Me estarrece pensar em como fomos impostos brutalmente a um período ditatorial 3 vezes mais longo que o da Argentina, provindo de um golpe militar também ocorrido em março, que foi encerrado justamente no ano do julgamento descrito no filme, mas que nunca tivemos algo parecido por aqui. Crimes atrozes tornaram a hipótese de impunidade não caso monstruoso, mas aceito - e negado - por parte da sociedade. O senso moral do brasileiro médio (a classe é cirurgicamente citada/representada aqui) parece (em certeza, dados os últimos anos) ter sido sequestrado, torturado e assassinado como ferramenta política de subversão da história: que sempre julga, mas que não deve ser a única a ser delegada a tais termos. Pois ela leva tempo e não dita sentenças que se sensibilizem aos mortos e desaparecidos - até hoje.
Espero um dia poder repetir, com certeza, o "Nunca mais." Quanto ao filme: potente e necessário.
"Tem uma coisa que eu não entendi, papai. - O que, Pinóquio? - Todo mundo gosta dele. - De quem? - Dele (aponta para Jesus). Estavam cantando pra ele, que é feito de madeira também. Por que gostam dele e de mim não?"
Pode entregar o Oscar pro Del Toro, porque o velho merece. Só Guillermo pra conseguir tratar assuntos tão pesados e complexos (em similaridade com O Labirinto do Fauno, mas encontrando um frescor inquestionável para uma história já tão, mas tão batida e adaptada) de maneira tão tocante sobre "pais e filhos imperfeitos", a glorificação e os horrores da guerra e do fascismo, a vida e o fardo eterno (?) de se procurar por aceitação e por um coração - ou uma pinha "perfeita e inteira" - através de um desejo inocente, rebelde e verdadeiro de ser um menino "normal". O que acontece, acontece... Até que nós partimos.
Espere o melhor, não importa o que for, pois a vida sempre dá voltas de um mundo surreal.
"A boca serve para o riso tanto quanto para o choro, mas não deve se abrir quando o marido estiver no recinto. Quando o marido estiver no recinto, você não é uma mulher, você é um cozido, um chá. O seu lugar é dentro da palma dele. Você escorre feito água ao redor dele. Mas quando você está com as mulheres, sua boca não deve nunca se fechar. Quando se está com as mulheres, você é um espelho. Quando as sobrancelhas delas levantarem, você também as suas. Quando arregalarem os olhos, você também arregala os seus. Para as mulheres, você é vidro. Para os homens, você é água. Homens... Tão, tão, tão fácil... O mundo é uma coisa ardente e dolorosa, te queima, te destrói, te mastiga, despedaça, te vomita. Ainda assim..."
"Por 90 anos, Daomé viveu sob a opressão de Oyó. Quando chove, são os nossos ancestrais que choram pela dor que sentimos nos porões sombrios dos navios com destino a costas distantes. Quando o vento sopra, são os nossos ancestrais que nos empurram para a batalha contra aqueles que nos escravizam. Quando troveja, são os nossos ancestrais exigindo que quebremos os grilhões das dúvidas em nossas mentes para lutarmos com coragem. Nós lutamos não apenas pelo presente, mas pelo futuro. Nós somos a lança da vitória. Somos a lâmina da liberdade. Nós somos Daomé!"
"- Eu treinava segurar a respiração quando era criança. - Qual foi o seu tempo máximo? - Vinte e seis anos. - Ganhei de você por quatro anos."
Acho que são nesses dramas mais lentos, frios (delineados por distantes, que de tão carregados parecem vazios e cheios ao mesmo tempo), possuindo mais finalmentes que entretantos (mas que casa bem com a temática de "homecoming" após a guerra e a busca por reestabelecimento - seja este qual for) que a Jennifer Lawrence prova bastante a razão de ser a queridinha da Academia: porque ela é boa mesmo. Brian Tyree Henry idem.
