- Gostei da história cheia de tensões que nunca se resolvem; Julianne Moore incorpora Gracie como uma personagem em constante estado de negação – que é uma forma interessante que o roteiro, a direção e a atuação de Moore colocam como aquela mulher consegue conviver consigo mesma e com o mundo à sua volta depois do que ela fez –, Gracie escolhe não ver o quão monstruosa ela mesma é, e Elizabeth (Natalie Portman sensacional) adentra o mundo dela e tenta quebrar a sua resistência em tocar nos assuntos cruciais que deram início a essa relação.
É muito notável como a negação do ato de violência contra um menor cometido por Gracie
se estende para as pessoas do seu convívio, como a professora de arranjo de flores e o seu advogado (?), é um detalhe que evoca uma vibe satírica bem sofisticada pelo absurdo da situação, como se todos escolhessem viver num transe.
- Gracie também é sutilmente retratada como uma caçadora literal e metafórica, manipuladora, como na cena em que joga com as inseguranças da própria filha, que estava radiante após achar o vestido perfeito para sua formatura, mas muda de opinião com os comentários que a mãe faz sobre seu corpo; isso sem contar os vários momentos em que ela faz gaslighting com o marido, e se mostra uma control freak, dominando todas as informações à sua volta que chegam para Elizabeth;
- Queria ter sentido mais ao longo do filme a Elizabeth de Portman pegando os maneirismos de Gracie, mas não era essa a intenção aparentemente; o foco é mais no seu processo de pesquisa e entrevistas, bem interessante. Dessa pegada de método tivemos aquela bela cena em plano-sequência dela lendo a carta no último terço do filme,
a transa com Joe e, de fato, reproduzindo no set de filmagem o momento em que Gracie seduziu o menino.
- Então o que temos é um trabalho delicioso de metalinguagem, onde uma atriz (Portman) interpreta uma atriz (Elizabeth) que vai interpretar uma personagem (Gracie) baseada na construção que outra atriz fez (Moore) de uma pessoa que realmente existiu. Esse é o meu aspecto preferido do filme, por exemplo, aquela cena na aula de teatro em que Elizabeth responde à pergunta engraçadinha do aluno com uma verdadeira aula, dissecando com requintes de filosofia tudo que acontece em uma cena de sexo do ponto de vista de um ator – adorei.
- O marido Joe é um jovem adulto perdido entre ser
um menino que precisou amadurecer muito rápido para lidar com as questões que seu relacionamento com Gracie trouxe, e um homem que não cresceu totalmente porque não viveu fases essenciais da adolescência. Ele, ao final, joga para Gracie que não estava preparado para aquilo, a decisão dele não deveria importar àquela altura, ele tinha 13 anos, por Deus! Ela, uma mulher feita, casada e mãe, era responsável que nada daquilo jamais acontecesse! Ele é, até ali, a vítima de um jogo mental de muita manipulação;
A cena em que ele visita o pai e comenta sobre como é inacreditável seus próprios filhos indo para faculdade, como se pedisse direcionamento ao seu "coroa", mas este não vem, então eles apenas ficam sentados em silêncio fumando...
- Todd Haynes usa uma música repetitiva, como uma vírgula sonora ou uma rima, por vezes chega a ser opressora; a fotografia é bem bonita, parece ser tudo meio pastel; os animais usados como signos dos personagens, as larvas de borboletas monarcas e seu processo de metamorfose como o amadurecimento necessário a Joe e que lhe foi negado, e a cobra na cena final da gravação do filme, que emula a natureza predatória de Gracie.
- Gostei muito do filme, das atuações de Natalie Portman, Juliane Moore e Charles Melton, mas não diria que são arrebatadoras ou "as melhores da carreira" de nenhum deles. Bom, talvez do Charles Melton.
Narra com detalhes duros de acompanhar, a luta pela sobrevivência da equipe de rugby uruguaia depois que o avião em que estavam cai nos Andes chilenos em 1972. Eu tinha uma amiga que falava muito de um outro filme dos anos 90 chamado "Vivos" que contava a mesma história, mas com um elenco majoritariamente estadunidense (ah, os anos 90!)... Aqui pelo menos todos falam castelhano.
O filme do competente diretor espanhol J. A. Bayona talvez seja um pouco mais longo do que eu gostaria, mas pensei nos mais de 70 dias que aquelas pessoas passaram naquele ambiente e concluí que acho que dá pra aguentar um filme, né. Bom que dá tempo do roteiro dar atenção a cada um dos sobreviventes, mesmo que a caracterização ou o casting criem uma dificuldade pra que eu conseguisse identificá-los, toda hora me confundia (todos lindos), mas os atores são muito bons.
A cena do acidente aéreo é muito bem dirigida, montada e sonorizada, causa um impacto muito forte. Gostei de não ver aqui os usuais clichês de heroísmo que vêm com esse tipo de filme e o peso que o filme dá para o dilema moral da decisão crucial que eles precisam tomar para continuar vivos, e que é algo inimaginável, uma resolução que uma vez tomada, é um limiar ultrapassado que só vai somar aos diversos traumas que eles já carregam caso sobrevivam e que, certamente, os mudou e conectou para sempre; os personagens discutem e levantam todos os pontos de vista sob os quais aquilo pode ser visto, moral, jurídico, religioso, etc. antes de decidir que a sobrevivência era o seu direito mais básico;
O final é emocionante sem exageros melodramáticos e bastante satisfatório; esta é uma história que precisava ser recontada para esta geração. Gostei muito, coloca nossa vida e nossa noção de privilégios em cheque... mas não quero tornar a vê-lo.
As melhores coisas do filme são a música e o trabalho de iluminação; filha e mãe Jamie Lee Curtis e Janet Leigh, as scream queens originais, têm personagens subdesenvolvidas assim como o restante do elenco, a ameaça não é é sentida, não curti a direção do Carpenter neste aqui, que veio logo depois de "Halloween"... A história não engaja, o desenrolar não empolga, achei um sonífero.
Contrariando as expectativas que o pôster do filme gera, "Nas ondas da fé" não se trata de uma sátira ácida ao universo das igrejas neopentecostais; existe aqui um respeito com a religião em si, mas uma crítica ao sistema, aos homens que movem as peças desse grande business que se tornou a fé, se aproveitando principalmente dos mais humildes. Essa decisão criativa, que poderia ser um ponto negativo, de alguma forma funciona.
Nem toda piada que Marcelo Adnet faz, eu acho graça, e beleza. Ele mesmo sempre fala sobre como o humor é algo muito mais particular do que coletivo, e aqui não é diferente, pois nem todas as piadas funcionam, e o filme tem uma certa dificuldade de achar o seu tom.
Hickson (Marcelo Adnet), é mais um brasileiro suburbano se virando em vários empregos para sobreviver ao lado da mulher Jessika (Letícia Lima, ótima), e que agarra as oportunidades conforme elas vão surgindo. Sua ascensão como líder religioso tem muito mais a ver com o seu desejo de crescimento pessoal do que com a vontade de enganar ou explorar a fé alheia. Ele eventualmente vai acabar se tornando mais uma engrenagem dessa máquina, ou seja, um canalha, mas ainda existem características que o redimem aqui e ali.
Eu gostaria de ver mais do conflito ético do personagem pelas coisas que precisa fazer para manter o seu 'momentum', porque tanto ele quanto a esposa, são personagens carismáticos e que geram uma identificação imediata, pensei "eu conheço esse casal!" Então isso eu senti falta. Mesmo assim, a dupla é uma das melhores coisas do filme, junto com toda a parte dos 'bastidores da fé', as relações de hierarquia, os interesses, a inveja, a ganância, o pecado, o marketing, etc... todas essas contradições daquele microcosmo são retratados de um jeito bem interessante.
Existe uma cena onde o protagonista vai a um presídio tentar negociar o fim de uma rebelião que eu não gosto nem um pouco, pois além de não ter nenhum pay-off, isto é, não afeta em nada a história nem o personagem, ela não é bem sucedida em nada que se propõe, servindo inclusive como plataforma reacionária em um monólogo muito estranho dado por Michel Melamed, e que ainda estou tentando enxergar a crítica feita ali, pois o tom da direção foi na exata direção contrária.
