Em Crash, por mais que suas locações sejam realistas, Cronenberg faz questão de criar situações eróticas que beira o fantástico sem causar estranhamento. Sua mise-en-scene transmite suscitamente essa divisão de realidade versus erotismo fantástico.
Encurralado possui uma montagem dinâmica que se torna a personagem principal da obra. Aqui a montagem é usada como elemento narrativo para criar suspense, além de balancear o tom e o ritmo do filme. Uma faroeste moderno com carros no lugar de armas. A masculinidade sendo medida por quem é mais rápido e por quem dirige melhor. Spielberg cria uma pérola em sua estréia.
Se todo filme é um sintoma da época em que é concebido, Medianeras é um sintoma contemporâneo de uma grande parcela de nossa sociedade que, mesmo após 10 anos do lançamento do filme, encontra-se cada vez mais na era da incomunicabilidade. O olhar de Gustavo Taretto nos entornos da vida de Martin e Mariana deduz de forma poética e crua o cotidiano de pessoas que se adaptaram a forma de vida proporcionada pela expansão dos grandes centros e da imensidão da rede de telecomunicações, principalmente a iternet.
A existência resumida no simples fato de existir, a solidão proporcionada pelas novas incompatibilidades do mundo moderno, misantropia do homem atual, incomunicabilidade nos prende em nosso ambiente ao ponto de virarmos mais um cômodo em nossa casa ou um manequim na vitrine. Seja qual for a linha de raciocínio, encontraremos escolhas estéticas que sustente cada uma destas linhas de pensamento.
“OLD (2021)”, “Matar ou Morrer (1952)”, “A Última Noite (2002)”, “Antes do Amanhecer (1995)”, e tanto outros filmes que eu poderia citar, possuem uma conexão apesar de tratarem de gêneros completamente diferentes – a utilização do tempo como narrativa. Não é segredo que o tempo cinematográfico passa de forma distinta da nossa realidade, o filme consegue criar essa ilusão de passagem das horas e nós aceitamos tal escolha. Estes são filmes que utilizam o tempo como elemento para resolução do conflitos criados. Constantemente estamos cumprindo prazos e seguindo horários, comportamentos pertinentes a nossa rotina que caso não seja cumprido, causará impactos inestimáveis. Sabendo disso, o tempo como elemento narrativo, sempre é uma boa escolha do diretor caso este procure causar algum tipo de impacto no público, assim como em “Matar ou Morrer (1952)” que os minutos são contados antes da catastrofe, em “A Última Noite (2002)” que o tempo anúncia o fim da liberdade ou em “Antes do Amanhecer (1995)”, tempo precede a separação.
Em “OLD (2021)”, Shyamalan utiliza o tempo como unidade de terror para o seu mais novo filme. Não há uma presença sobrenatural ou um slasher bem armado, mas a própria inevitabilidade do tempo. Não se luta contra ele, apenas aceitamos o fato de que ele passa e traz consigo inúmeros efeitos. Sabendo disso, Shyamalan escancara os mais variados tipos de fragilidade que possuímos e são atenuados através do tempo. Muitos planos são utilizados para anunciar sua passagem, mas também as sequelas que o mesmo deixa: como movimentos circulares em volta de uma das personagens anunciando uma possível perda de audição, uma plano subjetivo indicando cegueira, planos fechados refletindo um certo enclausuramento dentro da própria mente ou cortes e travellings que enxergamos a passagem das horas.
Shyamalan, tradicionalmente, explora bem o fantástico e o naturalista em seus filmes, conduzindo a história através deste meandro até desaguar de vez em um desses polos. Alguns torcem o nariz para as escolhas que o diretor faz para resolver suas histórias, porém é inegável o talento que o mesmo possuí para unir estética e linguagem, simultaneamente.
A câmera de Sérgio Machado é uma lupa que utilizamos para enxergar a mente de Karina, Naldinho e Deco. Uma câmera intrusiva que não respeita o espaço dos personagens, abusando de closes que não só exprimem as reações externas, mas também captam muito bem os pensamentos mais escondidos - o olhar exprime mais detalhes do psicológico dos personagena do que palavras.
Apesar disso, Machado muitas vezes distância a Câmara dos objetos principais e, com ajuda do cenário, externaliza certos sentimentos, seja deixar uma personagem isolado no canto esquerdo enquanto o lado direito está totalmente vago para expressar sua sensação de desprezado, ou quando a personagem vive olhando pela janela enquanto a janela do quarto a frente sempre se fecha sendo ai mais uma oportunidade que se foi, ou a sensação de estar perdido enquanto Deco está pensativo num corredor com grande profundidade de campo.
O filme está mais interessado no desenvolvimento da relação do trio e como isso afeta o relacionamento entre eles; se Deco e Naldinho são amigos de infância, essa amizade será posta em prova depois da chegada da protagonista Karina.
Os espaços exibem como estes estão a margem da sociedade. Enclausurados, por não saberem lidar com suas emoções, seus sonhos, paixões e, além de tudo, aquilo que escondem um do outro . Cidade Baixa é uma bomba atômica prestes a explodir, e o estopim é a provável ruptura entre os laços de Naldinho e Deco.
A partir da família principal que acompanhamos durante o filme, Kurosawa os utiliza como forma de experimento para que seu olhar análitico seja exposto de forma artística até nós. Essa família, a primeira vista, representa o antiquado começando pelos enquadramentos em formas geométricas retangulares, soando um lugar opressor, conservador e controlador. Todos estes adjetivos atribuídos à figura paterna. Por mais que o pai queira expressar seu autoritarismo e imposição onde mora, ele também exerce uma figura vitimista na história, justamente por ser ultrapassado socialmente e profissionalmente. Além dele, inúmeras pessoas que não se encaixaram nessa modernidade, movimentam-se como zumbis (literalmente), apenas existindo em uma sociedade de aparências e de exclusão, Kyioshi resume este como uma “sociedade de aparências”: como a autoridade do professor hipócrita que puni aquilo que pratica, de pessoas que não conseguem se re-alocar em suas antigas funções de prestígios, mas mantém suas vestimentas a fim de esconder seus trabalhos atuais que julgam "vergonhosos" e até na família principal que se comportam como uma seguidora dos antigos costumes japonês, mas esconde os conflitos que possuem justamente por praticar estes costumes de forma rigorosa.
O moderno os engolhe de forma visceral exigindo cada vez mais atribuições, julgando-os como incapacitados por saberem apenas aquele ofício na qual trabalhou há anos, criando robôs programados para produzir, propondo uma civilização que “vive para trabalhar”, sendo que o correto seria “trabalhar para viver”.
Kiyoshi Kurosawa é mestre em expor seu ponto de vista sobre a sociedade japonesa de uma maneira gradual, sem expor abruptamente tudo o que tem a dizer, exibe essa visão muito bem nos thrillers em que dirigiu (Ex: Pulse, The Cure), mas em Sonata de Tóquio, aposta em uma linguagem mais dramática, com elementos do suspense e sendo visceral em sua proposta narrativa.
O desejo de recomeçar proveniente da reflexão de si própio, move uma sequência belíssima do filme exaltando nossa potencialidade de como somos fortes o suficiente para mudar nossa trajetória no presente. Através das mazelas da família, enxergamos ensinamentos importantes de como podemos recomeçar: Podemos começar escolhendo ser livre como Megumi, podemos iniciar não exigindo tanto de si e dos outros, enxergando que status e dinheiro não é o mais impotante tal qual Sasaki. Ou então como Kenji, seguindo os seus sonhos.
Ozu cria uma espaço altamente sufocante de um vilarejo que, apesar das pessoas viveram próximas umas as outras, elas estão separadas justamente pelas suas palavras.
Os adultos falam coisas desnecessárias: "Bom dia", "boa tarde", "Boa noite", "o tempo está bom". Palavras meramente vázias que expressam uma formalidade com o intuito de esconder a incapacidade de se comunicar ou desinteresse pelo próximo, como apontado num certo diálogo - Essas palavras funcionam como lubrificantes, pois as coisas que importam são difíceis de dizer.
A mis en scène de Ozu é perfeitamente idealizada através dessa introdução. Somos apresentados a um vilarejo onde os vizinhos são separados praticamente por portas, porém suas atitudes os fazem distanciarem de um convívio pacífico. Começando pela escolha dos enquadramentos dos moradores, nenhuma das vizinhas são enquadradas num plano conjunto ao pontos de estarem próximas e, quando há necessidade de um plano aberto para a localização espacial das personagens, sempre há uma profundidade no campo que as separam. Suas atuações não são naturalistas soando deveras inexpressivo em certos momentos. O que já não podemos dizer a respeito do convívio entre as crianças ou os homens nos bares, neles não há conflitos onde que Ozu tenha que filmá-los em planos separadores.
Além do moderno estar gradativamente preenchendo o lugar do tradicional com a proliferação da TV, da obrigatoriedade da língua inglesa ou da expansão do mercado, vejam que Ozu reforça cada vez mais a necessidade da comunicabilidade neste universo contemporâneo, e quando duas crianças decidem não se comunicar como forma de protesto pelos seus pais recusarem o "moderno ", soa um tanto quanto irônico por parte de Ozu.
A princípio, com certo tom documentarista, Person introduz o espectador ao universo de Araguari onde iremos acompanhar a história dos irmãos Naves. Do documentário, passamos para uma drama ao expor o sofrimento que foi a vida dos irmãos Naves nas mãos de uma polícia exploradora e violenta e fechamos com um filme de tribunal. Essa pluralidade de gêneros, a visão européia de se fotografar e uma montagem desorientada, cria-se uma obra inquietante de um dos casos mais desastrosos da justiça brasileira.
Person mais uma vez surpreende em contar uma história que, mesmo que pareça apenas um relato histórico de uma época ou uma simples ficção, esconde um discurso social de revolta e insatisfação, assim como foi há dois anos antes deste filme, o excelente "São Paulo, Sociedade Anônima".
Tudo que circula Anna soa falso e intocável, a não ser seus próprios pensamentos, Joe Wright ilustra de forma atenuante as emoções da protagonista o que contrasta com as escolhas não naturalista do espaço em que a circula. Todas as luzes do extra-campo que são projedatas nas janelas, as atuações dos personagens secundários e a arte do seu apartamento ilustram uma espaço quase teatral e imaginário para que Anna possa expor suas paranóias que, ai sim, transparecem algo palpável ao ponto de gerar dúvidas sobre sua sanidade.
