende mais para um certo cinismo da narrativa diante da alienação social de Molly. Não me parece um humor desgovernado.
Por fim, duas cenas que com certeza levarei comigo: a sequência silenciosa no parque, que começa com as duas mulheres rodando em uma xícara gigante e termina com tapas e abraços emocionados; e a cena final - Dakota Fanning desconstrói a rigidez de sua personagem com classe, sem nunca tirar o sarcasmo do rosto, enquanto dança lindamente. É uma performance impressionante.
Fico me perguntando se, pelo menos na época do lançamento, esse filme foi engraçado. Quase nada aqui funcionou para mim. O roteiro é bastante besta, os acontecimentos são ilógicos, nenhum personagem é interessante e a dinâmica de Ginger Rogers hipnotizada fazendo bobagens em público é péssima (e, não contente, o roteiro recorre duas vezes a esse recurso).
De positivo, há apenas a música: a trilha sonora é boa, e as poucas coreografias originam cenas muito bonitas, como a sequência do sonho de Rogers.
A mudança no título original não deixa de ter sido uma boa escolha: apesar de parte da franquia Kingsman, esse filme funciona quase como um spin-off, fugindo do espectro narrativo, temporal e dos personagens originais. Aqui, o enredo se concentra em torno de um "homem do rei" literalmente: um ótimo Ralph Fiennes em constante diálogo com a realeza inglesa nos episódios que antecedem a fundação da agência. E isso traz boas e más consequências.
Dentre as boas consequências, existe a deliciosa atmosfera histórica proporcionada pela ambientação no início do século passado: os cenários são lindíssimos e emolduram bem nossas visitas à Rússia, à Áustria, a cenários montanhosos sensacionais e a acontecimentos e figuras históricos.
Entretanto, esse filme não consegue manter o mesmo nível de humor, anarquia e cenas bonitas de ação que caracterizam os filmes anteriores. Aqui o andamento é mais lento e sério, se aproximando mais de qualquer filme generalizado de espionagem, e as cenas de ação não empolgam - com exceção da ótima sequência de luta com Rasputin. Tudo que envolve esse personagem, aliás, é deliciosamente grotesco, dos diálogos ao exagero em sua caracterização.
A escalação de Alicia Silverstone, famosa por uma obra que se tornou símbolo dos filmes de colegial nos anos 90, para representar aqui novamente o ideal de perfeição almejado pelas colegiais, mas que mais tarde se revela decadente e pouco próspera, mostra bem o propósito interessante do filme: revisitar o universo do ensino médio representado no cinema americano dos anos 1990 e 2000 e desconstrui-lo sob a ótica atual.
Em alguns momentos isso fica bem claro e oferece momentos bons. O filme retrata com bastante exagero e sarcasmo a mudança no paradigma de popularidade nas últimas décadas: no momento atual, o esforço em torno de um engajamento no mundo virtual e a construção de uma figura popular consciente, que ganha fama fingindo mobilizar a massa em direção a ideais de autoaceitação e igualdade, torna ainda mais ridícula a superficialidade barata e escrachada à qual as personagens de filmes análogos, nas décadas anteriores, se resumiam.
Mas fica só nisso mesmo. A graça novamente se restringe às caras e bocas de Rebel Wilson, enquanto o resto consolida um todo bagunçado, mal escrito e sem-graça. Além disso, ver duas adultas brigando pela popularidade em um baile de escola não foi tão engraçado quanto parecia ser. Aliás, parecia?
É difícil falar de Güeros. Não é um filme comum. Às vezes parece que vai se restringir ao argumento social, mas de repente insere elementos que fogem a isso. Depois parece que vai desaguar em um coming of age, o que de fato nunca acontece - e se acontece, o faz de forma bem singular.
Não é um filme triste nem feliz. É realista. Os personagens, tais como em uma crônica, atravessam a cidade e, enquanto fazem isso, cortam transversalmente camadas da sociedade mexicana. Não se aprofundam em nenhuma delas, mas parecem observá-las de forma tão curiosa como nós.
Por fim, vale mais como um exercício de observação de parcelas daquela sociedade sob uma ótica artística (muito artística, aliás, pois os enquadramentos e os cenários são lindíssimos), enquanto conta sobre dois irmãos que partem em busca de algo íntimo a eles, desconhecido para o resto daquela sociedade, como se estivessem em busca de uma parte de si mesmos e do que os une.
Admito que tive um pouco de dificuldade para acompanhar todo o raciocínio do filme. Não por ser extremamente complexo, mas por trazer um conjunto denso de informações, nomes e referências que às vezes nos atropelam, enquanto estamos muito ocupados sendo sufocados por sua atmosfera pesada ou refazendo as conexões entre os inúmeros personagens do passado e do presente.
Ainda assim, a história é bem contada. O ritmo mantém uma regularidade, e o argumento em si é bem intrigante. Imagino que transpor uma obra de tais proporções para o cinema não deve ter sido fácil. Exemplo disso é que senti falta de um aprofundamento maior na singularidade de cada personagem componente da família Vanger, e simplesmente porque não há tempo, mesmo sendo um filme bem longo: há MUITO para se contar e mostrar.
A personagem de Rooney Mara, por exemplo, parece tecer uma subtrama própria, tão chocante quanto o mistério principal, até ocorrer sua anexação à investigação central do filme. E os minutos finais do filme, após a resolução do mistério, se desdobram tão velozmente que não sei até agora se entendi o que houve. O argumento parece nunca ter fim. E mesmo assim, nunca fica chato nem cai em enrolações.
Além disso, a atmosfera do filme é muito bem trabalhada. O cenário invernal e escuro da ilha, bem como os ambientes frios e suspeitos das casas, combinam bem com os personagens dúbios e emolduram para os personagens um local de trabalho nada acalentador.
Menos interessante que o primeiro e com suas propriedades mais dosadas: as cenas de ação são menos anárquicas, a vilã merecidamente com menos destaque (Juliane Moore herdando um papel meio sem-graça) e soluções narrarivas mais óbvias, menos paródias de si mesmas.
