Essa obra me lembrou muito sobre as reflexões do psicólogo Kohlberg; ela atinge a capacidade de julgamento moral dos espectadores. Passamos grande parte da narrativa não só torcendo para que a justiça seja feita, mas também nutrindo um sentimento de ódio pelo responsável por tanto sofrimento à família de Ricci. Quando este realiza a mesma ação ("repudiada" inicialmente) realizada pelo ladrão, passamos a julgar, nessa ocasião, um ato moral, e sobretudo, almejar seu êxito. É um jogo reflexivo acerca da moralidade presente nos mesmos feitos, porém com circunstâncias e desígnios distintos. Como é curiosa a psique humana.
Eu tenho PAVOR da velhice! Essa frase é tão marcante para mim desde a primeira vez que assisti à obra, chamando minha atenção para a personagem de Helena Ignez. Ao rever, percebo detalhes e críticas implícitas nos monólogos e diálogos ao período ditatorial da época, enriquecendo o roteiro de modo indelével. Além deste, destaque para a trilha sonora, belamente composta por Gil, a qual, somada à insigne fotografia, evidencia o tropicalismo da "ex- capital". "É preciso a polícia, para não deixar esse mundo sujo e o povo louco correrem por água abaixo. Metade do povo brasileiro não tem dente nem sabe falar, ouvir ou escrever. Sem a polícia, a fome ia ser maior ainda. A polícia salva o Brasil do desastre e do comunismo. Nossa grande miséria nacional não deixa ninguém pensar direito...e todos dopados."
Embora haja pontos negativos, o filme possui suas virtudes: a premissa é interessante, cujas interpretações podem variar (no meu caso, acolhi como uma crítica à fragilidade presente nas relações sociais contemporâneas, pautadas na virtualidade e indiferença, e caso algum indivíduo desviar-se dessa coerção, será um "anormal" marginalizado pela sociedade; ademais, todo meio social possui "escondidos", coagidos pelas normas impostas). A paleta de cores e fotografia ajusta-se perfeitamente a todo esse conteúdo, contribuindo para a impassibilidade das personagens habitantes do "Coletivo".
Acima de tudo, Clara é uma cultuadora de lembranças. As reminiscências de seu passado são personificadas em 'Aquarius', fato incompreensível por (quase) todas as pessoas de seu convívio, restando apenas o apoio daqueles que justamente não compartilharam tais momentos cultuados junto dela (destaque para aquele que infelizmente não é seu filho, Tomás). Há sutis críticas ao egoísmo e às consequências de uma sociedade pautada no capitalismo, como os filhos interessados somente nos '2 milhões de reais', ou até a recusa de um homem devido à sua deformação, e a empregada lembrada apenas por seu furto (porém, a crítica desta vez vem da irmã de Clara, a qual dispara uma amarga reflexão sobre os motivos da 'empregada', afinal esta é tão explorada, o que mais restaria a ela, senão o furto?) Pra finalizar, o fator que mais atraiu minha atenção foi a personalidade de Clara, diante de todas as ameaças, persistiu nos seus ideais e na busca pela perpetuação de seu passado.
Realmente não entendo porque eu demorei tanto pra ver essa verdadeira obra de arte, ou melhor, uma fiel retratação da realidade, não só pela frugalidade estética das protagonistas, mas também pela trivialização do cotidiano de uma colegial francesa; porém o propósito de Kechiche baseia-se em naturalizar o relacionamento homossexual, o quê infelizmente é incompatível com a realidade. Uma minúcia que atraiu minha atenção em especial foi a contradição presente no título do HQ, "Le bleu est une couleur chaude", afinal, o azul é uma cor fria, entretanto, os cabelos de Emma transforma-o na 'cor mais quente'. Ademais, é um elemento representativo muito presente nos primórdios do longa, uma vez que é um período em que Adèle vivencia constantes descobertas, resultando em emoções conflituosas; sobretudo, é um contribuinte adequado para esta fotografia minuciosa, bela e repleta de closes, a fim de enfatizar o naturalismo das protagonistas. Não há necessidade de ênfase às atuações, pois é evidente sua proeminência, principalmente a performance de Adèle Exarchopoulos. Talvez a única falha (embora não muito grave) do roteiro foi prevenir o espectador da cena em que os pais de Adèle descobrem sua orientação sexual, a despeito de ser evidente a futura reprovação do casal; todavia, este fato desencadeia a ausência de seus pais em sua vida, além de contribuir para a jovem viver com Emma. Exarchopoulos explica esta decisão como uma forma de deixar o filme ‘mais leve’, porém não é um motivo plausível. Apesar dos meus elogios acerca da direção de Kechiche, não posso ignorar as reclamações das atrizes na época da divulgação do filme acerca do abuso de poder do diretor, o qual infelizmente é um fator trivial no ramo cinematográfico. Embora admire seu trabalho, como feminista eu o repudio; idem para Bertolucci. Enfim, trata-se de uma obra desprovida de esforços para eclipsar a feiura da realidade. É a vida como ela é. P.S.: As obras de Klimt não são florais.