A obssessão pela vida dos vizinhos, os planos subjetivos de Anna para fora do seu apartamento, as luzes que criam um palco místico e até os enquadramentos (principalmente de dialogos), mostram uma influência clara dos clássicos de Hitchcock, a fonte inspiradora é excelente, infelizmente não há controle na exposição dos mistérios que circudam o filme. Da mesma forma que a dúvida é gerada , ela é entregue sem ao menos criar o suspense necessário ao ponto da surpresa ser reveladora.
Os anteriores a ele (Dr. No e Da Rússia com amor) são bons filmes, o que difere é que sinto que estes dois primeiros se levam mais a sério, e com isto a sensação de perigo torna-se mais palpável. Sinto que a discrepância dos tons usados em Goldfinger me distânciaram do filme, ele tenta usar um tom cômico falho ao mesmo tempo que estabelece o seu conflito, e falha em ambos.
O fato que mais gostei do filme foi o uso da antropofagia como elemento narrativo para referir-se o moderno comendo o passado, o poderoso devorando o mais fraco. Por exemplo, o poderoso Pietro fazendo feijoada de pessoas, Macunaíma trocando a tribo pela cidade e para isso tendo que ficar branco, e quando o mesmo volta, leva consigo guitarra e TV, objetos que não faziam parte daquele lugar, ou até mesmo todas obstinação pelo dinheiro e pela revolução dando lugar as tradições pertinentes à cultura nacional. Gosto da direção de Joaquim Pedro de Andrade, ele procura sempre resolver uma cena apenas com um movimento de câmera ou com o deslocamento dos atores em cena, não sendo refém do corte. O antagonismo de se utilizar Macunaíma como herói, mesmo ele sendo um preguiçoso safado, cria-se em minha mente um panorama de uma sociedade decadente, pois todos em sua volta possui as mesmas características. O "NonSense" cria um palco transgressor com todos estes personagens com desvios de caráter, o que é bom até se tornar repetitivo.
O Partido dos Panteras Negras foi fundado em 1966 por Bobby Seale e Huey Newton, foi uma organização revolucionária que buscava prestar programas sociais e realizar patrulhas contra qualquer tipo de violência policial que um pessoa negra poderia sofrer. Fred Hampton era o presidente da filial de Illinois, um dos líderes mais influentes dos panteras negras. Foi assassinado em 1969 pelo estado americano. Um dos seguidores de Fred era o informante do FBI, William O’Neal – que foi responsável por passar informações do líder e do grupo para o FBI, onde este tentava desmantelar o partido - É neste último ponto que o nosso filme trabalha.
Abrindo com gravações reais da época, temos uma contextualização superficial do que foi a organização, para logo depois aderir a uma linguagem mais ficcional, mas sem distanciar do líder que foi Fred Hampton e focar totalmente em seus discursos. Interpretado pelo excelente Daniel Kaluuya vencedor da categoria melhor ator coadjuvante na edição de 2021 do globo de ouro por este papel, percorremos entre seus discursos e situações vividas pelo partido, deslumbrando sua oratória que se contrasta a forma rústica de falar de William. Entre altos e baixos na organização e na vida social desse líder, torna-se cômico muitas vezes o esforço que o traidor faz para manter o seu disfarce, pois sabia que além dos serviços altruístas, os Panteras Negras tinham métodos nada ortodoxos de tratar farsantes.
Seja em ter um sonho de almejar o fim da segregação através de uma luta pacifista, com debates políticos e manifestações controladas defendidas por Martin Luther King, ou buscar o fim da segregação utilizando-se de quaisquer meios necessários para alcança-lo, respondendo com violência qualquer ato de violência defendida por Malcom X, entramos numa linha de debate delicada de qual deve ser a nossa reação perante a um situação de racismo , injuria ou violência. O filme também trabalha com este argumento gerando ótimos pontos de análise em qual decisão deveríamos tomar. O mais importante, e o que é consensual, é que a busca por direitos civis igualitários é obrigação de todos, e o cinema tem feito um papel importante neste aspecto nos últimos anos.
Se eu puder arriscar, acredito que esteja surgindo atualmente um movimento cinematográfico liderado por vários diretores interessados em retratar a luta do povo negro americano contra o racismo ao longo da história, e concomitante a isto trazer assuntos pertinentes a conscientização do racismo impregnado na sociedade atual. Filmes como: “Uma Noite em Miami (2021)”, “Infiltrado na Klan (2018)”, “A Voz Suprema do Blues (2020)”, “Judas e o Messias Negro (2021)” e até “Corra!(2017), fazem um trabalho excelente e necessário ao trazer pautas relevantes socialmente contra o racismo, independente dos seus gêneros. Espero que eu esteja certo e que surjam mais filmes incríveis com esta temática.
Junte a busca pela representação de uma realidade cruel suburbana do neorrealismo italiano, a inventividade técnica e desvinculação do cinema tradicional da nouvelle vague, acrescente tudo isso com muita brasilidade e temos uma umas das obras mais importantes do cinema nacional. Rio, 40 Graus.
Filme decisivo que influenciou, tematicamente e esteticamente, o que viria a ser o “Cinema Novo” que teve seu inicio em 1960. O movimento preocupava-se em destacar o cenário social brasileiro da época, tratando de temas como a fome, violência e exploração econômica vivida pelos mais pobres. Estes filmes afastavam-se daqueles que eram feitos até então pelos grandes estúdios da época, como os filmes do estúdio Vera Cruz que apostava em dramas influenciados por Hollywood e o estúdio Atlântida, este produzindo as famosas chanchadas que incluíam os grandes Oscarito e Grande Otelo.
Rio, 40 Graus acompanha um dia na vida de cinco garotos de favela que vendem amendoim nas regiões nobres do Rio de Janeiro. Durante este dia, vamos acompanhando a situação de outros personagens que vão surgindo durante o filme. É com tamanha sensibilidade com que Nelson Pereira dos Santos desloca de uma história para outra sem causar estranheza ou transparecer ilógico. As primeiras tramas vão sendo evidenciadas e Nelson usa travellings ou profundidade de campo para migrarmos de um personagem a outro, assim apresentando um novo drama. Quando todas as intrigas já estão expostas aguardando seu desfecho, o diretor aposta numa montagem mais acelerada utilizando-se cada vez mais de cortes para criar energia ao longa.
Impressionante como numa mesma situação, o filme consegue extrair beleza e decadência simultaneamente: Exemplo no jogo de futebol do time pengo (trocadilho para mengo) em que a paixão por futebol é apagada por conflitos constantes de torcedores, quando numa cena poética o garoto Paulo fica maravilhado com a beleza de um jardim até ser escorraçado por um guarda, ou quando preste a ser escoltado por um policial, sujinho que não tem pai e nem mãe é acolhido pelos moradores do morro.
Trafegando nos mais distintos campos de problemas sociais brasileiros que transparecem atemporais até os dias de hoje, o filme almeja sinceridade em retratar mazelas reais sem estereotipar cada núcleo social. É uma síntese de maior e menor escala daquela sociedade, pois seja para retratar pobreza ou egoísmo individual, corrupção ou mercado de apostas, trabalho infantil ou descaso social, todos eles não deixam de ser problemas reais de pessoas reais. Desta forma, com todas as informações que nos chegam sem parar, concluímos que nada mudou em nossa sociedade urbana desde 1955.
- Temos de acabar com essa maldita guerra e fazer com que seja a última. - Não se iluda.
Este diálogo entre Maréchal e Rosenthal nos minutos finais de “A Grande Ilusão”, exprime uma ideia de que a esperança pode ser uma arma para seguirmos em frente, ou simplesmente uma ilusão criada para que a realidade não seja tão aflitiva. A guerra sendo um produto daqueles que não irão lutar em campo, torna-se um peso para uma sociedade que fica a deriva do seu estado. Muitos dos homens em batalha não querem estar ali e cumprem o dever na qual foi obrigado, sacrificando suas próprias vidas.
Acompanhamos o Tenente Maréchal (Jean Gabin) e capitão Boeldieu (Pierre Fresnay) sendo aprisionados pela rival Alemanha e sendo arrastados com outros presos de guerra de diversas nacionalidades. O que se vê então é uma relação de amizade entre prisioneiros que transcende o conflito armado, sendo esta relação mais potente com o personagem Rosenthal (Marcel Dalio).
Jean Renoir, na maior parte do tempo, enquadra seus personagens no mesmo plano para reforçar o quão unido os mesmos estão. Somado a isto, temos as profundidades de campo que Renoir utiliza para incluir ação ocorrendo ao fundo gerando uma decupagem rica em detalhes e que dita as características da nova linguagem cinematográficas que estava a surgir no final dos anos 30 e inicio dos anos 40. Além disso, Renoir não é refém do corte, ele consegue transmitir emoção e informação ao público simplesmente com um movimento de câmera, um plano mais longo ou com a interação dos personagens com a locação.
Renoir aposta numa narrativa mais humanizada da guerra, onde muitos soldados, incluindo os Alemães, possuem empatia e humanidade por aqueles que defendem sua nação, vide a amizade entre o capitão alemão Rauffenstein e o capitão aprisionado francês Boeldieu, ou quando Maréchal está numa espécie de solitária e recebe de um soldado alemão uma gaita para aliviar sua solidão, o mesmo soldado verbaliza –“A guerra é demasiada longa”.
Renoir viria a dirigir dois anos mais tarde sua outra obra-prima “A Regra do Jogo”, que ilustraria as futilidades da aristocracia Francesa enquanto uma guerra estava prestes a acontecer, nas palavras do próprio diretor “uma sociedade a beira do vulcão”. Não obstante, “A Grande Ilusão” já ilustrava essa visão política e sarcástica de Renoir, pois ambos os filmes possui um certo tom de comédia, mesmo tendo como plano de fundo uma narrativa trágica.
“A Grande Ilusão” é sutil, tanto em seu tom provocativo quanto no seu teor dramático, conseguiu ser poderoso ao ponto do próprio Joseph Goebbels (ministro da propaganda nazista) determinar que as cópias do filme fossem as primeiras apreensões a serem realizadas quando a Alemanha ocupasse a França.