O elenco é cheio de nomes ótimos, Tonico Pereira, Stepan Nercessian, Otávio Muller, Elisa Lucinda, só para citar alguns, e as participações especiais também, de vários comediantes em papéis não necessariamente cômicos, como Fernando Caruso fazendo um PM, tem muitas pérolas. Mas de tudo o que mais me conquistou foi a parte de produção; criar toda a atmosfera de uma vida no subúrbio carioca através das locações, objetos de cena e posteriormente desse universo das igrejas, tudo muito bem resolvido e verossímil, parece fácil de fazer aquilo ali, mas não é.
O saldo final é de um filme ágil, que faz bom proveito de seus 90 minutos, observando com um olhar curioso e crítico para as religiões cristãs neopentecostais, e que poderia, inclusive, ter sido realizado por uma produtora evangélica com um pouco de senso de humor, pois o filme nunca pretende ridicularizar essa cultura ou o que seus fiéis consideram sagrado, mas sim causar uma reflexão, tanto para quem vai reconhecer os clichês do mundo gospel, como para quem é de fora desse universo, como eu, sobre as suas contradições.
- Vi este filme numa madrugada, após ter sido impactado pela atuação de Maika Monroe no sensacional "It Follows" (2014), eu já havia adicionado ele à lista quando saiu, mas tinha esquecido dele.
- Muito mais do que um suspense que pega algumas coisas emprestadas de "Janela Indiscreta" (1954), só que invertendo a perspectiva, pois acompanhamos a perspectiva da pessoa observada, o que eu mais gostei em "Watcher" é a forma que a diretora e co-roteirista Chloe Okuno trabalha o isolamento da Julia chegando a Bucareste, na Romênia; um país desconhecido, uma língua que ela não fala, e eu amo que os diálogos não são traduzidos para nós também, estendendo ao espectador essa sensação de estar perdido, alienado de tudo que a cidade tem a oferecer, o que torna muito mais palpável o tédio, o abandono que a personagem sente, potencializado pela ausência do marido; O medo e a ansiedade que vêm de se sentir exposta, observada por um estranho, no meio de um contexto onde há um assassino de mulheres na cidade e seu marido não acredita em você, então tem essa questão do gaslighting, mas também pode ser que o isolamento de Julia tenha criado nela uma obsessão nesse observador - a diretora joga com essa possibilidade de ser uma paranoia da protagonista; esse elemento do stalker, do voyeurismo mútuo são centrais à trama e Okuno cria uma atmosfera opressora que casa perfeitamente com a arquitetura da cidade, a temperatura de cor fria, o trabalho de cor deste filme é muito bonito... Todas as escolhas dela aqui me agradam demais.
- Inclusive e principalmente a estrela do filme: Maika Monroe faz aqui mais um trabalho de atuação muito sofisticado e meticuloso; é uma descida gradual ao desamparo, ao desespero de ter a certeza que algo terrível vai acontecer a você a qualquer momento e ninguém vai te ajudar; Monroe é muito boa em demonstrar fragilidade e uma gama de emoções em suas expressões faciais, especialmente nos silêncios, e sempre dentro de uma busca por um realismo que mantém a personagem com os pés no chão e faz a plateia não só simpatizar consigo, como viver aquilo na pele com ela, e como eu amo esse tipo de ator/atriz! Espero vê-la indicada a prêmios grandes em breve, assim como foi com a igualmente fantástica Florence Pugh.
- Igualmente bem no filme, está o contraponto de Julia, o observador interpretado por Burn Gorman, que consegue ser medonho apenas com o olhar, ao mesmo tempo que a nossa percepção e pré-concepções são expostos, afinal aquele é o rosto do cidadão e, assim como Julia, poderíamos estar tirando conclusões baseadas apenas na aparência, e o ator também traz essa ambiguidade para a mesa com muito sucesso. São atuações quase minimalistas que fazem um filme de premissa simples e até batida, ser algo fresco e diferente. Um exemplo é aquela cena do metrô, tensão que dá pra cortar com uma faca e é tudo direção e atuações.
- A construção do clímax funcionou demais para mim,
gostei de como a profissão de Julia ser atriz foi usada ali, os caminhos que a história parece que vai tomar e aí BAM! E aquele olhar de nojo no último frame do filme que parece dizer "I fucking told you so" foi TÃO gratificante! A jornada de Julia é completa e ela descobre uma força que talvez nem ela sabia que tinha, TÃO fodona.
- A diretora disse que neste filme teve influências de Hitchcock, David Fincher e Satoshi Kon e eu consigo ver todos esses toques em "Watcher", mas o produto final tem sua identidade própria.
- Curioso que tanto em "Watcher" como em "It Follows", há uma cena em que a personagem interpretada por Maika Monroe vai ao cinema e o filme passando é "Charade" (1963).
Botei esse filme pra ver numa noite enquanto me preparava pra dormir, pois, na minha cabeça, as cartas já estavam todas na mesa e não tinha como me surpreender como no anterior; bem como a tentativa de fazer a órfã Esther parecer ainda mais jovem nesta prequel me parecia muito difícil de alcançar, afinal a atriz Isabelle Fuhrman não tem mais onze anos.
Essa parte da menina realmente ficou bizarro, mesmo com os ângulos de câmera, os filtros que embaçam a fotografia e os outros artifícios para enganar o nosso olhar que insiste em ver a mulher de vinte e poucos anos, e não uma menina de sete anos. Mas dentro da premissa insólita, esse "vale da estranheza", para mim, funcionou como mais um elemento narrativo do terror/suspense ou mesmo como algo camp, uma vez que o filme tem muito mais humor desta vez.
Com minha suspensão de descrença ligada, me peguei não só desperto, acompanhando o desenrolar da trama, como pas-sa-do com a direção que a história toma! Eles conseguiram de novo!! O frescor da reviravolta reorganiza todas as peças no jogo e dá todo um novo fôlego ao filme, não só pelo conteúdo escandaloso da revelação, mas pelo momento na história em que ela acontece; pois quando parece que estava vendo apenas uma versão inferior do primeiro filme, ele mostra que era tudo um set-up para uma punchline que te acerta por onde você não espera,
invertendo as dinâmicas de poder e nos fazendo torcer pela "vilã".
Fiquei tão bobo com a orquestração desse twist, que gargalhei. Ótima execução.
Isabelle Fuhrman continua bem no papel de Esther, impressiona menos que no primeiro filme, mas entrega; Julia Stiles (que estou odiando na 5ª temp de "Dexter") aqui serve uma personagem que funciona tão bem com Fuhrman quanto Flora e Donatella (quem pegou, pegou), as cenas das duas são folhetinescas, deliciosas; e o pai interpretado por Rossif Sutherland é um SABOR...
Esse é um filme que pede constantemente que o espectador embarque no que ele propõe, já que parasse para pensar dois segundos sobre o que estava vendo, as fraquezas do roteiro ficariam evidentes. Mas ele também não se leva a sério, o que funciona como um "tão ruim que fica bom", ou seja, é uma pataquada bem tosca e eu curti.
Essa tal de Emerald Fennell é mesmo uma coisa né? Fez tudo nesse filme hein escreveu, produziu e dirigiu! Estou encantado. E me surpreendeu ver o nome de ninguém menos que Margot Robbie entre os produtores, passado!
A história vai num crescendo de loucura e perversão, mentiras e sedução, crime, ambição e luxo difícil de prever e tudo com muita convicção, algumas cenas eu desejei que fossem cortadas bem antes, mas Fennell não grita "corta!" até que nossa capacidade de levantar a sobrancelha tenha sido testada ao máximo. Adorei os excessos, o jogo de manipulação, a falta de limites, a vida de fachada da aristocracia... Espécie de "Segundas Intenções" (1999) elevado ao cubo, até no uso maravilhoso da música, eu já amava "Murder on the dancefloor" da Sophie Ellis Bextor desde que ela veio no programa da Hebe (kkkk), amei esse revival que está tendo. Uma fotografia vibrante, colorida, sexy, linda, linda, linda.
