Contado de forma biográfica, o filme não acontece por diversos motivos. Primeiro, a não-linearidade da narrativa, com diversos flashbacks e flashforward que não contribuem para o bom fluido dramático. Segundo, o foco no romance de Sérgio com Carolina (Ana de Armas), que apesar de esboçar uma leve química, destoa o tempo inteiro do argumento central, além de apresentar cenas românticas carimbadas. Por fim, apenas para não me alongar, pois há mais defeitos, o cenário geopolítico é retratado de forma rasa e pouco convincente - mesmo sabendo que não se trata de um documentário, espera-se algo mínimo de uma inspiração de acontecimentos reais. É um filme que tinha todos os atribuídos para ser uma grande produção, mas não foi. Creio que o principal problema foi o roteiro, muito mambembe.
O título engana à primeira vista se acharmos que é um mais um filme novelesco sobre o amor proibido. É uma história sobre a repressão do desejo e as suas consequências. Não há espaço para romantismo na arquitetura escolhida por Andrade (diretor) nas ruínas e grutas de uma Minas Gerais esquecida e pessimista com a fortuna do ouro. O diretor utiliza-se de uma linguagem incomum no cinema novo do Brasil à época, trazendo para cá referências de um cinema mais introspectivo, bergniano. Sobre a tortura do silêncio e do desejo impuro, o sofrimento da protagonista eclode “não sei se é o Demônio mesmo ou se é Deus que tá no meu corpo." Não há salvação, nem mesmo quando amor é por alguém enviado pelo divino. A fotografia é um dos grandes destaques, uma das mais bonitas que eu já vi no cinema brasileiro antes da retomada. Vale muito a pena conferir.
Iniciante, Amaral constroi a narrativa de maneira simples e leve, o que colabora para uma imersão naturalista e verdadeira ao drama, sensações pouco vistas no cinema brasileiro. Macabéa é o retrato de que a ingenuidade não tem vez. Ela é passada a perna pela amiga, pelo namorado, pela vida. Mesmo assim, ela se questiona “ser feliz serve pra que?”. Macabéa tem muitas perguntas e poucas respostas. A humanidade é cruel e não a fornece, quem não as sabem, julgam-a para alcançar um sentimento de superioridade. A personagem corria o risco de ser pouco crível e estereotipada com uma escalação incorreta, mas Marcelia Cartaxo dá vida à Macabéa de forma irretocável. Também iniciante, curiosamente assim como a personagem, ela tem o sonho de ser estrela de cinema. A realização do sonho chega e a hora da estrela é como cada espectador imagina. Um belo filme!
Com diálogos em alguns momentos quase inaudíveis, Mendonça coloca como destaque o som corriqueiro, aquele que muitas vezes incomoda: o som do carro do vizinho, o latido do cachorro, a lavadora de roupas. Mas o que mais incomoda não é o som ao redor. É a podridão da classe média. Por meio de um recorte de um quarteirão, Mendonça monta uma espécie de sistema feudal, onde o colonialismo impera e quem está na base da pirâmide é a corda que explode incendiada por aqueles que nem ainda chegaram ao topo. A sequência da reunião de condomínio em que os moradores discutem o trabalho do vigilante reflete bem o viés da classe. Há também o som mais alto da patroa que humilha a empregada, algo que vimos também com maestria pela Muyelart em “Que Horas Ela Volta?”. Ao contrário deste, faltou a “O Som ao Redor” a construção rítmica que envolve o espectador não somente a refletir sobre o que se quer elucidar, mas também o envolvimento com, ao menos, algum personagem.
Há uma vaga lembrança ao filme Persona, de Bergman. Só que em “Elena” não é somente ficção. Recheado de vídeos de arquivos, recortes de jornais e fotografias antigas, Petra narra o filme e imprime a sua visão dos fatos. O filme trata de uma dor pessoal e é delicado mergulhar na história, mesmo com o domínio da sensibilidade narrativa. A impressão que tive é que eu era um intruso como espectador. Petra adentra à raizes famíliares profundas em busca de encontrar a si mesma, tanto como pessoa quanto como estilo cinematográfico. Como balanço final, para ela, possivelmente um ótimo aprendizado; para o público, não sei ao certo.