Daqueles filmes que não possuem grandes acontecimentos ou momentos de dramaticidade elevada, mas que são tão "rotineiros" e compassados, como páginas de um diário compartilhado entre pai e filha, do tipo real, autoral e bem íntimo, que você sabe que tem algo mais do que a superfície. Como uma piscina cheia de hotel ou as ondas negras de um mar solitário e noturno em que na margem está alguém que te amou inocentemente, mas que não foi o suficiente para concluir a sua busca por serenidade e paz. Uma dança sob pressão, ao lado de pessoas na rua, reflexos no espelho e na TV, reflexões filmadas, aniversários não comemorados, karaokês não cantados, fotografias reveladas, tapetes estendidos, choros escondidos e uma porta no fim de um corredor que se abre para não mais voltar. Delicado até o final, que destrói pela falta de "conclusão", pois assim é a vida; e a morte.
"Como eu poderia ser uma mãe? Eu detestava a sensação daquilo crescendo dentro de mim. Parecia uma doença. Me puxando e chupando como um animal carente num celeiro. Como eu poderia ser responsável por outra vida? A vida me apavora. É duro, sombrio e exaustivo... Eu não queria me sentir assim, tão patética. O Senhor deve ter sido generoso com você. Ele nunca atende as minhas orações. O que eu fiz? O que tem de errado comigo? Eu só quero dançar nas telas como aquelas meninas bonitas nos filmes. Eu quero tanto o que elas têm... ser perfeita... ser amada por muitas pessoas... para compensar todo o meu tempo gasto sofrendo. Eu sou exatamente o que mamãe disse: uma falha. Tudo que eu quero é ser amada. Está sendo tão difícil sem amor ultimamente..."
Mas vocês sabiam que Mia Goth é neta da atriz brasileira Maria Gladys? Que talento! Aqui temos ao menos 5 cenas que já se tornaram instantaneamente icônicas - e em Technicolor.
Basicamente um filme de terror - psicológico - muito bem atuado por Ana de Armas e muito bem composto visualmente (apesar do uso excessivo de nudez e fetos), mas um tanto quanto mal compassado em seus constantes reforços de abuso e exposição sem "contraponto" da personagem principal. Ela parece ser jogada para lá e para cá, esticada e cortada sem restar opiniões ou profundidades, num labirinto de sofrimento durante quase 3 horas - como um rolo de filmes sem fim. Simplesmente isso, como uma pessoa ingênua e incapaz, como uma "Blonde Girl" apenas sexualizada, explorada e estigmatizada eternamente pelos "Daddies": algo que já é discutido. Talvez fosse a intenção dos roteiristas: chocar ao máximo para mostrar como a indústria - e a sociedade - tratavam e enxergavam (e ainda o fazem, em certa medida) as mulheres dum meio majoritariamente machista. Como um pesadelo mesmo. Mas recai nas mesmas "armadilhas" (eufemisticamente falando, quiçá) que Última Noite em Soho ao fazer escolhas de muito mau gosto e que, mesmo com a longa duração, dão às elipses o papel de preencher lacunas que ele deixa deliberadamente.
Pode até parecer exagerado ou meio forçado, mas em boa parte de sua exibição, a única coisa que consegui pensar em paralelo simplório, mas inevitável, foi como esse filme parecia ter um princípio de "presa vs. predador" tão bem construído em suspense e uma atmosfera de prenúncio/terror contido em relapsos como Spielberg conseguiu fez em Tubarão. Lá, uma fera aquática aterrorizava uma cidade litorânea em alta temporada, enquanto seu prefeito negava os fatos e as mortes até último caso, levando homens a uma caçada inversa e desesperada por sobrevivência. Aqui, uma suposta nave paira em nuvens sobre uma comunidade temática e um rancho que provê cavalos para Hollywood, enquanto ninguém nega seus efeitos, mas os enfrentam com face impassível ou animada, buscando o possível para capturar esse “fantasma” num dia “sortudo”.
E é aí que o princípio se diverge. Enquanto no filme de Steven os caçadores apenas queriam salvar a cidade de mais e mais mortes, aqui Jordan trabalha personagens com bem menos moralidade cível – devido a traumas expostos ou somente por exposição midiática.