Barry Keoghan faz aqui uma atuação tão assombrosa quanto em "O Sacrifício do Cervo Sagrado", com seu olhar hipnótico de gato e carrega o filme com força de um ator mega experiente; Rosamund Pike é um acontecimento, amo essa atriz, e parece estar se divertindo muito no papel; Richard E. Grant e Carey Mulligan completam a constelação de veteranos que dão o tom da comédia dark, oscilando entre a caricatura e o realismo sem perder o tom; Alison Oliver foi a revelação do filme para mim, como Venetia, e Archie Madekwe conseguiu me fazer odiar seu Farleigh Start; Jacob Elordi é um ator que vi poucos trabalhos, curti em "Euphoria" S01, mas sua onipresença na cultura pop me repele... aqui ele serve algo que não parece muito nuançado, exceto pela cena da visita à casa de Oliver, onde seus olhos e seu sorriso forçado comunicam muito bem sua raiva por ter sido feito de idiota, o auge.
Sexy, perverso, satírico, incontrito e muito bem realizado.
Assistir a este filme depois de ter visto "Barbie" é engraçado: personagem de um universo de faz-de-conta que transpõe a fronteira para o mundo real, sente o choque desta realidade que não funciona como no seu mundo perfeito e causa muita confusão, dando origem a diversas cenas engraçadas; aqui foram a do dinheiro de mentira, o carro que não está pronto pra fuga assim que se entra nele, a espera pelo fade out depois do beijo perfeito...
Filme bem-humorado e charmoso que brinca com a fantasia invadindo o mundo real durante a depressão americana, e como a magia do cinema é capaz de fazer sonhar e esperar o melhor da vida, mesmo diante das tristezas que passamos. A indústria de Hollywood entrando em polvorosa foi divertido, a breve discussão sobre quem dá vida ao personagem, se o roteirista que o escreve ou o ator que o interpreta; Mia Farrow e Jeff Daniels estão encantadores, mas Danny Aiello e Dianne Wiest também brilham.
O final acabou comigo, foi como um soco totalmente do nada! Por que ele fez aquilo?!... Fui despedaçado e perdi a fé na humanidade. Nunca confiarei em um ator novamente.
Ando numa onda de reassistir filmes que não vejo há 20 anos ou mais, e só agora me dei conta disso, mas estou gostando desse movimento de resgate e reavaliação. "Femme Fatale" (2002) é um deles, lembro de assistí-lo no auge da adolescência e foi meu segundo do Brian De Palma. Gostei muito dessa coisa de thriller sexual à época, afinal, hormônios né.
Nesta revisão via NetMovies, logo na sequência do roubo em Cannes, percebi detalhes nos acontecimentos ali que, parando para pensar um pouco, não fazem muito sentido; mas gosto de como o diretor parece aproveitar ideias do primeiro "Missão: Impossível" (1995), criando uma ambientação bem parecida ali. E analisando algumas cenas no decorrer da história, tudo que a personagem de Rebecca Romijn, Laure Ash, precisa para escapar de seus perseguidores, cai diretamente em seu colo como uma intervenção divina (ou Deus ex machina, se preferir)... um pouco forçado né, convenhamos. O roteiro, também assinado por De Palma, abusa dessas conveniências, coincidências e do acaso, assim como muitas atitudes questionáveis dos personagens para que sua trama se desenrole, expondo fragilidade na escrita.
Mesmo assim, eu não consigo evitar gostar de "Femme Fatale"; é um daqueles filmes onde os prós superam os contras, pra mim. O estilo do diretor para os enquadramentos, os zenitais, os movimentos de câmera como travellings, o seus característicos 'split screens', perspectivas forçadas com dois assuntos em foco; um em primeiríssimo plano e outro ao fundo... O jeito que ele brinca com a linguagem cinematográfica é simplesmente delicioso.
Sobre o enredo, De Palma parece fazer aqui uma versão exacerbada do seu "neo-noir", pegando clichês do estilo e batendo-os no liquidificador (do mesmo jeito que Wes Craven fez com o slasher em "Pânico"); temos a personagem-título, uma clássica bombshell blonde, personagens sem moral, um homem acusado injustamente e por aí vai. A intriga e o quebra-cabeça que vão se formando são sedutores, as várias reviravoltas do roteiro... tudo me diverte muito mais do que aborrece.
Até o infame twist da banheira, eu gosto, pois não é um simples "foi tudo um sonho", o que invalidaria todo o filme; mas sim uma espécie de premonição que potencializa tudo aquilo como uma realidade paralela (ou um filme dentro do filme), e ao final, nos brinda com outro resultado da equação, bem mais satisfatório, dadas as decisões diferentes que foram tomadas a partir daquele ponto.
As coincidências mais uma vez têm um papel fundamental nos acontecimentos, porém, agora dando um viés determinista para o todo, que me atrai.
A música do premiado Ryuichi Sakamoto, que faleceu há menos de um ano (R.I.P), é excelente, embora nem sempre condizente com o clima do que está acontecendo na tela; e os figurinos luxuosos assinados por uma gama de designers de alta costura são lindos.
Rebecca Romijn, que na época ainda assinava "Romijn-Stamos" (a melhor versão de Mística dos "X-men" até hoje), nunca esteve tão estonteante e sua performance não é digna de nenhuma indicação a prêmios, mas ela se sai bem aqui; e Antonio Banderas está empenhado, sua afetação na cena com Lily no quarto de hotel lá pela metade do filme é um deleite.
Que belo filme. Gosto da direção onírica, às vezes parece usar de uma linguagem teatral; baseia-se principalmente em diálogos, atuação e cenários/locações. As falas são tão deliberadas, o idioma francês, tão charmoso... A direção de arte é lindamente minimalista, o apartamento de Jack e Julie, algo nele me lembra capas de álbuns e cenários de videoclipes dos anos 90. A cidade de Paris, uma coprotagonista. Amo os cortes, as elipses da montagem; lembram o estilo do Godard, o triângulo amoroso remeteu a Truffaut.
Delicadeza e poesia vêm à mente quando penso em cenas como Julie cantando pelas ruas de Paris ou ela com Joseph parados de frente ao monumento com os carros passando e a câmera lentamente se afastando, abrindo o plano, enquanto ouvimos Joseph enumerar as coisas que gosta e não gosta em Paris. A música também é linda, o jogo de luz, sombras e cores da fotografia também. Ah... O amor na juventude tão lindo e tão triste. Gosto de filmes assim, que te permitem ir fundo no que os personagens estão sentindo.
O jeito que o rosto de Julie (Guilaine Londez) me lembrou Amy Winehouse... Meu primeiro filme da diretora Chantal Akerman.
Assisti sem saber que era da dupla responsável por "Goodnight mommy", que ainda não assisti, mas que me foi bastante recomendado.
É um filme atmosférico, pesado no lado psicológico, e o que eu mais gostei foi o jeito que o roteiro joga com as diferentes possibilidades para explicar o que diabos está acontecendo ali:
Será que Grace está fazendo tudo durante seus episódios de sonambulismo? Ela tem dupla personalidade? Será que as crianças estão pregando uma peça nela? Será que tem mesmo uma presença sobrenatural na casa? Alguém do culto de Grace estaria fazendo aquilo? Eles morreram e estão no purgatório? Ou, minha solução preferida, o pai das crianças estaria por trás de tudo?...
Enfim, são muitos caminhos possíveis que a história vai sugerindo e as peças do quebra-cabeças ora parecem se encaixar, ora não fazem tanto sentido.