Interessante e pouco comum a dramaturgia se arriscar no gênero noir, cheia de reviravoltas, mulher fatal, personagens moralmente ambíguos e toques expressionistas na fotografia. Alguns furos foram difíceis de engolir, como o delegado (Stênio Garcia) atuando como investigador de campo, algo inimaginável, ainda mais num interior, sorte que o personagem esteve nas mãos de um bom ator. Boa direção do Talma. A trilha sonora com instrumentais de suspense foi um dos pontos altos. Poderíamos ter mais minisséries neste estilo.
A segunda temporada comecou bem chata com aquele pessoal explorando um suposto ouro. Ainda bem que foram embora logo. Depois disso, melhora. A chegada da nova professora achei muito corrido, foi pouco tempo demais para os alunos já criarem uma identificação imediata, poderia ter sido mais explorada.
Com uma luz natural, Glauber apresenta um retrato duro de um Brasil castigado entre a religião e o poder no sertão. Sobre promessas como "o sertão vai virar mar", a esperança do oprimido um dia se tornar o opressor. Talvez incomode cenas de violências sem pirotécnicas e com marcações erradas, mas era o naturalismo e a fuga do politicamente aceito do Cinema Novo.
Se quiser uma boa história, não há. Há uma melancolia visualmente bela, e vale prestar atenção na forma como ela é mostrada. Creio que é um filme que não cabe avaliação (nem em nota, nem estrelas), é um cinema de vanguarda, poético, que sustenta seu valor pela brilhante capacidade experimental de Peixoto, por meio da câmera de Edgar Brasil, em utilizar planos contemplativos e o uso da montagem para alternar diferentes eventos, algo similar ao que Griffith apresentava. Há mitos e polêmicas em torno da sua exibição e de uma suposta carta de elogios ao filme escrita por Eisenstein: há quem afirme que fora escrita pelo próprio Peixoto. Verdade ou não, talvez a única forma de encontrar algum reconhecimento pela imprensa à época, reconhecido tardiamente.
Uma visão diferente do lixão e dos moradores ao redor. O recorte é o extinto aterro Jardim Gramacho, no Rio, mas penso que poderia ser em qualquer lugar. Há um grande interesse panfletário em promover o trabalho do artista plástico brasileiro Vik Muniz, que participa ativamente também do elenco e produção do doc. Tirando essa ressalva, é um bom produto. Os personagens foram bem escolhidos.
Steven Spielberg cria um suspense mais pela tensão do que os ataques do tubarão em si. Algo que Hitchcock já fazia com maestria. A diferença é que o tubarão é tratado como vilão, enquanto no cinema de Hitch vimos em “Os Pássaros” uma espécie de vingança, em que é o homem o predador. Eu particularmente no filme de Spilberg torci para o tubarão! Imagino o impacto que deve ter causado à época (1975) e ainda nas décadas seguintes. Hoje, não me chamou atenção. Demorei demais para assistí-lo. É louvável, no entanto, a direção criativa de Spielberg para montar a narrativa visual sem apelar para a bizarrice explícita. Como aliado, a trilha musical composta por John Williams é fundamental para o êxito do filme.
O filme é um prato cheio para quem gosta dos bastidores do cinema e todos os problemas que o rodeia: intriga, ego, jogo de poder. A indústria cinematográfica que requer lucros é um mundo cruel. Bryan Granston - famoso pelo personagem principal de Breaking Bad - dá vida a Trumbo de forma excepcional, alguns momentos acreditamos que ele é de fato o famoso roteirista. Merecidamente, foi indicado ao Oscar de melhor ator em 2016. O filme aborda com muita clareza as consequências do Comitê de Atividades Americanas, que caçou diversos artistas e prejudicou o trabalho de uma geração. Trumbo conseguiu resistir, mas muitos foram mortos e ou tiveram suas carreiras arruinadas. É difícil perceber que os novos tempos ainda há perseguição ideológica. O discurso do roteirista no final do longa poderia ser feito hoje, vale ainda como resistência e reflexão.
Exótico e com traços de pornochanchada, o filme consagrou a inconfundível beleza da Sônia Braga com várias cenas de nudez. A direção de Bruno Barreto tem marcas prejudiciais de produção com resquício de linguagem televisa, comum ainda hoje. Há problemas também no áudio, oscilante e baixo em vários momentos. Com o intuito de compactar toda a obra literária, a narrativa é corrida e prejudicou a linearidade central da relação Gabriela - Nacib. Creio que seja difícil adaptar Jorge Amado para telonas, ao contrário das telenovelas, que em sua maioria foram sucesso por conta da possibilidade de explorar o universo do autor com mais tempo. O filme de Barreto, por sua vez, não é de todo ruim. Há cenas em que a Braga não exibe o corpo, como tb mostra a sua inocência e tristeza, como num bonito plano em que ela, reflexiva, fica parada na praia. A trilha sonora é o grande destaque, com as músicas que imortalizaram a personagem nas vozes de Jobim e Gal Costa.