Ainda assim, algumas escolhas tornam esse um filme muito divertido e ainda inventivo: a estética anos 50 da vilã e de seu universo, as participações impagáveis de Elton John e a inserção de novos personagens e uma nova agência de espionagem, que fundam na narrativa um universo à parte.
Também gosto da crítica nada sutil, exagerada e ainda assim necessária à guerra às drogas, aqui o impulso do conflito principal e o principal pilar do "plano esdrúxulo" da vilã deste volume.
Gosto muito da cena em que Colin Firth e Samuel L. Jackson rivalizam discretamente por meio de um diálogo que resume a própria cena: um espião frente a um vilão megalomaníaco com um plano esdrúxulo.
O filme está consciente da megalomania desmedida do personagem de Jackson, e não esconde que seu plano em escala mundial é pra lá de esdrúxulo (as cenas finais, mostrando o plano já em ação, são divertidíssimas). E tudo isso combina bem com os excessos propostos por esse filme, e que eu particularmente adoro.
Não é uma obra composta apenas por subversão do gênero e por metalinguagem. Há uma ação e sentimentos sérios representados aqui. Há um personagem passando por uma transformação sincera e bem trabalhada ao longo da narrativa, e vários coadjuvantes muito bem caracterizados (a comparsa inseparável de Valentine é minha favorita, e o visual de Firth aqui virou um símbolo que o precede).
Mas também há deliciosas sequências em que o roteiro chuta o pau da barraca e traz cenas de ação deslumbrantes, aceleradas, recheadas por mortes tosquíssimas e soluções criativas para as reviravoltas da trama.
Tenho a impressão de que Wes Anderson consegue extrair uma narrativa de qualquer cenário: de uma ilha, de um hotel, de uma revista... Aqui, o isolamento do oceano e a arquitetura comprida dos navios encontram força no estilo do diretor, que usa sua câmera com inteligência para criar poesia visual à beira-mar e passear, em deliciosos planos-sequência, pelos diversos recintos que compõem a embarcação.
O formato de falso-documentário sempre me parece uma boa ideia no início, pois geralmente nos colocam frente a um humor menos óbvio e mais metalinguístico, mas sempre acabam me cansando. Aqui não foi diferente. Em algum momento, o enredo das filmagens começou a me cansar.
Ainda assim, o roteiro está recheado de boas ideias: um personagem que vai lentamente percebendo que está fazendo tudo errado (tal como em Os Excêntricos Tenenbaums), piratas sequestradores e uma inimizade com outro navio são alguns de meus ingredientes favoritos nessa trama.
E que lindo ver o Seu Jorge e Bowie tocando juntos a trilha sonora!
Uma história simples, mas contada com muita graça e leveza. Não há aquele drama pesado, tampouco cenas melodramáticas e novelescas que caracterizam muitos filmes de época, principalmente quando estes são protagonizados por mulheres. Aqui, pelo contrário, sinto uma certa economia de emoções, e é justamente essa dosagem equilibrada entre razão e sentimento que me faz gostar ainda mais do filme.
Muito é representado aqui de forma bastante razoável. Discute-se explicitamente assuntos como a função da educação e a possibilidade da mulher (naquela época) perante esse caminho, mas sem passar do ponto. Afinal, alguns filmes discutem tais temas tão didaticamente, que às vezes dão a sensação de estarmos vendo uma palestra, o que não ocorre aqui.
Paralelamente a isso, o sentimento que se destaca ao longo da narrativa, dando o tom poético e agradável ao filme, é a excitação da protagonista diante do mundo que vem lhe sendo revelado. Carey Mulligan dá vida a uma personagem graciosa, madura, e ao mesmo deslumbrada e excitada com a vida e as coisas. Sentimos junto essa excitação.
Além disso, há muita classe envolvendo todos os aspectos dessa obra. Os figurinos, os cenários, as atuações, os diálogos e as várias referências artísticas constituem um todo muito charmoso, delicioso de se acompanhar e com um ar inteligente. Me senti até mais intelectual assistindo.
Não sei como a qualidade estética dessa animação foi recebida na época, mas eu achei bem ruim. Entendo que a ideia era capturar fielmente o movimento dos humanos (e de fato o estilo dos personagens foge bastante da recriação cartunesca do mundo que caracterizava animações da Pixar ou da DreamWorks já nesse período), mas isso também acaba levado a uma maior inenxpressividade dos personagens e a uma animação, de modo geral, visualmente feia.
Também me causa uma dupla impressão o rumo tomado pela narrativa: acho que a história poderia ter sido bem aproveitada se a monstruosidade da casa fosse mais sutil, fruto da imaginação das crianças (que, aliás, são bem engraçadas interagindo entre si). Por outro lado, me diverte o absurdo de uma casa realmente ganhando vida e engolindo de fato as pessoas. É preciso relevar e aceitar que, nesse universo, isso é possível.
O que mesmo assim foge muito do tom é o clímax trash e exagerado que antecede os minutos finais. O humor rápido e politicamente incorreto, que vinha se construindo junto ao suspense até então, é deixado totalmente de lado para ceder espaço a cenas mal projetadas de perseguição e gritaria. Faltou uma mão mais firme para manter as rédeas da narrativa.
Para o bem ou para o mal, acho que é impossível ficar indiferente a este filme. Isso porque o roteiro é, de fato, muito estranho. O que, no começo, me passou a sensação de estar diante de um suspense estilo A mão que balança o berço se converteu rapidamente em um terror de aspecto místico, quase mágico, de motivações até meio mitológicas. A sequência de estranhezas que decorrem daí são o sumo do trash: esquisitas, duvidosas e tecnicamente embebidas na feiura estética dos anos 90.
Me chamou a atenção a quase total ausência de trilha sonora. Durante os momentos mais cruciais, não há música alguma, o que é ousado, considerando que esse é um elemento central para a construção da atmosfera do terror. E justamente por isso precisava haver algum outro aspecto trabalhando nesse ponto. Aqui, senti que faltou: não houve uma construção conscisa de atmosfera. Assim, a história é der fato macabra, a violência se desenrola diante de nossos olhos, a câmera faz seu trabalho, mas não senti tensão alguma. Foi para mim um suspense e cru e frio.