Trilha sonora dá show, por ex. na cena em que eles estão dirigindo até o chalé, sobe um grave arrepiante! E a fotografia do Thimios Bakatakis? O mesmo cara que fez "O Sacrifício do Cervo Sagrado" (excelente trabalho); é agourenta, claustrofóbica, rica em luz natural, filmada em película, brinca com as proporções do chalé e da casa de bonecas... é mais um trabalho lindo desse ícone. Outra coisa que eu gosto é ser um filme de terror da Hammer, um estúdio tão clássico.
As referências a "Enigma de Outro Mundo" vão além da cena em que os personagens estão assistindo ao filme de John Carpenter, pois aqui também temos personagens isolados pela neve, acontecimentos estranhos, intriga do início ao fim... O que também remete a "O Iluminado". Mas acho que o filme mais imediato que "O Chalé" traz à mente, é "Hereditário", não só visualmente ou por ter elementos como o terror em decorrência do luto, tensões familiares e uma casa de bonecas... mas também por toda a forma como o roteiro é estruturado, e esse aspecto me incomodou um pouco, até porque o lançamento foi muito próximo um do outro para ser considerada uma coincidência ou uma referência. Ficou a sensação de algo meio derivativo mesmo.
O elenco tem só cinco atores praticamente, o que eu achei sensacional, porque em momento nenhum isso me ocorreu até os créditos subirem, não parece um filme "vazio" ou carente de mais elenco, todos preenchem a tela, muito competentes; Riley Keough é cativante e tem a voz de veludo herdada do avô, ninguém menos que Elvis Presley (fiquei passado) e sua personagem, Grace, carrega muito bem o filme com todas as suas nuances; Richard Armitage entrega a dubiedade que o personagem pede, tanto que fiquei desconfiado dele o filme todo,
sendo que após revelado o seu não-envolvimento no plano, só torna ele um péssimo pai, pois todas as suas decisões são péssimas;
Alicia Silverstone tem uma participação rápida, mas impactante; e Lia McHugh tem um momento devastador no início e depois segue num tom bem consistente. Só o menino do "It - A Coisa" que não fedeu nem cheirou.
Dados os pontos positivos e negativos do filme, não achei parado, nem previsível, nem anticlimático; tem uma direção competente, um visual belíssimo, é bem tenso, o roteiro tem furos (por que ela precisa esconder dele que está se medicando? Isso não faz sentido!) e deixa pontas soltas ou abertas à interpretação, dependendo do ponto de vista, o final poderia seguir caminhos mais instigantes dado todo o leque de "what ifs?" que ele abre, mas está longe de ser um filme ruim.
A dedicação e o entusiasmo da gangue de Leigh Whannell, James Wan, Oren Peli e Jason Blum em se revezarem para produzir, roteirizar, dirigir, atuar, bater claquete, passar cafezinho etc. nos filmes de terror uns dos outros nos últimos 20 anos é muito legal. Me dá aquela sensação de estar vendo um projeto despretensioso, feito entre amigos que têm ideias criativas para driblar orçamentos modestos e verdadeiro amor pelo gênero, mesmo trabalhando dentro de um contexto mercadológico.
Contudo, mesmo o melhor tipo de set para se fazer um filme do gênero, não necessariamente é garantia de render exemplares memoráveis como foram "Jogos Mortais", "Atividade Paranormal" ou "Invocação do mal", dos supracitados. Ainda mais quando estamos falando do terceiro filme de uma franquia, que geralmente é onde o trem começa a descarrilar.
Neste terceiro filme, a cadeira de diretor ficou vaga, uma vez que James Wan estava ocupado dirigindo "Velozes 8" (aqui ele é coprodutor e faz uma pontinha na cena do teste de atuação de Quinn); então Leigh Whannell, que volta a escrever e atuar, faz aqui sua estreia na direção.
Tendo crescido profissionalmente em Hollywood lado a lado com Wan e tendo escrito o ótimo "Jogos Mortais", Leigh Whannell claramente não é nenhum iniciante dentro da indústria, porém, sentar na cadeira de diretor aqui foi inédito para ele. Ele TEM boas ideias e executa bem seus sustos, como o do atropelamento, super eficaz e chocante; A longa sequência da câmera noturna no closet, em que Quinn quebra o gesso das pernas e quase termina em tragédia; e aquele momento da janela me fez literalmente pular do sofá gritando (e logo em seguida gargalhar alto da minha própria idiotice)! Mas talvez o acúmulo de funções tenha exigido um pouco demais de Whannell e o lado mais psicológico, atmosférico e creepy do terror não funcionou tão bem pra mim... Dá para resumir o filme naquele tipo de horror que é um jogo de esperar pelo próximo susto enquanto aturamos diálogos fracos.
Lin Shaye está de volta como Elise, cujo destaque central foi um dos maiores acertos deste irregular roteiro (e matá-la no primeiro filme foi a pior ideia), ela *É* a estrela da franquia e sua conexão emocional com a audiência, e não me admiraria se a decisão de fazer uma prequel ser totalmente para trazê-la de volta; Angus Sampson (olá moço) e o próprio Leigh Whannell, os caça-fantasmas dos filmes anteriores, que adicionam humor ao filme; E finalmente, Michael McKay, que já nos deu um dos maiores jump scares do cinema em "Se7en - Os Sete Crimes Capitais" como a vítima do pecado da "preguiça", faz aqui um trabalho razoável como "O Homem Que Não Consegue Respirar"... Entre as atuações menos impressionantes estão o pai e a filha que parecem um casting unicamente para trazer algum "star power" por imposição do estúdio: Dermot Mulroney faz um pai completamente desprovido de emoção num contexto que exigia justamente isso dele; é o tipo de ator que se acha bom demais para esse tipo de filme, fazendo o mínimo para receber seu cheque e meter o pé; Já Stephanie Scott (coitada) faz o que pode, mas sua Quinn é apagada, lembrando um clone pálido da Selena Gomez. Ou seja, claramente há atores 100% comprometidos com o projeto e outros que nem tanto assim. O que me pega aqui é a parceria de Leigh Whannell e Lin Shaye, muito parceiros.
Ainda sobre o roteiro e a direção, outros acertos de Whannell são as cenas em que olha para a solidão de Elise na ausência de seu marido e o momento com o fantasma da mãe de Quinn no clímax. Recorresse menos ao melodrama e melhor trabalhados, com foco maior no aspecto humano da história, esses temas sensíveis que o roteiro aborda, como traumas, perdas e luto poderiam funcionar ainda melhor. Por outro lado, Whannell consegue, como já disse, um bom equilíbrio entre humor e terror pela primeira vez na franquia, abandonando o ar pateta presente nos capítulos anteriores. Continuo não curtindo a mitologia do "The further", acho tudo meio cafooona demais, conceitualmente e na realização, mas temos aqui o melhor uso disto.
Por ser um "capítulo 3" que ainda por cima é uma prequel, o esperado a esta altura era já estar tudo esfarelando e que fosse muito pior do que de fato é, mas "Sobrenatural: A Origem" se virou bem sem os maiores nomes de seus antecessores (James Wan, Patrick Wilson e Rose Byrne) criando uma razão no roteiro para a ausência da família Lambert (a trama é anterior à sua introdução), Whannell injetou fôlego passando para a cadeira de diretor e manteve o nível da franquia, sendo uma boa diversão despretensiosa de shopping.
É preciso muita coragem ou estupidez para aceitar fazer um remake do clássico cult "The Thing" de John Carpenter. Sendo justo, de todas as ideias ruins que poderiam ter surgido, fazer um prequel baseado nos eventos que ocorreram na base norueguesa que os personagens do filme de 1982 acham no início daquele filme, é um bom argumento e faz sentido. Mas daí a fazer um filme à altura daquele, é uma história completamente diferente.
O excesso de personagens sem profundidade e muito parecidos entre si, não ajuda, eu nem sei quem foi o homem branco que sobreviveu e correu atrás do cachorro no final (risos). Um monte de cientistas que tomam decisões nada científicas a partir do momento que levam o bloco de gelo com a criatura para a base, foi foda de engolir kkkk.
O destino do piloto americano do brinco poderia ter sido mais ambíguo e seria ótimo... mas também poderia ser pior. Então acho que foi positivo.
