Os filmes espertinhos de Adam McKay são intragáveis. Piadas totalmente previsíveis dentro de uma obra com personagens bastante caricatos que, paradoxalmente, procuram fazer com que a gente tenha mais raiva deles do que, de fato, achar engraçado. Isso porque os personagens de DiCaprio, Jennifer Lawrence e Rob Morgan representam a razão em meio ao caos, o que cria uma conexão com o espectador que assiste ao absurdo estilizado de McKay. Mas, independente dessa ligação, o humor exagerado não possui material para se sustentar nas mais de 2 horas de filme por causa da sua superficialidade. Irônico, já que os trabalhos do diretor sempre possuem um ar arrogante - que não é diferente aqui. Crítica social f*** de um adolescente birrento.
A inexpressividade das animações de Expresso Polar representa o filme de forma geral. Uma obra vazia, que sofre com artifícios tecnológicos na tentativa de atrair o público criando uma espécie de parque de diversões nas sequências em que a câmera toma uma perspectiva subjetiva ao olhar dos personagens enquanto eles passam por diversos lugares com o trem descontrolado. Diversas dessas cenas não tem nada de diferente de uma atração do “cinema 9D” ou coisa do tipo. O filme se apoia nesse apelo visual que nunca é inteiramente alcançado e se torna desgastante quando o espectador nota a repetição preguiçosa da obra.
Essa liberdade na decupagem e movimentos de câmera é possível por se tratar de uma animação, mas, como se isso não bastasse, os personagens possuem traços muito semelhantes a um humano real, o que deveria, supostamente, trazer maior contemplação à essas cenas mirabolantes. Porém, além disso não funcionar nesse aspecto, também gera uma estranheza pela característica desses mesmos personagens, principalmente em momentos em que é difícil saber qual expressão está sendo proferida por eles. A animação de Expresso Polar é péssima.
Se o filme não consegue alcançar o seu principal objetivo (o apelo visual) outros pontos fundamentais também deixam a desejar. A história não tem nada substancial, resolve o ceticismo do protagonista com uma resolução extremamente superficial e é cheia de personagens que não têm nada a acrescentar. É possível fazer um filme sem um conflito evidente, mas aqui nada é desenvolvido ou gera um engajamento mínimo do espectador. Não existe uma trajetória em que vemos o crescimento desses personagens e não há nada que transmita algo sensorialmente.
Um dos campeões de delírios cinematográficos da infância de diversas pessoas leva esse título por várias razões. Não só pela sua temática onírica, mas, especialmente, por sua animação bizarra, a estranheza de seus personagens e trama nada inspiradora, que transforma este em um trabalho completamente ignorável.
Quando você entende o lado patético do filme (e não demora muito a acontecer), ele rende muitas risadas com as atuações absurdamente exageradas, decisões e diálogos imbecis de seus personagens, tudo isso com uma crítica a volta do conservadorismo no cenário político americano, representado na figura de George W. Bush - configurando até mesmo numa piada que faz duplo sentido com o seu nome -, denotada na cena em que a protagonista vai prestar depoimento na delegacia à um policial com o ceticismo de "n" filmes de terror (uma figura extremamente estilizada para causar humor). Além disso, comentários de Mackenzie sobre veganismo e política deixam essa mensagem mais explícita. Dessa maneira, a obra vai remontando a estupidez e hipocrisia do conservadorismo presente em slashers dos anos 80 e até mesmo fora das telas de cinema.
Porém, o filme não se sustenta em seus míseros 83 minutos, isso porque as sequências de perseguição e eventuais mortes não tem nenhum apelo visual que engaje o espectador. Além de montagem e movimento de câmera tenebrosos, a trilha sonora não presta nenhum serviço na construção de uma atmosfera decente para esses momentos.
Fica ainda pior quando a história toma um rumo em que conta os traumas do assassino, se colocando muito mais em contato com os slashers dos anos 2000. A tentativa de expandir esse aspecto narrativo mais dramático (não sei se é ideal chamá-lo assim) tira consideravelmente o peso daquilo que estava sendo construído no primeiro ato e era o ponto forte.
É possível argumentar que, ao fazer essa conexão com os seus contemporâneos, tenta mostrar as semelhanças do passado com o presente, mas o resultado é uma obra perdida em suas próprias ideias, sem nenhum apelo, com uma monotonia inacreditável.
O humor ácido e desprezível proferido por futuras vítimas (seguindo convenções clássicas do slasher) funciona, e o filme parece seguir esse tom, até mesmo com a trilha sonora não sendo tão sombria e "forte" em determinadas partes das cenas de ação, remetendo à seu pai, Pânico. Mas o lado dramático introduzido breca essa face cafajeste que produz os melhores momentos do longa e deixa tudo mais insólito, com a sensação de que não há um desenvolvimento adequado das ideias propostas.
Mesmo com suas inconsistências, a história é operante e há mortes bastante criativas, com destaque para um fura pneu e alguém forçado a beber algo - morte muito bem desenvolvida desde o começo da cena.
PS: O que me incomodou MESMO foi aquela fala final. Fica parecendo que o Paul foi o assassino de 25 anos atrás...
Se hoje estamos cansados de filmes de heróis entupindo a agenda dos cinemas ao redor do mundo, com franquias cada vez mais megalomaníacas, na década de 80 havia um número muito mais enxuto de adaptações de super heróis dos quadrinhos para as telonas. Até mesmo na TV, onde era mais comum, não tínhamos essa abrangência toda que temos atualmente. Então é importante considerar esse cenário onde a única grande franquia de um herói das HQs tinha sido a do Superman de Christopher Reeve, que começou com o memorável filme de 1978 dirigido por Richard Donner, para entender o que o Batman de Tim Burton significou em 1989.
Apesar da existência do filme gerado a partir da série de TV de 1966, era a primeira vez que um trabalho de audiovisual de longa metragem interpretava o Cavaleiro das Trevas de uma maneira mais condizente com o seu apelido. É difícil pensar em alguém mais apropriado para construir uma Gotham City nos cinemas do que Burton. O diretor tem um grande apelo visual em praticamente todos os trabalhos que fez, e sua abordagem inspirada no expressionismo alemão é totalmente coerente ao universo do personagem da DC Comics. O design de produção é espetacular, cria uma cidade suja, ressaltada pelas cores tanto de seus edifícios góticos, ruas e carros como pelo figurino dos habitantes quando é apresentada logo no início. Cinza, marrom, poucas luzes e um movimento considerável de pessoas que deixa tudo ainda mais poluído, inclusive sonoramente, mostrando a dificuldade de um personagem conseguir um táxi no centro de Gotham e sendo assaltado logo em seguida por ter que cortar caminho em um beco. A partir daí também somos apresentados à criminalidade de Gotham e ao tom do filme, mais violento do que o comum dentro do gênero quando foi lançado. Quando vemos o Batman de Michael Keaton pela primeira vez, ele surge como uma ameaça para os bandidos em cena como se fosse um vampiro em filme de terror, gerando uma expectativa de como ele vai enquadrar os criminosos enquanto vemos sua silhueta em um fundo que antecipa sua chegada por trás deles. Então, após umas porradas bem dadas, o personagem se expõe para quem ainda não tinha reconhecido: “I’m Batman!”. Uma boa introdução para o alter ego do bilionário Bruce Wayne. A trama envolve Jack (Jack Nicholson), um criminoso que, após ser derrubado acidentalmente por Batman em um tanque com substâncias tóxicas, se transforma no Coringa e vira chefe do crime na cidade. Em todos os filmes dessa franquia, os vilões se sobressaem. Aqui, Nicholson cria uma versão bastante coerente do que havia sido visto até então do Palhaço do Crime nos quadrinhos. Ele rouba a cena, é engraçado, com a infantilidade e besteiras características do personagem (a cena em que ele rouba o sinal de televisão é o Coringa clássico), imprevisível, sendo capaz até de matar inesperadamente o capanga que disse ser o seu “número 1”, e por isso, ameaçador dentro daquele universo. É perceptível o quão lunático é esse Coringa, seja pela risada, trejeitos ou até pela maquiagem que forma um sorriso estranhíssimo em seu rosto, e se esse cara tem tanto poder e lidera a maior parte do crime em uma cidade tão corrupta, ele é verdadeiramente perigoso. E é curioso a forma que Nicholson constrói essa aura de psicopata mesmo sem deixar seu personagem se exceder e parecer que está à beira de qualquer sanidade a todo o momento. Ele consegue contrastar partes passivo agressivas com outras em que chuta o balde completamente. A primeira cena em que Jack é de fato o Coringa há uma antecipação semelhante ao que vemos no começo com Batman, com o palhaço saindo do escuro e revelando, aos poucos, sua face deformada, que aparece em um contra plongeé acompanhada de notas musicais fortes e um movimento de câmera em direção a ela que realçam a presença dele no filme – tão importante quanto aquele que deveria ser o protagonista. Aliás, nos créditos iniciais o nome de Jack Nicholson é o que aparece primeiro. E assim como conhecemos o modus operandi de Batman em sua primeira cena, vemos o mesmo com o Coringa, que mata aquele que era o então chefe do crime a tiros, descarregando toda a sua munição nele enquanto se diverte fazendo diferentes poses e rindo depois que tudo acaba. Coringa clássico. Dentro da história, também temos Vicki Vale, jornalista e fotógrafa que se mudou para Gotham em busca de uma matéria sobre o Batman, por quem é fascinada. Após ir a uma festa na mansão de Wayne, onde esperava falar com a polícia e encontrar pistas sobre o vigilante da cidade, ela acaba se fascinando também pelo homem por trás da máscara escura. A personagem vivida por Kim Basinger tem uma importância na história, mesmo que muitas vezes seja usada apenas como a motivação para o herói ir salvá-la no topo de uma catedral, mas demonstra ser muito inteligente, inclusive nesta mesma cena. Porém, a relação entre ela e Bruce é um ponto fora da curva dentro do filme e deixa uma sensação de que se o roteirista quisesse, poderia encontrar maneiras diferentes de resolver o conflito principal da trama entre Batman e Coringa. Vicki Vale é pouco desenvolvida e não vemos nada além de uma jornalista apaixonada por Bruce e Batman. Ainda há uma tentativa de criar um background que melhorasse a relação do público com ela quando ela está na cozinha de Wayne, mas é tudo muito raso. Só que mais grave do que isso é perceber que não só ela, mas o personagem principal também não é ninguém. Quando termina o filme continuamos nos perguntando: “quem é Bruce Wayne”. Não há nenhum desenvolvimento significativo para ele além de mostrar o caso do assassinato de seus pais. Inclusive, uma coisa boa que o filme faz é não tratar a origem tão conhecida do herói como algo inédito. Ninguém precisa ser introduzido a como o Batman “nasceu”. Pode-se argumentar que esse aspecto estabelece um mistério inerente a figura de Wayne o que faria todo sentido, dada a sua natureza sigilosa, mas acaba formando apenas um protagonista vazio. Ainda mais se pensarmos que nesse filme, o segredo da bat-caverna é revelado por Alfred (Michael Gough) sem mais nem menos para a jornalista que acabara de conhecer Bruce. O único personagem que cativa e tem algo a mais a oferecer é o Coringa. Mesmo tendo a fama de ser um dos primeiros filmes de herói com uma aura mais sombria (talvez o primeiro de sucesso, numa escala tão grande), é necessário lembrar do humor presente aqui. Esse lado cômico é manifestado em vários momentos, com destaque para as já citadas cenas do vilão de Nicholson, mas também com piadas visuais mais sutis que podem passar despercebidas pelo público em geral. Um dos melhores exemplos é na festa na mansão Wayne, no começo, em que ainda não havíamos visto Bruce, apenas o Batman, com sua máscara, e enquanto o bilionário larga coisas pelo salão, observando a jornalista que chamou sua atenção, um mordomo (Alfred, que ainda não tinha sido apresentado) vai recolhendo tudo o que ele deixa pelo caminho nas suas costas. Não é só engraçado como também dá indicativos de quem é aquele homem.
Vivendo de altos e baixos, com uma trama simples e personagens pouco desenvolvidos, o Batman de 89 se sustenta pelo trabalho incrível da criação daquele universo, – com cenários espetaculares que renderam um Oscar de Direção de Arte em 1990 – figurinos, maquiagem, um vilão magnético e o ineditismo de uma obra que contava a história do herói com um teor adequado ao que os fãs do homem-morcego estavam acostumados.