O último filme da trajetória de Antoine Doinel, da sequência “Os Incompreendidos”, “Antoine e Collette”, “Beijos Proibidos” e “Domicílio Conjugal”. Truffaut quis presentear o público nostálgico. Recheado de flashback, revivemos as principais passagens de Doinel nos filmes anteriores com o reencontro dos seus antigos amores e de uma nova amante, Sabine, vendedora de discos. Doinel agora é divorciado e o filme retrata o primeiro divórcio amigável da França dos anos 70. De garoto rebelde a pai separado, o moleque Doinel é o mesmo: egocêntrico, libertino e contador de histórias. As suas lembranças geram um livro. Vemos as consequências da dura infância de Doinel refletidas na sua vida adulta e agora registradas. Cristine, sua ex, critica-o com uma frase memorável: “uma obra de arte não pode ser um acerto de contas, senão não é arte.” Truffaut, por meio do seu personagem biográfico, encerra o ciclo de forma feliz ou simplesmente não encerra. Ele é do jeito que é: sempre correndo, sempre em fuga. A arte salva.
Doinel vive uma vida mais madura e vemos ele revelar que o amor é gostar também dos pais, da família da noiva, sentimento que ele não encontrou na infância. Passado o período da novidade conjugal, Doinel não se deixa cair no tédio e se envolve num relacionamento extraconjugal. A liberdade é algo valioso demais para ele seguir regras. Até a escolha do nome do filho é um capricho unicamente dele. Com toques de humor, “Domicílio Conjugal” mostra algumas alterações políticas na França da década de 70 e faz referências a cineastas e autores da preferência de Truffaut. Mas é a essência balzaquiana de Doinel que segue intacta mesmo diante às mudanças.
Doinel cresceu, sem aquela leve ingenuidade vista no primeiro filme, mas ainda continua moleque. Engana-se, porém, quem acha que o personagem é vazio; é um leitor assíduo de Balzac e ostenta uma segurança em tudo que faz, mesmo não sabendo fazer. Truffaut monta com muita naturalidade as experiência do Doinel marcadas pelo provisório. O espectador segue na expectativa que algo permanente mude-o, talvez a encantadora Cristine, moça que não se rende fácil. Ou talvez temos que aceitar os descaminhos sem um ponto final. Veremos nos próximos ...
Alguns filmes formam a paixão pelo cinema. É o meu caso com “Os Incompreendidos”, de Truffaut, que eu revi hoje. Foi o meu primeiro contato com um filme totalmente diferente do habitual, em que cenas aparentemente sem nenhuma ligação mostravam o cotidiano de Antoine Doinel, um garoto avesso às regras. Há quem diga que o personagem é o alter ego do próprio diretor. Era a minha descoberta a nouvelle vague, movimento de jovens cineastas que valorizavam o sujeito e a quebra da linearidade narrativa. Personagem amorais geralmente aparecem em busca da liberdade. Liberdade esta que em “Os Incompreendidos” é representada numa cena final do Antoine Doinel que ficou marcada na minha memória. Talvez, aqui, também foi a primeira vez que senti a liberdade que todos podem construir com uma câmera na mão.
⭐️⭐️⭐️⭐️ Uma grande surpresa encontrar uma “desbiografia” de Manoel de Barros, um dos poetas que mais admiro. Conhecido por valorizar as coisas miúdas e desinteressantes da vida, a sua poesia enaltece o simples por meio de uma linguagem própria e desconstruída. O documentário de Pedro César, narrado por ele mesmo, consegue recriar o universo dos versos de Manoel com muito conteúdo e sensibilidade. Há trechos de entrevista com o próprio Manoel, momentos raros de um escritor que não gostava de exposição. Filho do pantanal mato-grossense, o filme enaltece a fotografia entre o sépio e o amarrozando como forma de se aproximar da terra do poeta. Mais do que conhecer um pouco mais sobre ele, o doc permite conhecer mais os seus versos, repletos de símbolos que não precisam de significados. Vale a pena conferir.