O mais frustrante é que o filme chegou a ter uma versão com efeitos práticos bem decentes - mais ou menos na pegada do que Rob Bottin e Stan Winston fizeram 29 anos antes - e um clímax que contava mais sobre a origem da 'coisa'; havia na nave várias espécies diferentes de aliens que foram assimilados pelo bicho, dando a entender que a espaçonave fora roubada pelo bicho e caiu na Terra... porém o estúdio não gostou e decidiu trocar tudo por um CGI inferior e aquele desfecho genérico naquela nave genérica.
Falta o suspense, o senso de paranoia, claustrofobia e a capacidade de síntese da versão oitentista, além dos efeitos especiais espetaculares e designs de monstro memoráveis. O filme tem como principal atenuante, o cuidado com os detalhes da história que estabelecem os eventos do filme clássico, demonstrando pelo menos certa reverência ao que Carpenter realizou.
Filme de terror bem nota 7, baseado em um livro de sucesso dos anos 80 capitalizando sobre a tendência teen cheia de nostalgia de "Stranger Things", "It" e "Fear Street".
O elenco é ok, as histórias são assustadoras o bastante para o público PG13, têm algo creepy no tom delas, têm bons monstros com designs fiéis às artes do livro (obrigado Guillermo Del Toro), há riscos reais uma vez que os jovens morrem mesmo (pelo menos até o final deixar isso em aberto na esperança de uma continuação) e alguns efeitos práticos bons, mesmo que haja também bastante CG ruim.
Por sua natureza infantojuvenil, é compreensível a falta de mais gore nas cenas de matança, o que não curti é a explicação final para as histórias com a resolução do mistério, bem chocha.
O filme me divertiu muito com as constantes quebras de expectativa que ele propõe, desde a cena de abertura que satiriza "2001". As gargalhadas surgem principalmente com as piadas que a Mattel se permitiu ser alvo e o escárnio com os pilares frágeis que sustentam a masculinidade. A indicação de "I'm just Ken" a melhor canção original no Oscar parece certa, assim como as de melhor direção de arte, figurinos, melhor atriz para Margot Robbie e melhor diretora pra Greta Gerwig.
O elenco é quase um "who's who" da constelação em atividade atualmente (meu coração vai para Issa Rae e o trio de "Sex Education", Ncuti Gatwa - que estava TÃO lindo -, Connor Swindells e Emma Mackie, que só de contracenar com Margot Robbie já zerou aquele meme sobre elas serem idênticas) e foi muito legal ir reconhecendo ao longo do filme cada rosto.
Gostei de como balancearam as zoeiras à Mattel e suas contradições, como a administração majoritariamente masculina, piadas e fatos com a importância da boneca como um símbolo feminista ao longo da História, e como o espírito do tempo desta geração trouxe novas problemáticas a serem expostas. Aparentemente nenhum elogio ou ataque possível à Barbie como conceito foi deixado de fora, o que eu achei refrescante, e a forma como tudo isso foi costurado em uma trama exigiu habilidade. Tenho a impressão que o roteiro partiu desses pontos de vista e opiniões para só então construir o enredo, o que eu achei interessante.
Porém, não é um filme imune a críticas. Ryan Gosling faz um trabalho apenas ok como Ken, o que não chegou a prejudicar o personagem porque, enfim, é o que ele sempre serve, mas achei que poderia ter mais nuance. America Ferrera também não curti a atuação ou a personagem, a atriz não parecia conectada com aquele mundo como o roteiro pedia (algo que ficou bem evidente em entrevistas) e a personagem é uma chata. E não vejo graça no Will Ferrell e o núcleo dele com os executivos da Mattel, são bobos mas não engraçados. Algumas digressões do roteiro me perderam e o ritmo sofre para manter o momentum.
Talvez a campanha de marketing mais cara da História disfarçada de filme, talvez a comédia-produto mais relevante desta década, talvez a melhor versão de "feminism for dummies" já filmada, e certamente o último filme-evento de que tivemos notícia.
Perdeu uma estrela por não ter nem uma pontinha da Trixie Mattel, crime de homofobinha.
Um filme que em 1950 teve a coragem de falar de Hollywood como essa máquina que mastiga e cospe fora seus astros, em uma época onde a imagem da "fábrica de sonhos" era vendida para o mundo como o cartão-postal do sonho americano, é muito visionário e metalinguístico. Há de se entender que em pleno clima de pós-guerra, expor assim as feridas que a transição do cinema mudo para o falado deixou na indústria, e os talentos que se viram sem espaço naquela nova lógica do mercado, como Norma Desmond, não era a imagem que os estúdios queriam passar.
Isso para não falar que uma atriz aos 50 anos sem trabalho era muito comum naquele tempo, enquanto atores homens tinham uma carreira muito mais longa. Pelo mesmo motivo que a relação de Norma com um homem mais jovem não era bem vista pela sociedade da época; porém, em se invertendo os papéis, isso era percebido com naturalidade - como acontece até hoje. Não à toa, a história do jovem roteirista com problemas financeiros que acaba na mansão da atriz rica de meia idade reclusa, ávida por um retorno às telas, e que enxergam a própria salvação um no outro, culminando em um affair fatal, soava tão possível e é considerado o primeiro a apresentar tropos do que viria a ser conhecido como "hagsploitation" (gênero que explorava a figura de mulheres mais velhas como megeras decrépitas e psicóticas); ao mesmo tempo que usa elementos do film noir, como a narração em off e a tragédia do narrador.
Há um elemento de melancolia real de estrelas descartadas que permeia todo o filme, como na sequência em que Norma Desmond faz uma visita aos estúdios da sua antiga "casa", a Paramount; ao ser barrada nos portões, Desmond brada que sem ela, nada daquilo existiria, e Gloria Swanson não mentiu, pois já foi o maior nome da produtora; Também está presente na figura do mordomo Max, interpretado por Erich von Stroheim, cuja história de ter sido um diretor de filmes mudos também é inspirada em sua vida; e em participações como a do astro Buster Keaton. É uma carta de amor e também uma nota de repúdio ao cinema.
Para ser justo, Norma é uma diva cheia de caprichos e exigências, e não seria errado deduzir que parte de sua derrocada artística tenha se devido ao seu próprio gênio e teimosia em se adaptar à nova tecnologia, já que ela demonstra aversão aos filmes falados. Não por acaso, a atuação de Gloria Swanson beira o exagero, com seus olhos arregalados e muita expressão corporal; uma vez que atriz e personagem são formadas pelo cinema mudo, faz todo sentido. Outro eco da história de Desmond que existe em Swanson: o filme que vemos junto com Norma e Joe em seu projetor, é um filme real de Gloria dirigido por von Stroheim (Max) em seu auge. E sua cena vestida como Chaplin é uma recordação carinhosa do mestre símbolo daquela era, mas também algo que Swanson fazia no início da carreira.
William Holden está bem como Joe Gillis, sua atuação é econômica, mas repleta de nuances; ele não é um golpista, mas a situação que se apresenta diante dele, cai como uma luva para resolver todos os seus problemas, um caso clássico de "a ocasião faz o ladrão". Logo ele percebe que está envolto em uma teia de dependência emocional e mentiras, se questiona ainda mais quando vai se aproximando da aspirante a roteirista Betty Schaefer, e toma a decisão que julga moralmente correta, mas infelizmente é tarde demais. Billy Wilder sabia o que estava fazendo quando rodou aquela cena dele de traje de banho na piscina...
A forma como a direção de arte ajuda a contar a história é brilhante: objetos de cena como o órgão tocado por Max; os porta-retratos de Norma mais jovem; o roteiro de "Salomé" escrito por ela e editado por Joe; a arma que termina sendo determinante na história; a cigarreira que Joe ganha dela no ano novo; e o próprio carro dele que é o pontapé inicial da história - todos esses 'props' são usados narrativamente de uma forma muito eficaz por Wilder.