Freddy Krueger não é Robert Englund no remake de A Nightmare On Elm Street, de 2010. Da mesma forma, esse é um trabalho que não representa nada do que a franquia produziu em todos os seus outros oito filmes. Pra começo de conversa, quais eram as chances de um dos vilões mais icônicos do terror no cinema que ficou imortalizado com a imagem e atuação de Englund funcionar com outro ator que não fosse ele? Se antes tínhamos uma figura ameaçadora, que atacava suas vítimas com jogos psicológicos e que também trazia com isso um humor que variava entre algo mais pesado e às vezes mais bobo, mas sempre engraçado e marcante, acompanhado de uma produção perfeita envolvendo maquiagem e figurino brilhantes que formavam um personagem assustador que ao mesmo tempo possuía uma relação próxima ao público, agora temos uma atuação fraca de Jackie Earle Haley prejudicada pelos péssimos diálogos e ideias introduzidas na história, que criam um Freddy Krueger tarado que abusava de crianças antes de se transformar no bicho papão que invade sonhos. Isso somado ao visual pobre e pouco expressivo feito em CGI do seu novo rosto resulta em um vilão indiferente. Não é carismático e nem dá medo. É chato. Krueger é a alma de toda a franquia e se o filme tem uma versão tão ruim do personagem, praticamente metade do trabalho é comprometido. Mas seria bom se os problemas fossem tão exclusivos para essa versão de Freddy Krueger. O início, na cafeteria, deu alguma esperança de que poderia ser um filme incompreendido, quando a fotografia e iluminação da cena apresentam uma luz do lado de fora que alternava entre vermelho e verde, remetendo ao suéter do vilão e trazendo a cor vermelha como sinal de perigo. Entretanto, isso durou alguns poucos minutos até que chega o primeiro estrondo desnecessário. Todo o terror que esse filme busca é apoiado em jump scares que aparecem literalmente do nada, com uma parede sonora capaz de deixar o espectador surdo. Com exceção de uma cena, todos os sustos desse filme são ou totalmente previsíveis ou extremamente apelativos e sem nenhuma coerência dentro da cena. A cena do sótão, na primeira metade, é um exemplo claro do que é o horror desse filme. Não existe construção, a montagem e direção colocam uma sequência de planos aleatórios e, de repente, Freddy aparece com uma poluição barulhenta por segundos e acaba a cena. A melhor cena de susto é quando uma das personagens se levanta da cama, a câmera mostra a altura de seus pés, ela vai ao banheiro e é esperado o clichê do espelho, que não acontece, ela volta a cama, demora um pouco antes de deitar, dando indício de que pode ser atacado pelo pé que havia sido mostrado anteriormente, mas nada disso acontece. Essa é uma boa cena, que consegue quebrar a expectativa colocando diversas possibilidades e surpreendendo com sua conclusão. Caso isolado. Mas o que causa mais revolta é perceber que os roteiristas escreveram esse filme com a maior preguiça possível. Existem furos enormes aqui que constituem uma trama desconexa. Em determinado momento, Freddy diz que se alimenta da memória de suas vítimas, só que aparentemente nenhuma das crianças tem qualquer recordação dele. Quentin descobre em uma cena que Krueger está indo atrás deles porque eles sabem dos abusos que ele cometeu e que ele não tinha a menor chance de ser inocente, como os pais das vítimas suspeitavam e se culpavam. Só que foi Freddy quem começou os ataques no filme e, como já mencionei, eles nem sabiam quem ele era quando foram atacados. A evidência maior da preguiça de quem escreveu esse negócio são as inúmeras ideias utilizadas em diversos filmes da franquia. A cena da banheira, o suéter trazido para a realidade que levou os protagonistas a tentarem colocar Freddy no seu mundo, personagens se queimando pra ficarem acordados, a cena final da mãe... E não é um uso referencial, na grande maioria das vezes são simples cópias de conceitos que já existiam nos outros filmes. Não há uma preocupação em fazer algo novo de verdade. A abordagem de Freddy é a única grande mudança no roteiro e mesmo assim desempenha uma função muito parecida com o que havia antes. Pra comprovar isso, o filme original queria um Freddy Krueger que tivesse abusado de crianças, mas por causa de casos da época, Wes Craven achou melhor deixar isso de lado. Outro problema grave do roteiro é a falta de foco na construção de uma história sólida, que gera personagens vazios e sem nenhuma química. A cena do beijo entre Nancy e Quentin é totalmente anticlimática porque não vemos uma relação sendo formada durante o filme e o espectador não poderia se importar menos com aquilo. Além da péssima história, também é muito mal contada (se isso ainda não ficou claro). A estrutura narrativa é incoerente. Um exemplo claro disso é na cena da biblioteca. Após um pequeno pesadelo de Quentin com mais um susto telegrafado, ele acorda com Nancy que foi até ele, pois precisavam conversar. Ao invés de seguirmos essa cena e acompanharmos o diálogo entre os dois, vemos outra cena de morte, susto, sangue e Freddy Krueger com uma vítima dentro de uma cela na cadeia, porque a intenção parece ser criar um filme que deve ser assustador o tempo todo, nem que pra isso seja preciso deixar a história de lado. E nenhum dos dois dá certo. Os primeiros 30 minutos são praticamente um compilado de jump scares mal feitos. A fotografia também não tem sentido e soa até meio esquizofrênica (não podendo ser usada como uma metáfora para a trama, bem longe disso). Uma lente grande angular o tempo todo, mudança do plano de foco sem razão nenhuma e com imenso exagero, assim como movimentos e zooms completamente equivocados e que não mostram nada, como na cena da piscina. O final de Freddy é tão vagabundo quanto quase tudo que temos nesse filme. É uma resolução qualquer pra ter um final. E a cena da mãe, assim como em 1984, deixou aberto para continuações. A diferença é que agora acabamos implorando pra que não aconteça.
SPOILERS Quando a sinopse de um filme de terror dos anos 80 fala sobre um cachorro assassino eu esperava algo com estilo mais trash e engraçado. Mas muito pelo contrário, Cujo é um filme de terror genuíno. A história é construída sem pressa e desde o princípio entramos no que o filme está propondo. A primeira cena mostra um coelho inofensivo, fofinho e que conquista a simpatia do público com uma trilha sonora bastante encantadora enquanto os planos mostram o animal de perto, fortalecendo os detalhes do seu rosto e depois o que ele vai fazendo na floresta ensolarada. Imagens adoráveis. E num mesmo plano em que vemos o coelho, a câmera recua um pouco e revela Cujo, com a visão centralizada atrás das pernas abertas do cão e de frente para o coelho, como em um faroeste, mostrando o seu alvo. Nesse momento a trilha sonora fica muito mais sombria e, contando com a diferença enorme do tamanho entre os animais destacada no quadro, entendemos que aquele cachorro pode ser uma ameaça. Em seguida, na perseguição de Cujo para o coelho, que acaba com ele preso no tronco da árvore adquirindo os seus poderes de um morcego, vemos pela primeira vez a câmera subjetiva na visão de Cujo. Esse detalhe é muito importante para a narrativa e mais tarde causa um momento muito forte no filme que logo vou escrever aqui. Após isso, somos apresentados a família Trenton, especificamente a Tad, que tem medo de um monstro em seu armário e é acalmado pelos seus pais, em uma cena que denota a união entre o casal pelo bem do filho. Depois, quando descobrimos o caso de Donna com Kemp ficamos surpreendidos, principalmente por termos visto uma imagem tão positiva anteriormente. Mesmo que as cenas com Kemp entregando o cavalo de madeira de volta para a casa dos Trenton tenha causado pequenos estranhamentos que são entendidos depois por causa dessa relação extra conjugal, não passava pela nossa cabeça que o casal vivesse aquela situação. Tanto que a cena em que isso é revelado nos surpreende com Donna saindo de trás de Kemp, deitado na cama. Mais tarde, Vic, publicitário e marido de Donna, descobre a traição. O filme é bem coeso, por mais que pareça que essa parte da história é uma subtrama desnecessária, as peças vão se encaixando e formam um filme bem correto. A calma da narrativa também vale para a história da família que trabalha com a oficina. Descobrimos que o dono do estabelecimento ficará sozinho durante um período, enquanto a mulher vai visitar a irmã junto do filho, após ganhar na loteria (5.000 dólares) - uma cena posterior, do álbum de fotos, dá a entender que talvez ela fosse embora de vez, fugindo do marido violento e agressivo. Quando Joe Camber, dono da oficina vai conversar com seu amigo sobre o dinheiro que ganhou e como pretende gastar traindo a mulher e bebendo, pedindo a companhia dele, a câmera subjetiva de Cujo volta e, ao assistirmos um homem tão fdp planejar uma atitude deplorável contra sua própria família, a visão que temos pelos olhos do cachorro passa a ser também uma tentativa do filme nos colocar do lado dele. Isso é recompensado quando vemos o ataque de Cujo sobre os dois e não sentimos medo, mas satisfação, ao mesmo tempo em que vemos o monstro que Cujo se transformou. O trabalho de maquiagem é essencial para esse aspecto e é realizado de maneira formidável. O pus saindo dos olhos do animal, o pelo sujo, enlameado, os olhos vermelhos, a baba de raiva e o sangue das vítimas acumulado em seu corpo. Tudo isso junto a primeiríssimos planos, com o cachorro dominando a tela e capacitando o espectador a enxergar os pequenos detalhes que criam aquela imagem aterrorizante, e uma trilha sonora pesada e sombria. Deve ter sido bem legal ver isso no cinema. Mas o terror ainda vai chegar. Antes, quando os Trenton levam o carro de Donna que apresenta problemas pela primeira vez a oficina, vemos um plano que, assim como no começo do filme, destaca a diferença entre o tamanho de Tad e Cujo. A cabeça do cachorro deve ser quase três vezes maior que a da criança. É mais um ingrediente na construção do filme. A expectativa é criada em cima de praticamente todos os elementos que a história apresentou até aqui. Tad não quer ficar na colônia de férias e a família tem que ficar com ele, Vic tem uma reunião importante para a empresa fora da cidade e Donna tem que ficar com a criança. Charity Camber foi visitar a irmã junto do filho e o único responsável pelo local, Joe, foi morto pelo cachorro que já consideramos um serial killer. Donna tem que levar o carro que está em péssimo estado até a oficina junto de Tad. É aí o momento que cai a ficha de que tudo vai dar errado, quando vemos que o carro não vai aguentar mais de 15 segundos andando e eles estão quase chegando a oficina que é território de Cujo. A frase que Donna diz para o filho pouco antes de toda a tragédia acontecer é certeira: "só precisamos aguentar um pouco mais". O público sabe mais do que a protagonista, o que deixam essas palavras irônicas e ligam a chave para o espectador sobre o perigo iminente. Um alcance de narrativa irrestrito, parte da Hollywood clássica, que gera ansiedade e aumenta a tensão, fundamental para filmes do gênero. O momento forte do filme, que falei no começo do texto vem de um susto muito bem construído. A câmera que se movimenta atrás de uma vítima é subjetiva de quem vai cometer o assassinato, e vemos esse movimento acontecer em uma cena na casa dos Trenton com Donna. A câmera subjetiva estava sendo usada constantemente com Cujo, como mencionei. Certo. Quando a mãe e o filho param com o carro na oficina e a mulher investiga com o olhar o local e após isso, volta a olhar para dentro do carro, com a porta ainda aberta. É aí que uma câmera se movimenta atrás dela. O filme nos ensinou que aquele deveria ser o momento que o cachorro viria por trás e nós estávamos acompanhando a visão dele. Mas não. Quando temos certeza do que vai acontecer, somos surpreendidos pelo cachorro pulando e atacando a janela do outro lado. É um ótimo susto, concebido com o tempo necessário. A partir da segunda metade do filme, Cujo é o vilão e vamos passar a acompanhar Donna na jornada em que busca se livrar daquela situação. A maquiagem é muito boa em ressaltar os olhos fundos da mulher que não dormiu, e os lábios secos e o suor mostrando o cansaço dos dois. A montagem é muito certeira, destaque para a cena em que Donna olha a maçaneta de uma porta e sente que consegue chegar até lá. A colocação daqueles planos mostrando a direção do olhar dela é muito sagaz e temos um momento de subjetividade mental, em que entendemos as intenções da personagem apenas com a montagem e o efeito Kuleshov, mostrando sua reação diante de alguns planos. Esse aspecto do filme também funciona nas cenas de ação em que Cujo está executando alguém, e os cortes frenéticos, que dificultam o acompanhamento do espectador, geram questionamentos sobre a força do animal, além de trazer inquietação. A direção dos planos em que Cujo sobe no carro é sensacional. Que grande ator era esse cachorro. Os defeitos não são numerosos, mas são importantes. O monstro no armário do menino, que parece ter alguma relação com Cujo, não faz o menor sentido, e os personagens, embora bem construídos, não são tão cativantes e não despertam tanta simpatia, com exceção de Tad. O final é muito inteligente e não se prolonga, explicando acontecimentos posteriores a resolução principal da trama. Isso faz falta em vários filmes de terror desde sempre.
SPOILERS "Se a aventura tem um nome... ele é Indiana Jones" Desde a primeira cena, em um belíssimo número de dança com um grande coreografia, temos pistas da história. Isso é notado quando Willie entra na boca de um dragão do cenário que possui uma cor vermelha e muita fumaça dentro dela, durante a apresentação. Essa cor e a fumaça remetem ao fogo presente no sacrifício que seria visto mais tarde no filme e que tem uma composição muito parecida com aquela vista nessa cena. A fumaça, destacando o calor fervente do fogo e o vermelho que, além de ter ligação óbvia com esse elemento, também simboliza o perigo. A coesão presente no filme é brilhante. Logo no começo, quando Indiana começa falando em mandarim com os mafiosos chineses que enfrenta na primeira cena em que aparece, o seu inimigo se mostra surpreso: "não sabia que você falava nossa língua, Dr. Jones!". Durante o longa, Indiana Jones conversa em mandarim com seu companheiro juvenil, que por sinal é o melhor da série, Short Round, e lá no final, quando precisam escapar de um lugar que parece não ter saída ao se encontrarem cercados por inimigos no meio de uma ponte de madeira, os dois conversam entre si na língua chinesa e formam um plano relâmpago para a situação - que arranca o ar de preocupação dos espectadores visto na reação de Willie ("OH MY GOD!"). Nada está aqui por acaso. A relação entre os personagens parece ser estabelecida muito rapidamente, mas a história mostra que a narrativa estava certa em ser rápida. A interação entre todos eles faz sentido, tudo é bem estabelecido e não é preciso ficar forçando diálogos desnecessários. As circunstâncias apresentadas desde o início reforçam a construção de um roteiro muito sólido. Um dos poucos defeitos seriam algumas piadas utilizadas como running gags que não funcionam tão bem como quando o pequeno parceiro de Indiana ri do fato de Willie ter se molhado, mas isso não atrapalha o filme. Porém, uma outra piada que acontece mais de uma vez e que é engraçada, mesmo que não seja tão original, é a tentativa infantil e doce de Short Round imitar tudo que seu herói Indiana faz. Essas piadas acontecem em planos onde Indiana Jones está dentro do plano de foco como objeto principal, e no fundo vemos o menino realizar os mesmos movimentos que o personagem de Harrison Ford ao escutar o líder da aldeia indiana contar os problemas que a região tem enfrentado. A personagem Willie Scott também é muito engraçada. As reações dela, que já mencionei aqui, acontecem diversas vezes durante o filme e contribuem tanto para o humor, como para a apreensão em cenas que precisam que ela encare seus medos (de classe média-alta) para salvar os dois protagonistas. Essas cenas também ajudam muito no desenvolvimento dela. A ação é muito bem dirigida e a montagem não cansa o espectador, que assiste cenas muito energéticas sem excesso de cortes que poderiam atrapalhar no acompanhamento do que estava acontecendo. O design de produção é irretocável. Assim como no primeiro filme, os cenários são fantásticos e ambientam muito bem toda a história, com destaque para a cena do ritual, em que a estátua gigante tem uma imagem assustadora e intimadora, acentuado pelo contra plongeé em que é apresentado, as cores, a fumaça e o som macabro dos seguidores de Kali Ma cobrindo tudo isso. Por mais místico que toda a história da pedra possa soar, o final mostra claramente como o filme levou tudo para um desfecho onde o herói interferiu de maneira direta em um problema que não era metafísico. A aventura levou todos eles ao resgate das crianças que haviam sido raptadas e eram escravizadas, e o filme demonstra como esse era o ponto principal quando, nos últimos instantes, Indiana diz que "entendeu o que a pedra significava" enquanto os parentes das crianças se encontravam de novo, se abraçando e reproduzindo diversas manifestações de afeto. É uma cena bastante comovente, os planos mostram as reações dos pais, mães, avós, etc. e mexem com quem está assistindo, mesmo com a trilha sonora mais convencional para aquele momento.