Gosto como a decupagem dos planos são inventivas para criar enquadramentos memoráveis como sally fugindo na caminhonete, a mesa de jantar e a dança no por do sol. É uma decupagem que busca enquadrar os personagens no ambiente cru e sem vida em que habitam, pois assim como o noticiário relata no primeiro ato do filme, é um universo violento. A cinematografia alcança uma unidade estilística com o "freak" que o filme almeja. Planos de perseguição com ângulo contra-plonge lindíssimos criando dinamismo e perigo, por exemplo. Assim como planos subjetivos de sally durante o horror que ela vive na mesa de jantar e até um montagem que cria corte precisos para chocar sem ser explícito, até porque eles tinham pouco recursos.
Independente de querer criar personagens para morrer, todos eles são desumanizados ao pontos de parecer meras marionetes fazendo caretas e falando frases de 5 a 6 palavras. Há um certo exagero na narrativa utilizada, seja na forma como as vítimas reagem ou como os vilões se comportam, o diretor aproveita desse exagero com intenção de criar desespero que, para mim, não funcionou, por exemplo: sally gritando horrores por quase 10 minutos enquanto há repetitivos close-ups dos vilões rindo. Há uma certa repetitividade que perdura por quase todo filme que demonstra ser mais um uso abusivo do mesmo recurso - Quanto dos personagens foram para a mesma rota do assassino? Por quantos vezes leatherface correu atrás da mocinha? Quantos shorts-reverse-shorts eram mais necessários para saber que Sally estava apavorada?
Magnatas do Crime consola quem sentia falta do antigo modo de contar história do criativo Guy Ritchie, quem gostou das tramas mirabolantes e montagem criativa proporcionada por “Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes (1998)” e “Snatch – Porcos e Diamantes (2001)”, encontrará um terreno familiar neste divertido longa.
Guy Ritchie apresenta um roteiro com inúmeros personagens e conflitos que, até certo momento, pode parecer moroso ao ter que acompanhar toda aquela apresentação extensa, porém quando a trama está estabelecida, entramos numa teia complexa que vai desenrolando e prendendo nossa atenção até sua resolução, durante todo esse percurso somos enganados inúmeras vezes. Seria isso uma grande virtude do filme, se não fosse pelo fato de depender muito do seu narrador para explicar todo contexto do filme, assim como narrar todo desfecho da trama principal.
Tal narração impressiona pela sua criatividade em utilizar a metalinguagem do cinema para narrar os acontecimentos dos fatos, pois Fletcher (Hugh Grant) é um detive particular que, após ser contratado para investigar a vida do grande Mafioso Mickey (Matthew McConaughey), escreve um roteiro cinematográfico com todos os fatos que conseguiu angariar. É a partir deste roteiro que Fletcher narra a historia do filme fazendo referências a esta indústria que tanto nos cativa.
Guy Ritchie está em seu habitat natural contando histórias de máfia com personagens cativantes, mesmo estes com desvios de caráter. Apresenta novamente uma trama cômica abusando da tragédia para trazer aquela culpa interna de estarmos vibrando por algo que não devíamos. Bom rever o Guy de antigamente.
Ammonite é silencioso e com intervalos de ruídos como o som das ondas do mar, ríspido e ao mesmo tempo sutil, como um toque na pele.
Através do toque das mãos é possível expressar os mais diversos tipos de sentimentos. Com as mãos também é possível criar artes belíssimas, porém também são usadas para ofender e causar dor, mas muitas vezes são utilizadas para demonstrar afeto e cuidado.
É sabendo disso que Ammonite cria sutileza e expressividade através do toque, constantes planos detalhes deste pequeno gesto que evidencia mais que qualquer palavra verbalizada. As mãos já calejadas de Mary (Kate Winslet) tem força suficiente para escavar um fóssil, mas sutilidade o bastante para cuidá-lo de forma quase que artesanal, sutileza para cuidar de um enfermo e transmitir desejo a quem se ama. As mãos de Charlotte (Saoirse Ronan) têm firmeza o suficiente para demonstrar desespero, suavidade proporcional para afagar. Quando estas mãos se encontram, descobrem o que ambas sempre procuravam e ninguém era capaz de proporcionar.
Há elementos que lembram “Retrato de uma Jovem em Chamas”, a começar pela trama em que ambas personagens deverão conviver em conjunto por um tempo limitado, na leitura feita por olhares e quando a convivência culmina no amor. Sem querer promulgar que houve cópias, cada uma das obras são excelentes em seu próprio universo e relevantes separadamente.
Mary é paleontóloga, o silêncio de sua vida é preenchida pelo som violento do mar, a frieza da fotografia com as locações com cores predominantemente cinzas, criam um palco de solidão somado a todas as mazelas que esta deve enfrentar. A chegada de Charlotte parece piorar a situação, pois esta também sofre com a melancolia de sua vida e o desafeto de sua vida amorosa. Com tamanha paciência, o diretor Francis Lee conta sua história sem forçar a relação das personagens, tudo é cuidadoso e gradativo até culminar numa relação amorosa mais sólida.
Além de tudo, o filme ainda tem espaço para expressar o seu descontentamento com a esfera acadêmica e cientifica que, por séculos, era constituída exclusivamente por homens. Na Sequência do museu, Mary é enquadrada num plano aberto onde ao fundo encontram-se uma parede com centenas de retratos de cientistas homens, vale ressaltar que neste museu há descobertas de Mary, porém nenhuma referencia a ela. Após um corte, enxergamos a personagem num plano médio em um certo ângulo que faz a mesma ser emoldurada metaforicamente numa tela de pintura. Desta forma, nós espectadores sempre lembraremos de todo os esforços e pesquisas feitas por Mary e outras mulheres que nunca tiveram um retrato seu na parede de um grande museu.
Solidão e amor de certa forma andam juntos para reforçar o poder que cada um possui separadamente, a força que um possui com ausência do outro, assim como Mary poetiza - “Será que estou sozinha? No entanto, em meus sonhos, uma forma eu vejo que pensa em mim e me ama também. Eu começo, e quando a visão voa, eu choro e estou sozinha”.
Não há como assistir Malcolm & Marie sem lembrar do excelente “Quem tem medo de Virginia Woolf? (1966)”, um clássico de Mike Nichols que narra uma noite de discussões entre o casal Martha e George após um jantar. Coincidentemente em Malcolm and Marie, somos convidados a conhecer a vida conturbada do casal cujo nome está expresso no título, após o evento solene de divulgação do mais novo filme de Malcom.
O diretor Sam Levinson decupa muito bem suas cenas buscando uma unidade estilística que concilie a fotografia e montagem em prol das atuações de Zendaya e Washington: No inicio ao apresentar os personagens, o filme enquadra Marie nos cômodos da casa em figuras geométricas retangulares numa espécie de prisão, seja logo no primeiro take do banheiro ou quando imediatamente esta se dirige para fumar enquanto é aprisionada pelo formato da porta, no mesmo momento em que Malcom dança em todo espaço da casa num longo plano sem cortes exaltando sua leveza de divulgar seu novo filme e uma aparente isenção de problemas, contrapondo-se a suposta inquietação de sua namorada. Logo Marie deixa de lado sua prisão e desabafa sua insatisfação para o diretor.
Durante o filme estes aspectos são reforçados: em momentos de histeria temos cortes mais excessivos e uma câmera que se movimenta mais no espaço; quando a discussão adquire tons mais amenos, a câmera desacelera abusando de closes mais longos enquanto um tenta ferir o outro com palavras, e até para explicitar o fim da primeira briga num momento de entrega e suavidade, a regra dos 180º é quebrada onde cada ator deveria ser filmado respeitado um área que compreende-se a 180º, aqui a câmera simplesmente inverteu sua posição para registrar um belíssimo beijo. Essa conformidade cria uma unidade própria para o filme onde todos os elementos de linguagem trabalham em conjunto para reforçar as ideias e sentimentos que o diretor quer transmitir.
O roteiro é peça fundamental numa história em menor escala como está onde há apenas dois atores contracenando, há pontos enervantes e de ternura que o roteiro conduz com ótimos diálogos. Infelizmente, em determinado ponto, a trama principal começa a torna-se redundante apelando para as mesmas indagações individuais que um há pelo outro, ou que Malcom possui pelos críticos de cinema.
Malcom & Marie reforça a consolidação dos nomes Zendaya e John David Washington como ótimos atores. Exprime verborragicamente discussões da vida de um casal apoiado num gráfico que a curva varia entre amor e ódio, e apresenta uma perspectiva da relação entre artista e crítico.
Promising Young woman evidencia um machismo e misoginia estrutural na sociedade. Instituições de alto e baixo escalão convivem com este comportamento deplorável e encaram como algo comum ou em casos mais graves, preferem ocultar para não se expor publicamente. Assim como os conceitos e valores que, ainda hoje, continuam invertidos, onde a roupa que a mulher usa ou quantidade de álcool que ela ingere, torna-a culpada de um possível abuso que a mesma venha a sofrer. O filme trabalha com estes temas de forma explicita chocando numa primeira vista para que depois a recompensa possa ser gratificante.
Sem fazer julgamento dos atos cometidos por Cassandra (Carey Mulligan), pois isto fica a critério moral de cada individuo, mas a recompensa é satisfatória ao presenciar certas situações onde a justiça é alcançada através de vingança, ou até mesmo quando homens são expostos aos seus comportamentos deploráveis e respondem de forma humilhante. Porém o longa expõe os dois lados de Cassandra: Contrapondo às locações festivas noturnas que a personagem frequenta, figurino extravagante e presença ameaçadora, temos a casa onde ela reside e cafeteria onde trabalha, ambas semelhante a um casa de boneca. Dualidade que mostra os dois pontos da personalidade de Cassandra – Perigosa, mais ainda assim aquela menina lúdica que abandonou a faculdade.
A trilha sonora acompanha essa ambiguidade incluindo músicas com letras tais quais: “I was busy thinking ‘bout boys” e “It’s raining men”. Um ponto análogo ao tema do filme, mas que aqui utilizada, reforça a ideia de um feminino mais empoderado.
Bem menos dramático como é de se esperar para este tipo de assunto, Emerald Fennel adotou tons de suspense e cômicos para abordar estes problemas sociais, o que deixou relativamente original e de certa forma corajoso, pois ainda são assuntos delicados.