A ideia é ótima e as críticas aos clichês de Hollywood são bem colocadas, mas achei a condução do filme em geral tão bagunçada (eu sei que foi de certa forma proposital, mas passou do ponto para mim, tornando a experiência chata), e a maioria dos personagens inseridos em arcos tão pouco engraçados (o melhor do filme é mesmo o Ben Stiller, em um papel e em situações sensacionais), que tive dificuldades para gostar.
Delicadeza, serenidade e introspecção preenchem a obra de Fábio Meira, o que não poderia ser mais adequado, já que estamos diante de uma personagem que, em posse de um segredo que parece ir além de sua compreensão, se movimentar pelo filme de forma igualmente delicada e introspectiva.
Sentimos isso em cada silêncio e em cada olhar atento da personagem: Irene parece estar sempre se controlando para não revelar seu segredo - ou estudando o que fazer com ele. E por meio desses silêncios atentos, também nós nos infiltramos no ambiente tradicional e opressivo que a cerca, e que lentamente vai desnudando camadas de seus personagens.
Mas é no contraponto entre as duas famílias - e consequentemente entre as duas Irenes - que aprendemos mais sobre todos os personagens envolvidos. Ao mesmo tempo, é nas similaridades cada vez mais visíveis entre as duas Irenes que vamos, junto a elas, descobrindo novas possibilidades, viabilizadas pelo amadurecimento e pela chegada da juventude, tal qual se espera de um coming of age.
Além disso, os cenários são lindamente explorados, a trilha sonora é de bom gosto e o desfecho foi inteligentemente escolhido: há muita substância nos últimos segundos, que extrapolam o filme.
No chato e interminável monólogo do personagem que dá início ao filme, temi que o ele todo mantivesse aquele tom besta. O personagem, de fato, é bastante idiota, mas encontra seu tom quando se insere na cidade de Poeira e ao universo que ela inaugura no filme. A partir daí, o western é reconstruído com bom gosto, os elementos clássicos do gênero se misturam a um humor visual ágil e os momentos de silêncio são usados de forma relativamente inteligente.
Os personagens são engraçados demais e muito bem caracterizados. Além disso, a dublagem brasileira casa bem com os diálogos rápidos e as piadas incorretas que saltam a todo momento.
Tudo que diz respeito à parte visual, aliás, é muito bem acertado aqui. A animação consegue tirar beleza da feiura, já que todos os personagens são horríveis e, ao mesmo tempo, bonitos, de texturas secas e bem trabalhadas, que irradiam um ar rústico e o desértico. São figuras condizentes com o cenário esteticamente bem projetado e com a paleta de cores quente, que acentua a solidão e a secura da cidade.
Cai um pouco da metade para o fim, quando se alonga demais e o humor acelerado cede lugar a momentos desnecessários de introspecção e a um clímax sério demais. Ainda assim, as homenagens brilhantes ao gênero continuam e fazem a experiência valer a pena até o fim.
Por trás de um filme de terror de monstro e de uma crítica social, temos um conto macabro sobre a raiva, sobre os sentimentos negativos que, cumulativamente, disputam espaço sobre o indivíduo até governá-lo.
Para dar conta disso, o roteiro estabelece uma relação interessantíssima entre a protagonista e sua criatura, que se desenvolve de forma enigmática e revela após poucos a dinâmica da transformação que vinha sendo representada.
A atmosfera é construída de forma competente, o ritmo é bom e os arcos que vão sendo abertos permanecem dúbios. A cena final, por sua vez, carimba o desfecho do filme com a promessa de um futuro nada tranquilo para aquela família, mas assustadoramente condizente com o que aquele estilo de vida, metaforicamente falando, poderia criar.
Já gostei bem mais desse filme. Hoje, ainda me divirto com alguns aspectos, mas desgosto de outros.
Me agrada honestamente o humor grotesco e grande parte dos excessos cometidos em todas as esferas. Existem, claro, elementos totalmente fora do tom que cansam, como o histerismo interminável dos protagonistas em algumas cenas e o final prolongado demais (após a estreia do musical, todo aquele resto é desnecessariamente comprido). Mas a sucessão de absurdos, o humor visual e o politicamente incorreto fazem dos absurdos um bom guilty pleasure.
Além disso, o time de coadjuvantes desajustados é divertido, e alguns números musicais são de muito bom gosto - a sequência meio Disney no escritório de contabilidade e as velhinhas dançado com seus andadores são meus momentos favoritos.
É um filme sincero. O protagonista não é nenhum exemplo de ser humano e sua aparente redenção não é glorificada. Já o personagem de Fasanaro tem suas próprias tensões, marcadas pela claustrofobia proporcionada pelo conservadorismo das cidades pequenas. Se parece que Sara serviu de escada para o processo de humanização do outro, é pela falta de profundidade em explorar o universo desses personagens com mais nuances.
Ainda assim, possui bons momentos. As cenas iniciais em busca de Sara são bonitas e preenchidas por um ar de road movie solitário e misterioso, algo que me fez lembrar um Paris, Texas com bem menos força. Toda essa viagem até o primeiro encontro com Sara, inclusive, foi minha parte favorita do filme, quando viajávamos junto do protagonista em busca de algo que não sabíamos bem o que era.
Os atores estão afiados e seguros em suas introspecções. E o desfecho termina de projetar aquilo que se pincelava desde o início: é um exercício narrativo simples, pouco ambicioso e também menos profundo do que poderia ter sido.
Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore
3.3 570Quando vi o primeiro filme, o que mais me agradou foi a expansão do universo de Rowling para além dos muros se Hogwarts. Depois, a franquia se revelou uma expansão para além dos continentes. Após ambientações nos Estados Unidos e na França, este, o melhor e mais cosmopolita dos filmes até então, se passa na Alemanha, no Butão (que rende alguns dos cenários mais fascinantes do filme) e conta com um elenco de bruxos multicultural, ao qual se insere inclusive uma brasileira.