As metalinguagens sempre são muito bem acolhidas por mim, essencialmente quando grandes nomes do cinema independente utilizam suas próprias obras a fim de efetuar acres críticas acerca de grandes produções americanas ('blockbusters'). Assim como em "A Noite Americana", entretanto com uma pauta mais ceticista, expressionista e surrealista (devido ao desfecho originalíssimo, sobretudo divergente de toda a obra), esta metalinguagem é encontrada em "Irma Vep". A crítica é explicitamente entoada na cena da entrevista de Maggie, na qual o entrevistador realiza diversas acusações contra o cinema de René Vidal, diretor totalmente incompreendido por uma geração de espectadores admiradores de 'schwarzeneggers' e 'van dammes". Se Vidal correspondesse a um factual diretor, este estaria entre os meus favoritos, ademais, cabalmente interpretado por Léaud. Maggie Cheung exala contemporaneidade, o real significado de ser exímia aos olhos de René e na pele de Irma Vep.
Se há algo de prodigioso neste longa, é a direção de Jean-Pierre; subsequente, a fotografia exímia, um verdadeiro esmero visual (acredito que muitos rotulou-a como "artificial", assim como o fizeram com o longa de Amélie Poulain) e a montagem minuciosa e criativa já característica nas obras de Jeunet. Em determinados momentos, algumas atitudes das personagens (gostaria de dar ênfase nas cenas do 'talk show') foram capciosas, e apesar do nítido propósito do diretor de transmitir uma ácida crítica acerca da superficialidade presente nos programas de entretenimento americano, ecoou um efeito negativo e infantil à obra; entretanto, estes momentos foram raros e não deturparam minha admiração pela estória de T.S. O fator mais contribuinte para meu favoritismo (além da genialidade visual e sonora) foi a conclusão que o espectador realiza no final da obra: a despeito de toda aptidão de T.S. com os termos científicos, ele continua sendo um menino de 10 anos, o qual carrega o fardo de ser (no seu ponto de vista) o agente da morte de seu irmão; isto é, nem mesmo um prodígio é capaz de solucionar todos os problemas sozinho. P.S.: Confesso que foi a primeira vez que vi Helena B. Carter "normal".
"Morrer... quando este mundo é um paraíso, E a alma um cisne de douradas plumas: Não! o seio da amante é um lago virgem... Quero boiar à tona das espumas. Vem! formosa mulher — camélia pálida, Que banharam de pranto as alvoradas, Minh'alma é a borboleta, que espaneja O pó das asas lúcidas, douradas ... E a mesma voz repete-me terrível, Com gargalhar sarcástico: — impossível! [..] Adeus... arrasta-me uma voz sombria, Já me foge a razão na noite fria! ..."
A questão que está pairada na minha mente é: o que impulsionou o homem ao pensamento de que possui o direito de retirar um animal de seu habitat natural (ou sensibilizando, de sua família) para fins meramente desnecessários? Sim, este tipo de entretenimento é unicamente redundante. Um pensamento característico unicamente da espécie humana, isto é, apoderar-se de sua 'elevação' comparada às outras espécies e utilizá-la com objetivos egoístas e redundantes. Essa é mais uma prova de que a 'elevação' moral do homem ante os demais seres é burlesca, pois as atitudes do mesmo ao longo do tempo apenas comprovam o abjeto mau uso de sua competência intelectual. É lamentável a falta de informações dos próprios funcionários do SeaWorld, ou as mudanças e deturpações que as mesmas sofrem para serem partilhadas com o público, o qual, desprovido de quaisquer questionamentos e ceticismo, as aceitam. Felizmente, o público se sensibilizou com esse documentário, e através dos feitos dos ativistas, torna-se tangível uma possível mudança na realidade das "killer whales"; infelizmente, o adjetivo foi empregado na espécie errada.