Sait Maud é um filme corajoso em expressar sua trama nada fácil de uma forma tão explicita e ríspida. Independentemente de necessitar de mais tempo para conseguir desenvolver melhor sua protagonista, o longo consegue explanar suas ideias e explorar o máximo que pode da situação nada fácil vivida por Maud. Consequentemente tudo acontece de forma rápida, eventos acontecem sucessivamente sem tempo para um suspiro.
Filmes de terror/suspense a fim de enaltecer negativamente o fundamentalismo religioso possuem aos montes, por exemplo: O Mensageiro do Diabo (1955), A bruxa (2015) e Carrie – A Estranha (1976). Saint Maud consegue acrescentar muito ao tema ao trazer uma visão individual e centralizada na mente de Maud, sendo imprevisível na maior parte do tempo, principalmente quando a protagonista busca seu apogeu divino. Inicialmente sua fé está calcada numa mudança de vida que nunca chega, como bem expressado no inicio do filme quando a mesma diz – Perdoe-me a impaciência, mas espero que logo revele o plano que tem para mim. Mas que vai ganhando níveis maiores até deturpar o consciente já deteriorado da protagonista.
O contraste entre claro e escuro dos enquadramentos revelam a luz que Maud esforça-se em alcançar. Nos closes do rosto de Maud, luz e sombras predominam demonstrando essa ambiguidade moral que a personagem deve carregar. E nesta ambiguidade, encerramos com nossa protagonista encontrando a luz metaforicamente, evidenciada em seu canto “Eu vi a Luz, Eu vi a luz...”
Promising Young woman evidencia um machismo e misoginia estrutural na sociedade. Instituições de alto e baixo escalão convivem com este comportamento deplorável e encaram como algo comum ou em casos mais graves, preferem ocultar para não se expor publicamente. Assim como os conceitos e valores que, ainda hoje, continuam invertidos, onde a roupa que a mulher usa ou quantidade de álcool que ela ingere, torna-a culpada de um possível abuso que a mesma venha a sofrer. O filme trabalha com estes temas de forma explicita chocando numa primeira vista para que depois a recompensa possa ser gratificante.
Sem fazer julgamento dos atos cometidos por Cassandra (Carey Mulligan), pois isto fica a critério moral de cada individuo, mas a recompensa é satisfatória ao presenciar certas situações onde a justiça é alcançada através de vingança, ou até mesmo quando homens são expostos aos seus comportamentos deploráveis e respondem de forma humilhante. Porém o longa expõe os dois lados de Cassandra: Contrapondo às locações festivas noturnas que a personagem frequenta, figurino extravagante e presença ameaçadora, temos a casa onde ela reside e cafeteria onde trabalha, ambas semelhante a um casa de boneca. Dualidade que mostra os dois pontos da personalidade de Cassandra – Perigosa, mais ainda assim aquela menina lúdica que abandonou a faculdade.
A trilha sonora acompanha essa ambiguidade incluindo músicas com letras tais quais: “I was busy thinking ‘bout boys” e “It’s raining men”. Um ponto análogo ao tema do filme, mas que aqui utilizada, reforça a ideia de um feminino mais empoderado.
Bem menos dramático como é de se esperar para este tipo de assunto, Emerald Fennel adotou tons de suspense e cômicos para abordar estes problemas sociais, o que deixou relativamente original e de certa forma corajoso, pois ainda são assuntos delicados.
O Cinema como objeto de arte escapa de nossa perpeceção e, muitas vezes, esquecemos que estamos contemplando uma sessão de cinema. Ou seja, quando estamos vendo uma pintura, conseguimos separar aquela arte de nossa atual realidade, vemos uma tela emoldurada com pinceladas de tinta, assim como quado lemos um livro, estamos entertido na literatura através de letras sobre papéis que, constamente, estamos trocando de folha. Mas no cinema, uma vez que estamos numa sala escura e o único objeto iluminado é uma tela circunscrita, presenciaremos uma história que utilizará de imagens em movimento, em determinado ponto você esquecerá que estará vendo uma arte chamada cinema que trabalha através de 24 quadros por segundos, pois o filme tomou conta de sua percepção sobre a sua realiadade. Agora o que é real, é o que estamos vendo em tela, aquela é a única verdade que existe naquele momento.
Bergman, no início do filme, coloca uma sequencia de imagens de rolos de filmes em movimento e neste exato momento ele reforça que tudo o que veremos é cinema, e seu domonio é magistral nesta linha de raciocínio, pois aos 47 minutos de filme, quando já estamos imerso no meio de todo o conflinto, vemos o rolo do próprio filme sendo queimado, isso é Bergman dizendo que ainda estamos numa sessão de cinema.
Em Persona, acompanhamos a estadia da atriz Elisabet (Liv Ullmann) na casa de praia de sua médica junto com a Enfermeira Alma (Bibi Andersson). Neste período veremos a relação entre ambas e o uso de suas “máscaras”.
Segundo a psicologia de Carl Jung, Persona refere-se à personalidade que um sujeito apresenta aos demais como sendo real, no entanto pode ser uma versão muito contrária à verdadeira. Dito isso, vemos a principio uma relação estável de ambas as mulheres, sua reações e seus comportamentos, porém estas máscaras caem ou, é queimada literalmente para que elas possam expressar a verdadeira face. Uma vez que Elisabet deixa te falar, ela simplesmente torna-se um ser que não exprime sua vontade, praticamento neutro ao seu entorno, mas suas reações diz mais do que palavras podiam dizer. Alma, ao contrário, fala pelos cutuvelos exprimindo seus segredos; nessa dualidade não estamos totalmente confortados em confiar cem por cento em ambas, a dúvida da confiança é um stopin para nossa curiosidade.
A apreciação de Persona não está apenas em uma interpretação objetiva, ele vai além, a imersão sensorial também é impactante pelo desenrolar da tensão, e de enigmas que Bergman planta ocasionados pela convivência de ambas as personagens. Bergman além de tudo isso, abre mão de um design de produção mais requintado, todo cenário é simples sem informar nada sobre nossos personagens ou o espaço que está inserido, mas assim damos atenção aos nossos objetos de estudos, Elisabet e Alma.
Não só as máscaras destas mulheres caem, mas também a própria ilusão que o cinema cria da realidade, Bergman faz questão de apontar para nós. Pagamos para ser enganados, amamos a realidade anternativa que o cinema apresenta, amamos o cinema em sua forma por completo.
Francis Ford Coppola disse certa vez em uma entrevista que o sucesso do filme está calcado no roteiro e nas atuações, o rigor técnico de uma fotografia ou direção de arte não sustenta o filme por si só. Se seguirmos esta linha de pensamento de Coppola, a trilogia “Before” já nasceu como uma obra-prima, o que não discordo. Imagino num futuro próximo em que os cinéfilos, professores ou teóricos vão estar citando a trilogia “Before” como um dos grandes clássicos do cinema ao lado de outras trilogias como a dos Dólares, a trilogia Noriko e a Trilogia da Incomunicabilidade.
Se no primeiro filme destacamos a descoberta de Jesse (Ethan Hawke) e Celine (Julie Delpy), no segundo a (re)descoberta, em “Before Midnight” temos agora o conhecimento pleno que um tem do outro. É neste ponto onde mora o perigo, pois ao mesmo tempo em que sabem o que dizer para confortar, também sabem exatamente o que dizer para desestabilizar.
Agora de família constituída, Jesse e Celine encaram um novo estágio em suas vida com muitos diálogos (claro) acrescentando mais conteúdo sobre si mesmos, e nós achando que não tinham mais nada para ser dito. Como bem apontado em certa cena do filme, eles não lembram quando haviam conversado sobre qualquer outro assunto que não tenha sido sobre as próprias filhas e o que comer no dia seguinte.
Aqui os personagens encontram-se em férias na Grécia onde o filho de Jesse esta prestes a voltar para os Estados Unidos, e essa situação faz Jesse ser acometidos por inúmeros pensamentos por achar que está sendo um pai ausente na vida do garoto.
Nestas férias o casal encontra-se também ao lado de um casal mais jovem e outro casal mais velho, o que desperta um acaloroso diálogo numa mesa onde são discutidos inúmeros estágios sobre casamento, a descoberta de quando se ama a outra pessoa, as formas de manter contato (o que era um problema para Jesse e Celine em 94), sexo e encerra-se numa bela epifania sobre perda.
Jesse agora com mais rugas e Celine com o evidente corpo de uma mulher que tivera filhos, ambos ainda possuem o charme e a espontaneidade em seus longos planos de conversa, porém a fotografia laranja que foi muito usada que trazia aquela sensação da energia que sentiam um pelo outro, foi dado lugar a um azul austero refletindo que eles não possuem mais aquele desejo ardente a todo momento, pois agora há mais assuntos a serem tratados e de maior importância. O que é totalmente natural, uma vez que todos os casais, depois de um certo tempo, acostumam com a presença e a rotina provocada pelo tempo.
Assim como foi em “Before Sunset”, aqui há certas exposições do que ocorreram nos últimos 9 anos, mas no segundo filme da trilogia a exposição servia para uma atualização da vida de ambos e uma (re)descoberta, a exposição neste terceiro filme entre o casal é natural e não soa como artificio falho de roteiro, ao contrario, é utilizado numa cena carregada de discussão para um ter vantagem sobre o outro, de rebaixar e até de justificar as próprias ações.
Qualquer casal sofre os efeitos do tempo em seus corpos e em suas mentes; os bons e os maus momentos são consequências de um longo período juntos e cabe a cada um tornar o seus relacionamentos mais fortes a partir destes momentos. Pois no fundo de cada um ainda haverá sempre aquelas características que fizeram um se apaixonar pelo outro naquele verão de 1994.
Como Eu Era Antes de Você
3.7 2,3K Assista AgoraMe before you (2016) é a versão "família" do filme Breaking Waves (1996) de Lars Von Trier que foi lançado 20 anos antes.
Crash: Estranhos Prazeres
3.6 328 Assista AgoraEm Crash, por mais que suas locações sejam realistas, Cronenberg faz questão de criar situações eróticas que beira o fantástico sem causar estranhamento. Sua mise-en-scene transmite suscitamente essa divisão de realidade versus erotismo fantástico.
Encurralado
3.9 432 Assista AgoraEncurralado possui uma montagem dinâmica que se torna a personagem principal da obra. Aqui a montagem é usada como elemento narrativo para criar suspense, além de balancear o tom e o ritmo do filme. Uma faroeste moderno com carros no lugar de armas. A masculinidade sendo medida por quem é mais rápido e por quem dirige melhor. Spielberg cria uma pérola em sua estréia.