Não tem um tom definido. As cenas de ação, em grande maioria, são compostas por coisas absurdas (Leon pendurado de cabeça pra baixo, se escondendo e atirando, subindo e descendo, como se fosse um morcego é hilário) e que seriam bem-vindas em um filme que tivesse uma proposta estabelecida a cumprir esse tipo de obra. Mas, ao mesmo tempo em que temos essa ação que arranca risadas, o filme tenta criar uma história comovente. Pra ser justo, a ação até funciona em determinados momentos e, principalmente, estabelece uma coesão entre as primeiras cenas com o final do personagem Leon (SPOILER: a câmera subjetiva que vinha atrás da vítima, que no começo era Leon, é usada depois em um contexto em que Leon é a vítima do vilão de Gary Oldman). Mas a coesão é pontual. Por que o pai de Tony aparece ali no canto e câmera faz questão de mostrá-lo como se tivesse alguma importância para o que estava acontecendo? (se perdi alguma coisa pode me corrigir) O que mais dificulta a identificação com o personagens e o desenvolvimento da história proposta é a maneira caricata com que são construídos. O leite que Leon toma, o jeito de falar, a forma como ele "engasga" bebendo esse leite quando Mathilda diz coisas absurdas (na primeira vez até ok, mas a segunda foi preguiçoso) e a galhofa de personagem que é Stansfield, de Gary Oldman. É bizarro como as Leon e Stansfield são unidimensionais. O vilão é uma caricatura de "carinha do mal que toma drogas e pira o cabeção". Leon é tão pouco carismático que as tentativas de deixá-lo mais doce são vergonhosas, como na cena envolvendo o John Wayne. É claro que temos que deixar Mathilda de fora dessa, uma personagem que se destaca em cena, principalmente pela grande atuação de Natalie Portman que, aos 12 anos, já desenvolvia trabalhos exemplares com uso do "método". Além de ser engraçada em boa parte (o roteiro exagera em repetições que já comentei), é uma personagem intrigante e que apresenta momentos extremamente desconfortáveis. O contraste estabelecido na primeira cena em que vemos Mathilda, com uma câmera que vai subindo lentamente, revelando primeiro seus sapatos e meias infantis, e depois mostra um cigarro na mão de uma criança já causa um primeiro estranhamento. Mas o maior responsável pelo incômodo do público com o filme é a relação entre ela e Leon. Logo de cara, remete a Lolita, livro que foi adaptado para o cinema por Stanley Kubrick e, até hoje, recebe críticas negativas pela trama. A análise crítica de um filme não deve ser considerada através de uma perspectiva moral, então não estou falando sobre nada disso. É inclusive um ponto forte que o longa tenha andado nesse fio, brincando com o perigo e os limites e trazendo o extremo desconforto para quem está assistindo, podendo até estreitar a relação entre espectador e Leon. A trilha sonora e mixagem de som tem acertos específicos, mas na maior parte do tempo são bem artificiais e deixam a manipulação explícita em cenas mais sentimentais. A cena em que o design de som funciona muito bem é no confronto entre Mathilda e Stansfield no banheiro. Quando o silêncio entra e percebemos o perigo que a protagonista (por que não?) corre, os planos mais abertos dão lugar a outros mais fechados enquanto Stansfield se aproxima da menina e a ameaça, trazendo junto de tudo isso uma música atmosférica e sombria que vai crescendo aos poucos conforme o perigo cresce também, e vamos vendo Mathilda se dando por vencida, chorando enquanto o olhar de psicopatia de Stansfield praticamente não pisca e ele mexe no rosto da personagem indefesa que não poe fazer nada. Esse é um momento bem tenso. Outra cena que é um ponto forte é a que Leon vai ensinar Mathilda a ser uma sniper. A quebra de expectativa é brilhante. Apesar disso, é uma obra que desliza na maior parte do tempo, não encontra uma direção certa e fica perdida. Um filme com ambições de ser um drama comovente que parece um filme medíocre e infantilizado de super heróis.
De longe, sem dúvida alguma, o pior da franquia até aqui (misericórdia por nós, que esperamos pelo quinto filme com o maior ponto de interrogação na cabeça). Mais uma vez, Indiana é sequestrado por um inimigo dos Estados Unidos para ir atrás de algum artefato. Na primeira metade, mesmo com alguns problemas corriqueiros que são encontrados na volta de grandes franquias do cinema, como a apresentação do protagonista feita da forma mais idólatra possível e com diálogos funcionando com um fan service barato, ainda consegue remeter aos filmes anteriores com cenas de ação bem dirigidas e improváveis. A melhor cena de ação da obra é a perseguição de carro no começo. Essa cena é totalmente divertida, desde o encontro entre Indiana e Mutt na cafeteria, que tem piadas visuais bem engraçadas e uma condução muito boa envolvendo o design de som e a abertura dos planos, que denotam juntos o momento em que a conversa torna-se mais íntima e centrada em um assunto particular entre os dois, fazendo isso com a diminuição do volume do barulho das pessoas que estão em volta e colocando planos mais fechados nos rostos dos dois personagens. O roteiro consegue trabalhar causa e efeito principalmente quando se trata do personagem de Mutt, que acabou de ser apresentado ao público e precisa de uma história por trás que justifique suas ações no filme. Mas nem sempre é assim, aquele pente é caricato demais até pra um filme de aventura como esse. A história começa a ficar chata com as explicações do significado daquele crânio alienígena por parte dos comunistas, construindo uma narrativa muito mais explicativa do que costumava ser e com menos humor, e piora quando temos a volta da personagem Marion Ravenwood, que adiciona um drama e discussões de relacionamento entre ela e Indiana que ninguém pediu. E piora ainda mais (daqui é só ladeira abaixo) quando descobrimos que Mutt é filho de Indiana Jones. Tudo de mais clichê que o filme poderia fazer em relação a volta de um personagem consagrado do cinema ele faz. A boa parte de causa e efeito também aparece na função que o crânio tem de "expulsar" determinados corpos de perto dele. Da metade para o final, onde tudo começou a dar errado, temos as cenas de ação na Amazônia que, em 2008, conseguem ter efeitos visuais menos convincentes do que em 1981, ano do primeiro filme da franquia. O CGI é ruim e tira o espectador dos momentos que, nos filmes anteriores, eram o ponto forte. A fotografia mais escura também destoa muito nas cenas dentro dos templos. Quando chegamos ao final, tudo já foi pro saco. A história do "agente triplo" e o desfecho daquele artefato são patéticos. Em "Templo da perdição", por exemplo, fica muito claro que a pedra recuperada na Índia era apenas uma parte da real busca feita pelo professor arqueólogo. Ao encontrar a pedra, ele também achou as crianças raptadas que estavam sendo escravizadas e as libertou. Aqui, ele leva o crânio até onde precisa, acontece uma doideira alienígena, uma galera morre e é isso. Termina falando alguma coisa sobre a "busca pelo conhecimento". É isso. De repente ele se casa com Marion e pronto. Ela apareceu do nada pra se casar com ele de repente. Aliás, uma das falas entre os dois é completamente ridícula: "elas não eram você". Um frase de efeito construída da maneira mais galhofa possível. Não tinha nenhum motivo pra mexer na ótima trilogia de Indiana Jones, ainda mais se era pra fazer algo tão preguiçoso e sem a essência dos filmes originais. Inclusive, esse Shia LaBeouf cheira a filme ruim, hein?
Filme enorme pra uma história cansativa por causa das repetições da sua narrativa. O roteiro é estruturado quase inteiramente em relembrar o passado trazendo os protagonistas adultos que passam cerca de uma hora e meia lidando com acontecimentos do primeiro filme (contando com cenas inéditas das crianças) que entram em contato com o que aquelas vivem no presente. São cenas que supostamente deveriam ser assustadoras, mas passam apenas como um apanhado de terror genérico da década de 2010 totalmente desconexo, tentando implantar nuances aos personagens dentro desse filme, pra gerar uma coesão apenas com as 2 horas e 50 minutos de duração. A continuação não sabe se aproveitar de elementos do longa anterior para seguir em frente a partir daquilo. Os roteiristas sentem que são necessários flash backs ou novas cenas da infância. Não existe uma coesão narrativa entre os dois filmes e a segunda parte torna-se entediante pelo roteiro mal estruturado e pelas cenas extremamente previsíveis que compõem essa história. Pra ser justo, a única personagem que cresceu foi Beverly, traumatizada pelos abusos do pai e convivendo com outro tipo de violência no presente. O humor é fraco. A cena do reencontro dos personagens no restaurante chinês, no momento em que Richie, comediante de stand up (do nível medíocre que estamos acostumados), faz piadas imaturas e completamente banais para o público entre 11-14 anos, motiva risadas bizarras da maioria deles e dificulta a identificação que aquele momento almejava. Mas já no final dessa parte do restaurante, quando após alucinações o grupo começa a quebrar tudo e gritar, há uma piada bem engraçada. Mas o humor decente e com bom timing vive de lampejos dentro do filme. A direção também exausta o público com o uso de técnicas repetidas para criar uma mesma sensação em diversas cenas. Falando especificamente do plano holandês, usado para expressar desorientação, podendo ser pelo medo, loucura ou os dois em alguns casos aqui, durante várias cenas percebe-se o uso excessivo dele. Quando Henry Bowers está fugindo do manicômio (doideira!), a câmera faz uma tombada para a diagonal no último plano - e a montagem usa esse movimento muito bem na sequência, mostrando outra cena que se inicia saindo daquele ângulo tombado da cena anterior para o ângulo a ser usada naquele plano -, e mais tarde em várias cenas com Pennywise até o terceiro ato. Os efeitos visuais são brilhantes na hora de criar uma montagem fluida, como na cena em que o céu noturno se transforma na parte debaixo de uma mesa de vidro onde um quebra-cabeça está sendo montado. Porém, os personagens feitos pela computação gráfica são pouco convincentes e tiram o espectador da cena, dando a impressão de aqueles monstros que deveriam ser aterrorizantes se assemelham a um Space Jam, com cartoons de desenhos animados sendo integrados num universo de live action. O "terror" que essas piadas conseguem é, no máximo, com alguns poucos jump scares que não são previsíveis e com outros extremamente apelativos. Um filme de terror tentar assustar alguém com jump scares como o da cena da estátua do lenhador, é equivalente a um comediante realizar seu material fazendo cócegas no público alvo. Inclusive, Pennywise é mais engraçado do que assustador e fica complicado julgar algo desse tipo como bom ou ruim. Claro que a primeira vista é péssimo para um filme de terror fazer um vilão que não é ameaçador, mas quando o palhaço aparece ele rouba a cena. Mesmo no primeiro It, de 2017, Bill Skarsgard realiza um trabalho com alguma proximidade cômica, mas ali conseguiu também amedrontar. It: Capítulo Dois não é péssimo, mas sua narrativa tediosa e um roteiro insípido produzem, na melhor das hipóteses, algo medíocre.
Os figurinos têm valor narrativo de verdade (como deve ser sempre). A mulher com quem o personagem Paul Varjak tem um "caso" por interesse, vivido por Patricia Neal, sempre apresenta-se com cores frias e escuras. Em determinados momentos, Mr. Faileson, o caso de Paul, aparece vestindo uma única peça vermelha em seu figurino com medo de perder a relação estabelecida com ele, quando suspeita que seu marido tenha descoberto tudo, porque mesmo tendo um relacionamento pouquíssimo romântico, ela ainda sente atração por ele obviamente. Holly Holightly, interpretada por Audrey Hepburn, aparece no começo do longa vestindo predominantemente peças monocromáticas em branco ou preto, enquanto ainda vive a procura de um "sugar daddy" com quem possa se sustentar. A partir do momento em que Holly é rejeitada por Rusty Trawler e sai num outro dia com Paul, ela começa a vestir peças com cores mais quentes como laranja e vermelho. Essas cores aparecem no filme como elemento de paixão, amor, seja ele pela pessoa ou estritamente carnal, então quando ela veste o vermelho ela está finalmente sentindo aquilo pela primeira vez. Como Holly é uma personagem mais aberta quanto ao que sente, o tom de suas roupas é mudado por completo e não apenas adicionando pequenos detalhes em alguns acessórios como em Varjak, por exemplo. Na cena em que ambos estão na loja indo roubar alguma coisa, o design de produção também é majoritariamente formado por cores quentes, revelando um sentimento vívido e até malicioso daquele momento, principalmente para Paul, que nesse passeio com Holly pela cidade aparece com listras vermelhas em sua gravata e um lenço da mesma cor no bolso do paletó. Mais tarde, quando Holly está se preparando pra ir ao Brasil com José, ela demonstra um verdadeiro ânimo enquanto ouve um disco que fala português, possui cartazes referenciando ao país e tricoteia uma roupa da cor vermelha. Isso denota o sentimento real de que dessa vez ela poderia estar vivendo um amor de verdade com José. Mais tarde ela vai verbalizar isso em uma cena com Paul, mas essa cena já havia deixado isso bem claro. A movimentação de câmera é espetacular e um elemento fundamental para que os planos sequência funcionem com a ótima fluidez. O diretor manipula o olhar do espectador constantemente e sabe como posicionar o que quer mostrar em cena. Os melhores momentos que retratam isso é a cena da festa na casa de Holly.
Uma dica pra assistir o filme é tentar deixar o máximo possível o anacronismo de lado pois, do contrário, você larga nos primeiros 10 minutos com a cena do vizinho asiático do andar de cima. É BASTANTE desconfortável.
Terminando a trilogia de Coppola e trazendo o desfecho inevitável para Michael Corleone, esse é um bom filme, que apesar de defeitos inéditos em relação aos dois primeiros filmes como diálogos expositivos, um voiceover estranhíssimo logo no começo e algumas raras cenas onde a mise en scène é levemente comprometida por cores intrusivas que não harmonizam com o resto da imagem, conclui a trajetória com os aspectos narrativos fundamentais que fizeram The Godfather uma obra prima do cinema.
As duas histórias contadas paralelamente servem para traduzir as diferenças entre Vito e Michael Corleone, e ao mesmo tempo explicar porque a vida da família Corleone era mais harmônica e resolvida com Vito e tornou-se mais rachada e conflitante durante os anos 50, nas mãos de Michael. A personalidade mais "acolhedora" e analítica de Vito não tem muito a ver com a tecnocracia e frieza do seu filho.
A melhor edição que já vi em qualquer filme, além de uma das melhores maquiagens, atuações, direção e óbvio, roteiro. Dentro das quase 3 horas de duração, existem vários arcos e todos fazem o espectador ter real curiosidade e interesse. Mas não é somente por isso que o longa tem um andamento tão prazeroso. Ele parece ler a mente de quem está assistindo e colocar a cena que o espectador quer ver naquele momento, qual é a parte da história que ele quer que seja contada naquele instante. Ele sacia as dúvidas que ele mesmo plantou durante o filme na hora certa. Quando todo mundo está ansioso pra saber determinada parte do enredo, ele conta exatamente aquele pedaço que o público quer ver. O ritmo é tão perfeito que chega a ser sobrenatural. A direção sabe acentuar a violência e tornar os momentos "passivos agressivos" inquietantes. Tanto as cenas em que
Luca Brasi é morto, onde a câmera mostra um membro da família Tattaglia agarrando a mão de Brasi por cima e prenunciando o ataque ao infiltrado dos Corleone - que aconteceu dois segundos depois dele fazer isso -, como na incrível cena em que Michael Corleone assassina dois membros dos Tattaglia num restaurante. Nesta cena, a insegurança do jovem Corleone não é demonstrada apenas na atuação impecável de Al Pacino, mas na edição e mixagem de som, música e fotografia. Quando ele senta de volta a mesa após pegar uma arma escondida pela família no banheiro do restaurante, a hesitação do personagem combina com o barulho confuso que o desconecta daquele lugar e deixa-o apreensivo. Mas nessa cena o mais incrível é o momento em que ele finalmente decide agir. A câmera fica parada no seu rosto perdido, olhando para o nada e com o corpo tenso, e então, as cores mais quentes e convidativas somem da cena e dão lugar a uma face esbranquiçada de pânico e ansiedade com um escurecer ao seu fundo, caracterizando o limite que ele chegou. É aí que Michael Corleone atira e foge do local.