Detalhes que eu curti também são a chegada de Joe na mansão meio gótica e aquela dinâmica inicial onde a figura "decadente" não permite que ele saia, remete a "Drácula"; e o plot twist de Max revelando que não só foi o diretor do primeiro filme de Norma, mas também seu marido! Excelente controle narrativo.
E por último, os diálogos são um deleite, desde a narração em off de Joe, que estabelece o tom, descreve personagens com seu olhar enviesado e acrescenta leves toques cômicos, fazendo dele um narrador nada confiável; Suas cenas com a bela Betty Schaefer têm uma dinâmica leve, ela está decidida a trabalhar com Joe, e ele aos poucos vai se rendendo a ela... Mas é Norma quem tem as falas mais memoráveis do filme – Wilder e cia. criaram tantos diálogos icônicos: "I AM big. It's the PICTURES that got small" é a minha favorita; e a descida das escadas, onde ela quebra a quarta parede falando das "pessoas no escuro" referindo-se à plateia e vem em direção à câmera para o fade out... é simplesmente assombroso.
Esse filme foi um dos que, na minha opinião, fez jus à fama que carrega e entregou tudo que eu nem sabia que precisava: é divertido, envolvente, bem escrito, bem dirigido, tem um elenco fabuloso, cheio de metalinguagem e easter eggs.
Frodo, eu te odeio, seu verme egoísta; Sam, para de ser cadelinha desse hetero, ele não vai te comer; Gollum tenho zero penas, teve o que mereceu, trabalho esplêndido de Andy Serkis porém; Miranda Otto como Éowyn melhor personagem, uma das únicas três mulheres com fala de toda a trilogia, inventora do feminismo; Legolas fez muito menos nesses filmes do que sua fama vendia e tem menos screentime que o rei chato que morreu debaixo do cavalo; Aragorn, um homem que não tem piru em um universo onde ninguém transa; Gandalf ganha pontos por ser a bicha fabulosa que é o Ian McKellen yaaass kween!
É esse que haviam me dito há vinte anos que era o melhor dos três, really?... A história é toda uma borefest, é brega, quando Peter Jackson dirigiu isso, o plot já estava velho e rançoso, "História Sem Fim" fez tudo isso aqui e melhor vinte anos antes, "Ah, mas Tolkien criou os tropos", palmas para ele, mestre. Mas todo mundo que seguiu no seu rastro fez melhor, até "A Lenda" com Tom Cruise, que tá no mesmo nível narrativo, só que tem a decência de ser mais curto. Meu veredito é: um grande surto coletivo.
Única cena digna de nota foi a batalha das árvores Ent, quando solta a água é catártico, lindamente filmada e montada, lembrou aqueles filmes de monstro gigante dos anos 50. Só tinha assistido até este aqui nos anos 2000 e segue sendo o que mais me agradou na trilogia, mas aihn... que filme chato gente.
Hmmm não sei se achei tão melhor assim que o primeiro filme. Certamente que o conflito entre Maverick e Rooster cria uma tensão movida a mágoa, culpa e um desejo reprimido de se conectar, que é interessante... O elenco atualizado para 2022 tem mais cara de mundo real... Jon Hamm e Ed Harris no elenco como contrapontos masculinos à figura narcisista de Tom me parece correto... A cena entre Maverick e Iceman, com todo o contexto da doença de Val Kilmer, tendo em mente que nenhum dos dois queria realmente fazer o "Top Gun" original e agora se reconectam neste aqui quase 40 anos depois é carregada de significado, mas a direção de Joseph Kosinski falha em canalizar essa emoção... As cenas aéreas são indiscutivelmente superiores aos takes soltos do filme de 1986, a clareza da decupagem aqui é estupenda... Mas a cena inicial com os caças na pista para decolar carece do charme e do talento de Tony Scott para criar aquelas silhuetas contra o céu em chamas... Não tem nada de errado com o filme, entretanto ele não me conquistou como seu antecessor.
Assim como da primeira vez que assisti, há cerca de vinte anos, achei chato, longo, sem uma única fala memorável ou cena empolgante, os personagens não me cativam, a construção de universo não me impressiona, e assistí-lo foi como um dever de casa que eu queria muito terminar. Uma estrela pelas trucagens de câmera, brincadeiras com proporções e perspectiva, que são impecáveis; principal legado desse filme.
- Neill Blomkamp ("Distrito 9") escreve e dirige este filme que parte de uma premissa insólita envolvendo tecnologia e sobrenatural através de simulações virtuais para investigar casos de possessão demoníaca; que me impressionou pelo bom aproveitamento do budget de ridículos US$1,5 mi – os efeitos visuais são pontuais e satisfatórios –; Na escalação do elenco, que é competente em estabelecer uma ligação emocional entre os personagens, sobretudo a relação de mãe e filha, cuja química era essencial para o filme funcionar; E que também me agradou pela escrita funcional de Blomkamp; os diálogos são claros, sem encheção de linguiça e ele se permite viajar nesta trama algo camp onde o Vaticano usa padres-soldados e a tecnologia para exterminar demônios (o timing para esta informação ser revelada para o espectador foi bem eficaz). Nada inovador, pois ainda recorre a clichês sempre que julga necessário, mas existe algo de fresh na abordagem do tema.
- O que eu não gosto nem um pouco é do design do bicho. Não causa nenhum tipo de medo ou arrepio, pois ninguém tem medo de um homem com cabeça de pássaro. Também faltou gore aqui.
- A direção faz boas escolhas no geral, especialmente considerando que foi rodado durante a pandemia da covid-19, e extrai boas atuações do elenco, com ações e reações plausíveis diante das situações que se apresentam. É um esforço criativo que tem seus méritos dentro de um subgênero do terror, mas que deixa a constante impressão que funcionaria muito melhor como um curta.
Esse filme nunca falha em me dar uma injeção de adrenalina com apenas 3 minutos de projeção, não importa quantas vezes eu assista. A eficácia dessa cena 'in medias res' é espantosa porque ela faz um monte de coisa num espaço de tempo ridículo: apresenta um vilão que não está para brincadeira na forma do hipertalentoso Philip Seymour Hoffman; mostra Ethan Hunt mais vulnerável e impotente do que nunca; Tem a melhor atuação do Tom Cruise na franquia até então, passando por todos os estágios do luto a cada número da contagem regressiva; estabelece que o negócio agora é muito mais sério, com o presumido assassinato da mocinha; e espalha várias pistas do que está por vir na história de forma bem sucinta, com diálogos como "Eu implantei uma carga explosiva na sua cabeça. Soa familiar?"; "Ah, como você me ajudou no avião? Daquele jeito?"; "Mas... eu já te dei o pé de coelho", etc... Então, quando chegamos nesses pontos narrativos e essas peças vão se encaixando no quebra-cabeça, a gente já prende a respiração, porque como é dito a certa altura: "Isto é adrenalina. Você vai sentir isso". E. COMO. ESSE. FILME. ENTREGA. É o primeiro - e o melhor - longa co-escrito e dirigido por J.J. Abrams.
Gosto deste elenco também, Tom Cruise nos dá a melhor encarnação de Ethan Hunt até aqui, pois seu vínculo emocional com a Julia de Michelle Monaghan é bem construído, eles são um casal bem mais cativante que o par do filme anterior; Ving Rhames tem um merecido desenvolvimento em sua relação com Hunt; Keri Russell tem poucas cenas, mas sua personagem é marcante demais; Jonathan Rhys-Meyers e Maggie Q sendo lindos; Laurence Fishburne tem ambiguidade e boas falas; Simon Pegg é introduzido como o recorrente Benji; Aaron Paul logo antes da calvície antigí-lo em cheio... Não gosto do Billy Crudup em geral, mas aqui ele tem um papel que me pegou. Mas sem dúvida, o rosto desse filme é o do saudoso Philip Seymour Hoffman, o homem faz *O* melhor vilão da franquia com sua interpretação magistral de Owen Davian, o jeito que ele pega falas potencialmente bregas e dá a elas um ar realmente ameaçador é coisa de artesão. Ele é focado, ele é frio, é totalmente blasé, mas também sobe o tom quando preciso, ele é imprevisível, ele sempre parece ter a vantagem sobre Ethan. Minha cena preferida é a do avião, tem algo da dinâmica Batman/Coringa de "The Dark Knight", sendo que este veio antes. Cara, como Seymour Hoffman faz falta! Ele era um dos grandes. E se este filme tem um defeito é não ter cenas suficientes com ele.