Medianeras: Buenos Aires na Era do Amor Virtual
4.3 2,3K Assista AgoraSe todo filme é um sintoma da época em que é concebido, Medianeras é um sintoma contemporâneo de uma grande parcela de nossa sociedade que, mesmo após 10 anos do lançamento do filme, encontra-se cada vez mais na era da incomunicabilidade. O olhar de Gustavo Taretto nos entornos da vida de Martin e Mariana deduz de forma poética e crua o cotidiano de pessoas que se adaptaram a forma de vida proporcionada pela expansão dos grandes centros e da imensidão da rede de telecomunicações, principalmente a iternet.
A existência resumida no simples fato de existir, a solidão proporcionada pelas novas incompatibilidades do mundo moderno, misantropia do homem atual, incomunicabilidade nos prende em nosso ambiente ao ponto de virarmos mais um cômodo em nossa casa ou um manequim na vitrine. Seja qual for a linha de raciocínio, encontraremos escolhas estéticas que sustente cada uma destas linhas de pensamento.
Tempo
3.1 1,1K Assista Agora“OLD (2021)”, “Matar ou Morrer (1952)”, “A Última Noite (2002)”, “Antes do Amanhecer (1995)”, e tanto outros filmes que eu poderia citar, possuem uma conexão apesar de tratarem de gêneros completamente diferentes – a utilização do tempo como narrativa. Não é segredo que o tempo cinematográfico passa de forma distinta da nossa realidade, o filme consegue criar essa ilusão de passagem das horas e nós aceitamos tal escolha. Estes são filmes que utilizam o tempo como elemento para resolução do conflitos criados. Constantemente estamos cumprindo prazos e seguindo horários, comportamentos pertinentes a nossa rotina que caso não seja cumprido, causará impactos inestimáveis. Sabendo disso, o tempo como elemento narrativo, sempre é uma boa escolha do diretor caso este procure causar algum tipo de impacto no público, assim como em “Matar ou Morrer (1952)” que os minutos são contados antes da catastrofe, em “A Última Noite (2002)” que o tempo anúncia o fim da liberdade ou em “Antes do Amanhecer (1995)”, tempo precede a separação.
Em “OLD (2021)”, Shyamalan utiliza o tempo como unidade de terror para o seu mais novo filme. Não há uma presença sobrenatural ou um slasher bem armado, mas a própria inevitabilidade do tempo. Não se luta contra ele, apenas aceitamos o fato de que ele passa e traz consigo inúmeros efeitos. Sabendo disso, Shyamalan escancara os mais variados tipos de fragilidade que possuímos e são atenuados através do tempo. Muitos planos são utilizados para anunciar sua passagem, mas também as sequelas que o mesmo deixa: como movimentos circulares em volta de uma das personagens anunciando uma possível perda de audição, uma plano subjetivo indicando cegueira, planos fechados refletindo um certo enclausuramento dentro da própria mente ou cortes e travellings que enxergamos a passagem das horas.
Shyamalan, tradicionalmente, explora bem o fantástico e o naturalista em seus filmes, conduzindo a história através deste meandro até desaguar de vez em um desses polos. Alguns torcem o nariz para as escolhas que o diretor faz para resolver suas histórias, porém é inegável o talento que o mesmo possuí para unir estética e linguagem, simultaneamente.
Cidade Baixa
3.4 356 Assista AgoraA câmera de Sérgio Machado é uma lupa que utilizamos para enxergar a mente de Karina, Naldinho e Deco. Uma câmera intrusiva que não respeita o espaço dos personagens, abusando de closes que não só exprimem as reações externas, mas também captam muito bem os pensamentos mais escondidos - o olhar exprime mais detalhes do psicológico dos personagena do que palavras.
Apesar disso, Machado muitas vezes distância a Câmara dos objetos principais e, com ajuda do cenário, externaliza certos sentimentos, seja deixar uma personagem isolado no canto esquerdo enquanto o lado direito está totalmente vago para expressar sua sensação de desprezado, ou quando a personagem vive olhando pela janela enquanto a janela do quarto a frente sempre se fecha sendo ai mais uma oportunidade que se foi, ou a sensação de estar perdido enquanto Deco está pensativo num corredor com grande profundidade de campo.
O filme está mais interessado no desenvolvimento da relação do trio e como isso afeta o relacionamento entre eles; se Deco e Naldinho são amigos de infância, essa amizade será posta em prova depois da chegada da protagonista Karina.
Os espaços exibem como estes estão a margem da sociedade. Enclausurados, por não saberem lidar com suas emoções, seus sonhos, paixões e, além de tudo, aquilo que escondem um do outro . Cidade Baixa é uma bomba atômica prestes a explodir, e o estopim é a provável ruptura entre os laços de Naldinho e Deco.
Sonata de Tóquio
4.1 59 Assista AgoraO Antiquado e o moderno
A partir da família principal que acompanhamos durante o filme, Kurosawa os utiliza como forma de experimento para que seu olhar análitico seja exposto de forma artística até nós. Essa família, a primeira vista, representa o antiquado começando pelos enquadramentos em formas geométricas retangulares, soando um lugar opressor, conservador e controlador. Todos estes adjetivos atribuídos à figura paterna. Por mais que o pai queira expressar seu autoritarismo e imposição onde mora, ele também exerce uma figura vitimista na história, justamente por ser ultrapassado socialmente e profissionalmente. Além dele, inúmeras pessoas que não se encaixaram nessa modernidade, movimentam-se como zumbis (literalmente), apenas existindo em uma sociedade de aparências e de exclusão, Kyioshi resume este como uma “sociedade de aparências”: como a autoridade do professor hipócrita que puni aquilo que pratica, de pessoas que não conseguem se re-alocar em suas antigas funções de prestígios, mas mantém suas vestimentas a fim de esconder seus trabalhos atuais que julgam "vergonhosos" e até na família principal que se comportam como uma seguidora dos antigos costumes japonês, mas esconde os conflitos que possuem justamente por praticar estes costumes de forma rigorosa.
O moderno os engolhe de forma visceral exigindo cada vez mais atribuições, julgando-os como incapacitados por saberem apenas aquele ofício na qual trabalhou há anos, criando robôs programados para produzir, propondo uma civilização que “vive para trabalhar”, sendo que o correto seria “trabalhar para viver”.
Kiyoshi Kurosawa é mestre em expor seu ponto de vista sobre a sociedade japonesa de uma maneira gradual, sem expor abruptamente tudo o que tem a dizer, exibe essa visão muito bem nos thrillers em que dirigiu (Ex: Pulse, The Cure), mas em Sonata de Tóquio, aposta em uma linguagem mais dramática, com elementos do suspense e sendo visceral em sua proposta narrativa.
O desejo de recomeçar proveniente da reflexão de si própio, move uma sequência belíssima do filme exaltando nossa potencialidade de como somos fortes o suficiente para mudar nossa trajetória no presente. Através das mazelas da família, enxergamos ensinamentos importantes de como podemos recomeçar: Podemos começar escolhendo ser livre como Megumi, podemos iniciar não exigindo tanto de si e dos outros, enxergando que status e dinheiro não é o mais impotante tal qual Sasaki. Ou então como Kenji, seguindo os seus sonhos.
Bom Dia
4.3 66Ozu cria uma espaço altamente sufocante de um vilarejo que, apesar das pessoas viveram próximas umas as outras, elas estão separadas justamente pelas suas palavras.
Os adultos falam coisas desnecessárias: "Bom dia", "boa tarde", "Boa noite", "o tempo está bom". Palavras meramente vázias que expressam uma formalidade com o intuito de esconder a incapacidade de se comunicar ou desinteresse pelo próximo, como apontado num certo diálogo - Essas palavras funcionam como lubrificantes, pois as coisas que importam são difíceis de dizer.
A mis en scène de Ozu é perfeitamente idealizada através dessa introdução. Somos apresentados a um vilarejo onde os vizinhos são separados praticamente por portas, porém suas atitudes os fazem distanciarem de um convívio pacífico. Começando pela escolha dos enquadramentos dos moradores, nenhuma das vizinhas são enquadradas num plano conjunto ao pontos de estarem próximas e, quando há necessidade de um plano aberto para a localização espacial das personagens, sempre há uma profundidade no campo que as separam. Suas atuações não são naturalistas soando deveras inexpressivo em certos momentos.
O que já não podemos dizer a respeito do convívio entre as crianças ou os homens nos bares, neles não há conflitos onde que Ozu tenha que filmá-los em planos separadores.
Além do moderno estar gradativamente preenchendo o lugar do tradicional com a proliferação da TV, da obrigatoriedade da língua inglesa ou da expansão do mercado, vejam que Ozu reforça cada vez mais a necessidade da comunicabilidade neste universo contemporâneo, e quando duas crianças decidem não se comunicar como forma de protesto pelos seus pais recusarem o "moderno ", soa um tanto quanto irônico por parte de Ozu.
O Caso dos Irmãos Naves
4.2 87 Assista AgoraA princípio, com certo tom documentarista, Person introduz o espectador ao universo de Araguari onde iremos acompanhar a história dos irmãos Naves. Do documentário, passamos para uma drama ao expor o sofrimento que foi a vida dos irmãos Naves nas mãos de uma polícia exploradora e violenta e fechamos com um filme de tribunal. Essa pluralidade de gêneros, a visão européia de se fotografar e uma montagem desorientada, cria-se uma obra inquietante de um dos casos mais desastrosos da justiça brasileira.
Person mais uma vez surpreende em contar uma história que, mesmo que pareça apenas um relato histórico de uma época ou uma simples ficção, esconde um discurso social de revolta e insatisfação, assim como foi há dois anos antes deste filme, o excelente "São Paulo, Sociedade Anônima".
A Mulher na Janela
3.0 1,1K Assista AgoraTudo que circula Anna soa falso e intocável, a não ser seus próprios pensamentos, Joe Wright ilustra de forma atenuante as emoções da protagonista o que contrasta com as escolhas não naturalista do espaço em que a circula. Todas as luzes do extra-campo que são projedatas nas janelas, as atuações dos personagens secundários e a arte do seu apartamento ilustram uma espaço quase teatral e imaginário para que Anna possa expor suas paranóias que, ai sim, transparecem algo palpável ao ponto de gerar dúvidas sobre sua sanidade.