O argumento do filme é um grande chamariz para os amantes da área. Um dos principais é Zeca, numa atuação pouco crível de Felipe Simas, quase atuando como um episódio da “Malhação”. Jorge Dias, por sua vez, passa a emoção necessária, diluída no drama de outros personagens. Mostrar a realidade de vários jovens, inclusive, foi um dos erros do longa, que poderia ter focado só em dois, no máximo três. Intencionado, o filme promove o Instituto Criar, local em que os adolescentes da quebrada encontram a oportunidade de estudar cinema gratuitamente, organização financiada por Luciano Huck, irmão do diretor. Infelizmente, nem sempre boa intenção e boa ideia fazem um grande filme. A mistura entre linguagem ficcional e documentário embolorou o roteiro, construído sem a força emocional que a sinopse exigia. Como cinema não funcionou, mas acredito no seu valor como fonte de pesquisa e inspiração para os interessados. Um produto razoável para ser utilizado em escolas.
Com um início morno, o filme encadeia para um romance com a boa química entre os protagonistas, dando margem a uma boa interpretação da Fernanda Machado. Solano ainda aparece com os trejeitos do seu personagem de TV, o Felix, mas não prejudica. Apesar de aparecer pouco, a ótima Clarisse Abujamra dá um chame à trama como a mãe da Mari. A narrativa salta quando o conflito é posto: Mari sofre um golpe e se envergonha da situação. A narrativa embala um suspense psicológico comedido, mas bem desenhado e crível. Mérito da direção de Michel Tikhomiroff, que acerta em criar situações envolventes mesmo diante do baixo orçamento. O roteiro bebe na fonte de tramas policiais com os de Agatha Christie e Sidney Sheldon e monta uma arquitetura simples, mas que funciona: os detalhes em pequenas situações não são por acaso, como os presentes comprados e recebidos pela protagonista, a insegurança que lhe é conferida pela família, bem como a ascensão que ela tem no trabalho. O defeito está apenas em entregar as associações e pistas mastigadas ao espectador; ele pouco precisa pensar para montar o quebra-cabeça. Apesar de ser um trama brasileira, poderia se passar em qualquer lugar, o conflito é universal e pode acontecer com qualquer mulher, o que vale como alerta. Pouco conhecido, “Confia em Mim” é um filme simples, mas honesto em sua construção e é envolvente. Merece ser descoberto.
Filmado numa grandiosa embalagem típica dos filmes de faroeste, a direção de Vinicus Coimbra promove bonitos planos da paisagem rural mineira, palco de cenas de guerrilha que não devem em nada às filmografias do gênero. João Miguel - do filme Estômago - aparece com um personagem do tipo cangaceiro que não combina com seu tipo físico, mas a sua boa atuação engole este detalhe, mostrando, mais uma vez, a sua versatilidade e competência. Na segunda parte, agora como religioso - quase um São Francisco de Assis - João parece um outro ator, tamanha a sua dedicação com a transição de fase. O filme como um todo é de grandes atuações, nomes como José Wilker, Teca Pereira, Vanessa Gerbeli são alguns exemplos. Destaque para o Chico Anysio como Major Consilva, imponente nas rápidas cenas em que ele aparece. Senti falta do personagem dele na segunda fase. A propósito, é uma pena que a transição do Matraga tenha deixado algumas pontas soltas. Muito bem filmado e com uma fotografia de encher os olhos, “A Hora e a Vez de Augusto Matraga” é mais um filme que comprova a potencialidade do cinema nacional.
Sérgio
3.2 223Contado de forma biográfica, o filme não acontece por diversos motivos. Primeiro, a não-linearidade da narrativa, com diversos flashbacks e flashforward que não contribuem para o bom fluido dramático. Segundo, o foco no romance de Sérgio com Carolina (Ana de Armas), que apesar de esboçar uma leve química, destoa o tempo inteiro do argumento central, além de apresentar cenas românticas carimbadas. Por fim, apenas para não me alongar, pois há mais defeitos, o cenário geopolítico é retratado de forma rasa e pouco convincente - mesmo sabendo que não se trata de um documentário, espera-se algo mínimo de uma inspiração de acontecimentos reais. É um filme que tinha todos os atribuídos para ser uma grande produção, mas não foi. Creio que o principal problema foi o roteiro, muito mambembe.