E como está linda Maria Fernanda Cândido! Apesar de ter apenas uma fala, sua importância é indiscutível, e sua figura é quase onipresente: durante toda a narrativa ela está posandoo em público ou cartazes com seu rosto são expostos. Nas cenas finais, com sua imagem estampada nas transmissões, sua figura já é um ícone e uma das imagens mais inesquecíveis do filme. Isso é de um valor imenso.
Por fim, a história parece ter encontrado seu tom. Ela avança demais, os arcos se fecham (estendendo-se mais um pouco, poderia ter sido o desfecho de uma trilogia) e a quantidade menor de narrativas paralelas possibilita que os personagens, já mais maduros, consigam se relacionar melhor (a transformação de Queenie e um Jacob mais reativo são alguns dos pontos que mais aprecio). Além disso, Mads Mikelsen é o vilão que faltava, trazendo toda a classe e ameaça que Depp, perdido, não conseguia.
Não posso deixar de comentar minha sequências favoritas do filme: a cena do resgate a Teseu na prisão (ridiculamente divertida), o jantar (cruzamento tenso de conflitos com direito a uma fuga visualmente linda de Jacob e Lally Hicks) e as perseguições labirínticas pelas ruas encantadoras do Butão.
A Grande Farra dos Muppets
3.4 9 Assista AgoraMais interessante e completo que o filme de 1979 em todos os aspectos. Passada a responsabilidade de apresentar "o primeiro filme dos Muppets", que, explorando sua zona de conforto, apostou em uma espécie de prequel, aqui a proposta é totalmente outra: eles estão imersos em um filme de investigação.
O gênero não poderia ter sido melhor escolhido. Tal como em A Pantera Cor-de-Rosa, de Blake Edwards (meu favorito do estilo), vemos se desenrolar uma trama policial que articula o humor a um leve clima de mistério e desconfiança.
Os círculos sociais da aristocracia inglesa e do mundo da moda, nos quais a trama se sustenta, além de charmosos por si só (o que são a presença magnética de Diana Higgs ou a cena na casa de John Cleese?), são cenários perfeitos para que os personagens se insiram causando estranheza e desequilíbrio. É como o humor do show business americano, que os Muppets representam, visitando a singularidade do humor inglês.
Os números musicais são mais ousados que os do primeiro filme, com coreografias bem trabalhadas e efeitos visuais questionáveis (tudo que envolve o protagonismo da Miss Piggy é, felizmente, muito brega). E a metalinguagem segue funcionando a todo vapor, tendo início já nos primeiros minutos, quando os personagens comentam os créditos iniciais e apresentam as regras do enredo.
Animais Fantásticos - Os Crimes de Grindelwald
3.5 1,1K Assista AgoraComo muitos já comentaram, este filme não diz muito coisa, não tem aquele ar clássico de aventura do primeiro filme e, por isso, aposta na ramificação das tramas, trazendo muitos personagens e conflitos paralelos. Isso não me incomoda, muito pelo contrário: fiquei muito mais interessado nas novas relações entre os personagens do que na trama besta de procurar Creedence por Paris.
Repito aqui o que digo sobre o primeiro filme: este também nos pega muito mais pela expansão do fascinante mundo de J.K. Rowling do que pelo desenvolvimento da trama. Os cenários seguem lindos, os figurinos são finíssimos e as cenas especificamente no Ministério da Magia - tal qual no primeiro filme e também como eu já havia notado em As Relíquias da Morte - Parte I -, são deliciosas, unindo magia, formalidade e burocracia em sequências de fuga sempre muito bem executadas. Nunca vou esquecer de Harry e Hermione em trajes sociais correndo pelos corredores do ministério e espalhando papéis por onde passavam; aqui, somos agraciados com Newt, Tina e Leta em uma espécie de dança acidental com armários e arquivos móveis, seguidos de um embate com cães de guarda do ministério. Muita classe!
E por falar em sequências lindas, o primeiro momento em que Hogwarts surge na tela, ao som da clássica trilha sonora de Harry Potter, seguido da imagens dos alunos amontoados à janela em seus já conhecidos uniformes, são um presente.
O clímax deste também é superior ao do primeiro filme, bem mais cauteloso e silencioso do que aquela destruição desgovernada na estação de metrô. O que continua me incomodando é a presença de Johnny Depp como o grande vilão. Ele não consegue trazer ao personagem um ar de ameaça e imponência, tampouco consegue atacar o espectador por meio da classe e do carisma, como alguns vilões, mais descontraídos, o fazem. Enfim, um personagem desorientado.
Muppets: O Filme
3.4 56 Assista AgoraNão escondo de ninguém que amo os Muppets. E passei a amá-los quando vi o filme de 2011. Eles entregam tanto carisma e entretenimento... cantam, performam, contam piadas, como grandes estrelas do show business.
Esta primeira incursão dos personagens no cinema é perfeita para introduzir os espectadores a esse universo. Não só por contar como eles se conheceram, permitindo que cada um deles se acrescente de forma individual e única à narrativa, mas também por ter início com uma das canções-símbolo dos Muppets: Kermit à beira do lago tocando banjo e cantando The Rainbow Connection, com seu reflexo refletido na água, é uma cena lindíssima de abertura.
A trilha sonora, aliás, é sempre um dos pontos altos dos Muppets. As canções aqui são bonitas e bem interpretadas. E não só de musical vive a obra: há influências de road movies e até de faroestes, em uma brincadeira gostosa com gêneros e referências.
O enredo em si não é tão fascinante. Resume-se no movimento narrativo de uma viagem pelo país até Hollywood, durante a qual mais personagens vão se juntando, enquanto tentam fugir do vilão. Mas ao longo dessa viagem, há momentos inspirados de humor, exagero (meu momento favorito talvez seja o do Animal em sua forma gigante, ridículo e grotesco) e metalinguagem - as piadas envolvendo a leitura do roteiro do filme são demais.