É possível formular três impressões desta obra, dependendo do momento. Nos primórdios da mesma, pode-se rotulá-la como um drama clássico hollywoodiano (a despeito da estética e do ideal do Dogma 95); entretanto, após "os idiotas" revelarem suas autênticas intenções, é válida a afirmação de que se trata de mais um longa com humor negro de Lars. Nos momentos finais, é lançado ao espectador uma narrativa muito mais sensível e intrincada do que aparenta, impulsionando-o a retornar à sua primeira conclusão, exceto pelo "clássico hollywoodiano". Em suma, trata-se de um drama de caráter niilista, político e social. Isto é, através de um dogma em que o cinema voltado ao comércio é irônica e rigidamente depreciado, a sociedade e as pressões hipócritas que a mesma aplica sobre o indivíduo são singularmente pautadas. Não se trata apenas de um coletivo de "idiotas", apresentados sob uma fotografia "frugal". Trata-se de jovens com uma visão cética, crítica e política acerca dos fatos e regras que a sociedade impõe, e através desta ideologia, têm-se o objetivo de subverter esta realidade.
"—Nem consigo acreditar, isto é mesmo Beverly Hills. Meu Deus, é tudo tão limpo aqui. —Não jogam fora o lixo, transformam-no em programas de televisão."
—E minha mãe, cadê? —Sua mãe tá trabalhando. —Que horas ela volta? É lamentável saber que essa é a realidade de muitos jovens. É lamentável uma mulher nutrir uma maior intimidade pelo "filho da patroa" do que por sua própria filha, devido às circunstâncias que as levaram a isso. É lamentável a superficialidade presente na 'classe B', já que apesar de todos os atributos materiais de Carlos, sua vida é vazia (igualmente para sua mulher, Bárbara). A complexidade social e o realismo presente no longa de Muylaert é impressionante, características que nos impulsionam a refletir acerca da desigualdade/realidade de nossa nação, tornando-o merecedor de todo reconhecimento e aclamação proferidos pelo público e pelos críticos.
A trama em si não prendeu minha atenção, porém as estridentes paisagens, a metalinguagem, a presença exorbitante de cores e a belíssima Bardot, contribuíram para minha persistência na obra. Talvez o fato que mais instigou minha atenção foi o vínculo que a personalidade de Camille e Paul possuem com os protagonistas de "Odisseia" (característica não muito enfatizada na obra, entretanto, através de diálogos, é clara esta conexão), já que assim como Penélope, Camille demonstra repentinamente certo desprezo e desinteresse por seu companheiro, devido à liberdade que o mesmo permite à ela. Não considero a obra-prima de Godard, porém insisto em enfatizar a beleza visual e metalinguística que a mesma carrega consigo.
Pela terceira vez, acompanho Doinel em uma nova etapa de sua vida, e possivelmente devido às cores inéditas neste conjunto de Truffaut, transformou "Baisers Volés" no longa mais vivaz e ao mesmo tempo cômico e lépido da saga, comparado aos seus antecedentes. A jovialidade constante no espírito de Antoine e sua incapacidade de se vincular fixamente com um trabalho (ou uma mulher), somados com a direção resplandecente de Truffaut, impulsionaram esta obra a culminar no ápice de minha admiração e ternura pelo eterno personagem de Léaud (e também pelo próprio Jean-Pierre) e pelo trabalho do diretor.
O amore e a rabbia são retratados desconexa e singularmente nos cinco episódios, ambos analisados criticamente por cada mestre. A pragmatista crítica de Lizzani acerca da indiferença e apatia presente no homem é impressionante e provoca ao menos uma breve reflexão àqueles que espectam sobre o individualismo que acompanha paralelamente o desenvolvimento da (des)humanidade, presente em cada um de nós em diferentes proporções; este capítulo despertou-me um interesse pelo trabalho do diretor. Por conseguinte, o capítulo de Bertolucci, em que através de seu caráter vanguardista e teatral, surtiu um efeito avassalador na minha concepção acerca das emoções e do intelecto que um enfermo 'pré-morte' pode carregar consigo, pois era justamente essa a função do grupo vanguarda: representar o lado intrínseco de uma alma angustiada; de longe, o maior destaque da obra. Pasolini focaliza os valores da inocência e ao mesmo passo é um instrumento ceticista acerca da irrelevância de conflitos sociais, isto, sobre um cenário fotográfico instigante; "Escalate the mind, not the war". Final e felizmente Godard, sua atmosfera lírica e voltada às minúcias logo se contrasta das demais narrativas; "Se não é livre, a existência torna-se vazia ou neutra. Se é livre, ela é um jogo". Enquanto o amor é pautado em "L'amore", a sequência de Bellocchio baseia-se na raiva, revolta e intolerância, através de complexos debates marxistas entoados por universitários concisos em sua ideologia. Uma obra-prima composta por instrumentos críticos, cada um ao seu modo e pauta.