The Godfather é sutil, brilhante e, por isso, também é entretenimento puro para todos que têm bom gosto. Uma verdadeira obra prima.
Está muito longe de ser apenas "mais um filme de máfia" do Scorsese. Dentro desse estilo é o mais denso que o diretor já produziu. É existencialista, reflexivo e possui uma mensagem diferente do que todos os outros que ele já fez. Se normalmente os filmes com homens poderosos que se aproveitam de uma forma ilegal para fazer montanhas de dinheiro trazia uma mensagem de como aquilo não valia a pena, The Irishman vai além. Não só deixa claro as consequências individuais óbvias já retratadas em diversas obras do cinema como mostra um outro nível de miséria particular para as escolhas erradas feitas por aqueles personagens e, acima de tudo, o quão banal é tudo isso que vivemos. Essa é a principal ideia e é traduzida ao espectador com elementos como anotações marcadas em diversas pessoas envolvidas no crime organizado de como elas morreram tempos depois e até pela trilha sonora original extremamente sombria. Um momento que esclarece a insignificância que o filme quer mostrar é na última cena,
em que Frank Sheeran, já vivendo em um asilo, pergunta a uma das enfermeiras algo sobre Jimmy Hoffa, que na sua época era uma das pessoas mais importantes e influentes no cenário nacional, e a mulher não faz a menor ideia do que Sheeran está falando.
The Irishman encerra uma quadrilogia da máfia de Scorsese que parece ter sido arquitetada para ser dessa forma desde o começo. Mean Streets (1973) conta a história de agiotas cobrando dívidas em sua região; Goodfellas (1990) é a ascensão no meio do crime; Casino (1995) mostra a vida de grandes mafiosos; e em 2019, as proporções são gigantescas. Hoffa, Buffalino, Bruno, todos os Tonys... esses marcaram os livros de história. De alguma forma eles fizeram isso.
Como quase sempre em filmes religiosos, muitas alegorias visuais, principalmente com as pinturas nos templos. Não só com essas obras, o filme fala muito apenas com o que é mostrado na tela, seja pelo figurino, iluminação, posicionamento e movimentação das câmeras. No figurino, é bastante óbvio que as cores opostas que vestem os papas refletem também o antagonismo dos personagens que é o que movimenta a trama. A cor branca, da pureza, da paz que este carrega consigo, veste o papa Bento XVI de maneira irônica e denota a sua hipocrisia (mais tarde verbalizada entre os papas), de uma pessoa que mostra-se entendedora máxima da igreja mas não conhece os seus adeptos e mesmo assim, continua confiante de que está fazendo o certo. Por outro lado, Francisco predominantemente preto e com detalhes vermelhos, representa tanto a visão retrógrada e conservadora que líderes religiosos tinham (e ainda têm) de sua postura mais progressista, associando essas ideias como algo contra a crença cristã - logo ligando essas cores ao diabo ou coisa parecida -, como também a falta de confiança que Bergoglio tinha nele mesmo como católico, a falta de fé trazida por diversas dúvidas e injustiças que encontrava no mundo, além do vermelho ser a culpa e o sangue que carregava pelos seus atos durante a ditadura militar. Ao mostrar os templos pela primeira vez, o contra plongée é utilizada para trazer grandeza e exaltar tanto as estruturas como a divindade católica. Em um momento marcante, quando Francisco entra em uma das capelas no Vaticano, a iluminação vai esclarecendo gradativamente de um ambiente bem escuro até uma claridade muito forte revelando diversas pinturas com apelo religioso deixando o próprio Jorge Bergoglio maravilhado pelo momento, que passa a sensação de um arrebatamento em que somos mandados para o paraíso. A posição que alguns desses quadros são colocados também conversam com o espectador (como não poderia deixar de ser). Um deles acima de Bento XVI, dá a impressão de um anjo pisando na cabeça do alemão, o que parece acusatório por parte do diretor - que também faz críticas a ele com depoimentos pesados de diversos cidadãos - e soa engraçado. Em outro momento, quando em uma conversa Francisco diz que Deus também era (ou foi?) humano, uma pintura na capela de uma mão furada e sangrando exemplifica a passagem de Jesus pela terra e a colocação do papa argentino. As cores também têm um papel importante no preto e branco dos flashbacks da vida de Bergoglio nos anos 50 em Buenos Aires, quando ainda não tinha decidido se tornar um padre e nem ouvido a voz de Deus. Ao entrar em uma igreja e encontrar um padre que transmitia a mensagem divina auxiliando e colocando a missão na vida do jovem argentino que havia acabado de se tornar noivo, Francisco segue sua tarefa e dias depois termina a relação com a que seria sua futura esposa e vai atrás da sua realização espiritual. Após tudo isso acontecer, as cores surgem nos quadros que mostram o passado de Bergoglio, demonstrando a consumação do que buscava na religião. Os planos aéreos também são bastante simbólicos e evidenciam um olhar divino para a terra. Um dos melhores momentos desses planos é quando há uma movimentação de um local de classe média-alta de uma cidade para uma região mais carente salientando uma das questões mais discutidas durante o longa: a desigualdade social. Essas mostras acontecem mais de uma vez, como já na parte final em Buenos Aires. O roteiro é muito bom, os diálogos são muito bem escritos e não deixam as falas sobrando ou muito óbvias. Principalmente na primeira metade do filme, diversas questões relacionadas a igreja católica são apresentadas no primeiro encontro dos papas no Vaticano. O que a igreja prefere debater? Quais as prioridades devem ser tomadas por ela? O que realmente é importante? Qual o julgamento para os atos falhos cometidos por ela? Basicamente: como ela está parada no tempo e precisa se adaptar ao mundo. Francisco, mais liberal, argumenta com diversas mudanças morais e éticas enormes na história do catolicismo, como o celibato dos padres. Bento XVI, com visão mais reacionária, também apresenta suas opiniões embasadas nas escrituras sagradas e em frases prontas do cristianismo conservador, e que são rebatidas por Francisco tanto por respostas, como quando ele completa as frases batidas que já sabe onde vão chegar - o filme é claramente a favor de Francisco. Na segunda metade, as discussões não se expandem como deveriam em casos mais problemáticos da igreja como a pedofilia e o desenvolvimento das figuras principais também não é completamente plausível. Claro que as conversas entre os papas parecem ter efeito, mas Bento XVI não demonstra tanta abertura até chegar do ponto "A" ao "B". O seu arco é defeituoso. O de Francisco um pouco menos. Ele deixa a culpa para trás e cresce para se tornar a figura central do catolicismo. E na cena em que se apresenta no Vaticano como papa, obviamente está vestindo a roupa do papa, branca. As indicações de Jonathan Pryce e Anthony Hopkins são indiscutíveis. Dão vida e corpo aos bons diálogos. Hopkins é duro, irritado e completamente convicto de suas ideias. Ele transmite tudo isso. Pryce coloca todo o coração de Francisco em seu personagem. É calmo, sabe escutar e demonstra a incerteza e fragilidade pelo peso que carrega de tantos anos. Atuações sutis que são fundamentais e precisas. A boa direção de Fernando Meirelles não é impecável, e algumas marcas dele não são bem utilizadas, como a câmera na mão, que causa pequenos incômodos, bem como um zoom estranhíssimo feito da mesma forma. Mas além dos méritos já mencionados aqui, ele aumenta a qualidade do roteiro com truques como uma câmera fechando inteiramente dos personagens que estão falando e colocando mais tensão no momento em que precisa. Quando essa tensão passa, ele naturalmente tira o zoom do rosto de Pryce, que suspira pensativo após um debate mais acalorado com Hopkins. Os Dois Papas tem os seus deslizes, mas é uma obra reflexiva, sutil e que traz discussões necessárias para o momento atual da religião, embora tivesse potencial para se aprofundar mais.
Sempre entra um superestimado entre os melhores filmes do Oscar. [Edit: esse nem é o maior superestimado. Ford v Ferrari superou, pqp] Nos últimos anos tem sido assim, pelo menos. A imagem exageradamente cômica do Hitler não é nada inovadora (ainda mais considerando O Grande Ditador, que na década de 40 já reproduzia essa mesma ideia) e aqui não entrega nada que possa agregar a esse tipo de personagem. "Eu já vi isso antes e já vi melhor", é esse o sentimento para o Hitler de Waititi. O problema não é exclusivamente da atuação ou da concepção familiar do ditador nazista, mas também no roteiro que não entrega piadas tão engraçadas e que não soam tão inteligentes quanto o filme pensa ser. Roman Griffis Davis tem carisma, é engraçado, convence como uma criança que sofre lavagem cerebral de um governo autoritário mas que ainda está crescendo e desenvolvendo a sua pessoa, o que o torna mais vulnerável as manipulações que o governo impõe nele. Consegue construir o seu personagem como é proposto, o arco de Jojo é bem conduzido pelo ator mirim. Mas de todo o elenco, quem rouba a cena (e não poderia ser diferente) é Scarlett Johansson. Grande demonstração de como atuar em todos os aspectos. Fisicamente ela é rígida e insegura quando está triste e cheia de incertezas, além de leve e confiante quando dança e explica para o filho os valores da vida e o cenário de Segunda Guerra que o país vive para o filho que ainda não entendeu direito. Mas mesmo com essas atuações, as cenas entre mãe e filho tem diálogos batidos e que já foram usadas em diversos longas no contexto da guerra. Não há problemas apenas nisso, mas também em discussões quanto ao papel desempenhado pelo pai de Jojo na família e na guerra. A ideia do que está sendo mostrado é compreensível, mas algumas fala são expositivas, principalmente quando a mãe de Jojo vai para o canto e conversa sozinha em voz alta interpretando o pai. As escolhas musicais são irregulares. Enquanto logo na abertura a versão alemã de "I Wanna Hold Your Hand" é irônica e engraçada, associando a canção a saudação nazista, a cena em que mãe e filho andam de bicicleta em um parque não tem boa trilha sonora. Ali é feita a escolha extremamente óbvia para casar com o que está sendo mostrado em tela tanto visualmente como através de diálogos. O filme apresenta em diversos momentos falta de sutileza, em uma comédia que também não define o seu tom, horas mais pastelão e visual, (principalmente envolvendo o "fantasma de Hitler") horas com diálogos que tentam ser sagazes e conseguem em raríssimas oportunidades. Um incômodo gerado já no final do terceiro ato, e que é a síntese de como a delicadeza não é um ponto forte do filme, é um crowd pleaser exageradamente perceptível e que busca manipular o espectador de maneira clara com um "Fuck Hitler" e uma bicuda do garoto jogando a figura imaginária do ditador pela janela. Em "Inglorious Bastards", ou Bastardos Inglórios, também existem diversas partes e diálogos que estão presentes para o que deveria ser uma satisfação barata de quem assiste, mas lá o tom justifica e não deixa como algo jogado tentando alcançar picos numa história pouco agradável, porque lá o filme tem um ritmo e história que satisfaz o público. Ainda com esses diversos excessos disfuncionais, o filme utiliza bem o silêncio e consegue criar uma das poucas cenas verdadeiramente inteligentes, na cena em que
Jojo ao perseguir uma borboleta no meio da cidade se defronta com cadáver da mãe pendurado publicamente por traição. A morte dela é revelada pela simples mostra de seus sapatos pendurados no meio daquele local que o filme havia apresentado mais cedo. Essa cena na verdade é uma construção muito bem feita, que mostrou que aqueles closes nos pés de Scarlett durante cenas de dança não eram um mero fetiche a lá Tarantino.
O humor é ainda mais irregular do que o filme. Já mencionadas aqui, diversas piadas não chegam onde querem, não tem o peso e esperteza que procuram. Algumas boas ideias estão nas partes em que diversos personagens tentam entender o que são esses tais judeus, em conversas que associam os seguidores dessa religião a seres mitológicos bizarros. O terceiro ato, mesmo com o filme já conduzido a um local de tragédia na vida do protagonista, tem um dos momentos mais engraçados, principalmente na invasão americana (sempre exaltada de forma mais heroica e fundamental do que realmente foi) e russa. Jojo Rabbit é sobre amadurecimento e compaixão sem deixar de ter uma narrativa e estrutura muito convencional. Com diversas decisões equivocadas, não é um desastre completo, mas entrega um filme fraco e que sempre parece sentir falta de alguma coisa. Talvez um roteiro mais consistente.
Christopher Waltz está sensacional. E o Brad Pitt? Tem horas que a abordagem mais caricata (e até cartunesca) de um "yankee" é perfeita, e há outros momentos em que parece se exceder, mas o importante é que está ligada completamente com o que é esse e a maioria dos filmes do Tarantino: uma hipérbole. Além do filme ter uma história pesada, é principalmente divertido e exagerado, o que não necessariamente significa algo ruim. Os excessos do diretor estão não apenas no roteiro e história, mas nas atuações, ação e na música. Majoritariamente na música. Há diversas partes nesse filme que se estivessem nas mãos de outro diretor provavelmente não teriam tanta música. É um cineasta mais barulhento do que o convencional. Inglorious Basterds é a experiência cinematográfica mais satisfatória que Tarantino já proporcionou, seja pela qualidade incontestável da peça ou por assistir nazistas sendo humilhados e queimando até a morte.
Deixa você tenso, te congela. Em diversos momentos fiquei arrepiado e sem reação. Esse é o Coringa mais impactante dos cinemas. A violência dele é mais chocante, muito em razão do contraste entre os movimentos leves e das danças que ele faz com a ferocidade que agride os seus inimigos. A sua personalidade que é moldada durante o filme também ajuda nesse aspecto. A fragilidade que ele expressa fisicamente e nas falas tornam toda violência mais forte. Esse elemento já havia sido usado em Laranja Mecânica de Stanley Kubrick e é revisitado aqui. A ideia principal do filme também revisita o clássico de 1971, uma vez que mostra a história da perspectiva do vilão caótico e tenta fazer o público entender o seu lado. Grande filme.
Não Olhe para Cima
3.7 1,9K Assista AgoraOs filmes espertinhos de Adam McKay são intragáveis. Piadas totalmente previsíveis dentro de uma obra com personagens bastante caricatos que, paradoxalmente, procuram fazer com que a gente tenha mais raiva deles do que, de fato, achar engraçado. Isso porque os personagens de DiCaprio, Jennifer Lawrence e Rob Morgan representam a razão em meio ao caos, o que cria uma conexão com o espectador que assiste ao absurdo estilizado de McKay. Mas, independente dessa ligação, o humor exagerado não possui material para se sustentar nas mais de 2 horas de filme por causa da sua superficialidade. Irônico, já que os trabalhos do diretor sempre possuem um ar arrogante - que não é diferente aqui. Crítica social f*** de um adolescente birrento.
Peter Pan
3.5 495 Assista Agorae o capitão gancho? que perdeu a mão, foi tirado pra merda e ainda saiu como vilão?