O estilo de direção de J.J. Abrams era, para mim, o que havia de mais maneiro nos anos 2000: muito contraste, muita saturação, pouca profundidade de campo nos planos médios, uns flare e uma granulação bonita, montagem fluida, a câmera na mão aqui serve ao propósito de dar o senso de realismo e urgência que Abrams introduziu é que ajudou a revitalizar "M: I".. Isso daqui é o puro suco!
Também me agradou a forma que as máscaras são usadas neste aqui, muito mais pontualmente e com máximo impacto em ambas as cenas. Mostrar também como elas eram feitas e como funcionavam efetivamente foi outro acerto, já que o conceito de impressora 3D ainda não era tão presente no cotidiano das pessoas.
Outra coisa que é divertida é ficar pegando os easter eggs de "filme do Tom Cruise": a clássica cena dele bonitão andando de moto, as corridinhas, o início da sua busca por mais realismo com stunts perigosos; além dos callbacks aos anteriores, sempre acrescentando algo de fresh, a descida clássica pelo cabo é precedida por uma inédita subida caminhando pela parede; a festa de gala aqui é muito mais movimentada, tensa e legal que a do primeiro; tem uma rápida cena no poço do elevador recordando a cena que matou o agente do 1...
No filme de John Woo, Ethan era mais um super-herói que resolvia tudo praticamente sozinho e neste aqui, a equipe volta com uma participação maior, o que eu prefiro, pois dá mais dinamismo e tensão às sequências. E é sequência foda após sequência foda, o ritmo nunca cai! Só para pontuar algumas, ele entrega aquela abertura eletrizante, o resgate de Lindsey, a invasão ao Vaticano e a festa da captura de Davian, a cena do avião, onde Seymour Hoffman brilha demaais, o ataque e resgate de Davian na ponte (principal set piece do filme), o roubo do pé-de-coelho em Xangai, aí temos o clímax da abertura resolvido, que eu acho divertido, mesmo que muita gente ache anticlimático... Todas funcionam.
Há de se contextualizar que se hoje o que manda são franquias intermináveis e multiversos de heróis, nos idos de 2006, as trilogias é que eram a tendência do mercado e eram o que vendiam box de DVDs, "Matrix", "O Senhor Dos Anéis", "X-men"... Sem contar que Tom Cruise estava com a popularidade em baixa depois de se tornar o maior símbolo da cientologia, pular no sofá da Oprah e ser alvo de inúmeras chacotas, o que até afetou a bilheteria baixa do filme. Então, um quarto filme não fazia sentido naquele zeitgeist, este filme era para ser a homenagem-tributo ao legado da franquia que encerraria (em tese, pois óbvio que o dinheiro fala), logo,
Um filme onde Michael Cera (cuja comédia física baseada em apenas existir nunca falha) é o cara que faz as gatas do colégio brigarem por ele, e que dá a Kat Dennings seu primeiro orgasmo, só não consegue ser mais inverossímil do que Dennings, que tem charme e beleza de sobra, dizendo que não se acha tão bonita ou cool suficiente para ele. Para o Michael Cera.
Esta comédia romântica não funciona por outros motivos além desses; a jornada noite de adentro é até simpática, mas o filme sofre de um plot extremamente previsível; a direção não tem personalidade nenhuma e parece não entender o star quality dos seus protagonistas; As situações em que eles são colocados não têm o apelo cômico que seus idealizadores acreditam, exceto por um único 'prop', uma certa goma de mascar, que tem o melhor arco e garante os melhores momentos da fita. Tivessem feito um filme sobre a jornada daquele chiclete, seria muito melhor. Cameos legais de Andy Samberg, Seth Meyers, Mimi Imfurst, Billy Griffith e Jay Baruchel.
Dado o panorama mundial atual, acho que demorou até demais para a HBO Max anunciar que retirará de seu catálogo no final de Jan/2024 esta comédia besteirol produzida e estrelada por Adam Sandler, sobre um soldado de elite israelense que forja a própria morte para seguir seu sonho de ser cabeleireiro nos EUA.
Como todo bom besteirol, ou você embarca na palhaçada, ou acha tudo forçado, ridículo e até ofensivo. Eu me diverti, dei risada, curti os cameos de Chris Rock e Mariah Carey, confundi a Emmanuelle Chriqui com Nina Dobrev (idêntica) e tentei olhar com bons olhos a leveza com que o filme aborda as diferenças entre os dois povos; pelo bem da comédia e porque em 2008, o mundo era outro.
Segredos de um Escândalo
3.5 297 Assista Agora- Gostei da história cheia de tensões que nunca se resolvem; Julianne Moore incorpora Gracie como uma personagem em constante estado de negação – que é uma forma interessante que o roteiro, a direção e a atuação de Moore colocam como aquela mulher consegue conviver consigo mesma e com o mundo à sua volta depois do que ela fez –, Gracie escolhe não ver o quão monstruosa ela mesma é, e Elizabeth (Natalie Portman sensacional) adentra o mundo dela e tenta quebrar a sua resistência em tocar nos assuntos cruciais que deram início a essa relação.
É muito notável como a negação do ato de violência contra um menor cometido por Gracie
- Gracie também é sutilmente retratada como uma caçadora literal e metafórica, manipuladora, como na cena em que joga com as inseguranças da própria filha, que estava radiante após achar o vestido perfeito para sua formatura, mas muda de opinião com os comentários que a mãe faz sobre seu corpo; isso sem contar os vários momentos em que ela faz gaslighting com o marido, e se mostra uma control freak, dominando todas as informações à sua volta que chegam para Elizabeth;
- Queria ter sentido mais ao longo do filme a Elizabeth de Portman pegando os maneirismos de Gracie, mas não era essa a intenção aparentemente; o foco é mais no seu processo de pesquisa e entrevistas, bem interessante. Dessa pegada de método tivemos aquela bela cena em plano-sequência dela lendo a carta no último terço do filme,
a transa com Joe e, de fato, reproduzindo no set de filmagem o momento em que Gracie seduziu o menino.
- Então o que temos é um trabalho delicioso de metalinguagem, onde uma atriz (Portman) interpreta uma atriz (Elizabeth) que vai interpretar uma personagem (Gracie) baseada na construção que outra atriz fez (Moore) de uma pessoa que realmente existiu. Esse é o meu aspecto preferido do filme, por exemplo, aquela cena na aula de teatro em que Elizabeth responde à pergunta engraçadinha do aluno com uma verdadeira aula, dissecando com requintes de filosofia tudo que acontece em uma cena de sexo do ponto de vista de um ator – adorei.
- O marido Joe é um jovem adulto perdido entre ser
um menino que precisou amadurecer muito rápido para lidar com as questões que seu relacionamento com Gracie trouxe, e um homem que não cresceu totalmente porque não viveu fases essenciais da adolescência. Ele, ao final, joga para Gracie que não estava preparado para aquilo, a decisão dele não deveria importar àquela altura, ele tinha 13 anos, por Deus! Ela, uma mulher feita, casada e mãe, era responsável que nada daquilo jamais acontecesse! Ele é, até ali, a vítima de um jogo mental de muita manipulação;
- Todd Haynes usa uma música repetitiva, como uma vírgula sonora ou uma rima, por vezes chega a ser opressora; a fotografia é bem bonita, parece ser tudo meio pastel; os animais usados como signos dos personagens, as larvas de borboletas monarcas e seu processo de metamorfose como o amadurecimento necessário a Joe e que lhe foi negado, e a cobra na cena final da gravação do filme, que emula a natureza predatória de Gracie.