O Padre e a Moça
3.9 51O título engana à primeira vista se acharmos que é um mais um filme novelesco sobre o amor proibido. É uma história sobre a repressão do desejo e as suas consequências. Não há espaço para romantismo na arquitetura escolhida por Andrade (diretor) nas ruínas e grutas de uma Minas Gerais esquecida e pessimista com a fortuna do ouro. O diretor utiliza-se de uma linguagem incomum no cinema novo do Brasil à época, trazendo para cá referências de um cinema mais introspectivo, bergniano. Sobre a tortura do silêncio e do desejo impuro, o sofrimento da protagonista eclode “não sei se é o Demônio mesmo ou se é Deus que tá no meu corpo." Não há salvação, nem mesmo quando amor é por alguém enviado pelo divino. A fotografia é um dos grandes destaques, uma das mais bonitas que eu já vi no cinema brasileiro antes da retomada. Vale muito a pena conferir.
A Hora da Estrela
3.9 516Iniciante, Amaral constroi a narrativa de maneira simples e leve, o que colabora para uma imersão naturalista e verdadeira ao drama, sensações pouco vistas no cinema brasileiro. Macabéa é o retrato de que a ingenuidade não tem vez. Ela é passada a perna pela amiga, pelo namorado, pela vida. Mesmo assim, ela se questiona “ser feliz serve pra que?”. Macabéa tem muitas perguntas e poucas respostas. A humanidade é cruel e não a fornece, quem não as sabem, julgam-a para alcançar um sentimento de superioridade. A personagem corria o risco de ser pouco crível e estereotipada com uma escalação incorreta, mas Marcelia Cartaxo dá vida à Macabéa de forma irretocável. Também iniciante, curiosamente assim como a personagem, ela tem o sonho de ser estrela de cinema. A realização do sonho chega e a hora da estrela é como cada espectador imagina. Um belo filme!
O Som ao Redor
3.8 1,1K Assista AgoraCom diálogos em alguns momentos quase inaudíveis, Mendonça coloca como destaque o som corriqueiro, aquele que muitas vezes incomoda: o som do carro do vizinho, o latido do cachorro, a lavadora de roupas. Mas o que mais incomoda não é o som ao redor. É a podridão da classe média. Por meio de um recorte de um quarteirão, Mendonça monta uma espécie de sistema feudal, onde o colonialismo impera e quem está na base da pirâmide é a corda que explode incendiada por aqueles que nem ainda chegaram ao topo. A sequência da reunião de condomínio em que os moradores discutem o trabalho do vigilante reflete bem o viés da classe. Há também o som mais alto da patroa que humilha a empregada, algo que vimos também com maestria pela Muyelart em “Que Horas Ela Volta?”. Ao contrário deste, faltou a “O Som ao Redor” a construção rítmica que envolve o espectador não somente a refletir sobre o que se quer elucidar, mas também o envolvimento com, ao menos, algum personagem.
Da Derrota à Vitória
3.0 8Fraco. Cheio de músicas. Não apresenta nada de destaque no gênero.
Elena
4.2 1,3K Assista AgoraHá uma vaga lembrança ao filme Persona, de Bergman. Só que em “Elena” não é somente ficção. Recheado de vídeos de arquivos, recortes de jornais e fotografias antigas, Petra narra o filme e imprime a sua visão dos fatos. O filme trata de uma dor pessoal e é delicado mergulhar na história, mesmo com o domínio da sensibilidade narrativa. A impressão que tive é que eu era um intruso como espectador. Petra adentra à raizes famíliares profundas em busca de encontrar a si mesma, tanto como pessoa quanto como estilo cinematográfico. Como balanço final, para ela, possivelmente um ótimo aprendizado; para o público, não sei ao certo.
Boca do Lixo
3.4 10Interessante e pouco comum a dramaturgia se arriscar no gênero noir, cheia de reviravoltas, mulher fatal, personagens moralmente ambíguos e toques expressionistas na fotografia. Alguns furos foram difíceis de engolir, como o delegado (Stênio Garcia) atuando como investigador de campo, algo inimaginável, ainda mais num interior, sorte que o personagem esteve nas mãos de um bom ator. Boa direção do Talma. A trilha sonora com instrumentais de suspense foi um dos pontos altos. Poderíamos ter mais minisséries neste estilo.