O Expresso Polar
3.6 633 Assista AgoraA inexpressividade das animações de Expresso Polar representa o filme de forma geral. Uma obra vazia, que sofre com artifícios tecnológicos na tentativa de atrair o público criando uma espécie de parque de diversões nas sequências em que a câmera toma uma perspectiva subjetiva ao olhar dos personagens enquanto eles passam por diversos lugares com o trem descontrolado. Diversas dessas cenas não tem nada de diferente de uma atração do “cinema 9D” ou coisa do tipo. O filme se apoia nesse apelo visual que nunca é inteiramente alcançado e se torna desgastante quando o espectador nota a repetição preguiçosa da obra.
Essa liberdade na decupagem e movimentos de câmera é possível por se tratar de uma animação, mas, como se isso não bastasse, os personagens possuem traços muito semelhantes a um humano real, o que deveria, supostamente, trazer maior contemplação à essas cenas mirabolantes. Porém, além disso não funcionar nesse aspecto, também gera uma estranheza pela característica desses mesmos personagens, principalmente em momentos em que é difícil saber qual expressão está sendo proferida por eles. A animação de Expresso Polar é péssima.
Se o filme não consegue alcançar o seu principal objetivo (o apelo visual) outros pontos fundamentais também deixam a desejar. A história não tem nada substancial, resolve o ceticismo do protagonista com uma resolução extremamente superficial e é cheia de personagens que não têm nada a acrescentar. É possível fazer um filme sem um conflito evidente, mas aqui nada é desenvolvido ou gera um engajamento mínimo do espectador. Não existe uma trajetória em que vemos o crescimento desses personagens e não há nada que transmita algo sensorialmente.
Um dos campeões de delírios cinematográficos da infância de diversas pessoas leva esse título por várias razões. Não só pela sua temática onírica, mas, especialmente, por sua animação bizarra, a estranheza de seus personagens e trama nada inspiradora, que transforma este em um trabalho completamente ignorável.
Drive-Thru: Fast Food da Morte
1.9 235Quando você entende o lado patético do filme (e não demora muito a acontecer), ele rende muitas risadas com as atuações absurdamente exageradas, decisões e diálogos imbecis de seus personagens, tudo isso com uma crítica a volta do conservadorismo no cenário político americano, representado na figura de George W. Bush - configurando até mesmo numa piada que faz duplo sentido com o seu nome -, denotada na cena em que a protagonista vai prestar depoimento na delegacia à um policial com o ceticismo de "n" filmes de terror (uma figura extremamente estilizada para causar humor). Além disso, comentários de Mackenzie sobre veganismo e política deixam essa mensagem mais explícita. Dessa maneira, a obra vai remontando a estupidez e hipocrisia do conservadorismo presente em slashers dos anos 80 e até mesmo fora das telas de cinema.
Porém, o filme não se sustenta em seus míseros 83 minutos, isso porque as sequências de perseguição e eventuais mortes não tem nenhum apelo visual que engaje o espectador. Além de montagem e movimento de câmera tenebrosos, a trilha sonora não presta nenhum serviço na construção de uma atmosfera decente para esses momentos.
Fica ainda pior quando a história toma um rumo em que conta os traumas do assassino, se colocando muito mais em contato com os slashers dos anos 2000. A tentativa de expandir esse aspecto narrativo mais dramático (não sei se é ideal chamá-lo assim) tira consideravelmente o peso daquilo que estava sendo construído no primeiro ato e era o ponto forte.
É possível argumentar que, ao fazer essa conexão com os seus contemporâneos, tenta mostrar as semelhanças do passado com o presente, mas o resultado é uma obra perdida em suas próprias ideias, sem nenhum apelo, com uma monotonia inacreditável.
Lenda Urbana
2.8 764O humor ácido e desprezível proferido por futuras vítimas (seguindo convenções clássicas do slasher) funciona, e o filme parece seguir esse tom, até mesmo com a trilha sonora não sendo tão sombria e "forte" em determinadas partes das cenas de ação, remetendo à seu pai, Pânico. Mas o lado dramático introduzido breca essa face cafajeste que produz os melhores momentos do longa e deixa tudo mais insólito, com a sensação de que não há um desenvolvimento adequado das ideias propostas.
Mesmo com suas inconsistências, a história é operante e há mortes bastante criativas, com destaque para um fura pneu e alguém forçado a beber algo - morte muito bem desenvolvida desde o começo da cena.
PS: O que me incomodou MESMO foi aquela fala final. Fica parecendo que o Paul foi o assassino de 25 anos atrás...
Teocracia em Vertigem
3.5 147Não é só sair jogando um monte de referência misturada com a temática bíblica que o seu filme vai ficar engraçado.
Batman
3.5 831 Assista AgoraSe hoje estamos cansados de filmes de heróis entupindo a agenda dos cinemas ao redor do mundo, com franquias cada vez mais megalomaníacas, na década de 80 havia um número muito mais enxuto de adaptações de super heróis dos quadrinhos para as telonas. Até mesmo na TV, onde era mais comum, não tínhamos essa abrangência toda que temos atualmente. Então é importante considerar esse cenário onde a única grande franquia de um herói das HQs tinha sido a do Superman de Christopher Reeve, que começou com o memorável filme de 1978 dirigido por Richard Donner, para entender o que o Batman de Tim Burton significou em 1989.
Apesar da existência do filme gerado a partir da série de TV de 1966, era a primeira vez que um trabalho de audiovisual de longa metragem interpretava o Cavaleiro das Trevas de uma maneira mais condizente com o seu apelido. É difícil pensar em alguém mais apropriado para construir uma Gotham City nos cinemas do que Burton. O diretor tem um grande apelo visual em praticamente todos os trabalhos que fez, e sua abordagem inspirada no expressionismo alemão é totalmente coerente ao universo do personagem da DC Comics. O design de produção é espetacular, cria uma cidade suja, ressaltada pelas cores tanto de seus edifícios góticos, ruas e carros como pelo figurino dos habitantes quando é apresentada logo no início. Cinza, marrom, poucas luzes e um movimento considerável de pessoas que deixa tudo ainda mais poluído, inclusive sonoramente, mostrando a dificuldade de um personagem conseguir um táxi no centro de Gotham e sendo assaltado logo em seguida por ter que cortar caminho em um beco.
A partir daí também somos apresentados à criminalidade de Gotham e ao tom do filme, mais violento do que o comum dentro do gênero quando foi lançado. Quando vemos o Batman de Michael Keaton pela primeira vez, ele surge como uma ameaça para os bandidos em cena como se fosse um vampiro em filme de terror, gerando uma expectativa de como ele vai enquadrar os criminosos enquanto vemos sua silhueta em um fundo que antecipa sua chegada por trás deles. Então, após umas porradas bem dadas, o personagem se expõe para quem ainda não tinha reconhecido: “I’m Batman!”. Uma boa introdução para o alter ego do bilionário Bruce Wayne.
A trama envolve Jack (Jack Nicholson), um criminoso que, após ser derrubado acidentalmente por Batman em um tanque com substâncias tóxicas, se transforma no Coringa e vira chefe do crime na cidade. Em todos os filmes dessa franquia, os vilões se sobressaem. Aqui, Nicholson cria uma versão bastante coerente do que havia sido visto até então do Palhaço do Crime nos quadrinhos. Ele rouba a cena, é engraçado, com a infantilidade e besteiras características do personagem (a cena em que ele rouba o sinal de televisão é o Coringa clássico), imprevisível, sendo capaz até de matar inesperadamente o capanga que disse ser o seu “número 1”, e por isso, ameaçador dentro daquele universo. É perceptível o quão lunático é esse Coringa, seja pela risada, trejeitos ou até pela maquiagem que forma um sorriso estranhíssimo em seu rosto, e se esse cara tem tanto poder e lidera a maior parte do crime em uma cidade tão corrupta, ele é verdadeiramente perigoso. E é curioso a forma que Nicholson constrói essa aura de psicopata mesmo sem deixar seu personagem se exceder e parecer que está à beira de qualquer sanidade a todo o momento. Ele consegue contrastar partes passivo agressivas com outras em que chuta o balde completamente. A primeira cena em que Jack é de fato o Coringa há uma antecipação semelhante ao que vemos no começo com Batman, com o palhaço saindo do escuro e revelando, aos poucos, sua face deformada, que aparece em um contra plongeé acompanhada de notas musicais fortes e um movimento de câmera em direção a ela que realçam a presença dele no filme – tão importante quanto aquele que deveria ser o protagonista. Aliás, nos créditos iniciais o nome de Jack Nicholson é o que aparece primeiro. E assim como conhecemos o modus operandi de Batman em sua primeira cena, vemos o mesmo com o Coringa, que mata aquele que era o então chefe do crime a tiros, descarregando toda a sua munição nele enquanto se diverte fazendo diferentes poses e rindo depois que tudo acaba. Coringa clássico.
Dentro da história, também temos Vicki Vale, jornalista e fotógrafa que se mudou para Gotham em busca de uma matéria sobre o Batman, por quem é fascinada. Após ir a uma festa na mansão de Wayne, onde esperava falar com a polícia e encontrar pistas sobre o vigilante da cidade, ela acaba se fascinando também pelo homem por trás da máscara escura. A personagem vivida por Kim Basinger tem uma importância na história, mesmo que muitas vezes seja usada apenas como a motivação para o herói ir salvá-la no topo de uma catedral, mas demonstra ser muito inteligente, inclusive nesta mesma cena. Porém, a relação entre ela e Bruce é um ponto fora da curva dentro do filme e deixa uma sensação de que se o roteirista quisesse, poderia encontrar maneiras diferentes de resolver o conflito principal da trama entre Batman e Coringa.
Vicki Vale é pouco desenvolvida e não vemos nada além de uma jornalista apaixonada por Bruce e Batman. Ainda há uma tentativa de criar um background que melhorasse a relação do público com ela quando ela está na cozinha de Wayne, mas é tudo muito raso. Só que mais grave do que isso é perceber que não só ela, mas o personagem principal também não é ninguém. Quando termina o filme continuamos nos perguntando: “quem é Bruce Wayne”. Não há nenhum desenvolvimento significativo para ele além de mostrar o caso do assassinato de seus pais. Inclusive, uma coisa boa que o filme faz é não tratar a origem tão conhecida do herói como algo inédito. Ninguém precisa ser introduzido a como o Batman “nasceu”. Pode-se argumentar que esse aspecto estabelece um mistério inerente a figura de Wayne o que faria todo sentido, dada a sua natureza sigilosa, mas acaba formando apenas um protagonista vazio. Ainda mais se pensarmos que nesse filme, o segredo da bat-caverna é revelado por Alfred (Michael Gough) sem mais nem menos para a jornalista que acabara de conhecer Bruce. O único personagem que cativa e tem algo a mais a oferecer é o Coringa.
Mesmo tendo a fama de ser um dos primeiros filmes de herói com uma aura mais sombria (talvez o primeiro de sucesso, numa escala tão grande), é necessário lembrar do humor presente aqui. Esse lado cômico é manifestado em vários momentos, com destaque para as já citadas cenas do vilão de Nicholson, mas também com piadas visuais mais sutis que podem passar despercebidas pelo público em geral. Um dos melhores exemplos é na festa na mansão Wayne, no começo, em que ainda não havíamos visto Bruce, apenas o Batman, com sua máscara, e enquanto o bilionário larga coisas pelo salão, observando a jornalista que chamou sua atenção, um mordomo (Alfred, que ainda não tinha sido apresentado) vai recolhendo tudo o que ele deixa pelo caminho nas suas costas. Não é só engraçado como também dá indicativos de quem é aquele homem.
Vivendo de altos e baixos, com uma trama simples e personagens pouco desenvolvidos, o Batman de 89 se sustenta pelo trabalho incrível da criação daquele universo, – com cenários espetaculares que renderam um Oscar de Direção de Arte em 1990 – figurinos, maquiagem, um vilão magnético e o ineditismo de uma obra que contava a história do herói com um teor adequado ao que os fãs do homem-morcego estavam acostumados.
A Hora do Pesadelo
3.0 1,5K Assista AgoraFreddy Krueger não é Robert Englund no remake de A Nightmare On Elm Street, de 2010. Da mesma forma, esse é um trabalho que não representa nada do que a franquia produziu em todos os seus outros oito filmes. Pra começo de conversa, quais eram as chances de um dos vilões mais icônicos do terror no cinema que ficou imortalizado com a imagem e atuação de Englund funcionar com outro ator que não fosse ele? Se antes tínhamos uma figura ameaçadora, que atacava suas vítimas com jogos psicológicos e que também trazia com isso um humor que variava entre algo mais pesado e às vezes mais bobo, mas sempre engraçado e marcante, acompanhado de uma produção perfeita envolvendo maquiagem e figurino brilhantes que formavam um personagem assustador que ao mesmo tempo possuía uma relação próxima ao público, agora temos uma atuação fraca de Jackie Earle Haley prejudicada pelos péssimos diálogos e ideias introduzidas na história, que criam um Freddy Krueger tarado que abusava de crianças antes de se transformar no bicho papão que invade sonhos. Isso somado ao visual pobre e pouco expressivo feito em CGI do seu novo rosto resulta em um vilão indiferente. Não é carismático e nem dá medo. É chato. Krueger é a alma de toda a franquia e se o filme tem uma versão tão ruim do personagem, praticamente metade do trabalho é comprometido.
Mas seria bom se os problemas fossem tão exclusivos para essa versão de Freddy Krueger. O início, na cafeteria, deu alguma esperança de que poderia ser um filme incompreendido, quando a fotografia e iluminação da cena apresentam uma luz do lado de fora que alternava entre vermelho e verde, remetendo ao suéter do vilão e trazendo a cor vermelha como sinal de perigo. Entretanto, isso durou alguns poucos minutos até que chega o primeiro estrondo desnecessário. Todo o terror que esse filme busca é apoiado em jump scares que aparecem literalmente do nada, com uma parede sonora capaz de deixar o espectador surdo. Com exceção de uma cena, todos os sustos desse filme são ou totalmente previsíveis ou extremamente apelativos e sem nenhuma coerência dentro da cena. A cena do sótão, na primeira metade, é um exemplo claro do que é o horror desse filme. Não existe construção, a montagem e direção colocam uma sequência de planos aleatórios e, de repente, Freddy aparece com uma poluição barulhenta por segundos e acaba a cena. A melhor cena de susto é quando uma das personagens se levanta da cama, a câmera mostra a altura de seus pés, ela vai ao banheiro e é esperado o clichê do espelho, que não acontece, ela volta a cama, demora um pouco antes de deitar, dando indício de que pode ser atacado pelo pé que havia sido mostrado anteriormente, mas nada disso acontece. Essa é uma boa cena, que consegue quebrar a expectativa colocando diversas possibilidades e surpreendendo com sua conclusão. Caso isolado.