A obssessão pela vida dos vizinhos, os planos subjetivos de Anna para fora do seu apartamento, as luzes que criam um palco místico e até os enquadramentos (principalmente de dialogos), mostram uma influência clara dos clássicos de Hitchcock, a fonte inspiradora é excelente, infelizmente não há controle na exposição dos mistérios que circudam o filme. Da mesma forma que a dúvida é gerada , ela é entregue sem ao menos criar o suspense necessário ao ponto da surpresa ser reveladora.
007 Contra Goldfinger
3.8 255 Assista AgoraOs anteriores a ele (Dr. No e Da Rússia com amor) são bons filmes, o que difere é que sinto que estes dois primeiros se levam mais a sério, e com isto a sensação de perigo torna-se mais palpável. Sinto que a discrepância dos tons usados em Goldfinger me distânciaram do filme, ele tenta usar um tom cômico falho ao mesmo tempo que estabelece o seu conflito, e falha em ambos.
Macunaíma
3.3 274 Assista AgoraO fato que mais gostei do filme foi o uso da antropofagia como elemento narrativo para referir-se o moderno comendo o passado, o poderoso devorando o mais fraco. Por exemplo, o poderoso Pietro fazendo feijoada de pessoas, Macunaíma trocando a tribo pela cidade e para isso tendo que ficar branco, e quando o mesmo volta, leva consigo guitarra e TV, objetos que não faziam parte daquele lugar, ou até mesmo todas obstinação pelo dinheiro e pela revolução dando lugar as tradições pertinentes à cultura nacional. Gosto da direção de Joaquim Pedro de Andrade, ele procura sempre resolver uma cena apenas com um movimento de câmera ou com o deslocamento dos atores em cena, não sendo refém do corte. O antagonismo de se utilizar Macunaíma como herói, mesmo ele sendo um preguiçoso safado, cria-se em minha mente um panorama de uma sociedade decadente, pois todos em sua volta possui as mesmas características. O "NonSense" cria um palco transgressor com todos estes personagens com desvios de caráter, o que é bom até se tornar repetitivo.
Judas e o Messias Negro
4.1 517 Assista AgoraO Partido dos Panteras Negras foi fundado em 1966 por Bobby Seale e Huey Newton, foi uma organização revolucionária que buscava prestar programas sociais e realizar patrulhas contra qualquer tipo de violência policial que um pessoa negra poderia sofrer. Fred Hampton era o presidente da filial de Illinois, um dos líderes mais influentes dos panteras negras. Foi assassinado em 1969 pelo estado americano. Um dos seguidores de Fred era o informante do FBI, William O’Neal – que foi responsável por passar informações do líder e do grupo para o FBI, onde este tentava desmantelar o partido - É neste último ponto que o nosso filme trabalha.
Abrindo com gravações reais da época, temos uma contextualização superficial do que foi a organização, para logo depois aderir a uma linguagem mais ficcional, mas sem distanciar do líder que foi Fred Hampton e focar totalmente em seus discursos. Interpretado pelo excelente Daniel Kaluuya vencedor da categoria melhor ator coadjuvante na edição de 2021 do globo de ouro por este papel, percorremos entre seus discursos e situações vividas pelo partido, deslumbrando sua oratória que se contrasta a forma rústica de falar de William. Entre altos e baixos na organização e na vida social desse líder, torna-se cômico muitas vezes o esforço que o traidor faz para manter o seu disfarce, pois sabia que além dos serviços altruístas, os Panteras Negras tinham métodos nada ortodoxos de tratar farsantes.
Seja em ter um sonho de almejar o fim da segregação através de uma luta pacifista, com debates políticos e manifestações controladas defendidas por Martin Luther King, ou buscar o fim da segregação utilizando-se de quaisquer meios necessários para alcança-lo, respondendo com violência qualquer ato de violência defendida por Malcom X, entramos numa linha de debate delicada de qual deve ser a nossa reação perante a um situação de racismo , injuria ou violência. O filme também trabalha com este argumento gerando ótimos pontos de análise em qual decisão deveríamos tomar. O mais importante, e o que é consensual, é que a busca por direitos civis igualitários é obrigação de todos, e o cinema tem feito um papel importante neste aspecto nos últimos anos.
Se eu puder arriscar, acredito que esteja surgindo atualmente um movimento cinematográfico liderado por vários diretores interessados em retratar a luta do povo negro americano contra o racismo ao longo da história, e concomitante a isto trazer assuntos pertinentes a conscientização do racismo impregnado na sociedade atual. Filmes como: “Uma Noite em Miami (2021)”, “Infiltrado na Klan (2018)”, “A Voz Suprema do Blues (2020)”, “Judas e o Messias Negro (2021)” e até “Corra!(2017), fazem um trabalho excelente e necessário ao trazer pautas relevantes socialmente contra o racismo, independente dos seus gêneros. Espero que eu esteja certo e que surjam mais filmes incríveis com esta temática.
Rio, 40 Graus
3.9 86 Assista AgoraJunte a busca pela representação de uma realidade cruel suburbana do neorrealismo italiano, a inventividade técnica e desvinculação do cinema tradicional da nouvelle vague, acrescente tudo isso com muita brasilidade e temos uma umas das obras mais importantes do cinema nacional. Rio, 40 Graus.
Filme decisivo que influenciou, tematicamente e esteticamente, o que viria a ser o “Cinema Novo” que teve seu inicio em 1960. O movimento preocupava-se em destacar o cenário social brasileiro da época, tratando de temas como a fome, violência e exploração econômica vivida pelos mais pobres. Estes filmes afastavam-se daqueles que eram feitos até então pelos grandes estúdios da época, como os filmes do estúdio Vera Cruz que apostava em dramas influenciados por Hollywood e o estúdio Atlântida, este produzindo as famosas chanchadas que incluíam os grandes Oscarito e Grande Otelo.
Rio, 40 Graus acompanha um dia na vida de cinco garotos de favela que vendem amendoim nas regiões nobres do Rio de Janeiro. Durante este dia, vamos acompanhando a situação de outros personagens que vão surgindo durante o filme. É com tamanha sensibilidade com que Nelson Pereira dos Santos desloca de uma história para outra sem causar estranheza ou transparecer ilógico. As primeiras tramas vão sendo evidenciadas e Nelson usa travellings ou profundidade de campo para migrarmos de um personagem a outro, assim apresentando um novo drama. Quando todas as intrigas já estão expostas aguardando seu desfecho, o diretor aposta numa montagem mais acelerada utilizando-se cada vez mais de cortes para criar energia ao longa.
Impressionante como numa mesma situação, o filme consegue extrair beleza e decadência simultaneamente: Exemplo no jogo de futebol do time pengo (trocadilho para mengo) em que a paixão por futebol é apagada por conflitos constantes de torcedores, quando numa cena poética o garoto Paulo fica maravilhado com a beleza de um jardim até ser escorraçado por um guarda, ou quando preste a ser escoltado por um policial, sujinho que não tem pai e nem mãe é acolhido pelos moradores do morro.
Trafegando nos mais distintos campos de problemas sociais brasileiros que transparecem atemporais até os dias de hoje, o filme almeja sinceridade em retratar mazelas reais sem estereotipar cada núcleo social. É uma síntese de maior e menor escala daquela sociedade, pois seja para retratar pobreza ou egoísmo individual, corrupção ou mercado de apostas, trabalho infantil ou descaso social, todos eles não deixam de ser problemas reais de pessoas reais. Desta forma, com todas as informações que nos chegam sem parar, concluímos que nada mudou em nossa sociedade urbana desde 1955.
A Grande Ilusão
4.1 53 Assista Agora- Temos de acabar com essa maldita guerra e fazer com que seja a última.
- Não se iluda.
Este diálogo entre Maréchal e Rosenthal nos minutos finais de “A Grande Ilusão”, exprime uma ideia de que a esperança pode ser uma arma para seguirmos em frente, ou simplesmente uma ilusão criada para que a realidade não seja tão aflitiva. A guerra sendo um produto daqueles que não irão lutar em campo, torna-se um peso para uma sociedade que fica a deriva do seu estado. Muitos dos homens em batalha não querem estar ali e cumprem o dever na qual foi obrigado, sacrificando suas próprias vidas.
Acompanhamos o Tenente Maréchal (Jean Gabin) e capitão Boeldieu (Pierre Fresnay) sendo aprisionados pela rival Alemanha e sendo arrastados com outros presos de guerra de diversas nacionalidades. O que se vê então é uma relação de amizade entre prisioneiros que transcende o conflito armado, sendo esta relação mais potente com o personagem Rosenthal (Marcel Dalio).
Jean Renoir, na maior parte do tempo, enquadra seus personagens no mesmo plano para reforçar o quão unido os mesmos estão. Somado a isto, temos as profundidades de campo que Renoir utiliza para incluir ação ocorrendo ao fundo gerando uma decupagem rica em detalhes e que dita as características da nova linguagem cinematográficas que estava a surgir no final dos anos 30 e inicio dos anos 40. Além disso, Renoir não é refém do corte, ele consegue transmitir emoção e informação ao público simplesmente com um movimento de câmera, um plano mais longo ou com a interação dos personagens com a locação.
Renoir aposta numa narrativa mais humanizada da guerra, onde muitos soldados, incluindo os Alemães, possuem empatia e humanidade por aqueles que defendem sua nação, vide a amizade entre o capitão alemão Rauffenstein e o capitão aprisionado francês Boeldieu, ou quando Maréchal está numa espécie de solitária e recebe de um soldado alemão uma gaita para aliviar sua solidão, o mesmo soldado verbaliza –“A guerra é demasiada longa”.
Renoir viria a dirigir dois anos mais tarde sua outra obra-prima “A Regra do Jogo”, que ilustraria as futilidades da aristocracia Francesa enquanto uma guerra estava prestes a acontecer, nas palavras do próprio diretor “uma sociedade a beira do vulcão”. Não obstante, “A Grande Ilusão” já ilustrava essa visão política e sarcástica de Renoir, pois ambos os filmes possui um certo tom de comédia, mesmo tendo como plano de fundo uma narrativa trágica.
“A Grande Ilusão” é sutil, tanto em seu tom provocativo quanto no seu teor dramático, conseguiu ser poderoso ao ponto do próprio Joseph Goebbels (ministro da propaganda nazista) determinar que as cópias do filme fossem as primeiras apreensões a serem realizadas quando a Alemanha ocupasse a França.