Neste ponto mora a complexidade e a questão mais interessante de Nope!:
num mundo e num mercado competitivo, em que todos querem ser o novo "Blockbuster" ou a nova "Oprah", você faria de tudo para conseguir filmar, em alta qualidade, um "Fenômeno Atmosférico Não Identificado"? Sacrificaria pessoas, arriscaria sua vida num "tudo ou nada" apenas pela fama ou viralização num embate contra os grandes estúdios, que desvalorizam seu trabalho ou apagam a sua história sem pensar duas vezes? Até onde você iria pelo "shot perfeito"? (Inclusive, o "bicho", quando sai da camada superficial em formato característico de chapéu caubói dos Bang Bang, não parece se abrir como os tubos de uma câmera fotográfica antiga? Ou estou louco?) Indo ainda em certa consonância com o clássico dos anos 70, e em discussões profundas que não imaginaria que se encaixariam no filme, o cerne que sorve toda a trama parece estar na exploração animal (até as últimas consequências, para um lado ou para o outro) em prol do entretenimento, e como isso pode afetá-los profundamente, pela vida toda ou acabando com esta após um esquecimento de fala na filmagem de uma sitcom.
Peele consegue discutir muitas coisas na sutileza, passando pela história do cinema (rimando os primeiros e o últimos frames lindamente) – o seu início, de fotos em movimento de um jóquei negro montado num corcel, e sua continuidade, impondo como tais indivíduos vêm sendo representados e explorados (diria) em frente e atrás das câmeras ao longo das décadas.
A indústria, por vezes, pode ser tão suja quanto uma casa grande, de madeiras brancas, banhada por tripas, chaves (que não abrem mais muitas portas), moedas (que não pagam mais a ninguém) e sangue regurgitados daqueles que a alimentam diariamente.
"I wear my sunglasses at night So I can, so I can Watch you weave then breathe your story lines"
O histórico complicadíssimo de produção do filme e todo o contexto emocional que o circunda, em milhões de fatores, obviamente refletiram na qualidade e principalmente coesão de roteiro e narrativa aqui. Seja em sua longa duração que não aproveita para desenvolver seus personagens suficientemente (a da Coel, por exemplo, é simplesmente jogada de um lado pro outro sem direção), no modo como é montado ou principalmente finalizado. Mas quando o filme acerta, ele aberta BEM na emoção, nas atuações das atrizes principais (Angela Bassett é uma FORÇA da natureza, talvez ainda leve uma indicação ao Oscar) e na mais uma vez ótima trilha sonora de Ludwig.
Chorei um tiquinho aqui e ali, e os 30 minutos finais têm mensagens sobre perda-recomeço e um fechamento de ciclo que são realmente bonitos. E a cena pós-créditos >>>
Num jardim de um mundo estranho, onde árvores são regadas por pios de pintarroxos escusos e onde cartas de amor viram balas em armas, David cultiva rosas que não são suaves como vozes de veludo ou notas musicais num chapéu infantil, tampouco azuis como o céu da manhã, mas que possuem espinhos capazes de cortar orelhas, fustigar fetiches, instigar crimes e afincarem-se numa atmosfera de estranheza, incerteza no que é lúcido ou insano e desconcerto - naturais de um sonho com palhaços coloridos e insetos em bicos - que somente Lynch sabe fazer.
"It's too bad that all these things Can only happen in my dreams Only in dreams In beautiful dreams"
O Que Josias Viu, de Vincent Grashaw (2021) Nota: 7/10+
Embora um pouco irregular em sua montagem e tendo uma conclusão mais falada do que deveria, apostando numa atmosfera pesadíssima de drama com toques de horror puramente humano, Vincent desenvolve, em 3 capítulos, como as visões, segredos e acepções distorcidas de um fantasma podem marcar profundamente a alma, o corpo e o coração de uma família. Maria (Mary), Tomé (Tommy) e Elias (Eli), filhos de Miriam, têm seu nome e vida alicerçados pelos assombros de um trauma compartilhado e desenterrado em culpa bíblica, feito um buraco no peito que jamais poderia ser preenchido ou limpado por ouros ciganos, assinaturas de venda, bebidas ou luzes de anjos e demônios, mas sim pelo fogo - literal ou metafórico, espiritual ou carnal. Este que os acompanhou às distâncias e os fez retornar, sabendo que apenas as podridões e os pecados semeados por um pai são feitos de herança perturbadora e irrevogável, só podendo ser regada e colhida por sua própria prole.
"- Então essa é a razão? - É o porquê. Não há razão. Nem para viver nem para morrer. - Então, qual é a sua? - Indiferença. Seja realista... Milhões de galáxias e estrelas, nós somos tão insignificantes: perdidos no espaço. Um policial, você e eu... Um sujeito que anda de metrô à noite e morre... Quem iria reparar?"