Lars, aquele que comumente é referido à frase "ou você ama, ou odeia", ao realizar essa obra-prima, acabou por impulsionar a conclusão de que sou um membro do grupo daqueles que "amam". De modo frugal e lírico, foi propagada uma lição moralizante acerca de nossas arrogâncias, presentes em cada um de nós ao seu modo singular; no caso da protagonista, ela está submergida em uma complacência exclusiva de Grace, porém ainda presente. No ápice da narrativa, o fato da grande maioria das figuras presentes em Dogville agirem de forma assemelhante (ou nem tanto assim) da realidade, causa uma espécie de angústia e ânsia por justiça naqueles que observam a obra; este efeito repercutido nos espectadores é trivial em todas as obras de Lars, ao menos é o que acontece comigo. Favoritá-lo é pouco para demonstrar o que esse longa representou para mim, já que me identifiquei primorosamente à visão cética acerca dos valores do homem composta na história de Dogville, e obviamente, no próprio Lars.
Há certa singularidade neste trabalho de Truffaut ao se comparar com os demais; é apresentado uma atmosfera na qual se mescla ceticismo e suspense, onde a influência de Hitchcock na obra é claramente captável.
Nada como passar o 31/10 mergulhada neste ambivalente e psicótico thriller. A princípio, um injustiçado e incompreendido sendo 'brutalmente' torturado por uma adolescente "profissionalmente necessitada", entretanto, o desfecho revela uma realidade paradoxal. Uma mistura de misandria traumática e uma ideologia vingativa: esta é a premissa de Hayley. Só lamento por Slade não optar por explicitar a cena da 'castração', a qual foi claramente a mais atrativa.
Toda ausência de sonoridade nas cenas, juntamente com a frugalidade (no ótimo sentido) na retratação de um tema extremamente cotiano, apenas contribuíram para que essa obra independente seja digníssima de ênfase; é justamente esse o objetivo cardinal de Lacant: alvejar com simplicidade um assunto igualmente simples, porém, transformado pela própria sociedade em algo ilícito e imoral. Essa ideia é explicitamente imposta na última cena, na qual a personagem de Koffler final e felizmente cai em queda livre na busca de seus verdadeiros valores, e visivelmente, conclui sua aceitação (tardia) de quem realmente é.
Dois atores conseguiram transformar a adaptação de Polanski em uma obra-prima, aos quais, dou o maior reconhecimento por um trabalho de suma maestria. Neste show cinematográfico, a peça "A Vênus de Peles" de Masoch, é conduzida por Thomas (preferencialmente, o adaptador), em que esta é vista de modo lírico e exaltado por ele, contrastando com a opinião de Vanda, a mais tenaz candidata ao papel da "deusa" Vanda, que por coincidência (ou não) possui o mesmo nome. Esse paradoxo opinativo resulta em uma relação bipolar de ambos: ora Vanda é vista como uma simples e abjeta atriz, ora eficientíssima para viver a grande dominadora de Severin (papel que posteriormente será de Thomas); e como qualquer relação oscilante, há sempre diversas consequências: primeiramente, a lenta transição dos valores das personagens para os próprios atores, uma vez que os mesmos começam a se portar como os protagonistas; por conseguinte, um constante processo de trocas destes méritos, pois em certo momento, é inegável e explícita a adoção que Thomas faz da personagem de Vanda. Masoch, nome ao qual foi de extrema influência ao termo “sadomasoquismo”, teve sua proeminente peça representada de modo igualmente elevado, graças a Polanski e o nítido talento de Seigner e Amalric.
Ladrões de Bicicleta
4.4 533 Assista AgoraEssa obra me lembrou muito sobre as reflexões do psicólogo Kohlberg; ela atinge a capacidade de julgamento moral dos espectadores.
Passamos grande parte da narrativa não só torcendo para que a justiça seja feita, mas também nutrindo um sentimento de ódio pelo responsável por tanto sofrimento à família de Ricci. Quando este realiza a mesma ação ("repudiada" inicialmente) realizada pelo ladrão, passamos a julgar, nessa ocasião, um ato moral, e sobretudo, almejar seu êxito.
É um jogo reflexivo acerca da moralidade presente nos mesmos feitos, porém com circunstâncias e desígnios distintos. Como é curiosa a psique humana.
Haxan: A Feitiçaria Através dos Tempos
4.2 183 Assista AgoraBenjamin Christensen, em todos os sentidos, que olhar!