Mas o que causa mais revolta é perceber que os roteiristas escreveram esse filme com a maior preguiça possível. Existem furos enormes aqui que constituem uma trama desconexa. Em determinado momento, Freddy diz que se alimenta da memória de suas vítimas, só que aparentemente nenhuma das crianças tem qualquer recordação dele. Quentin descobre em uma cena que Krueger está indo atrás deles porque eles sabem dos abusos que ele cometeu e que ele não tinha a menor chance de ser inocente, como os pais das vítimas suspeitavam e se culpavam. Só que foi Freddy quem começou os ataques no filme e, como já mencionei, eles nem sabiam quem ele era quando foram atacados. A evidência maior da preguiça de quem escreveu esse negócio são as inúmeras ideias utilizadas em diversos filmes da franquia. A cena da banheira, o suéter trazido para a realidade que levou os protagonistas a tentarem colocar Freddy no seu mundo, personagens se queimando pra ficarem acordados, a cena final da mãe... E não é um uso referencial, na grande maioria das vezes são simples cópias de conceitos que já existiam nos outros filmes. Não há uma preocupação em fazer algo novo de verdade. A abordagem de Freddy é a única grande mudança no roteiro e mesmo assim desempenha uma função muito parecida com o que havia antes. Pra comprovar isso, o filme original queria um Freddy Krueger que tivesse abusado de crianças, mas por causa de casos da época, Wes Craven achou melhor deixar isso de lado.
Outro problema grave do roteiro é a falta de foco na construção de uma história sólida, que gera personagens vazios e sem nenhuma química. A cena do beijo entre Nancy e Quentin é totalmente anticlimática porque não vemos uma relação sendo formada durante o filme e o espectador não poderia se importar menos com aquilo.
Além da péssima história, também é muito mal contada (se isso ainda não ficou claro). A estrutura narrativa é incoerente. Um exemplo claro disso é na cena da biblioteca. Após um pequeno pesadelo de Quentin com mais um susto telegrafado, ele acorda com Nancy que foi até ele, pois precisavam conversar. Ao invés de seguirmos essa cena e acompanharmos o diálogo entre os dois, vemos outra cena de morte, susto, sangue e Freddy Krueger com uma vítima dentro de uma cela na cadeia, porque a intenção parece ser criar um filme que deve ser assustador o tempo todo, nem que pra isso seja preciso deixar a história de lado. E nenhum dos dois dá certo. Os primeiros 30 minutos são praticamente um compilado de jump scares mal feitos.
A fotografia também não tem sentido e soa até meio esquizofrênica (não podendo ser usada como uma metáfora para a trama, bem longe disso). Uma lente grande angular o tempo todo, mudança do plano de foco sem razão nenhuma e com imenso exagero, assim como movimentos e zooms completamente equivocados e que não mostram nada, como na cena da piscina.
O final de Freddy é tão vagabundo quanto quase tudo que temos nesse filme. É uma resolução qualquer pra ter um final. E a cena da mãe, assim como em 1984, deixou aberto para continuações. A diferença é que agora acabamos implorando pra que não aconteça.
A Hora do Pesadelo 6: Pesadelo Final, A Morte de …
3.0 376 Assista AgoraBrian May, Iron Butterfly, Sepultura e Alice Cooper.
Algumas das poucas coisas boas desse filme.
Cujo
3.3 439 Assista AgoraSPOILERS
Quando a sinopse de um filme de terror dos anos 80 fala sobre um cachorro assassino eu esperava algo com estilo mais trash e engraçado. Mas muito pelo contrário, Cujo é um filme de terror genuíno.
A história é construída sem pressa e desde o princípio entramos no que o filme está propondo. A primeira cena mostra um coelho inofensivo, fofinho e que conquista a simpatia do público com uma trilha sonora bastante encantadora enquanto os planos mostram o animal de perto, fortalecendo os detalhes do seu rosto e depois o que ele vai fazendo na floresta ensolarada. Imagens adoráveis. E num mesmo plano em que vemos o coelho, a câmera recua um pouco e revela Cujo, com a visão centralizada atrás das pernas abertas do cão e de frente para o coelho, como em um faroeste, mostrando o seu alvo. Nesse momento a trilha sonora fica muito mais sombria e, contando com a diferença enorme do tamanho entre os animais destacada no quadro, entendemos que aquele cachorro pode ser uma ameaça. Em seguida, na perseguição de Cujo para o coelho, que acaba com ele preso no tronco da árvore adquirindo os seus poderes de um morcego, vemos pela primeira vez a câmera subjetiva na visão de Cujo. Esse detalhe é muito importante para a narrativa e mais tarde causa um momento muito forte no filme que logo vou escrever aqui.
Após isso, somos apresentados a família Trenton, especificamente a Tad, que tem medo de um monstro em seu armário e é acalmado pelos seus pais, em uma cena que denota a união entre o casal pelo bem do filho. Depois, quando descobrimos o caso de Donna com Kemp ficamos surpreendidos, principalmente por termos visto uma imagem tão positiva anteriormente. Mesmo que as cenas com Kemp entregando o cavalo de madeira de volta para a casa dos Trenton tenha causado pequenos estranhamentos que são entendidos depois por causa dessa relação extra conjugal, não passava pela nossa cabeça que o casal vivesse aquela situação. Tanto que a cena em que isso é revelado nos surpreende com Donna saindo de trás de Kemp, deitado na cama. Mais tarde, Vic, publicitário e marido de Donna, descobre a traição. O filme é bem coeso, por mais que pareça que essa parte da história é uma subtrama desnecessária, as peças vão se encaixando e formam um filme bem correto.
A calma da narrativa também vale para a história da família que trabalha com a oficina. Descobrimos que o dono do estabelecimento ficará sozinho durante um período, enquanto a mulher vai visitar a irmã junto do filho, após ganhar na loteria (5.000 dólares) - uma cena posterior, do álbum de fotos, dá a entender que talvez ela fosse embora de vez, fugindo do marido violento e agressivo.
Quando Joe Camber, dono da oficina vai conversar com seu amigo sobre o dinheiro que ganhou e como pretende gastar traindo a mulher e bebendo, pedindo a companhia dele, a câmera subjetiva de Cujo volta e, ao assistirmos um homem tão fdp planejar uma atitude deplorável contra sua própria família, a visão que temos pelos olhos do cachorro passa a ser também uma tentativa do filme nos colocar do lado dele. Isso é recompensado quando vemos o ataque de Cujo sobre os dois e não sentimos medo, mas satisfação, ao mesmo tempo em que vemos o monstro que Cujo se transformou. O trabalho de maquiagem é essencial para esse aspecto e é realizado de maneira formidável. O pus saindo dos olhos do animal, o pelo sujo, enlameado, os olhos vermelhos, a baba de raiva e o sangue das vítimas acumulado em seu corpo. Tudo isso junto a primeiríssimos planos, com o cachorro dominando a tela e capacitando o espectador a enxergar os pequenos detalhes que criam aquela imagem aterrorizante, e uma trilha sonora pesada e sombria. Deve ter sido bem legal ver isso no cinema.
Mas o terror ainda vai chegar. Antes, quando os Trenton levam o carro de Donna que apresenta problemas pela primeira vez a oficina, vemos um plano que, assim como no começo do filme, destaca a diferença entre o tamanho de Tad e Cujo. A cabeça do cachorro deve ser quase três vezes maior que a da criança. É mais um ingrediente na construção do filme. A expectativa é criada em cima de praticamente todos os elementos que a história apresentou até aqui. Tad não quer ficar na colônia de férias e a família tem que ficar com ele, Vic tem uma reunião importante para a empresa fora da cidade e Donna tem que ficar com a criança. Charity Camber foi visitar a irmã junto do filho e o único responsável pelo local, Joe, foi morto pelo cachorro que já consideramos um serial killer. Donna tem que levar o carro que está em péssimo estado até a oficina junto de Tad. É aí o momento que cai a ficha de que tudo vai dar errado, quando vemos que o carro não vai aguentar mais de 15 segundos andando e eles estão quase chegando a oficina que é território de Cujo. A frase que Donna diz para o filho pouco antes de toda a tragédia acontecer é certeira: "só precisamos aguentar um pouco mais". O público sabe mais do que a protagonista, o que deixam essas palavras irônicas e ligam a chave para o espectador sobre o perigo iminente. Um alcance de narrativa irrestrito, parte da Hollywood clássica, que gera ansiedade e aumenta a tensão, fundamental para filmes do gênero.
O momento forte do filme, que falei no começo do texto vem de um susto muito bem construído. A câmera que se movimenta atrás de uma vítima é subjetiva de quem vai cometer o assassinato, e vemos esse movimento acontecer em uma cena na casa dos Trenton com Donna. A câmera subjetiva estava sendo usada constantemente com Cujo, como mencionei. Certo. Quando a mãe e o filho param com o carro na oficina e a mulher investiga com o olhar o local e após isso, volta a olhar para dentro do carro, com a porta ainda aberta. É aí que uma câmera se movimenta atrás dela. O filme nos ensinou que aquele deveria ser o momento que o cachorro viria por trás e nós estávamos acompanhando a visão dele. Mas não. Quando temos certeza do que vai acontecer, somos surpreendidos pelo cachorro pulando e atacando a janela do outro lado. É um ótimo susto, concebido com o tempo necessário.
A partir da segunda metade do filme, Cujo é o vilão e vamos passar a acompanhar Donna na jornada em que busca se livrar daquela situação. A maquiagem é muito boa em ressaltar os olhos fundos da mulher que não dormiu, e os lábios secos e o suor mostrando o cansaço dos dois.
A montagem é muito certeira, destaque para a cena em que Donna olha a maçaneta de uma porta e sente que consegue chegar até lá. A colocação daqueles planos mostrando a direção do olhar dela é muito sagaz e temos um momento de subjetividade mental, em que entendemos as intenções da personagem apenas com a montagem e o efeito Kuleshov, mostrando sua reação diante de alguns planos. Esse aspecto do filme também funciona nas cenas de ação em que Cujo está executando alguém, e os cortes frenéticos, que dificultam o acompanhamento do espectador, geram questionamentos sobre a força do animal, além de trazer inquietação.
A direção dos planos em que Cujo sobe no carro é sensacional. Que grande ator era esse cachorro.
Os defeitos não são numerosos, mas são importantes. O monstro no armário do menino, que parece ter alguma relação com Cujo, não faz o menor sentido, e os personagens, embora bem construídos, não são tão cativantes e não despertam tanta simpatia, com exceção de Tad.
O final é muito inteligente e não se prolonga, explicando acontecimentos posteriores a resolução principal da trama. Isso faz falta em vários filmes de terror desde sempre.
Indiana Jones e o Templo da Perdição
3.9 506 Assista AgoraSPOILERS
"Se a aventura tem um nome... ele é Indiana Jones"
Desde a primeira cena, em um belíssimo número de dança com um grande coreografia, temos pistas da história. Isso é notado quando Willie entra na boca de um dragão do cenário que possui uma cor vermelha e muita fumaça dentro dela, durante a apresentação. Essa cor e a fumaça remetem ao fogo presente no sacrifício que seria visto mais tarde no filme e que tem uma composição muito parecida com aquela vista nessa cena. A fumaça, destacando o calor fervente do fogo e o vermelho que, além de ter ligação óbvia com esse elemento, também simboliza o perigo.
A coesão presente no filme é brilhante. Logo no começo, quando Indiana começa falando em mandarim com os mafiosos chineses que enfrenta na primeira cena em que aparece, o seu inimigo se mostra surpreso: "não sabia que você falava nossa língua, Dr. Jones!". Durante o longa, Indiana Jones conversa em mandarim com seu companheiro juvenil, que por sinal é o melhor da série, Short Round, e lá no final, quando precisam escapar de um lugar que parece não ter saída ao se encontrarem cercados por inimigos no meio de uma ponte de madeira, os dois conversam entre si na língua chinesa e formam um plano relâmpago para a situação - que arranca o ar de preocupação dos espectadores visto na reação de Willie ("OH MY GOD!"). Nada está aqui por acaso. A relação entre os personagens parece ser estabelecida muito rapidamente, mas a história mostra que a narrativa estava certa em ser rápida. A interação entre todos eles faz sentido, tudo é bem estabelecido e não é preciso ficar forçando diálogos desnecessários. As circunstâncias apresentadas desde o início reforçam a construção de um roteiro muito sólido. Um dos poucos defeitos seriam algumas piadas utilizadas como running gags que não funcionam tão bem como quando o pequeno parceiro de Indiana ri do fato de Willie ter se molhado, mas isso não atrapalha o filme. Porém, uma outra piada que acontece mais de uma vez e que é engraçada, mesmo que não seja tão original, é a tentativa infantil e doce de Short Round imitar tudo que seu herói Indiana faz. Essas piadas acontecem em planos onde Indiana Jones está dentro do plano de foco como objeto principal, e no fundo vemos o menino realizar os mesmos movimentos que o personagem de Harrison Ford ao escutar o líder da aldeia indiana contar os problemas que a região tem enfrentado. A personagem Willie Scott também é muito engraçada. As reações dela, que já mencionei aqui, acontecem diversas vezes durante o filme e contribuem tanto para o humor, como para a apreensão em cenas que precisam que ela encare seus medos (de classe média-alta) para salvar os dois protagonistas. Essas cenas também ajudam muito no desenvolvimento dela.
A ação é muito bem dirigida e a montagem não cansa o espectador, que assiste cenas muito energéticas sem excesso de cortes que poderiam atrapalhar no acompanhamento do que estava acontecendo.
O design de produção é irretocável. Assim como no primeiro filme, os cenários são fantásticos e ambientam muito bem toda a história, com destaque para a cena do ritual, em que a estátua gigante tem uma imagem assustadora e intimadora, acentuado pelo contra plongeé em que é apresentado, as cores, a fumaça e o som macabro dos seguidores de Kali Ma cobrindo tudo isso.
Por mais místico que toda a história da pedra possa soar, o final mostra claramente como o filme levou tudo para um desfecho onde o herói interferiu de maneira direta em um problema que não era metafísico. A aventura levou todos eles ao resgate das crianças que haviam sido raptadas e eram escravizadas, e o filme demonstra como esse era o ponto principal quando, nos últimos instantes, Indiana diz que "entendeu o que a pedra significava" enquanto os parentes das crianças se encontravam de novo, se abraçando e reproduzindo diversas manifestações de afeto. É uma cena bastante comovente, os planos mostram as reações dos pais, mães, avós, etc. e mexem com quem está assistindo, mesmo com a trilha sonora mais convencional para aquele momento.