"Todas as coisas que costumavam ficar dentro de mim estão para fora. Logo, consigo ver tudo que é você, mas o meu interior é vazio."
Não parece haver cura quando o sobrenatural, a heresia, e o subconsciente se mesclam em elementos básicos de água e fogo para desmembrar os terrores puramente humanos da sugestão sem memória, sem razão, mas sempre com um fundo de uma verdade rejeitada: por vezes sombreada, mascarada, por vezes iluminada...
Não somente um thriller investigativo bem conduzido (o modo como Brian conserva seus motes de movimentação de câmera para aprofundar a história e nunca deixam de me impressionar), mas acima de tudo um que utiliza muito bem de uma metalinguagem cinematográfica - característica de várias obras do diretor, mas aqui focada em um ponto que pouco tem destaque: a sonoplastia - para construir o drama de seus personagens. Um técnico de som que precisa gravar um grito perfeito para o seu filme, mas que acaba se envolvendo demais com acidentes políticos, tiros na noite, serial killers de sinos e um emaranhado de conspirações no Dia da Liberdade. E o final... Perspicaz.
Avatar: O Caminho da Água
3.9 1,3K Assista AgoraNational Geographic, Pesca Dinâmica e Velozes e Furiosos could never 😭
Argentina, 1985
4.3 336Me estarrece pensar em como fomos impostos brutalmente a um período ditatorial 3 vezes mais longo que o da Argentina, provindo de um golpe militar também ocorrido em março, que foi encerrado justamente no ano do julgamento descrito no filme, mas que nunca tivemos algo parecido por aqui. Crimes atrozes tornaram a hipótese de impunidade não caso monstruoso, mas aceito - e negado - por parte da sociedade. O senso moral do brasileiro médio (a classe é cirurgicamente citada/representada aqui) parece (em certeza, dados os últimos anos) ter sido sequestrado, torturado e assassinado como ferramenta política de subversão da história: que sempre julga, mas que não deve ser a única a ser delegada a tais termos. Pois ela leva tempo e não dita sentenças que se sensibilizem aos mortos e desaparecidos - até hoje.
Espero um dia poder repetir, com certeza, o "Nunca mais."
Quanto ao filme: potente e necessário.
Até os Ossos
3.3 264 Assista AgoraMark Rylance. O resto, que eu tenho a ver? Prestou nem o tutano para a sopa.
Pinóquio
4.2 543 Assista Agora"Tem uma coisa que eu não entendi, papai.
- O que, Pinóquio?
- Todo mundo gosta dele.
- De quem?
- Dele (aponta para Jesus). Estavam cantando pra ele, que é feito de madeira também. Por que gostam dele e de mim não?"
Pode entregar o Oscar pro Del Toro, porque o velho merece. Só Guillermo pra conseguir tratar assuntos tão pesados e complexos (em similaridade com O Labirinto do Fauno, mas encontrando um frescor inquestionável para uma história já tão, mas tão batida e adaptada) de maneira tão tocante sobre "pais e filhos imperfeitos", a glorificação e os horrores da guerra e do fascismo, a vida e o fardo eterno (?) de se procurar por aceitação e por um coração - ou uma pinha "perfeita e inteira" - através de um desejo inocente, rebelde e verdadeiro de ser um menino "normal". O que acontece, acontece... Até que nós partimos.
Espere o melhor, não importa o que for, pois a vida sempre dá voltas de um mundo surreal.
Adão Negro
3.1 687 Assista Agora"- O povo precisa de um herói.
- Não, pai. O povo precisa ser livre."
Os Banshees de Inisherin
3.9 572 Assista Agora"Não há como superar certas coisas. E eu acho isso bom."
Você Não Estará Só
3.6 126 Assista Agora"A boca serve para o riso tanto quanto para o choro, mas não deve se abrir quando o marido estiver no recinto. Quando o marido estiver no recinto, você não é uma mulher, você é um cozido, um chá. O seu lugar é dentro da palma dele. Você escorre feito água ao redor dele. Mas quando você está com as mulheres, sua boca não deve nunca se fechar. Quando se está com as mulheres, você é um espelho. Quando as sobrancelhas delas levantarem, você também as suas. Quando arregalarem os olhos, você também arregala os seus. Para as mulheres, você é vidro. Para os homens, você é água. Homens... Tão, tão, tão fácil... O mundo é uma coisa ardente e dolorosa, te queima, te destrói, te mastiga, despedaça, te vomita. Ainda assim..."