Anne com um E (2ª Temporada)
4.6 443 Assista AgoraA segunda temporada comecou bem chata com aquele pessoal explorando um suposto ouro. Ainda bem que foram embora logo. Depois disso, melhora. A chegada da nova professora achei muito corrido, foi pouco tempo demais para os alunos já criarem uma identificação imediata, poderia ter sido mais explorada.
Deus e o Diabo na Terra do Sol
4.1 429 Assista AgoraCom uma luz natural, Glauber apresenta um retrato duro de um Brasil castigado entre a religião e o poder no sertão. Sobre promessas como "o sertão vai virar mar", a esperança do oprimido um dia se tornar o opressor. Talvez incomode cenas de violências sem pirotécnicas e com marcações erradas, mas era o naturalismo e a fuga do politicamente aceito do Cinema Novo.
Limite
4.0 168 Assista AgoraSe quiser uma boa história, não há. Há uma melancolia visualmente bela, e vale prestar atenção na forma como ela é mostrada. Creio que é um filme que não cabe avaliação (nem em nota, nem estrelas), é um cinema de vanguarda, poético, que sustenta seu valor pela brilhante capacidade experimental de Peixoto, por meio da câmera de Edgar Brasil, em utilizar planos contemplativos e o uso da montagem para alternar diferentes eventos, algo similar ao que Griffith apresentava. Há mitos e polêmicas em torno da sua exibição e de uma suposta carta de elogios ao filme escrita por Eisenstein: há quem afirme que fora escrita pelo próprio Peixoto. Verdade ou não, talvez a única forma de encontrar algum reconhecimento pela imprensa à época, reconhecido tardiamente.
Lixo Extraordinário
4.3 655Uma visão diferente do lixão e dos moradores ao redor. O recorte é o extinto aterro Jardim Gramacho, no Rio, mas penso que poderia ser em qualquer lugar. Há um grande interesse panfletário em promover o trabalho do artista plástico brasileiro Vik Muniz, que participa ativamente também do elenco e produção do doc. Tirando essa ressalva, é um bom produto. Os personagens foram bem escolhidos.
Tubarão
3.7 1,2K Assista AgoraSteven Spielberg cria um suspense mais pela tensão do que os ataques do tubarão em si. Algo que Hitchcock já fazia com maestria. A diferença é que o tubarão é tratado como vilão, enquanto no cinema de Hitch vimos em “Os Pássaros” uma espécie de vingança, em que é o homem o predador. Eu particularmente no filme de Spilberg torci para o tubarão! Imagino o impacto que deve ter causado à época (1975) e ainda nas décadas seguintes. Hoje, não me chamou atenção. Demorei demais para assistí-lo. É louvável, no entanto, a direção criativa de Spielberg para montar a narrativa visual sem apelar para a bizarrice explícita. Como aliado, a trilha musical composta por John Williams é fundamental para o êxito do filme.
Trumbo: Lista Negra
3.9 375 Assista AgoraO filme é um prato cheio para quem gosta dos bastidores do cinema e todos os problemas que o rodeia: intriga, ego, jogo de poder. A indústria cinematográfica que requer lucros é um mundo cruel. Bryan Granston - famoso pelo personagem principal de Breaking Bad - dá vida a Trumbo de forma excepcional, alguns momentos acreditamos que ele é de fato o famoso roteirista. Merecidamente, foi indicado ao Oscar de melhor ator em 2016. O filme aborda com muita clareza as consequências do Comitê de Atividades Americanas, que caçou diversos artistas e prejudicou o trabalho de uma geração. Trumbo conseguiu resistir, mas muitos foram mortos e ou tiveram suas carreiras arruinadas. É difícil perceber que os novos tempos ainda há perseguição ideológica. O discurso do roteirista no final do longa poderia ser feito hoje, vale ainda como resistência e reflexão.
Anne com um E (1ª Temporada)
4.6 759 Assista AgoraBoa pedida para estimular a imaginação e o otimismo. A protagonista é muito cativante. Lembra Pollyana, da Eleanor Porter.