O Profissional
4.3 2,2K Assista AgoraNão tem um tom definido. As cenas de ação, em grande maioria, são compostas por coisas absurdas (Leon pendurado de cabeça pra baixo, se escondendo e atirando, subindo e descendo, como se fosse um morcego é hilário) e que seriam bem-vindas em um filme que tivesse uma proposta estabelecida a cumprir esse tipo de obra. Mas, ao mesmo tempo em que temos essa ação que arranca risadas, o filme tenta criar uma história comovente. Pra ser justo, a ação até funciona em determinados momentos e, principalmente, estabelece uma coesão entre as primeiras cenas com o final do personagem Leon (SPOILER: a câmera subjetiva que vinha atrás da vítima, que no começo era Leon, é usada depois em um contexto em que Leon é a vítima do vilão de Gary Oldman). Mas a coesão é pontual. Por que o pai de Tony aparece ali no canto e câmera faz questão de mostrá-lo como se tivesse alguma importância para o que estava acontecendo? (se perdi alguma coisa pode me corrigir)
O que mais dificulta a identificação com o personagens e o desenvolvimento da história proposta é a maneira caricata com que são construídos. O leite que Leon toma, o jeito de falar, a forma como ele "engasga" bebendo esse leite quando Mathilda diz coisas absurdas (na primeira vez até ok, mas a segunda foi preguiçoso) e a galhofa de personagem que é Stansfield, de Gary Oldman. É bizarro como as Leon e Stansfield são unidimensionais. O vilão é uma caricatura de "carinha do mal que toma drogas e pira o cabeção". Leon é tão pouco carismático que as tentativas de deixá-lo mais doce são vergonhosas, como na cena envolvendo o John Wayne. É claro que temos que deixar Mathilda de fora dessa, uma personagem que se destaca em cena, principalmente pela grande atuação de Natalie Portman que, aos 12 anos, já desenvolvia trabalhos exemplares com uso do "método". Além de ser engraçada em boa parte (o roteiro exagera em repetições que já comentei), é uma personagem intrigante e que apresenta momentos extremamente desconfortáveis. O contraste estabelecido na primeira cena em que vemos Mathilda, com uma câmera que vai subindo lentamente, revelando primeiro seus sapatos e meias infantis, e depois mostra um cigarro na mão de uma criança já causa um primeiro estranhamento. Mas o maior responsável pelo incômodo do público com o filme é a relação entre ela e Leon. Logo de cara, remete a Lolita, livro que foi adaptado para o cinema por Stanley Kubrick e, até hoje, recebe críticas negativas pela trama. A análise crítica de um filme não deve ser considerada através de uma perspectiva moral, então não estou falando sobre nada disso. É inclusive um ponto forte que o longa tenha andado nesse fio, brincando com o perigo e os limites e trazendo o extremo desconforto para quem está assistindo, podendo até estreitar a relação entre espectador e Leon.
A trilha sonora e mixagem de som tem acertos específicos, mas na maior parte do tempo são bem artificiais e deixam a manipulação explícita em cenas mais sentimentais. A cena em que o design de som funciona muito bem é no confronto entre Mathilda e Stansfield no banheiro. Quando o silêncio entra e percebemos o perigo que a protagonista (por que não?) corre, os planos mais abertos dão lugar a outros mais fechados enquanto Stansfield se aproxima da menina e a ameaça, trazendo junto de tudo isso uma música atmosférica e sombria que vai crescendo aos poucos conforme o perigo cresce também, e vamos vendo Mathilda se dando por vencida, chorando enquanto o olhar de psicopatia de Stansfield praticamente não pisca e ele mexe no rosto da personagem indefesa que não poe fazer nada. Esse é um momento bem tenso.
Outra cena que é um ponto forte é a que Leon vai ensinar Mathilda a ser uma sniper. A quebra de expectativa é brilhante.
Apesar disso, é uma obra que desliza na maior parte do tempo, não encontra uma direção certa e fica perdida.
Um filme com ambições de ser um drama comovente que parece um filme medíocre e infantilizado de super heróis.
Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal
3.2 614 Assista AgoraDe longe, sem dúvida alguma, o pior da franquia até aqui (misericórdia por nós, que esperamos pelo quinto filme com o maior ponto de interrogação na cabeça).
Mais uma vez, Indiana é sequestrado por um inimigo dos Estados Unidos para ir atrás de algum artefato. Na primeira metade, mesmo com alguns problemas corriqueiros que são encontrados na volta de grandes franquias do cinema, como a apresentação do protagonista feita da forma mais idólatra possível e com diálogos funcionando com um fan service barato, ainda consegue remeter aos filmes anteriores com cenas de ação bem dirigidas e improváveis. A melhor cena de ação da obra é a perseguição de carro no começo. Essa cena é totalmente divertida, desde o encontro entre Indiana e Mutt na cafeteria, que tem piadas visuais bem engraçadas e uma condução muito boa envolvendo o design de som e a abertura dos planos, que denotam juntos o momento em que a conversa torna-se mais íntima e centrada em um assunto particular entre os dois, fazendo isso com a diminuição do volume do barulho das pessoas que estão em volta e colocando planos mais fechados nos rostos dos dois personagens.
O roteiro consegue trabalhar causa e efeito principalmente quando se trata do personagem de Mutt, que acabou de ser apresentado ao público e precisa de uma história por trás que justifique suas ações no filme. Mas nem sempre é assim, aquele pente é caricato demais até pra um filme de aventura como esse. A história começa a ficar chata com as explicações do significado daquele crânio alienígena por parte dos comunistas, construindo uma narrativa muito mais explicativa do que costumava ser e com menos humor, e piora quando temos a volta da personagem Marion Ravenwood, que adiciona um drama e discussões de relacionamento entre ela e Indiana que ninguém pediu. E piora ainda mais (daqui é só ladeira abaixo) quando descobrimos que Mutt é filho de Indiana Jones. Tudo de mais clichê que o filme poderia fazer em relação a volta de um personagem consagrado do cinema ele faz. A boa parte de causa e efeito também aparece na função que o crânio tem de "expulsar" determinados corpos de perto dele.
Da metade para o final, onde tudo começou a dar errado, temos as cenas de ação na Amazônia que, em 2008, conseguem ter efeitos visuais menos convincentes do que em 1981, ano do primeiro filme da franquia. O CGI é ruim e tira o espectador dos momentos que, nos filmes anteriores, eram o ponto forte. A fotografia mais escura também destoa muito nas cenas dentro dos templos.
Quando chegamos ao final, tudo já foi pro saco. A história do "agente triplo" e o desfecho daquele artefato são patéticos. Em "Templo da perdição", por exemplo, fica muito claro que a pedra recuperada na Índia era apenas uma parte da real busca feita pelo professor arqueólogo. Ao encontrar a pedra, ele também achou as crianças raptadas que estavam sendo escravizadas e as libertou. Aqui, ele leva o crânio até onde precisa, acontece uma doideira alienígena, uma galera morre e é isso. Termina falando alguma coisa sobre a "busca pelo conhecimento". É isso. De repente ele se casa com Marion e pronto. Ela apareceu do nada pra se casar com ele de repente. Aliás, uma das falas entre os dois é completamente ridícula: "elas não eram você". Um frase de efeito construída da maneira mais galhofa possível.
Não tinha nenhum motivo pra mexer na ótima trilogia de Indiana Jones, ainda mais se era pra fazer algo tão preguiçoso e sem a essência dos filmes originais.
Inclusive, esse Shia LaBeouf cheira a filme ruim, hein?
It: Capítulo Dois
3.4 1,5K Assista AgoraFilme enorme pra uma história cansativa por causa das repetições da sua narrativa. O roteiro é estruturado quase inteiramente em relembrar o passado trazendo os protagonistas adultos que passam cerca de uma hora e meia lidando com acontecimentos do primeiro filme (contando com cenas inéditas das crianças) que entram em contato com o que aquelas vivem no presente. São cenas que supostamente deveriam ser assustadoras, mas passam apenas como um apanhado de terror genérico da década de 2010 totalmente desconexo, tentando implantar nuances aos personagens dentro desse filme, pra gerar uma coesão apenas com as 2 horas e 50 minutos de duração. A continuação não sabe se aproveitar de elementos do longa anterior para seguir em frente a partir daquilo. Os roteiristas sentem que são necessários flash backs ou novas cenas da infância. Não existe uma coesão narrativa entre os dois filmes e a segunda parte torna-se entediante pelo roteiro mal estruturado e pelas cenas extremamente previsíveis que compõem essa história. Pra ser justo, a única personagem que cresceu foi Beverly, traumatizada pelos abusos do pai e convivendo com outro tipo de violência no presente.
O humor é fraco. A cena do reencontro dos personagens no restaurante chinês, no momento em que Richie, comediante de stand up (do nível medíocre que estamos acostumados), faz piadas imaturas e completamente banais para o público entre 11-14 anos, motiva risadas bizarras da maioria deles e dificulta a identificação que aquele momento almejava. Mas já no final dessa parte do restaurante, quando após alucinações o grupo começa a quebrar tudo e gritar, há uma piada bem engraçada. Mas o humor decente e com bom timing vive de lampejos dentro do filme.
A direção também exausta o público com o uso de técnicas repetidas para criar uma mesma sensação em diversas cenas. Falando especificamente do plano holandês, usado para expressar desorientação, podendo ser pelo medo, loucura ou os dois em alguns casos aqui, durante várias cenas percebe-se o uso excessivo dele. Quando Henry Bowers está fugindo do manicômio (doideira!), a câmera faz uma tombada para a diagonal no último plano - e a montagem usa esse movimento muito bem na sequência, mostrando outra cena que se inicia saindo daquele ângulo tombado da cena anterior para o ângulo a ser usada naquele plano -, e mais tarde em várias cenas com Pennywise até o terceiro ato.
Os efeitos visuais são brilhantes na hora de criar uma montagem fluida, como na cena em que o céu noturno se transforma na parte debaixo de uma mesa de vidro onde um quebra-cabeça está sendo montado. Porém, os personagens feitos pela computação gráfica são pouco convincentes e tiram o espectador da cena, dando a impressão de aqueles monstros que deveriam ser aterrorizantes se assemelham a um Space Jam, com cartoons de desenhos animados sendo integrados num universo de live action. O "terror" que essas piadas conseguem é, no máximo, com alguns poucos jump scares que não são previsíveis e com outros extremamente apelativos. Um filme de terror tentar assustar alguém com jump scares como o da cena da estátua do lenhador, é equivalente a um comediante realizar seu material fazendo cócegas no público alvo.
Inclusive, Pennywise é mais engraçado do que assustador e fica complicado julgar algo desse tipo como bom ou ruim. Claro que a primeira vista é péssimo para um filme de terror fazer um vilão que não é ameaçador, mas quando o palhaço aparece ele rouba a cena. Mesmo no primeiro It, de 2017, Bill Skarsgard realiza um trabalho com alguma proximidade cômica, mas ali conseguiu também amedrontar.
It: Capítulo Dois não é péssimo, mas sua narrativa tediosa e um roteiro insípido produzem, na melhor das hipóteses, algo medíocre.
O Homem Que Copiava
3.5 900 Assista AgoraDINHEIRO
Bonequinha de Luxo
4.1 1,7K Assista AgoraOs figurinos têm valor narrativo de verdade (como deve ser sempre). A mulher com quem o personagem Paul Varjak tem um "caso" por interesse, vivido por Patricia Neal, sempre apresenta-se com cores frias e escuras. Em determinados momentos, Mr. Faileson, o caso de Paul, aparece vestindo uma única peça vermelha em seu figurino com medo de perder a relação estabelecida com ele, quando suspeita que seu marido tenha descoberto tudo, porque mesmo tendo um relacionamento pouquíssimo romântico, ela ainda sente atração por ele obviamente. Holly Holightly, interpretada por Audrey Hepburn, aparece no começo do longa vestindo predominantemente peças monocromáticas em branco ou preto, enquanto ainda vive a procura de um "sugar daddy" com quem possa se sustentar. A partir do momento em que Holly é rejeitada por Rusty Trawler e sai num outro dia com Paul, ela começa a vestir peças com cores mais quentes como laranja e vermelho. Essas cores aparecem no filme como elemento de paixão, amor, seja ele pela pessoa ou estritamente carnal, então quando ela veste o vermelho ela está finalmente sentindo aquilo pela primeira vez. Como Holly é uma personagem mais aberta quanto ao que sente, o tom de suas roupas é mudado por completo e não apenas adicionando pequenos detalhes em alguns acessórios como em Varjak, por exemplo. Na cena em que ambos estão na loja indo roubar alguma coisa, o design de produção também é majoritariamente formado por cores quentes, revelando um sentimento vívido e até malicioso daquele momento, principalmente para Paul, que nesse passeio com Holly pela cidade aparece com listras vermelhas em sua gravata e um lenço da mesma cor no bolso do paletó. Mais tarde, quando Holly está se preparando pra ir ao Brasil com José, ela demonstra um verdadeiro ânimo enquanto ouve um disco que fala português, possui cartazes referenciando ao país e tricoteia uma roupa da cor vermelha. Isso denota o sentimento real de que dessa vez ela poderia estar vivendo um amor de verdade com José. Mais tarde ela vai verbalizar isso em uma cena com Paul, mas essa cena já havia deixado isso bem claro.
A movimentação de câmera é espetacular e um elemento fundamental para que os planos sequência funcionem com a ótima fluidez. O diretor manipula o olhar do espectador constantemente e sabe como posicionar o que quer mostrar em cena. Os melhores momentos que retratam isso é a cena da festa na casa de Holly.
Uma dica pra assistir o filme é tentar deixar o máximo possível o anacronismo de lado pois, do contrário, você larga nos primeiros 10 minutos com a cena do vizinho asiático do andar de cima. É BASTANTE desconfortável.
O Poderoso Chefão: Parte III
4.2 1,1K Assista AgoraTerminando a trilogia de Coppola e trazendo o desfecho inevitável para Michael Corleone, esse é um bom filme, que apesar de defeitos inéditos em relação aos dois primeiros filmes como diálogos expositivos, um voiceover estranhíssimo logo no começo e algumas raras cenas onde a mise en scène é levemente comprometida por cores intrusivas que não harmonizam com o resto da imagem, conclui a trajetória com os aspectos narrativos fundamentais que fizeram The Godfather uma obra prima do cinema.
O Poderoso Chefão: Parte II
4.6 1,2K Assista AgoraAs duas histórias contadas paralelamente servem para traduzir as diferenças entre Vito e Michael Corleone, e ao mesmo tempo explicar porque a vida da família Corleone era mais harmônica e resolvida com Vito e tornou-se mais rachada e conflitante durante os anos 50, nas mãos de Michael. A personalidade mais "acolhedora" e analítica de Vito não tem muito a ver com a tecnocracia e frieza do seu filho.
O Poderoso Chefão
4.7 2,9K Assista AgoraA melhor edição que já vi em qualquer filme, além de uma das melhores maquiagens, atuações, direção e óbvio, roteiro. Dentro das quase 3 horas de duração, existem vários arcos e todos fazem o espectador ter real curiosidade e interesse. Mas não é somente por isso que o longa tem um andamento tão prazeroso. Ele parece ler a mente de quem está assistindo e colocar a cena que o espectador quer ver naquele momento, qual é a parte da história que ele quer que seja contada naquele instante. Ele sacia as dúvidas que ele mesmo plantou durante o filme na hora certa. Quando todo mundo está ansioso pra saber determinada parte do enredo, ele conta exatamente aquele pedaço que o público quer ver. O ritmo é tão perfeito que chega a ser sobrenatural.