Red: Crescer é uma Fera
3.9 554 Assista AgoraEsse é mais um dos filmes recentes da Pixar em que o protagonista se vê submetido ao processo de transformação a alguma outra coisa. As caveiras de Viva - A vida é uma festa, as almas abstratas de Soul, a passagem de peixe para humano em Luca e, aqui, de humano para panda, revelam uma tendência já marcada nas obras recentes do estúdio, ainda que servindo a propósitos diferentes. Parece que, independente do assunto que se queira tratar e da mensagem a ser alcançada, uma certa dinâmica para o desenrolar do roteiro já está debaixo das mangas.
Outra repetição encontrada aqui é a exploração da essência e do autodescobrimento do protagonista por meio de sua fuga à rigidez familiar. Em Coco e em Luca, o personagem passa grande parte escapando de sua família, em um enredo de fuga e perseguição, enquanto descobre seu próprio potencial. Em Encanto, da Disney, a personagem não é perseguida fisicamente, mas banida da família pela avó, em uma atitude mais radical e opressiva do que nos casos anteriores - tudo em nome da segurança da família. Aqui, um novo passo é dado: mãe e filha chegam a duelar corporalmente, em uma rivalidade física de proporções grandes, que até então eu não tinha visto em animações norte-americanas. A cena é cafonérrima, mas tem seu valor.
Feitos esses comentários sobre os lugares-comuns da esteira de ideias do universo Disney-Pixar, cabe comentar que este filme é sim divertido, ágil e visualmente bonito. O exagero nas reações lembra muito o estilo mangá, que combina com o toque japonês presente na história. Aliás, achei muito bem construída essa questão de um templo e de uma tradição familiar preservados no centro de Toronto.
Outra coisa que acho interessante é o modo como diferentes gerações tratam de questões de ordem familiar. Enquanto as mais velhas reservam isso ao foro íntimo, com discrição e até repressão, as gerações mais novas ousam, tratando alguns problemas e dilemas como assuntos públicos, chegando a torná-los entretenimento e recursos de autopromoção, algo comum nas redes sociais.
Enfim, há muito dos ingredientes típicos das animações recentes, mas tem seu espaço de originalidade e autoria.
Tudo em Todo O Lugar ao Mesmo Tempo
4.0 2,1K Assista AgoraNão sei dizer algo que já não tenha sido dito por todo mundo. O que posso reafirmar é que é, sim, sim um filme doido, criativo, livre, plástico, excessivo, que assume várias formas, como os multiversos que visitamos.
Assim, a ideia principal da narrativa, de universos diferentes, mas semelhantes em suas essências, se entrelaçando e se influenciando, se imprime na própria forma do filme, em como ele conta tudo isso. É como se estivéssemos vendo vários filmes ao mesmo tempo, que repete de diferentes formas os mesmos conflitos e resoluções.
Gosto muito do fato de Evelyn ser uma mulher completamente imperfeita. Cheia de questões mal resolvidas, arrependimentos e ressentimentos. Ou, como é mencionado no filme, a pior versão de si mesma. É essa imperfeição que permite a viagem ao fundo de si proporcionada pelo filme, durante a qual ela busca forças nas figuras que ela nunca conseguiu ser - mas que, de alguma forma, é.
Também acho incrível como a montagem e o roteiro privilegiam o entrelaçamento dos universos diante de nossos olhos. Chega um momento em que o movimento narrativo de um universo ecoa simultaneamente em acontecimentos análogos em todos os universos paralelos. Esses pedaços interuniversais de narrativa se completam de tal forma, que uma mesma ação é apresentada a nós em sua completude devido a sua recorrência dentro do funcionamento das regras dos outros mundos. Como Evelyn, nos sentimos também em todo lugar, vendo tudo ocorrer ao mesmo tempo.
E que performance entrega Michelle Yeoh! Ela, como Jamie Lee Curtis e Ke Huy Quan, se fragmenta em diversas variantes de si mesma, como se pincelasse um mosaico de interpretações. Isso é belo!
Grande Menina, Pequena Mulher
3.6 773 Assista AgoraAinda bem que não me deixei desencorajar pelo péssimo título nacional. Mais genérico, impossível. E isso não condiz com o que encontrei quando assisti esse filme.
A obra já me ganhou na primeira cena. O prólogo em tom de conto de fadas e a lindíssima Brittany Murphy saindo de seu luxuoso prédio e pegando um táxi aos assovios é uma graça.
E essa graça perdura durante todo o filme. A atriz, além de linda, é extremamente carismática, elegante, magnética. E a personagem, uma perua alienada tendo que enfrentar a vida adulta, traz consigo um universo próprio, lúdico, infantil e misterioso. Murphy se encaixa bem dentro dessa mitologia.
Dakota Fanning mantém o nível trazido pela sua parceira de cena. Eu, particularmente, me canso rápido de crianças super inteligentes. Mas a personagem de Dakota não é somente inteligente. Ela é grossa, arrogante, dramática e amargurada. Suas respostas são rápidas, seus comentários são ácidos. O encontro entre as duas é bastante agradável, não só pelo choque de mentalidades, mas porque ambas, dentro de seus espectros, são igualmente exageradas e dramáticas. Isso dá origem a momentos bem divertidos.
Aliás, o filme não economiza em exageros. Muitos podem se irritar com os excessos e a infantilidade da protagonista. Esse exagero, porém, pende mais para um certo cinismo da narrativa diante da alienação social de Molly. Não me parece um humor desgovernado.
Por fim, duas cenas que com certeza levarei comigo: a sequência silenciosa no parque, que começa com as duas mulheres rodando em uma xícara gigante e termina com tapas e abraços emocionados; e a cena final - Dakota Fanning desconstrói a rigidez de sua personagem com classe, sem nunca tirar o sarcasmo do rosto, enquanto dança lindamente. É uma performance impressionante.