O Massacre da Serra Elétrica
3.7 1,0K Assista AgoraGosto como a decupagem dos planos são inventivas para criar enquadramentos memoráveis como sally fugindo na caminhonete, a mesa de jantar e a dança no por do sol. É uma decupagem que busca enquadrar os personagens no ambiente cru e sem vida em que habitam, pois assim como o noticiário relata no primeiro ato do filme, é um universo violento. A cinematografia alcança uma unidade estilística com o "freak" que o filme almeja. Planos de perseguição com ângulo contra-plonge lindíssimos criando dinamismo e perigo, por exemplo. Assim como planos subjetivos de sally durante o horror que ela vive na mesa de jantar e até um montagem que cria corte precisos para chocar sem ser explícito, até porque eles tinham pouco recursos.
Independente de querer criar personagens para morrer, todos eles são desumanizados ao pontos de parecer meras marionetes fazendo caretas e falando frases de 5 a 6 palavras. Há um certo exagero na narrativa utilizada, seja na forma como as vítimas reagem ou como os vilões se comportam, o diretor aproveita desse exagero com intenção de criar desespero que, para mim, não funcionou, por exemplo: sally gritando horrores por quase 10 minutos enquanto há repetitivos close-ups dos vilões rindo. Há uma certa repetitividade que perdura por quase todo filme que demonstra ser mais um uso abusivo do mesmo recurso - Quanto dos personagens foram para a mesma rota do assassino? Por quantos vezes leatherface correu atrás da mocinha? Quantos shorts-reverse-shorts eram mais necessários para saber que Sally estava apavorada?
Magnatas do Crime
3.8 299 Assista AgoraMagnatas do Crime consola quem sentia falta do antigo modo de contar história do criativo Guy Ritchie, quem gostou das tramas mirabolantes e montagem criativa proporcionada por “Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes (1998)” e “Snatch – Porcos e Diamantes (2001)”, encontrará um terreno familiar neste divertido longa.
Guy Ritchie apresenta um roteiro com inúmeros personagens e conflitos que, até certo momento, pode parecer moroso ao ter que acompanhar toda aquela apresentação extensa, porém quando a trama está estabelecida, entramos numa teia complexa que vai desenrolando e prendendo nossa atenção até sua resolução, durante todo esse percurso somos enganados inúmeras vezes. Seria isso uma grande virtude do filme, se não fosse pelo fato de depender muito do seu narrador para explicar todo contexto do filme, assim como narrar todo desfecho da trama principal.
Tal narração impressiona pela sua criatividade em utilizar a metalinguagem do cinema para narrar os acontecimentos dos fatos, pois Fletcher (Hugh Grant) é um detive particular que, após ser contratado para investigar a vida do grande Mafioso Mickey (Matthew McConaughey), escreve um roteiro cinematográfico com todos os fatos que conseguiu angariar. É a partir deste roteiro que Fletcher narra a historia do filme fazendo referências a esta indústria que tanto nos cativa.
Guy Ritchie está em seu habitat natural contando histórias de máfia com personagens cativantes, mesmo estes com desvios de caráter. Apresenta novamente uma trama cômica abusando da tragédia para trazer aquela culpa interna de estarmos vibrando por algo que não devíamos. Bom rever o Guy de antigamente.
Ammonite
3.6 243 Assista AgoraAmmonite é silencioso e com intervalos de ruídos como o som das ondas do mar, ríspido e ao mesmo tempo sutil, como um toque na pele.
Através do toque das mãos é possível expressar os mais diversos tipos de sentimentos. Com as mãos também é possível criar artes belíssimas, porém também são usadas para ofender e causar dor, mas muitas vezes são utilizadas para demonstrar afeto e cuidado.
É sabendo disso que Ammonite cria sutileza e expressividade através do toque, constantes planos detalhes deste pequeno gesto que evidencia mais que qualquer palavra verbalizada. As mãos já calejadas de Mary (Kate Winslet) tem força suficiente para escavar um fóssil, mas sutilidade o bastante para cuidá-lo de forma quase que artesanal, sutileza para cuidar de um enfermo e transmitir desejo a quem se ama. As mãos de Charlotte (Saoirse Ronan) têm firmeza o suficiente para demonstrar desespero, suavidade proporcional para afagar. Quando estas mãos se encontram, descobrem o que ambas sempre procuravam e ninguém era capaz de proporcionar.
Há elementos que lembram “Retrato de uma Jovem em Chamas”, a começar pela trama em que ambas personagens deverão conviver em conjunto por um tempo limitado, na leitura feita por olhares e quando a convivência culmina no amor. Sem querer promulgar que houve cópias, cada uma das obras são excelentes em seu próprio universo e relevantes separadamente.
Mary é paleontóloga, o silêncio de sua vida é preenchida pelo som violento do mar, a frieza da fotografia com as locações com cores predominantemente cinzas, criam um palco de solidão somado a todas as mazelas que esta deve enfrentar. A chegada de Charlotte parece piorar a situação, pois esta também sofre com a melancolia de sua vida e o desafeto de sua vida amorosa. Com tamanha paciência, o diretor Francis Lee conta sua história sem forçar a relação das personagens, tudo é cuidadoso e gradativo até culminar numa relação amorosa mais sólida.
Além de tudo, o filme ainda tem espaço para expressar o seu descontentamento com a esfera acadêmica e cientifica que, por séculos, era constituída exclusivamente por homens. Na Sequência do museu, Mary é enquadrada num plano aberto onde ao fundo encontram-se uma parede com centenas de retratos de cientistas homens, vale ressaltar que neste museu há descobertas de Mary, porém nenhuma referencia a ela. Após um corte, enxergamos a personagem num plano médio em um certo ângulo que faz a mesma ser emoldurada metaforicamente numa tela de pintura. Desta forma, nós espectadores sempre lembraremos de todo os esforços e pesquisas feitas por Mary e outras mulheres que nunca tiveram um retrato seu na parede de um grande museu.
Solidão e amor de certa forma andam juntos para reforçar o poder que cada um possui separadamente, a força que um possui com ausência do outro, assim como Mary poetiza - “Será que estou sozinha? No entanto, em meus sonhos, uma forma eu vejo que pensa em mim e me ama também. Eu começo, e quando a visão voa, eu choro e estou sozinha”.
Malcolm & Marie
3.5 314 Assista AgoraQuem tem medo de Zendaya Woolf?
Não há como assistir Malcolm & Marie sem lembrar do excelente “Quem tem medo de Virginia Woolf? (1966)”, um clássico de Mike Nichols que narra uma noite de discussões entre o casal Martha e George após um jantar. Coincidentemente em Malcolm and Marie, somos convidados a conhecer a vida conturbada do casal cujo nome está expresso no título, após o evento solene de divulgação do mais novo filme de Malcom.
O diretor Sam Levinson decupa muito bem suas cenas buscando uma unidade estilística que concilie a fotografia e montagem em prol das atuações de Zendaya e Washington: No inicio ao apresentar os personagens, o filme enquadra Marie nos cômodos da casa em figuras geométricas retangulares numa espécie de prisão, seja logo no primeiro take do banheiro ou quando imediatamente esta se dirige para fumar enquanto é aprisionada pelo formato da porta, no mesmo momento em que Malcom dança em todo espaço da casa num longo plano sem cortes exaltando sua leveza de divulgar seu novo filme e uma aparente isenção de problemas, contrapondo-se a suposta inquietação de sua namorada. Logo Marie deixa de lado sua prisão e desabafa sua insatisfação para o diretor.
Durante o filme estes aspectos são reforçados: em momentos de histeria temos cortes mais excessivos e uma câmera que se movimenta mais no espaço; quando a discussão adquire tons mais amenos, a câmera desacelera abusando de closes mais longos enquanto um tenta ferir o outro com palavras, e até para explicitar o fim da primeira briga num momento de entrega e suavidade, a regra dos 180º é quebrada onde cada ator deveria ser filmado respeitado um área que compreende-se a 180º, aqui a câmera simplesmente inverteu sua posição para registrar um belíssimo beijo. Essa conformidade cria uma unidade própria para o filme onde todos os elementos de linguagem trabalham em conjunto para reforçar as ideias e sentimentos que o diretor quer transmitir.
O roteiro é peça fundamental numa história em menor escala como está onde há apenas dois atores contracenando, há pontos enervantes e de ternura que o roteiro conduz com ótimos diálogos. Infelizmente, em determinado ponto, a trama principal começa a torna-se redundante apelando para as mesmas indagações individuais que um há pelo outro, ou que Malcom possui pelos críticos de cinema.
Malcom & Marie reforça a consolidação dos nomes Zendaya e John David Washington como ótimos atores. Exprime verborragicamente discussões da vida de um casal apoiado num gráfico que a curva varia entre amor e ódio, e apresenta uma perspectiva da relação entre artista e crítico.
Bela Vingança
3.8 1,3K Assista AgoraPromising Young woman evidencia um machismo e misoginia estrutural na sociedade. Instituições de alto e baixo escalão convivem com este comportamento deplorável e encaram como algo comum ou em casos mais graves, preferem ocultar para não se expor publicamente. Assim como os conceitos e valores que, ainda hoje, continuam invertidos, onde a roupa que a mulher usa ou quantidade de álcool que ela ingere, torna-a culpada de um possível abuso que a mesma venha a sofrer. O filme trabalha com estes temas de forma explicita chocando numa primeira vista para que depois a recompensa possa ser gratificante.
Sem fazer julgamento dos atos cometidos por Cassandra (Carey Mulligan), pois isto fica a critério moral de cada individuo, mas a recompensa é satisfatória ao presenciar certas situações onde a justiça é alcançada através de vingança, ou até mesmo quando homens são expostos aos seus comportamentos deploráveis e respondem de forma humilhante. Porém o longa expõe os dois lados de Cassandra: Contrapondo às locações festivas noturnas que a personagem frequenta, figurino extravagante e presença ameaçadora, temos a casa onde ela reside e cafeteria onde trabalha, ambas semelhante a um casa de boneca. Dualidade que mostra os dois pontos da personalidade de Cassandra – Perigosa, mais ainda assim aquela menina lúdica que abandonou a faculdade.