A Mulher Rei
4.1 490 Assista Agora"Por 90 anos, Daomé viveu sob a opressão de Oyó. Quando chove, são os nossos ancestrais que choram pela dor que sentimos nos porões sombrios dos navios com destino a costas distantes. Quando o vento sopra, são os nossos ancestrais que nos empurram para a batalha contra aqueles que nos escravizam. Quando troveja, são os nossos ancestrais exigindo que quebremos os grilhões das dúvidas em nossas mentes para lutarmos com coragem. Nós lutamos não apenas pelo presente, mas pelo futuro. Nós somos a lança da vitória. Somos a lâmina da liberdade. Nós somos Daomé!"
Passagem
3.3 114 Assista Agora"- Eu treinava segurar a respiração quando era criança.
- Qual foi o seu tempo máximo?
- Vinte e seis anos.
- Ganhei de você por quatro anos."
Acho que são nesses dramas mais lentos, frios (delineados por distantes, que de tão carregados parecem vazios e cheios ao mesmo tempo), possuindo mais finalmentes que entretantos (mas que casa bem com a temática de "homecoming" após a guerra e a busca por reestabelecimento - seja este qual for) que a Jennifer Lawrence prova bastante a razão de ser a queridinha da Academia: porque ela é boa mesmo. Brian Tyree Henry idem.
Aftersun
4.1 714Daqueles filmes que não possuem grandes acontecimentos ou momentos de dramaticidade elevada, mas que são tão "rotineiros" e compassados, como páginas de um diário compartilhado entre pai e filha, do tipo real, autoral e bem íntimo, que você sabe que tem algo mais do que a superfície. Como uma piscina cheia de hotel ou as ondas negras de um mar solitário e noturno em que na margem está alguém que te amou inocentemente, mas que não foi o suficiente para concluir a sua busca por serenidade e paz. Uma dança sob pressão, ao lado de pessoas na rua, reflexos no espelho e na TV, reflexões filmadas, aniversários não comemorados, karaokês não cantados, fotografias reveladas, tapetes estendidos, choros escondidos e uma porta no fim de um corredor que se abre para não mais voltar. Delicado até o final, que destrói pela falta de "conclusão", pois assim é a vida; e a morte.
Pearl
3.9 999"Como eu poderia ser uma mãe? Eu detestava a sensação daquilo crescendo dentro de mim. Parecia uma doença. Me puxando e chupando como um animal carente num celeiro. Como eu poderia ser responsável por outra vida? A vida me apavora. É duro, sombrio e exaustivo... Eu não queria me sentir assim, tão patética. O Senhor deve ter sido generoso com você. Ele nunca atende as minhas orações. O que eu fiz? O que tem de errado comigo? Eu só quero dançar nas telas como aquelas meninas bonitas nos filmes. Eu quero tanto o que elas têm... ser perfeita... ser amada por muitas pessoas... para compensar todo o meu tempo gasto sofrendo. Eu sou exatamente o que mamãe disse: uma falha. Tudo que eu quero é ser amada. Está sendo tão difícil sem amor ultimamente..."
Mas vocês sabiam que Mia Goth é neta da atriz brasileira Maria Gladys? Que talento! Aqui temos ao menos 5 cenas que já se tornaram instantaneamente icônicas - e em Technicolor.
Blonde
2.6 444 Assista AgoraBasicamente um filme de terror - psicológico - muito bem atuado por Ana de Armas e muito bem composto visualmente (apesar do uso excessivo de nudez e fetos), mas um tanto quanto mal compassado em seus constantes reforços de abuso e exposição sem "contraponto" da personagem principal. Ela parece ser jogada para lá e para cá, esticada e cortada sem restar opiniões ou profundidades, num labirinto de sofrimento durante quase 3 horas - como um rolo de filmes sem fim. Simplesmente isso, como uma pessoa ingênua e incapaz, como uma "Blonde Girl" apenas sexualizada, explorada e estigmatizada eternamente pelos "Daddies": algo que já é discutido. Talvez fosse a intenção dos roteiristas: chocar ao máximo para mostrar como a indústria - e a sociedade - tratavam e enxergavam (e ainda o fazem, em certa medida) as mulheres dum meio majoritariamente machista. Como um pesadelo mesmo. Mas recai nas mesmas "armadilhas" (eufemisticamente falando, quiçá) que Última Noite em Soho ao fazer escolhas de muito mau gosto e que, mesmo com a longa duração, dão às elipses o papel de preencher lacunas que ele deixa deliberadamente.