A direção sabe acentuar a violência e tornar os momentos "passivos agressivos" inquietantes. Tanto as cenas em que
Luca Brasi é morto, onde a câmera mostra um membro da família Tattaglia agarrando a mão de Brasi por cima e prenunciando o ataque ao infiltrado dos Corleone - que aconteceu dois segundos depois dele fazer isso -, como na incrível cena em que Michael Corleone assassina dois membros dos Tattaglia num restaurante. Nesta cena, a insegurança do jovem Corleone não é demonstrada apenas na atuação impecável de Al Pacino, mas na edição e mixagem de som, música e fotografia. Quando ele senta de volta a mesa após pegar uma arma escondida pela família no banheiro do restaurante, a hesitação do personagem combina com o barulho confuso que o desconecta daquele lugar e deixa-o apreensivo. Mas nessa cena o mais incrível é o momento em que ele finalmente decide agir. A câmera fica parada no seu rosto perdido, olhando para o nada e com o corpo tenso, e então, as cores mais quentes e convidativas somem da cena e dão lugar a uma face esbranquiçada de pânico e ansiedade com um escurecer ao seu fundo, caracterizando o limite que ele chegou. É aí que Michael Corleone atira e foge do local.
The Godfather é sutil, brilhante e, por isso, também é entretenimento puro para todos que têm bom gosto. Uma verdadeira obra prima.
O Irlandês
4.0 1,5K Assista AgoraEstá muito longe de ser apenas "mais um filme de máfia" do Scorsese. Dentro desse estilo é o mais denso que o diretor já produziu. É existencialista, reflexivo e possui uma mensagem diferente do que todos os outros que ele já fez. Se normalmente os filmes com homens poderosos que se aproveitam de uma forma ilegal para fazer montanhas de dinheiro trazia uma mensagem de como aquilo não valia a pena, The Irishman vai além. Não só deixa claro as consequências individuais óbvias já retratadas em diversas obras do cinema como mostra um outro nível de miséria particular para as escolhas erradas feitas por aqueles personagens e, acima de tudo, o quão banal é tudo isso que vivemos. Essa é a principal ideia e é traduzida ao espectador com elementos como anotações marcadas em diversas pessoas envolvidas no crime organizado de como elas morreram tempos depois e até pela trilha sonora original extremamente sombria. Um momento que esclarece a insignificância que o filme quer mostrar é na última cena,
em que Frank Sheeran, já vivendo em um asilo, pergunta a uma das enfermeiras algo sobre Jimmy Hoffa, que na sua época era uma das pessoas mais importantes e influentes no cenário nacional, e a mulher não faz a menor ideia do que Sheeran está falando.
The Irishman encerra uma quadrilogia da máfia de Scorsese que parece ter sido arquitetada para ser dessa forma desde o começo. Mean Streets (1973) conta a história de agiotas cobrando dívidas em sua região; Goodfellas (1990) é a ascensão no meio do crime; Casino (1995) mostra a vida de grandes mafiosos; e em 2019, as proporções são gigantescas. Hoffa, Buffalino, Bruno, todos os Tonys... esses marcaram os livros de história. De alguma forma eles fizeram isso.
Dois Papas
4.1 962 Assista AgoraComo quase sempre em filmes religiosos, muitas alegorias visuais, principalmente com as pinturas nos templos. Não só com essas obras, o filme fala muito apenas com o que é mostrado na tela, seja pelo figurino, iluminação, posicionamento e movimentação das câmeras. No figurino, é bastante óbvio que as cores opostas que vestem os papas refletem também o antagonismo dos personagens que é o que movimenta a trama. A cor branca, da pureza, da paz que este carrega consigo, veste o papa Bento XVI de maneira irônica e denota a sua hipocrisia (mais tarde verbalizada entre os papas), de uma pessoa que mostra-se entendedora máxima da igreja mas não conhece os seus adeptos e mesmo assim, continua confiante de que está fazendo o certo. Por outro lado, Francisco predominantemente preto e com detalhes vermelhos, representa tanto a visão retrógrada e conservadora que líderes religiosos tinham (e ainda têm) de sua postura mais progressista, associando essas ideias como algo contra a crença cristã - logo ligando essas cores ao diabo ou coisa parecida -, como também a falta de confiança que Bergoglio tinha nele mesmo como católico, a falta de fé trazida por diversas dúvidas e injustiças que encontrava no mundo, além do vermelho ser a culpa e o sangue que carregava pelos seus atos durante a ditadura militar.
Ao mostrar os templos pela primeira vez, o contra plongée é utilizada para trazer grandeza e exaltar tanto as estruturas como a divindade católica. Em um momento marcante, quando Francisco entra em uma das capelas no Vaticano, a iluminação vai esclarecendo gradativamente de um ambiente bem escuro até uma claridade muito forte revelando diversas pinturas com apelo religioso deixando o próprio Jorge Bergoglio maravilhado pelo momento, que passa a sensação de um arrebatamento em que somos mandados para o paraíso. A posição que alguns desses quadros são colocados também conversam com o espectador (como não poderia deixar de ser). Um deles acima de Bento XVI, dá a impressão de um anjo pisando na cabeça do alemão, o que parece acusatório por parte do diretor - que também faz críticas a ele com depoimentos pesados de diversos cidadãos - e soa engraçado. Em outro momento, quando em uma conversa Francisco diz que Deus também era (ou foi?) humano, uma pintura na capela de uma mão furada e sangrando exemplifica a passagem de Jesus pela terra e a colocação do papa argentino.
As cores também têm um papel importante no preto e branco dos flashbacks da vida de Bergoglio nos anos 50 em Buenos Aires, quando ainda não tinha decidido se tornar um padre e nem ouvido a voz de Deus. Ao entrar em uma igreja e encontrar um padre que transmitia a mensagem divina auxiliando e colocando a missão na vida do jovem argentino que havia acabado de se tornar noivo, Francisco segue sua tarefa e dias depois termina a relação com a que seria sua futura esposa e vai atrás da sua realização espiritual. Após tudo isso acontecer, as cores surgem nos quadros que mostram o passado de Bergoglio, demonstrando a consumação do que buscava na religião.
Os planos aéreos também são bastante simbólicos e evidenciam um olhar divino para a terra. Um dos melhores momentos desses planos é quando há uma movimentação de um local de classe média-alta de uma cidade para uma região mais carente salientando uma das questões mais discutidas durante o longa: a desigualdade social. Essas mostras acontecem mais de uma vez, como já na parte final em Buenos Aires.
O roteiro é muito bom, os diálogos são muito bem escritos e não deixam as falas sobrando ou muito óbvias. Principalmente na primeira metade do filme, diversas questões relacionadas a igreja católica são apresentadas no primeiro encontro dos papas no Vaticano. O que a igreja prefere debater? Quais as prioridades devem ser tomadas por ela? O que realmente é importante? Qual o julgamento para os atos falhos cometidos por ela? Basicamente: como ela está parada no tempo e precisa se adaptar ao mundo. Francisco, mais liberal, argumenta com diversas mudanças morais e éticas enormes na história do catolicismo, como o celibato dos padres. Bento XVI, com visão mais reacionária, também apresenta suas opiniões embasadas nas escrituras sagradas e em frases prontas do cristianismo conservador, e que são rebatidas por Francisco tanto por respostas, como quando ele completa as frases batidas que já sabe onde vão chegar - o filme é claramente a favor de Francisco. Na segunda metade, as discussões não se expandem como deveriam em casos mais problemáticos da igreja como a pedofilia e o desenvolvimento das figuras principais também não é completamente plausível. Claro que as conversas entre os papas parecem ter efeito, mas Bento XVI não demonstra tanta abertura até chegar do ponto "A" ao "B". O seu arco é defeituoso. O de Francisco um pouco menos. Ele deixa a culpa para trás e cresce para se tornar a figura central do catolicismo. E na cena em que se apresenta no Vaticano como papa, obviamente está vestindo a roupa do papa, branca.
As indicações de Jonathan Pryce e Anthony Hopkins são indiscutíveis. Dão vida e corpo aos bons diálogos. Hopkins é duro, irritado e completamente convicto de suas ideias. Ele transmite tudo isso. Pryce coloca todo o coração de Francisco em seu personagem. É calmo, sabe escutar e demonstra a incerteza e fragilidade pelo peso que carrega de tantos anos. Atuações sutis que são fundamentais e precisas.
A boa direção de Fernando Meirelles não é impecável, e algumas marcas dele não são bem utilizadas, como a câmera na mão, que causa pequenos incômodos, bem como um zoom estranhíssimo feito da mesma forma. Mas além dos méritos já mencionados aqui, ele aumenta a qualidade do roteiro com truques como uma câmera fechando inteiramente dos personagens que estão falando e colocando mais tensão no momento em que precisa. Quando essa tensão passa, ele naturalmente tira o zoom do rosto de Pryce, que suspira pensativo após um debate mais acalorado com Hopkins.
Os Dois Papas tem os seus deslizes, mas é uma obra reflexiva, sutil e que traz discussões necessárias para o momento atual da religião, embora tivesse potencial para se aprofundar mais.
Jojo Rabbit
4.2 1,6K Assista AgoraSempre entra um superestimado entre os melhores filmes do Oscar. [Edit: esse nem é o maior superestimado. Ford v Ferrari superou, pqp] Nos últimos anos tem sido assim, pelo menos. A imagem exageradamente cômica do Hitler não é nada inovadora (ainda mais considerando O Grande Ditador, que na década de 40 já reproduzia essa mesma ideia) e aqui não entrega nada que possa agregar a esse tipo de personagem. "Eu já vi isso antes e já vi melhor", é esse o sentimento para o Hitler de Waititi. O problema não é exclusivamente da atuação ou da concepção familiar do ditador nazista, mas também no roteiro que não entrega piadas tão engraçadas e que não soam tão inteligentes quanto o filme pensa ser.
Roman Griffis Davis tem carisma, é engraçado, convence como uma criança que sofre lavagem cerebral de um governo autoritário mas que ainda está crescendo e desenvolvendo a sua pessoa, o que o torna mais vulnerável as manipulações que o governo impõe nele. Consegue construir o seu personagem como é proposto, o arco de Jojo é bem conduzido pelo ator mirim. Mas de todo o elenco, quem rouba a cena (e não poderia ser diferente) é Scarlett Johansson. Grande demonstração de como atuar em todos os aspectos. Fisicamente ela é rígida e insegura quando está triste e cheia de incertezas, além de leve e confiante quando dança e explica para o filho os valores da vida e o cenário de Segunda Guerra que o país vive para o filho que ainda não entendeu direito. Mas mesmo com essas atuações, as cenas entre mãe e filho tem diálogos batidos e que já foram usadas em diversos longas no contexto da guerra. Não há problemas apenas nisso, mas também em discussões quanto ao papel desempenhado pelo pai de Jojo na família e na guerra. A ideia do que está sendo mostrado é compreensível, mas algumas fala são expositivas, principalmente quando a mãe de Jojo vai para o canto e conversa sozinha em voz alta interpretando o pai.
As escolhas musicais são irregulares. Enquanto logo na abertura a versão alemã de "I Wanna Hold Your Hand" é irônica e engraçada, associando a canção a saudação nazista, a cena em que mãe e filho andam de bicicleta em um parque não tem boa trilha sonora. Ali é feita a escolha extremamente óbvia para casar com o que está sendo mostrado em tela tanto visualmente como através de diálogos.
O filme apresenta em diversos momentos falta de sutileza, em uma comédia que também não define o seu tom, horas mais pastelão e visual, (principalmente envolvendo o "fantasma de Hitler") horas com diálogos que tentam ser sagazes e conseguem em raríssimas oportunidades. Um incômodo gerado já no final do terceiro ato, e que é a síntese de como a delicadeza não é um ponto forte do filme, é um crowd pleaser exageradamente perceptível e que busca manipular o espectador de maneira clara com um "Fuck Hitler" e uma bicuda do garoto jogando a figura imaginária do ditador pela janela. Em "Inglorious Bastards", ou Bastardos Inglórios, também existem diversas partes e diálogos que estão presentes para o que deveria ser uma satisfação barata de quem assiste, mas lá o tom justifica e não deixa como algo jogado tentando alcançar picos numa história pouco agradável, porque lá o filme tem um ritmo e história que satisfaz o público. Ainda com esses diversos excessos disfuncionais, o filme utiliza bem o silêncio e consegue criar uma das poucas cenas verdadeiramente inteligentes, na cena em que
Jojo ao perseguir uma borboleta no meio da cidade se defronta com cadáver da mãe pendurado publicamente por traição. A morte dela é revelada pela simples mostra de seus sapatos pendurados no meio daquele local que o filme havia apresentado mais cedo. Essa cena na verdade é uma construção muito bem feita, que mostrou que aqueles closes nos pés de Scarlett durante cenas de dança não eram um mero fetiche a lá Tarantino.
O humor é ainda mais irregular do que o filme. Já mencionadas aqui, diversas piadas não chegam onde querem, não tem o peso e esperteza que procuram. Algumas boas ideias estão nas partes em que diversos personagens tentam entender o que são esses tais judeus, em conversas que associam os seguidores dessa religião a seres mitológicos bizarros. O terceiro ato, mesmo com o filme já conduzido a um local de tragédia na vida do protagonista, tem um dos momentos mais engraçados, principalmente na invasão americana (sempre exaltada de forma mais heroica e fundamental do que realmente foi) e russa.
Jojo Rabbit é sobre amadurecimento e compaixão sem deixar de ter uma narrativa e estrutura muito convencional. Com diversas decisões equivocadas, não é um desastre completo, mas entrega um filme fraco e que sempre parece sentir falta de alguma coisa. Talvez um roteiro mais consistente.
Bastardos Inglórios
4.4 4,9K Assista AgoraChristopher Waltz está sensacional. E o Brad Pitt? Tem horas que a abordagem mais caricata (e até cartunesca) de um "yankee" é perfeita, e há outros momentos em que parece se exceder, mas o importante é que está ligada completamente com o que é esse e a maioria dos filmes do Tarantino: uma hipérbole.
Além do filme ter uma história pesada, é principalmente divertido e exagerado, o que não necessariamente significa algo ruim. Os excessos do diretor estão não apenas no roteiro e história, mas nas atuações, ação e na música. Majoritariamente na música. Há diversas partes nesse filme que se estivessem nas mãos de outro diretor provavelmente não teriam tanta música. É um cineasta mais barulhento do que o convencional.
Inglorious Basterds é a experiência cinematográfica mais satisfatória que Tarantino já proporcionou, seja pela qualidade incontestável da peça ou por assistir nazistas sendo humilhados e queimando até a morte.
Coringa
4.4 4,1K Assista AgoraDeixa você tenso, te congela. Em diversos momentos fiquei arrepiado e sem reação. Esse é o Coringa mais impactante dos cinemas. A violência dele é mais chocante, muito em razão do contraste entre os movimentos leves e das danças que ele faz com a ferocidade que agride os seus inimigos. A sua personalidade que é moldada durante o filme também ajuda nesse aspecto. A fragilidade que ele expressa fisicamente e nas falas tornam toda violência mais forte. Esse elemento já havia sido usado em Laranja Mecânica de Stanley Kubrick e é revisitado aqui. A ideia principal do filme também revisita o clássico de 1971, uma vez que mostra a história da perspectiva do vilão caótico e tenta fazer o público entender o seu lado.
Grande filme.