Dance Comigo
3.9 27Fico me perguntando se, pelo menos na época do lançamento, esse filme foi engraçado. Quase nada aqui funcionou para mim. O roteiro é bastante besta, os acontecimentos são ilógicos, nenhum personagem é interessante e a dinâmica de Ginger Rogers hipnotizada fazendo bobagens em público é péssima (e, não contente, o roteiro recorre duas vezes a esse recurso).
De positivo, há apenas a música: a trilha sonora é boa, e as poucas coreografias originam cenas muito bonitas, como a sequência do sonho de Rogers.
King's Man: A Origem
3.1 296 Assista AgoraA mudança no título original não deixa de ter sido uma boa escolha: apesar de parte da franquia Kingsman, esse filme funciona quase como um spin-off, fugindo do espectro narrativo, temporal e dos personagens originais. Aqui, o enredo se concentra em torno de um "homem do rei" literalmente: um ótimo Ralph Fiennes em constante diálogo com a realeza inglesa nos episódios que antecedem a fundação da agência. E isso traz boas e más consequências.
Dentre as boas consequências, existe a deliciosa atmosfera histórica proporcionada pela ambientação no início do século passado: os cenários são lindíssimos e emolduram bem nossas visitas à Rússia, à Áustria, a cenários montanhosos sensacionais e a acontecimentos e figuras históricos.
Entretanto, esse filme não consegue manter o mesmo nível de humor, anarquia e cenas bonitas de ação que caracterizam os filmes anteriores. Aqui o andamento é mais lento e sério, se aproximando mais de qualquer filme generalizado de espionagem, e as cenas de ação não empolgam - com exceção da ótima sequência de luta com Rasputin. Tudo que envolve esse personagem, aliás, é deliciosamente grotesco, dos diálogos ao exagero em sua caracterização.
É um filme curioso, mas desnecessário.
De Volta ao Baile
2.8 258A escalação de Alicia Silverstone, famosa por uma obra que se tornou símbolo dos filmes de colegial nos anos 90, para representar aqui novamente o ideal de perfeição almejado pelas colegiais, mas que mais tarde se revela decadente e pouco próspera, mostra bem o propósito interessante do filme: revisitar o universo do ensino médio representado no cinema americano dos anos 1990 e 2000 e desconstrui-lo sob a ótica atual.
Em alguns momentos isso fica bem claro e oferece momentos bons. O filme retrata com bastante exagero e sarcasmo a mudança no paradigma de popularidade nas últimas décadas: no momento atual, o esforço em torno de um engajamento no mundo virtual e a construção de uma figura popular consciente, que ganha fama fingindo mobilizar a massa em direção a ideais de autoaceitação e igualdade, torna ainda mais ridícula a superficialidade barata e escrachada à qual as personagens de filmes análogos, nas décadas anteriores, se resumiam.
Mas fica só nisso mesmo. A graça novamente se restringe às caras e bocas de Rebel Wilson, enquanto o resto consolida um todo bagunçado, mal escrito e sem-graça. Além disso, ver duas adultas brigando pela popularidade em um baile de escola não foi tão engraçado quanto parecia ser. Aliás, parecia?
Güeros
4.0 47 Assista AgoraÉ difícil falar de Güeros. Não é um filme comum. Às vezes parece que vai se restringir ao argumento social, mas de repente insere elementos que fogem a isso. Depois parece que vai desaguar em um coming of age, o que de fato nunca acontece - e se acontece, o faz de forma bem singular.
Não é um filme triste nem feliz. É realista. Os personagens, tais como em uma crônica, atravessam a cidade e, enquanto fazem isso, cortam transversalmente camadas da sociedade mexicana. Não se aprofundam em nenhuma delas, mas parecem observá-las de forma tão curiosa como nós.
Por fim, vale mais como um exercício de observação de parcelas daquela sociedade sob uma ótica artística (muito artística, aliás, pois os enquadramentos e os cenários são lindíssimos), enquanto conta sobre dois irmãos que partem em busca de algo íntimo a eles, desconhecido para o resto daquela sociedade, como se estivessem em busca de uma parte de si mesmos e do que os une.
Millennium: Os Homens que Não Amavam as Mulheres
4.2 3,1K Assista AgoraAdmito que tive um pouco de dificuldade para acompanhar todo o raciocínio do filme. Não por ser extremamente complexo, mas por trazer um conjunto denso de informações, nomes e referências que às vezes nos atropelam, enquanto estamos muito ocupados sendo sufocados por sua atmosfera pesada ou refazendo as conexões entre os inúmeros personagens do passado e do presente.
Ainda assim, a história é bem contada. O ritmo mantém uma regularidade, e o argumento em si é bem intrigante. Imagino que transpor uma obra de tais proporções para o cinema não deve ter sido fácil. Exemplo disso é que senti falta de um aprofundamento maior na singularidade de cada personagem componente da família Vanger, e simplesmente porque não há tempo, mesmo sendo um filme bem longo: há MUITO para se contar e mostrar.
A personagem de Rooney Mara, por exemplo, parece tecer uma subtrama própria, tão chocante quanto o mistério principal, até ocorrer sua anexação à investigação central do filme. E os minutos finais do filme, após a resolução do mistério, se desdobram tão velozmente que não sei até agora se entendi o que houve. O argumento parece nunca ter fim. E mesmo assim, nunca fica chato nem cai em enrolações.
Além disso, a atmosfera do filme é muito bem trabalhada. O cenário invernal e escuro da ilha, bem como os ambientes frios e suspeitos das casas, combinam bem com os personagens dúbios e emolduram para os personagens um local de trabalho nada acalentador.
Kingsman: O Círculo Dourado
3.5 885 Assista AgoraMenos interessante que o primeiro e com suas propriedades mais dosadas: as cenas de ação são menos anárquicas, a vilã merecidamente com menos destaque (Juliane Moore herdando um papel meio sem-graça) e soluções narrarivas mais óbvias, menos paródias de si mesmas.
Ainda assim, algumas escolhas tornam esse um filme muito divertido e ainda inventivo: a estética anos 50 da vilã e de seu universo, as participações impagáveis de Elton John e a inserção de novos personagens e uma nova agência de espionagem, que fundam na narrativa um universo à parte.