Copacabana Mon Amour
3.9 78 Assista AgoraEu tenho PAVOR da velhice!
Essa frase é tão marcante para mim desde a primeira vez que assisti à obra, chamando minha atenção para a personagem de Helena Ignez. Ao rever, percebo detalhes e críticas implícitas nos monólogos e diálogos ao período ditatorial da época, enriquecendo o roteiro de modo indelével. Além deste, destaque para a trilha sonora, belamente composta por Gil, a qual, somada à insigne fotografia, evidencia o tropicalismo da "ex- capital".
"É preciso a polícia, para não deixar esse mundo sujo e o povo louco correrem por água abaixo. Metade do povo brasileiro não tem dente nem sabe falar, ouvir ou escrever. Sem a polícia, a fome ia ser maior ainda. A polícia salva o Brasil do desastre e do comunismo.
Nossa grande miséria nacional não deixa ninguém pensar direito...e todos dopados."
Quando Te Conheci
3.3 472 Assista AgoraEmbora haja pontos negativos, o filme possui suas virtudes: a premissa é interessante, cujas interpretações podem variar (no meu caso, acolhi como uma crítica à fragilidade presente nas relações sociais contemporâneas, pautadas na virtualidade e indiferença, e caso algum indivíduo desviar-se dessa coerção, será um "anormal" marginalizado pela sociedade; ademais, todo meio social possui "escondidos", coagidos pelas normas impostas). A paleta de cores e fotografia ajusta-se perfeitamente a todo esse conteúdo, contribuindo para a impassibilidade das personagens habitantes do "Coletivo".
Aquarius
4.2 1,9K Assista AgoraAcima de tudo, Clara é uma cultuadora de lembranças. As reminiscências de seu passado são personificadas em 'Aquarius', fato incompreensível por (quase) todas as pessoas de seu convívio, restando apenas o apoio daqueles que justamente não compartilharam tais momentos cultuados junto dela (destaque para aquele que infelizmente não é seu filho, Tomás).
Há sutis críticas ao egoísmo e às consequências de uma sociedade pautada no capitalismo, como os filhos interessados somente nos '2 milhões de reais', ou até a recusa de um homem devido à sua deformação, e a empregada lembrada apenas por seu furto (porém, a crítica desta vez vem da irmã de Clara, a qual dispara uma amarga reflexão sobre os motivos da 'empregada', afinal esta é tão explorada, o que mais restaria a ela, senão o furto?)
Pra finalizar, o fator que mais atraiu minha atenção foi a personalidade de Clara, diante de todas as ameaças, persistiu nos seus ideais e na busca pela perpetuação de seu passado.
Haruo Ohara
4.1 8Belíssimo como as fotografias do Ohara!
Azul é a Cor Mais Quente
3.7 4,3K Assista AgoraRealmente não entendo porque eu demorei tanto pra ver essa verdadeira obra de arte, ou melhor, uma fiel retratação da realidade, não só pela frugalidade estética das protagonistas, mas também pela trivialização do cotidiano de uma colegial francesa; porém o propósito de Kechiche baseia-se em naturalizar o relacionamento homossexual, o quê infelizmente é incompatível com a realidade.
Uma minúcia que atraiu minha atenção em especial foi a contradição presente no título do HQ, "Le bleu est une couleur chaude", afinal, o azul é uma cor fria, entretanto, os cabelos de Emma transforma-o na 'cor mais quente'. Ademais, é um elemento representativo muito presente nos primórdios do longa, uma vez que é um período em que Adèle vivencia constantes descobertas, resultando em emoções conflituosas; sobretudo, é um contribuinte adequado para esta fotografia minuciosa, bela e repleta de closes, a fim de enfatizar o naturalismo das protagonistas. Não há necessidade de ênfase às atuações, pois é evidente sua proeminência, principalmente a performance de Adèle Exarchopoulos.
Talvez a única falha (embora não muito grave) do roteiro foi prevenir o espectador da cena em que os pais de Adèle descobrem sua orientação sexual, a despeito de ser evidente a futura reprovação do casal; todavia, este fato desencadeia a ausência de seus pais em sua vida, além de contribuir para a jovem viver com Emma. Exarchopoulos explica esta decisão como uma forma de deixar o filme ‘mais leve’, porém não é um motivo plausível.
Apesar dos meus elogios acerca da direção de Kechiche, não posso ignorar as reclamações das atrizes na época da divulgação do filme acerca do abuso de poder do diretor, o qual infelizmente é um fator trivial no ramo cinematográfico. Embora admire seu trabalho, como feminista eu o repudio; idem para Bertolucci.