Gabriela, Cravo e Canela
3.1 86Exótico e com traços de pornochanchada, o filme consagrou a inconfundível beleza da Sônia Braga com várias cenas de nudez. A direção de Bruno Barreto tem marcas prejudiciais de produção com resquício de linguagem televisa, comum ainda hoje. Há problemas também no áudio, oscilante e baixo em vários momentos. Com o intuito de compactar toda a obra literária, a narrativa é corrida e prejudicou a linearidade central da relação Gabriela - Nacib. Creio que seja difícil adaptar Jorge Amado para telonas, ao contrário das telenovelas, que em sua maioria foram sucesso por conta da possibilidade de explorar o universo do autor com mais tempo. O filme de Barreto, por sua vez, não é de todo ruim. Há cenas em que a Braga não exibe o corpo, como tb mostra a sua inocência e tristeza, como num bonito plano em que ela, reflexiva, fica parada na praia. A trilha sonora é o grande destaque, com as músicas que imortalizaram a personagem nas vozes de Jobim e Gal Costa.
O Amor em Fuga
4.1 92 Assista AgoraO último filme da trajetória de Antoine Doinel, da sequência “Os Incompreendidos”, “Antoine e Collette”, “Beijos Proibidos” e “Domicílio Conjugal”. Truffaut quis presentear o público nostálgico. Recheado de flashback, revivemos as principais passagens de Doinel nos filmes anteriores com o reencontro dos seus antigos amores e de uma nova amante, Sabine, vendedora de discos. Doinel agora é divorciado e o filme retrata o primeiro divórcio amigável da França dos anos 70. De garoto rebelde a pai separado, o moleque Doinel é o mesmo: egocêntrico, libertino e contador de histórias. As suas lembranças geram um livro. Vemos as consequências da dura infância de Doinel refletidas na sua vida adulta e agora registradas. Cristine, sua ex, critica-o com
uma frase memorável: “uma obra de arte não pode ser um acerto de contas, senão não é arte.” Truffaut, por meio do seu personagem biográfico, encerra o ciclo de forma feliz ou simplesmente não encerra. Ele é do jeito que é: sempre correndo, sempre em fuga. A arte salva.
Domicílio Conjugal
4.1 114 Assista AgoraDoinel vive uma vida mais madura e vemos ele revelar que o amor é gostar também dos pais, da família da noiva, sentimento que ele não encontrou na infância. Passado o período da novidade conjugal, Doinel não se deixa cair no tédio e se envolve num relacionamento extraconjugal. A liberdade é algo valioso demais para ele seguir regras. Até a escolha do nome do filho é um capricho unicamente dele. Com toques de humor, “Domicílio Conjugal” mostra algumas alterações políticas na França da década de 70 e faz referências a cineastas e autores da preferência de Truffaut. Mas é a essência balzaquiana de Doinel que segue intacta mesmo diante às mudanças.
Beijos Proibidos
4.1 138 Assista AgoraDoinel cresceu, sem aquela leve ingenuidade vista no primeiro filme, mas ainda continua moleque. Engana-se, porém, quem acha que o personagem é vazio; é um leitor assíduo de Balzac e ostenta uma segurança em tudo que faz, mesmo não sabendo fazer. Truffaut monta com muita naturalidade as experiência do Doinel marcadas pelo provisório. O espectador segue na expectativa que algo permanente mude-o, talvez a encantadora Cristine, moça que não se rende fácil. Ou talvez temos que aceitar os descaminhos sem um ponto final. Veremos nos próximos ...
O Dossiê Pelicano
3.4 157 Assista AgoraNada muito a dizer. Ritmo muito lento, suspense que não empolga. Vale só pra ver Julia Roberts.
Os Incompreendidos
4.4 645Alguns filmes formam a paixão pelo cinema. É o meu caso com “Os Incompreendidos”, de Truffaut, que eu revi hoje. Foi o meu primeiro contato com um filme totalmente diferente do habitual, em que cenas aparentemente sem nenhuma ligação mostravam o cotidiano de Antoine Doinel, um garoto avesso às regras. Há quem diga que o personagem é o alter ego do próprio diretor. Era a minha descoberta a nouvelle vague, movimento de jovens cineastas que valorizavam o sujeito e a quebra da linearidade narrativa. Personagem amorais geralmente aparecem em busca da liberdade. Liberdade esta que em “Os Incompreendidos” é representada numa cena final do Antoine Doinel que ficou marcada na minha memória. Talvez, aqui, também foi a primeira vez que senti a liberdade que todos podem construir com uma câmera na mão.