Também gosto da crítica nada sutil, exagerada e ainda assim necessária à guerra às drogas, aqui o impulso do conflito principal e o principal pilar do "plano esdrúxulo" da vilã deste volume.
Kingsman: Serviço Secreto
4.0 2,2K Assista AgoraGosto muito da cena em que Colin Firth e Samuel L. Jackson rivalizam discretamente por meio de um diálogo que resume a própria cena: um espião frente a um vilão megalomaníaco com um plano esdrúxulo.
O filme está consciente da megalomania desmedida do personagem de Jackson, e não esconde que seu plano em escala mundial é pra lá de esdrúxulo (as cenas finais, mostrando o plano já em ação, são divertidíssimas). E tudo isso combina bem com os excessos propostos por esse filme, e que eu particularmente adoro.
Não é uma obra composta apenas por subversão do gênero e por metalinguagem. Há uma ação e sentimentos sérios representados aqui. Há um personagem passando por uma transformação sincera e bem trabalhada ao longo da narrativa, e vários coadjuvantes muito bem caracterizados (a comparsa inseparável de Valentine é minha favorita, e o visual de Firth aqui virou um símbolo que o precede).
Mas também há deliciosas sequências em que o roteiro chuta o pau da barraca e traz cenas de ação deslumbrantes, aceleradas, recheadas por mortes tosquíssimas e soluções criativas para as reviravoltas da trama.
A Vida Marinha com Steve Zissou
3.8 453 Assista AgoraTenho a impressão de que Wes Anderson consegue extrair uma narrativa de qualquer cenário: de uma ilha, de um hotel, de uma revista... Aqui, o isolamento do oceano e a arquitetura comprida dos navios encontram força no estilo do diretor, que usa sua câmera com inteligência para criar poesia visual à beira-mar e passear, em deliciosos planos-sequência, pelos diversos recintos que compõem a embarcação.
O formato de falso-documentário sempre me parece uma boa ideia no início, pois geralmente nos colocam frente a um humor menos óbvio e mais metalinguístico, mas sempre acabam me cansando. Aqui não foi diferente. Em algum momento, o enredo das filmagens começou a me cansar.
Ainda assim, o roteiro está recheado de boas ideias: um personagem que vai lentamente percebendo que está fazendo tudo errado (tal como em Os Excêntricos Tenenbaums), piratas sequestradores e uma inimizade com outro navio são alguns de meus ingredientes favoritos nessa trama.
E que lindo ver o Seu Jorge e Bowie tocando juntos a trilha sonora!
Educação
3.8 1,2K Assista AgoraUma história simples, mas contada com muita graça e leveza. Não há aquele drama pesado, tampouco cenas melodramáticas e novelescas que caracterizam muitos filmes de época, principalmente quando estes são protagonizados por mulheres. Aqui, pelo contrário, sinto uma certa economia de emoções, e é justamente essa dosagem equilibrada entre razão e sentimento que me faz gostar ainda mais do filme.
Muito é representado aqui de forma bastante razoável. Discute-se explicitamente assuntos como a função da educação e a possibilidade da mulher (naquela época) perante esse caminho, mas sem passar do ponto. Afinal, alguns filmes discutem tais temas tão didaticamente, que às vezes dão a sensação de estarmos vendo uma palestra, o que não ocorre aqui.
Paralelamente a isso, o sentimento que se destaca ao longo da narrativa, dando o tom poético e agradável ao filme, é a excitação da protagonista diante do mundo que vem lhe sendo revelado. Carey Mulligan dá vida a uma personagem graciosa, madura, e ao mesmo deslumbrada e excitada com a vida e as coisas. Sentimos junto essa excitação.
Além disso, há muita classe envolvendo todos os aspectos dessa obra. Os figurinos, os cenários, as atuações, os diálogos e as várias referências artísticas constituem um todo muito charmoso, delicioso de se acompanhar e com um ar inteligente. Me senti até mais intelectual assistindo.
A Casa Monstro
3.4 599 Assista AgoraNão sei como a qualidade estética dessa animação foi recebida na época, mas eu achei bem ruim. Entendo que a ideia era capturar fielmente o movimento dos humanos (e de fato o estilo dos personagens foge bastante da recriação cartunesca do mundo que caracterizava animações da Pixar ou da DreamWorks já nesse período), mas isso também acaba levado a uma maior inenxpressividade dos personagens e a uma animação, de modo geral, visualmente feia.
Também me causa uma dupla impressão o rumo tomado pela narrativa: acho que a história poderia ter sido bem aproveitada se a monstruosidade da casa fosse mais sutil, fruto da imaginação das crianças (que, aliás, são bem engraçadas interagindo entre si). Por outro lado, me diverte o absurdo de uma casa realmente ganhando vida e engolindo de fato as pessoas. É preciso relevar e aceitar que, nesse universo, isso é possível.
O que mesmo assim foge muito do tom é o clímax trash e exagerado que antecede os minutos finais. O humor rápido e politicamente incorreto, que vinha se construindo junto ao suspense até então, é deixado totalmente de lado para ceder espaço a cenas mal projetadas de perseguição e gritaria. Faltou uma mão mais firme para manter as rédeas da narrativa.
A Árvore da Maldição
2.9 158Para o bem ou para o mal, acho que é impossível ficar indiferente a este filme. Isso porque o roteiro é, de fato, muito estranho. O que, no começo, me passou a sensação de estar diante de um suspense estilo A mão que balança o berço se converteu rapidamente em um terror de aspecto místico, quase mágico, de motivações até meio mitológicas. A sequência de estranhezas que decorrem daí são o sumo do trash: esquisitas, duvidosas e tecnicamente embebidas na feiura estética dos anos 90.
Me chamou a atenção a quase total ausência de trilha sonora. Durante os momentos mais cruciais, não há música alguma, o que é ousado, considerando que esse é um elemento central para a construção da atmosfera do terror. E justamente por isso precisava haver algum outro aspecto trabalhando nesse ponto. Aqui, senti que faltou: não houve uma construção conscisa de atmosfera. Assim, a história é der fato macabra, a violência se desenrola diante de nossos olhos, a câmera faz seu trabalho, mas não senti tensão alguma. Foi para mim um suspense e cru e frio.