Enfim, trata-se de uma obra desprovida de esforços para eclipsar a feiura da realidade. É a vida como ela é.
P.S.: As obras de Klimt não são florais.
Irma Vep
3.8 47As metalinguagens sempre são muito bem acolhidas por mim, essencialmente quando grandes nomes do cinema independente utilizam suas próprias obras a fim de efetuar acres críticas acerca de grandes produções americanas ('blockbusters'). Assim como em "A Noite Americana", entretanto com uma pauta mais ceticista, expressionista e surrealista (devido ao desfecho originalíssimo, sobretudo divergente de toda a obra), esta metalinguagem é encontrada em "Irma Vep".
A crítica é explicitamente entoada na cena da entrevista de Maggie, na qual o entrevistador realiza diversas acusações contra o cinema de René Vidal, diretor totalmente incompreendido por uma geração de espectadores admiradores de 'schwarzeneggers' e 'van dammes". Se Vidal correspondesse a um factual diretor, este estaria entre os meus favoritos, ademais, cabalmente interpretado por Léaud. Maggie Cheung exala contemporaneidade, o real significado de ser exímia aos olhos de René e na pele de Irma Vep.
Uma Viagem Extraordinária
4.1 611 Assista AgoraSe há algo de prodigioso neste longa, é a direção de Jean-Pierre; subsequente, a fotografia exímia, um verdadeiro esmero visual (acredito que muitos rotulou-a como "artificial", assim como o fizeram com o longa de Amélie Poulain) e a montagem minuciosa e criativa já característica nas obras de Jeunet.
Em determinados momentos, algumas atitudes das personagens (gostaria de dar ênfase nas cenas do 'talk show') foram capciosas, e apesar do nítido propósito do diretor de transmitir uma ácida crítica acerca da superficialidade presente nos programas de entretenimento americano, ecoou um efeito negativo e infantil à obra; entretanto, estes momentos foram raros e não deturparam minha admiração pela estória de T.S.
O fator mais contribuinte para meu favoritismo (além da genialidade visual e sonora) foi a conclusão que o espectador realiza no final da obra: a despeito de toda aptidão de T.S. com os termos científicos, ele continua sendo um menino de 10 anos, o qual carrega o fardo de ser (no seu ponto de vista) o agente da morte de seu irmão; isto é, nem mesmo um prodígio é capaz de solucionar todos os problemas sozinho.
P.S.: Confesso que foi a primeira vez que vi Helena B. Carter "normal".
Olhos de Ressaca
4.0 43"Morrer... quando este mundo é um paraíso,
E a alma um cisne de douradas plumas:
Não! o seio da amante é um lago virgem...
Quero boiar à tona das espumas.
Vem! formosa mulher — camélia pálida,
Que banharam de pranto as alvoradas,
Minh'alma é a borboleta, que espaneja
O pó das asas lúcidas, douradas ...
E a mesma voz repete-me terrível,
Com gargalhar sarcástico: — impossível!
[..]
Adeus... arrasta-me uma voz sombria,
Já me foge a razão na noite fria! ..."
Blackfish: Fúria Animal
4.4 456A questão que está pairada na minha mente é: o que impulsionou o homem ao pensamento de que possui o direito de retirar um animal de seu habitat natural (ou sensibilizando, de sua família) para fins meramente desnecessários? Sim, este tipo de entretenimento é unicamente redundante.
Um pensamento característico unicamente da espécie humana, isto é, apoderar-se de sua 'elevação' comparada às outras espécies e utilizá-la com objetivos egoístas e redundantes. Essa é mais uma prova de que a 'elevação' moral do homem ante os demais seres é burlesca, pois as atitudes do mesmo ao longo do tempo apenas comprovam o abjeto mau uso de sua competência intelectual.
É lamentável a falta de informações dos próprios funcionários do SeaWorld, ou as mudanças e deturpações que as mesmas sofrem para serem partilhadas com o público, o qual, desprovido de quaisquer questionamentos e ceticismo, as aceitam. Felizmente, o público se sensibilizou com esse documentário, e através dos feitos dos ativistas, torna-se tangível uma possível mudança na realidade das "killer whales"; infelizmente, o adjetivo foi empregado na espécie errada.
Ex Machina: Instinto Artificial
3.9 2,0K Assista Agora"It's strange to have made something that hates you?".