Só Dez Por Cento é Mentira
4.6 144⭐️⭐️⭐️⭐️
Uma grande surpresa encontrar uma “desbiografia” de Manoel de Barros, um dos poetas que mais admiro. Conhecido por valorizar as coisas miúdas e desinteressantes da vida, a sua poesia enaltece o simples por meio de uma linguagem própria e desconstruída. O documentário de Pedro César, narrado por ele mesmo, consegue recriar o universo dos versos de Manoel com muito conteúdo e sensibilidade. Há trechos de entrevista com o próprio Manoel, momentos raros de um escritor que não gostava de exposição. Filho do pantanal mato-grossense, o filme enaltece a fotografia entre o sépio e o amarrozando como forma de se aproximar da terra do poeta. Mais do que conhecer um pouco mais sobre ele, o doc permite conhecer mais os seus versos, repletos de símbolos que não precisam de significados. Vale a pena conferir.
Na Quebrada
3.3 98 Assista AgoraO argumento do filme é um grande chamariz para os amantes da área. Um dos principais é Zeca, numa atuação pouco crível de Felipe Simas, quase atuando como um episódio da “Malhação”. Jorge Dias, por sua vez, passa a emoção necessária, diluída no drama de outros personagens. Mostrar a realidade de vários jovens, inclusive, foi um dos erros do longa, que poderia ter focado só em dois, no máximo três. Intencionado, o filme promove o Instituto Criar, local em que os adolescentes da quebrada encontram a oportunidade de estudar cinema gratuitamente, organização financiada por Luciano Huck, irmão do diretor. Infelizmente, nem sempre boa intenção e boa ideia fazem um grande filme. A mistura entre linguagem ficcional e documentário embolorou o roteiro, construído sem a força emocional que a sinopse exigia. Como cinema não funcionou, mas acredito no seu valor como fonte de pesquisa e inspiração para os interessados. Um produto razoável para ser utilizado em escolas.
Confia em Mim
3.2 284 Assista AgoraCom um início morno, o filme encadeia para um romance com a boa química entre os protagonistas, dando margem a uma boa interpretação da Fernanda Machado. Solano ainda aparece com os trejeitos do seu personagem de TV, o Felix, mas não prejudica. Apesar de aparecer pouco, a ótima Clarisse Abujamra dá um chame à trama como a mãe da Mari. A narrativa salta quando o conflito é posto: Mari sofre um golpe e se envergonha da situação. A narrativa embala um suspense psicológico comedido, mas bem desenhado e crível. Mérito da direção de Michel Tikhomiroff, que acerta em criar situações envolventes mesmo diante do baixo orçamento. O roteiro bebe na fonte de tramas policiais com os de Agatha Christie e Sidney Sheldon e monta uma arquitetura simples, mas que funciona: os detalhes em pequenas situações não são por acaso, como os presentes comprados e recebidos pela protagonista, a insegurança que lhe é conferida pela família, bem como a ascensão que ela tem no trabalho. O defeito está apenas em entregar as associações e pistas mastigadas ao espectador; ele pouco precisa pensar para montar o quebra-cabeça. Apesar de ser um trama brasileira, poderia se passar em qualquer lugar, o conflito é universal e pode acontecer com qualquer mulher, o que vale como alerta. Pouco conhecido, “Confia em Mim” é um filme simples, mas honesto em sua construção e é envolvente. Merece ser descoberto.
A Hora e a Vez de Augusto Matraga
3.7 66Filmado numa grandiosa embalagem típica dos filmes de faroeste, a direção de Vinicus Coimbra promove bonitos planos da paisagem rural mineira, palco de cenas de guerrilha que não devem em nada às filmografias do gênero. João Miguel - do filme Estômago - aparece com um personagem do tipo cangaceiro que não combina com seu tipo físico, mas a sua boa atuação engole este detalhe, mostrando, mais uma vez, a sua versatilidade e competência. Na segunda parte, agora como religioso - quase um São Francisco de Assis - João parece um outro ator, tamanha a sua dedicação com a transição de fase. O filme como um todo é de grandes atuações, nomes como José Wilker, Teca Pereira, Vanessa Gerbeli são alguns exemplos. Destaque para o Chico Anysio como Major Consilva, imponente nas rápidas cenas em que ele aparece. Senti falta do personagem dele na segunda fase. A propósito, é uma pena que a transição do Matraga tenha deixado algumas pontas soltas. Muito bem filmado e com uma fotografia de encher os olhos, “A Hora e a Vez de Augusto Matraga” é mais um filme que comprova a potencialidade do cinema nacional.