Trovão Tropical
3.2 966 Assista AgoraA ideia é ótima e as críticas aos clichês de Hollywood são bem colocadas, mas achei a condução do filme em geral tão bagunçada (eu sei que foi de certa forma proposital, mas passou do ponto para mim, tornando a experiência chata), e a maioria dos personagens inseridos em arcos tão pouco engraçados (o melhor do filme é mesmo o Ben Stiller, em um papel e em situações sensacionais), que tive dificuldades para gostar.
As Duas Irenes
3.7 111 Assista AgoraDelicadeza, serenidade e introspecção preenchem a obra de Fábio Meira, o que não poderia ser mais adequado, já que estamos diante de uma personagem que, em posse de um segredo que parece ir além de sua compreensão, se movimentar pelo filme de forma igualmente delicada e introspectiva.
Sentimos isso em cada silêncio e em cada olhar atento da personagem: Irene parece estar sempre se controlando para não revelar seu segredo - ou estudando o que fazer com ele. E por meio desses silêncios atentos, também nós nos infiltramos no ambiente tradicional e opressivo que a cerca, e que lentamente vai desnudando camadas de seus personagens.
Mas é no contraponto entre as duas famílias - e consequentemente entre as duas Irenes - que aprendemos mais sobre todos os personagens envolvidos. Ao mesmo tempo, é nas similaridades cada vez mais visíveis entre as duas Irenes que vamos, junto a elas, descobrindo novas possibilidades, viabilizadas pelo amadurecimento e pela chegada da juventude, tal qual se espera de um coming of age.
Além disso, os cenários são lindamente explorados, a trilha sonora é de bom gosto e o desfecho foi inteligentemente escolhido: há muita substância nos últimos segundos, que extrapolam o filme.
Rango
3.6 1,6K Assista AgoraNo chato e interminável monólogo do personagem que dá início ao filme, temi que o ele todo mantivesse aquele tom besta. O personagem, de fato, é bastante idiota, mas encontra seu tom quando se insere na cidade de Poeira e ao universo que ela inaugura no filme. A partir daí, o western é reconstruído com bom gosto, os elementos clássicos do gênero se misturam a um humor visual ágil e os momentos de silêncio são usados de forma relativamente inteligente.
Os personagens são engraçados demais e muito bem caracterizados. Além disso, a dublagem brasileira casa bem com os diálogos rápidos e as piadas incorretas que saltam a todo momento.
Tudo que diz respeito à parte visual, aliás, é muito bem acertado aqui. A animação consegue tirar beleza da feiura, já que todos os personagens são horríveis e, ao mesmo tempo, bonitos, de texturas secas e bem trabalhadas, que irradiam um ar rústico e o desértico. São figuras condizentes com o cenário esteticamente bem projetado e com a paleta de cores quente, que acentua a solidão e a secura da cidade.
Cai um pouco da metade para o fim, quando se alonga demais e o humor acelerado cede lugar a momentos desnecessários de introspecção e a um clímax sério demais. Ainda assim, as homenagens brilhantes ao gênero continuam e fazem a experiência valer a pena até o fim.
Ninho do Mal
3.4 139 Assista AgoraPor trás de um filme de terror de monstro e de uma crítica social, temos um conto macabro sobre a raiva, sobre os sentimentos negativos que, cumulativamente, disputam espaço sobre o indivíduo até governá-lo.
Para dar conta disso, o roteiro estabelece uma relação interessantíssima entre a protagonista e sua criatura, que se desenvolve de forma enigmática e revela após poucos a dinâmica da transformação que vinha sendo representada.
A atmosfera é construída de forma competente, o ritmo é bom e os arcos que vão sendo abertos permanecem dúbios. A cena final, por sua vez, carimba o desfecho do filme com a promessa de um futuro nada tranquilo para aquela família, mas assustadoramente condizente com o que aquele estilo de vida, metaforicamente falando, poderia criar.
Os Produtores
3.3 158 Assista AgoraJá gostei bem mais desse filme. Hoje, ainda me divirto com alguns aspectos, mas desgosto de outros.
Me agrada honestamente o humor grotesco e grande parte dos excessos cometidos em todas as esferas. Existem, claro, elementos totalmente fora do tom que cansam, como o histerismo interminável dos protagonistas em algumas cenas e o final prolongado demais (após a estreia do musical, todo aquele resto é desnecessariamente comprido). Mas a sucessão de absurdos, o humor visual e o politicamente incorreto fazem dos absurdos um bom guilty pleasure.
Além disso, o time de coadjuvantes desajustados é divertido, e alguns números musicais são de muito bom gosto - a sequência meio Disney no escritório de contabilidade e as velhinhas dançado com seus andadores são meus momentos favoritos.
Deserto Particular
3.8 183 Assista AgoraÉ um filme sincero. O protagonista não é nenhum exemplo de ser humano e sua aparente redenção não é glorificada. Já o personagem de Fasanaro tem suas próprias tensões, marcadas pela claustrofobia proporcionada pelo conservadorismo das cidades pequenas. Se parece que Sara serviu de escada para o processo de humanização do outro, é pela falta de profundidade em explorar o universo desses personagens com mais nuances.
Ainda assim, possui bons momentos. As cenas iniciais em busca de Sara são bonitas e preenchidas por um ar de road movie solitário e misterioso, algo que me fez lembrar um Paris, Texas com bem menos força. Toda essa viagem até o primeiro encontro com Sara, inclusive, foi minha parte favorita do filme, quando viajávamos junto do protagonista em busca de algo que não sabíamos bem o que era.
Os atores estão afiados e seguros em suas introspecções. E o desfecho termina de projetar aquilo que se pincelava desde o início: é um exercício narrativo simples, pouco ambicioso e também menos profundo do que poderia ter sido.