Marcel a Concha de Sapatos
3.8 104 Assista Agora"- Eu não posso arriscar tudo que eu tenho por conta de uma esperança. E se todas as coisas mudarem novamente?
- Marcel, elas vão. Nós vamos."
Trem-Bala
3.6 589 Assista AgoraAna Vilela would be proud
Não! Não Olhe!
3.5 1,3K Assista AgoraPode até parecer exagerado ou meio forçado, mas em boa parte de sua exibição, a única coisa que consegui pensar em paralelo simplório, mas inevitável, foi como esse filme parecia ter um princípio de "presa vs. predador" tão bem construído em suspense e uma atmosfera de prenúncio/terror contido em relapsos como Spielberg conseguiu fez em Tubarão. Lá, uma fera aquática aterrorizava uma cidade litorânea em alta temporada, enquanto seu prefeito negava os fatos e as mortes até último caso, levando homens a uma caçada inversa e desesperada por sobrevivência. Aqui, uma suposta nave paira em nuvens sobre uma comunidade temática e um rancho que provê cavalos para Hollywood, enquanto ninguém nega seus efeitos, mas os enfrentam com face impassível ou animada, buscando o possível para capturar esse “fantasma” num dia “sortudo”.
E é aí que o princípio se diverge. Enquanto no filme de Steven os caçadores apenas queriam salvar a cidade de mais e mais mortes, aqui Jordan trabalha personagens com bem menos moralidade cível – devido a traumas expostos ou somente por exposição midiática.
Neste ponto mora a complexidade e a questão mais interessante de Nope!:
num mundo e num mercado competitivo, em que todos querem ser o novo "Blockbuster" ou a nova "Oprah", você faria de tudo para conseguir filmar, em alta qualidade, um "Fenômeno Atmosférico Não Identificado"? Sacrificaria pessoas, arriscaria sua vida num "tudo ou nada" apenas pela fama ou viralização num embate contra os grandes estúdios, que desvalorizam seu trabalho ou apagam a sua história sem pensar duas vezes? Até onde você iria pelo "shot perfeito"? (Inclusive, o "bicho", quando sai da camada superficial em formato característico de chapéu caubói dos Bang Bang, não parece se abrir como os tubos de uma câmera fotográfica antiga? Ou estou louco?) Indo ainda em certa consonância com o clássico dos anos 70, e em discussões profundas que não imaginaria que se encaixariam no filme, o cerne que sorve toda a trama parece estar na exploração animal (até as últimas consequências, para um lado ou para o outro) em prol do entretenimento, e como isso pode afetá-los profundamente, pela vida toda ou acabando com esta após um esquecimento de fala na filmagem de uma sitcom.
Peele consegue discutir muitas coisas na sutileza, passando pela história do cinema (rimando os primeiros e o últimos frames lindamente) – o seu início, de fotos em movimento de um jóquei negro montado num corcel, e sua continuidade, impondo como tais indivíduos vêm sendo representados e explorados (diria) em frente e atrás das câmeras ao longo das décadas.
A indústria, por vezes, pode ser tão suja quanto uma casa grande, de madeiras brancas, banhada por tripas, chaves (que não abrem mais muitas portas), moedas (que não pagam mais a ninguém) e sangue regurgitados daqueles que a alimentam diariamente.
"I wear my sunglasses at night
So I can, so I can
Watch you weave then breathe your story lines"
Enola Holmes 2
3.6 208"Só é preciso uma fagulha para começar um incêndio"
Pantera Negra: Wakanda Para Sempre
3.5 800 Assista AgoraUn niño sin amor 🤧🤧🤧
O histórico complicadíssimo de produção do filme e todo o contexto emocional que o circunda, em milhões de fatores, obviamente refletiram na qualidade e principalmente coesão de roteiro e narrativa aqui. Seja em sua longa duração que não aproveita para desenvolver seus personagens suficientemente (a da Coel, por exemplo, é simplesmente jogada de um lado pro outro sem direção), no modo como é montado ou principalmente finalizado. Mas quando o filme acerta, ele aberta BEM na emoção, nas atuações das atrizes principais (Angela Bassett é uma FORÇA da natureza, talvez ainda leve uma indicação ao Oscar) e na mais uma vez ótima trilha sonora de Ludwig.