Os Idiotas
3.5 283 Assista AgoraÉ possível formular três impressões desta obra, dependendo do momento. Nos primórdios da mesma, pode-se rotulá-la como um drama clássico hollywoodiano (a despeito da estética e do ideal do Dogma 95); entretanto, após "os idiotas" revelarem suas autênticas intenções, é válida a afirmação de que se trata de mais um longa com humor negro de Lars. Nos momentos finais, é lançado ao espectador uma narrativa muito mais sensível e intrincada do que aparenta, impulsionando-o a retornar à sua primeira conclusão, exceto pelo "clássico hollywoodiano".
Em suma, trata-se de um drama de caráter niilista, político e social. Isto é, através de um dogma em que o cinema voltado ao comércio é irônica e rigidamente depreciado, a sociedade e as pressões hipócritas que a mesma aplica sobre o indivíduo são singularmente pautadas. Não se trata apenas de um coletivo de "idiotas", apresentados sob uma fotografia "frugal". Trata-se de jovens com uma visão cética, crítica e política acerca dos fatos e regras que a sociedade impõe, e através desta ideologia, têm-se o objetivo de subverter esta realidade.
Noivo Neurótico, Noiva Nervosa
4.1 1,1K Assista Agora"—Nem consigo acreditar, isto é mesmo Beverly Hills. Meu Deus, é tudo tão limpo aqui.
—Não jogam fora o lixo, transformam-no em programas de televisão."
Que Horas Ela Volta?
4.3 3,0K Assista Agora—E minha mãe, cadê?
—Sua mãe tá trabalhando.
—Que horas ela volta?
É lamentável saber que essa é a realidade de muitos jovens. É lamentável uma mulher nutrir uma maior intimidade pelo "filho da patroa" do que por sua própria filha, devido às circunstâncias que as levaram a isso. É lamentável a superficialidade presente na 'classe B', já que apesar de todos os atributos materiais de Carlos, sua vida é vazia (igualmente para sua mulher, Bárbara).
A complexidade social e o realismo presente no longa de Muylaert é impressionante, características que nos impulsionam a refletir acerca da desigualdade/realidade de nossa nação, tornando-o merecedor de todo reconhecimento e aclamação proferidos pelo público e pelos críticos.
O Desprezo
4.0 266A trama em si não prendeu minha atenção, porém as estridentes paisagens, a metalinguagem, a presença exorbitante de cores e a belíssima Bardot, contribuíram para minha persistência na obra.
Talvez o fato que mais instigou minha atenção foi o vínculo que a personalidade de Camille e Paul possuem com os protagonistas de "Odisseia" (característica não muito enfatizada na obra, entretanto, através de diálogos, é clara esta conexão), já que assim como Penélope, Camille demonstra repentinamente certo desprezo e desinteresse por seu companheiro, devido à liberdade que o mesmo permite à ela.
Não considero a obra-prima de Godard, porém insisto em enfatizar a beleza visual e metalinguística que a mesma carrega consigo.
Beijos Proibidos
4.1 138 Assista AgoraPela terceira vez, acompanho Doinel em uma nova etapa de sua vida, e possivelmente devido às cores inéditas neste conjunto de Truffaut, transformou "Baisers Volés" no longa mais vivaz e ao mesmo tempo cômico e lépido da saga, comparado aos seus antecedentes.
A jovialidade constante no espírito de Antoine e sua incapacidade de se vincular fixamente com um trabalho (ou uma mulher), somados com a direção resplandecente de Truffaut, impulsionaram esta obra a culminar no ápice de minha admiração e ternura pelo eterno personagem de Léaud (e também pelo próprio Jean-Pierre) e pelo trabalho do diretor.
Amor e Raiva
3.9 21O amore e a rabbia são retratados desconexa e singularmente nos cinco episódios, ambos analisados criticamente por cada mestre. A pragmatista crítica de Lizzani acerca da indiferença e apatia presente no homem é impressionante e provoca ao menos uma breve reflexão àqueles que espectam sobre o individualismo que acompanha paralelamente o desenvolvimento da (des)humanidade, presente em cada um de nós em diferentes proporções; este capítulo despertou-me um interesse pelo trabalho do diretor. Por conseguinte, o capítulo de Bertolucci, em que através de seu caráter vanguardista e teatral, surtiu um efeito avassalador na minha concepção acerca das emoções e do intelecto que um enfermo 'pré-morte' pode carregar consigo, pois era justamente essa a função do grupo vanguarda: representar o lado intrínseco de uma alma angustiada; de longe, o maior destaque da obra.