A trilha sonora acompanha essa ambiguidade incluindo músicas com letras tais quais: “I was busy thinking ‘bout boys” e “It’s raining men”. Um ponto análogo ao tema do filme, mas que aqui utilizada, reforça a ideia de um feminino mais empoderado.
Bem menos dramático como é de se esperar para este tipo de assunto, Emerald Fennel adotou tons de suspense e cômicos para abordar estes problemas sociais, o que deixou relativamente original e de certa forma corajoso, pois ainda são assuntos delicados.
Saint Maud
3.5 334 Assista AgoraSait Maud é um filme corajoso em expressar sua trama nada fácil de uma forma tão explicita e ríspida. Independentemente de necessitar de mais tempo para conseguir desenvolver melhor sua protagonista, o longo consegue explanar suas ideias e explorar o máximo que pode da situação nada fácil vivida por Maud. Consequentemente tudo acontece de forma rápida, eventos acontecem sucessivamente sem tempo para um suspiro.
Filmes de terror/suspense a fim de enaltecer negativamente o fundamentalismo religioso possuem aos montes, por exemplo: O Mensageiro do Diabo (1955), A bruxa (2015) e Carrie – A Estranha (1976). Saint Maud consegue acrescentar muito ao tema ao trazer uma visão individual e centralizada na mente de Maud, sendo imprevisível na maior parte do tempo, principalmente quando a protagonista busca seu apogeu divino. Inicialmente sua fé está calcada numa mudança de vida que nunca chega, como bem expressado no inicio do filme quando a mesma diz – Perdoe-me a impaciência, mas espero que logo revele o plano que tem para mim. Mas que vai ganhando níveis maiores até deturpar o consciente já deteriorado da protagonista.
O contraste entre claro e escuro dos enquadramentos revelam a luz que Maud esforça-se em alcançar. Nos closes do rosto de Maud, luz e sombras predominam demonstrando essa ambiguidade moral que a personagem deve carregar. E nesta ambiguidade, encerramos com nossa protagonista encontrando a luz metaforicamente, evidenciada em seu canto “Eu vi a Luz, Eu vi a luz...”
Bela Vingança
3.8 1,3K Assista AgoraPromising Young woman evidencia um machismo e misoginia estrutural na sociedade. Instituições de alto e baixo escalão convivem com este comportamento deplorável e encaram como algo comum ou em casos mais graves, preferem ocultar para não se expor publicamente. Assim como os conceitos e valores que, ainda hoje, continuam invertidos, onde a roupa que a mulher usa ou quantidade de álcool que ela ingere, torna-a culpada de um possível abuso que a mesma venha a sofrer. O filme trabalha com estes temas de forma explicita chocando numa primeira vista para que depois a recompensa possa ser gratificante.
Sem fazer julgamento dos atos cometidos por Cassandra (Carey Mulligan), pois isto fica a critério moral de cada individuo, mas a recompensa é satisfatória ao presenciar certas situações onde a justiça é alcançada através de vingança, ou até mesmo quando homens são expostos aos seus comportamentos deploráveis e respondem de forma humilhante. Porém o longa expõe os dois lados de Cassandra: Contrapondo às locações festivas noturnas que a personagem frequenta, figurino extravagante e presença ameaçadora, temos a casa onde ela reside e cafeteria onde trabalha, ambas semelhante a um casa de boneca. Dualidade que mostra os dois pontos da personalidade de Cassandra – Perigosa, mais ainda assim aquela menina lúdica que abandonou a faculdade.
A trilha sonora acompanha essa ambiguidade incluindo músicas com letras tais quais: “I was busy thinking ‘bout boys” e “It’s raining men”. Um ponto análogo ao tema do filme, mas que aqui utilizada, reforça a ideia de um feminino mais empoderado.
Bem menos dramático como é de se esperar para este tipo de assunto, Emerald Fennel adotou tons de suspense e cômicos para abordar estes problemas sociais, o que deixou relativamente original e de certa forma corajoso, pois ainda são assuntos delicados.
Quando Duas Mulheres Pecam
4.4 1,1K Assista AgoraO Cinema como objeto de arte escapa de nossa perpeceção e, muitas vezes, esquecemos que estamos contemplando uma sessão de cinema. Ou seja, quando estamos vendo uma pintura, conseguimos separar aquela arte de nossa atual realidade, vemos uma tela emoldurada com pinceladas de tinta, assim como quado lemos um livro, estamos entertido na literatura através de letras sobre papéis que, constamente, estamos trocando de folha. Mas no cinema, uma vez que estamos numa sala escura e o único objeto iluminado é uma tela circunscrita, presenciaremos uma história que utilizará de imagens em movimento, em determinado ponto você esquecerá que estará vendo uma arte chamada cinema que trabalha através de 24 quadros por segundos, pois o filme tomou conta de sua percepção sobre a sua realiadade. Agora o que é real, é o que estamos vendo em tela, aquela é a única verdade que existe naquele momento.
Bergman, no início do filme, coloca uma sequencia de imagens de rolos de filmes em movimento e neste exato momento ele reforça que tudo o que veremos é cinema, e seu domonio é magistral nesta linha de raciocínio, pois aos 47 minutos de filme, quando já estamos imerso no meio de todo o conflinto, vemos o rolo do próprio filme sendo queimado, isso é Bergman dizendo que ainda estamos numa sessão de cinema.
Em Persona, acompanhamos a estadia da atriz Elisabet (Liv Ullmann) na casa de praia de sua médica junto com a Enfermeira Alma (Bibi Andersson). Neste período veremos a relação entre ambas e o uso de suas “máscaras”.
Segundo a psicologia de Carl Jung, Persona refere-se à personalidade que um sujeito apresenta aos demais como sendo real, no entanto pode ser uma versão muito contrária à verdadeira. Dito isso, vemos a principio uma relação estável de ambas as mulheres, sua reações e seus comportamentos, porém estas máscaras caem ou, é queimada literalmente para que elas possam expressar a verdadeira face. Uma vez que Elisabet deixa te falar, ela simplesmente torna-se um ser que não exprime sua vontade, praticamento neutro ao seu entorno, mas suas reações diz mais do que palavras podiam dizer. Alma, ao contrário, fala pelos cutuvelos exprimindo seus segredos; nessa dualidade não estamos totalmente confortados em confiar cem por cento em ambas, a dúvida da confiança é um stopin para nossa curiosidade.
A apreciação de Persona não está apenas em uma interpretação objetiva, ele vai além, a imersão sensorial também é impactante pelo desenrolar da tensão, e de enigmas que Bergman planta ocasionados pela convivência de ambas as personagens. Bergman além de tudo isso, abre mão de um design de produção mais requintado, todo cenário é simples sem informar nada sobre nossos personagens ou o espaço que está inserido, mas assim damos atenção aos nossos objetos de estudos, Elisabet e Alma.
Não só as máscaras destas mulheres caem, mas também a própria ilusão que o cinema cria da realidade, Bergman faz questão de apontar para nós. Pagamos para ser enganados, amamos a realidade anternativa que o cinema apresenta, amamos o cinema em sua forma por completo.
Antes da Meia-Noite
4.2 1,5K Assista AgoraFrancis Ford Coppola disse certa vez em uma entrevista que o sucesso do filme está calcado no roteiro e nas atuações, o rigor técnico de uma fotografia ou direção de arte não sustenta o filme por si só. Se seguirmos esta linha de pensamento de Coppola, a trilogia “Before” já nasceu como uma obra-prima, o que não discordo. Imagino num futuro próximo em que os cinéfilos, professores ou teóricos vão estar citando a trilogia “Before” como um dos grandes clássicos do cinema ao lado de outras trilogias como a dos Dólares, a trilogia Noriko e a Trilogia da Incomunicabilidade.
Se no primeiro filme destacamos a descoberta de Jesse (Ethan Hawke) e Celine (Julie Delpy), no segundo a (re)descoberta, em “Before Midnight” temos agora o conhecimento pleno que um tem do outro. É neste ponto onde mora o perigo, pois ao mesmo tempo em que sabem o que dizer para confortar, também sabem exatamente o que dizer para desestabilizar.
Agora de família constituída, Jesse e Celine encaram um novo estágio em suas vida com muitos diálogos (claro) acrescentando mais conteúdo sobre si mesmos, e nós achando que não tinham mais nada para ser dito. Como bem apontado em certa cena do filme, eles não lembram quando haviam conversado sobre qualquer outro assunto que não tenha sido sobre as próprias filhas e o que comer no dia seguinte.
Aqui os personagens encontram-se em férias na Grécia onde o filho de Jesse esta prestes a voltar para os Estados Unidos, e essa situação faz Jesse ser acometidos por inúmeros pensamentos por achar que está sendo um pai ausente na vida do garoto.
Nestas férias o casal encontra-se também ao lado de um casal mais jovem e outro casal mais velho, o que desperta um acaloroso diálogo numa mesa onde são discutidos inúmeros estágios sobre casamento, a descoberta de quando se ama a outra pessoa, as formas de manter contato (o que era um problema para Jesse e Celine em 94), sexo e encerra-se numa bela epifania sobre perda.
Jesse agora com mais rugas e Celine com o evidente corpo de uma mulher que tivera filhos, ambos ainda possuem o charme e a espontaneidade em seus longos planos de conversa, porém a fotografia laranja que foi muito usada que trazia aquela sensação da energia que sentiam um pelo outro, foi dado lugar a um azul austero refletindo que eles não possuem mais aquele desejo ardente a todo momento, pois agora há mais assuntos a serem tratados e de maior importância. O que é totalmente natural, uma vez que todos os casais, depois de um certo tempo, acostumam com a presença e a rotina provocada pelo tempo.
Assim como foi em “Before Sunset”, aqui há certas exposições do que ocorreram nos últimos 9 anos, mas no segundo filme da trilogia a exposição servia para uma atualização da vida de ambos e uma (re)descoberta, a exposição neste terceiro filme entre o casal é natural e não soa como artificio falho de roteiro, ao contrario, é utilizado numa cena carregada de discussão para um ter vantagem sobre o outro, de rebaixar e até de justificar as próprias ações.
Qualquer casal sofre os efeitos do tempo em seus corpos e em suas mentes; os bons e os maus momentos são consequências de um longo período juntos e cabe a cada um tornar o seus relacionamentos mais fortes a partir destes momentos. Pois no fundo de cada um ainda haverá sempre aquelas características que fizeram um se apaixonar pelo outro naquele verão de 1994.