Chorei um tiquinho aqui e ali, e os 30 minutos finais têm mensagens sobre perda-recomeço e um fechamento de ciclo que são realmente bonitos. E a cena pós-créditos >>>
Veludo Azul
3.9 777 Assista AgoraNum jardim de um mundo estranho, onde árvores são regadas por pios de pintarroxos escusos e onde cartas de amor viram balas em armas, David cultiva rosas que não são suaves como vozes de veludo ou notas musicais num chapéu infantil, tampouco azuis como o céu da manhã, mas que possuem espinhos capazes de cortar orelhas, fustigar fetiches, instigar crimes e afincarem-se numa atmosfera de estranheza, incerteza no que é lúcido ou insano e desconcerto - naturais de um sonho com palhaços coloridos e insetos em bicos - que somente Lynch sabe fazer.
"It's too bad that all these things
Can only happen in my dreams
Only in dreams
In beautiful dreams"
What Josiah Saw
3.4 62O Que Josias Viu, de Vincent Grashaw (2021)
Nota: 7/10+
Embora um pouco irregular em sua montagem e tendo uma conclusão mais falada do que deveria, apostando numa atmosfera pesadíssima de drama com toques de horror puramente humano, Vincent desenvolve, em 3 capítulos, como as visões, segredos e acepções distorcidas de um fantasma podem marcar profundamente a alma, o corpo e o coração de uma família. Maria (Mary), Tomé (Tommy) e Elias (Eli), filhos de Miriam, têm seu nome e vida alicerçados pelos assombros de um trauma compartilhado e desenterrado em culpa bíblica, feito um buraco no peito que jamais poderia ser preenchido ou limpado por ouros ciganos, assinaturas de venda, bebidas ou luzes de anjos e demônios, mas sim pelo fogo - literal ou metafórico, espiritual ou carnal. Este que os acompanhou às distâncias e os fez retornar, sabendo que apenas as podridões e os pecados semeados por um pai são feitos de herança perturbadora e irrevogável, só podendo ser regada e colhida por sua própria prole.
Malévola: Dona do Mal
3.4 617 Assista AgoraDona do mau roteiro, só se for.
Colateral
3.6 613 Assista Agora"- Então essa é a razão?
- É o porquê. Não há razão. Nem para viver nem para morrer.
- Então, qual é a sua?
- Indiferença. Seja realista... Milhões de galáxias e estrelas, nós somos tão insignificantes: perdidos no espaço. Um policial, você e eu... Um sujeito que anda de metrô à noite e morre... Quem iria reparar?"
A Cura
3.9 79"Todas as coisas que costumavam ficar dentro de mim estão para fora. Logo, consigo ver tudo que é você, mas o meu interior é vazio."
Não parece haver cura quando o sobrenatural, a heresia, e o subconsciente se mesclam em elementos básicos de água e fogo para desmembrar os terrores puramente humanos da sugestão sem memória, sem razão, mas sempre com um fundo de uma verdade rejeitada: por vezes sombreada, mascarada, por vezes iluminada...
O Colecionador
4.1 113Freddie Clegg, o primeiro grande Incel da história do cinema.
Um Tiro na Noite
3.9 236 Assista AgoraNão somente um thriller investigativo bem conduzido (o modo como Brian conserva seus motes de movimentação de câmera para aprofundar a história e nunca deixam de me impressionar), mas acima de tudo um que utiliza muito bem de uma metalinguagem cinematográfica - característica de várias obras do diretor, mas aqui focada em um ponto que pouco tem destaque: a sonoplastia - para construir o drama de seus personagens. Um técnico de som que precisa gravar um grito perfeito para o seu filme, mas que acaba se envolvendo demais com acidentes políticos, tiros na noite, serial killers de sinos e um emaranhado de conspirações no Dia da Liberdade. E o final... Perspicaz.