Pasolini focaliza os valores da inocência e ao mesmo passo é um instrumento ceticista acerca da irrelevância de conflitos sociais, isto, sobre um cenário fotográfico instigante; "Escalate the mind, not the war".
Final e felizmente Godard, sua atmosfera lírica e voltada às minúcias logo se contrasta das demais narrativas; "Se não é livre, a existência torna-se vazia ou neutra. Se é livre, ela é um jogo". Enquanto o amor é pautado em "L'amore", a sequência de Bellocchio baseia-se na raiva, revolta e intolerância, através de complexos debates marxistas entoados por universitários concisos em sua ideologia.
Uma obra-prima composta por instrumentos críticos, cada um ao seu modo e pauta.
Dogville
4.3 2,0K Assista AgoraLars, aquele que comumente é referido à frase "ou você ama, ou odeia", ao realizar essa obra-prima, acabou por impulsionar a conclusão de que sou um membro do grupo daqueles que "amam".
De modo frugal e lírico, foi propagada uma lição moralizante acerca de nossas arrogâncias, presentes em cada um de nós ao seu modo singular; no caso da protagonista, ela está submergida em uma complacência exclusiva de Grace, porém ainda presente. No ápice da narrativa, o fato da grande maioria das figuras presentes em Dogville agirem de forma assemelhante (ou nem tanto assim) da realidade, causa uma espécie de angústia e ânsia por justiça naqueles que observam a obra; este efeito repercutido nos espectadores é trivial em todas as obras de Lars, ao menos é o que acontece comigo.
Favoritá-lo é pouco para demonstrar o que esse longa representou para mim, já que me identifiquei primorosamente à visão cética acerca dos valores do homem composta na história de Dogville, e obviamente, no próprio Lars.
A Noiva Estava de Preto
3.9 99Há certa singularidade neste trabalho de Truffaut ao se comparar com os demais; é apresentado uma atmosfera na qual se mescla ceticismo e suspense, onde a influência de Hitchcock na obra é claramente captável.
Menina Má.Com
3.3 1,2KNada como passar o 31/10 mergulhada neste ambivalente e psicótico thriller. A princípio, um injustiçado e incompreendido sendo 'brutalmente' torturado por uma adolescente "profissionalmente necessitada", entretanto, o desfecho revela uma realidade paradoxal. Uma mistura de misandria traumática e uma ideologia vingativa: esta é a premissa de Hayley.
Só lamento por Slade não optar por explicitar a cena da 'castração', a qual foi claramente a mais atrativa.
Queda Livre
3.6 591Toda ausência de sonoridade nas cenas, juntamente com a frugalidade (no ótimo sentido) na retratação de um tema extremamente cotiano, apenas contribuíram para que essa obra independente seja digníssima de ênfase; é justamente esse o objetivo cardinal de Lacant: alvejar com simplicidade um assunto igualmente simples, porém, transformado pela própria sociedade em algo ilícito e imoral.
Essa ideia é explicitamente imposta na última cena, na qual a personagem de Koffler final e felizmente cai em queda livre na busca de seus verdadeiros valores, e visivelmente, conclui sua aceitação (tardia) de quem realmente é.
A Pele de Vênus
4.0 218 Assista AgoraDois atores conseguiram transformar a adaptação de Polanski em uma obra-prima, aos quais, dou o maior reconhecimento por um trabalho de suma maestria.
Neste show cinematográfico, a peça "A Vênus de Peles" de Masoch, é conduzida por Thomas (preferencialmente, o adaptador), em que esta é vista de modo lírico e exaltado por ele, contrastando com a opinião de Vanda, a mais tenaz candidata ao papel da "deusa" Vanda, que por coincidência (ou não) possui o mesmo nome. Esse paradoxo opinativo resulta em uma relação bipolar de ambos: ora Vanda é vista como uma simples e abjeta atriz, ora eficientíssima para viver a grande dominadora de Severin (papel que posteriormente será de Thomas); e como qualquer relação oscilante, há sempre diversas consequências: primeiramente, a lenta transição dos valores das personagens para os próprios atores, uma vez que os mesmos começam a se portar como os protagonistas; por conseguinte, um constante processo de trocas destes méritos, pois em certo momento, é inegável e explícita a adoção que Thomas faz da personagem de Vanda.
Masoch, nome ao qual foi de extrema influência ao termo “sadomasoquismo”, teve sua proeminente peça representada de modo igualmente elevado, graças a Polanski e o nítido talento de Seigner e Amalric.
Sense8 (1ª Temporada)
4.4 2,1K Assista Agora"Science is another language we use to talk about the same miracles that faith talks about".