- Gostei muito do filme, das atuações de Natalie Portman, Juliane Moore e Charles Melton, mas não diria que são arrebatadoras ou "as melhores da carreira" de nenhum deles. Bom, talvez do Charles Melton.
A Sociedade da Neve
4.2 715 Assista AgoraNarra com detalhes duros de acompanhar, a luta pela sobrevivência da equipe de rugby uruguaia depois que o avião em que estavam cai nos Andes chilenos em 1972. Eu tinha uma amiga que falava muito de um outro filme dos anos 90 chamado "Vivos" que contava a mesma história, mas com um elenco majoritariamente estadunidense (ah, os anos 90!)... Aqui pelo menos todos falam castelhano.
O filme do competente diretor espanhol J. A. Bayona talvez seja um pouco mais longo do que eu gostaria, mas pensei nos mais de 70 dias que aquelas pessoas passaram naquele ambiente e concluí que acho que dá pra aguentar um filme, né. Bom que dá tempo do roteiro dar atenção a cada um dos sobreviventes, mesmo que a caracterização ou o casting criem uma dificuldade pra que eu conseguisse identificá-los, toda hora me confundia (todos lindos), mas os atores são muito bons.
A cena do acidente aéreo é muito bem dirigida, montada e sonorizada, causa um impacto muito forte. Gostei de não ver aqui os usuais clichês de heroísmo que vêm com esse tipo de filme e o peso que o filme dá para o dilema moral da decisão crucial que eles precisam tomar para continuar vivos, e que é algo inimaginável, uma resolução que uma vez tomada, é um limiar ultrapassado que só vai somar aos diversos traumas que eles já carregam caso sobrevivam e que, certamente, os mudou e conectou para sempre; os personagens discutem e levantam todos os pontos de vista sob os quais aquilo pode ser visto, moral, jurídico, religioso, etc. antes de decidir que a sobrevivência era o seu direito mais básico;
O final é emocionante sem exageros melodramáticos e bastante satisfatório; esta é uma história que precisava ser recontada para esta geração. Gostei muito, coloca nossa vida e nossa noção de privilégios em cheque... mas não quero tornar a vê-lo.
A Bruma Assassina
3.3 194As melhores coisas do filme são a música e o trabalho de iluminação; filha e mãe Jamie Lee Curtis e Janet Leigh, as scream queens originais, têm personagens subdesenvolvidas assim como o restante do elenco, a ameaça não é é sentida, não curti a direção do Carpenter neste aqui, que veio logo depois de "Halloween"... A história não engaja, o desenrolar não empolga, achei um sonífero.
Nas Ondas da Fé
2.6 34Contrariando as expectativas que o pôster do filme gera, "Nas ondas da fé" não se trata de uma sátira ácida ao universo das igrejas neopentecostais; existe aqui um respeito com a religião em si, mas uma crítica ao sistema, aos homens que movem as peças desse grande business que se tornou a fé, se aproveitando principalmente dos mais humildes. Essa decisão criativa, que poderia ser um ponto negativo, de alguma forma funciona.
Nem toda piada que Marcelo Adnet faz, eu acho graça, e beleza. Ele mesmo sempre fala sobre como o humor é algo muito mais particular do que coletivo, e aqui não é diferente, pois nem todas as piadas funcionam, e o filme tem uma certa dificuldade de achar o seu tom.
Hickson (Marcelo Adnet), é mais um brasileiro suburbano se virando em vários empregos para sobreviver ao lado da mulher Jessika (Letícia Lima, ótima), e que agarra as oportunidades conforme elas vão surgindo. Sua ascensão como líder religioso tem muito mais a ver com o seu desejo de crescimento pessoal do que com a vontade de enganar ou explorar a fé alheia. Ele eventualmente vai acabar se tornando mais uma engrenagem dessa máquina, ou seja, um canalha, mas ainda existem características que o redimem aqui e ali.
Eu gostaria de ver mais do conflito ético do personagem pelas coisas que precisa fazer para manter o seu 'momentum', porque tanto ele quanto a esposa, são personagens carismáticos e que geram uma identificação imediata, pensei "eu conheço esse casal!" Então isso eu senti falta. Mesmo assim, a dupla é uma das melhores coisas do filme, junto com toda a parte dos 'bastidores da fé', as relações de hierarquia, os interesses, a inveja, a ganância, o pecado, o marketing, etc... todas essas contradições daquele microcosmo são retratados de um jeito bem interessante.
Existe uma cena onde o protagonista vai a um presídio tentar negociar o fim de uma rebelião que eu não gosto nem um pouco, pois além de não ter nenhum pay-off, isto é, não afeta em nada a história nem o personagem, ela não é bem sucedida em nada que se propõe, servindo inclusive como plataforma reacionária em um monólogo muito estranho dado por Michel Melamed, e que ainda estou tentando enxergar a crítica feita ali, pois o tom da direção foi na exata direção contrária.
O elenco é cheio de nomes ótimos, Tonico Pereira, Stepan Nercessian, Otávio Muller, Elisa Lucinda, só para citar alguns, e as participações especiais também, de vários comediantes em papéis não necessariamente cômicos, como Fernando Caruso fazendo um PM, tem muitas pérolas. Mas de tudo o que mais me conquistou foi a parte de produção; criar toda a atmosfera de uma vida no subúrbio carioca através das locações, objetos de cena e posteriormente desse universo das igrejas, tudo muito bem resolvido e verossímil, parece fácil de fazer aquilo ali, mas não é.
O saldo final é de um filme ágil, que faz bom proveito de seus 90 minutos, observando com um olhar curioso e crítico para as religiões cristãs neopentecostais, e que poderia, inclusive, ter sido realizado por uma produtora evangélica com um pouco de senso de humor, pois o filme nunca pretende ridicularizar essa cultura ou o que seus fiéis consideram sagrado, mas sim causar uma reflexão, tanto para quem vai reconhecer os clichês do mundo gospel, como para quem é de fora desse universo, como eu, sobre as suas contradições.
Observador
3.4 280 Assista Agora- Vi este filme numa madrugada, após ter sido impactado pela atuação de Maika Monroe no sensacional "It Follows" (2014), eu já havia adicionado ele à lista quando saiu, mas tinha esquecido dele.
- Muito mais do que um suspense que pega algumas coisas emprestadas de "Janela Indiscreta" (1954), só que invertendo a perspectiva, pois acompanhamos a perspectiva da pessoa observada, o que eu mais gostei em "Watcher" é a forma que a diretora e co-roteirista Chloe Okuno trabalha o isolamento da Julia chegando a Bucareste, na Romênia; um país desconhecido, uma língua que ela não fala, e eu amo que os diálogos não são traduzidos para nós também, estendendo ao espectador essa sensação de estar perdido, alienado de tudo que a cidade tem a oferecer, o que torna muito mais palpável o tédio, o abandono que a personagem sente, potencializado pela ausência do marido; O medo e a ansiedade que vêm de se sentir exposta, observada por um estranho, no meio de um contexto onde há um assassino de mulheres na cidade e seu marido não acredita em você, então tem essa questão do gaslighting, mas também pode ser que o isolamento de Julia tenha criado nela uma obsessão nesse observador - a diretora joga com essa possibilidade de ser uma paranoia da protagonista; esse elemento do stalker, do voyeurismo mútuo são centrais à trama e Okuno cria uma atmosfera opressora que casa perfeitamente com a arquitetura da cidade, a temperatura de cor fria, o trabalho de cor deste filme é muito bonito... Todas as escolhas dela aqui me agradam demais.
- Inclusive e principalmente a estrela do filme: Maika Monroe faz aqui mais um trabalho de atuação muito sofisticado e meticuloso; é uma descida gradual ao desamparo, ao desespero de ter a certeza que algo terrível vai acontecer a você a qualquer momento e ninguém vai te ajudar; Monroe é muito boa em demonstrar fragilidade e uma gama de emoções em suas expressões faciais, especialmente nos silêncios, e sempre dentro de uma busca por um realismo que mantém a personagem com os pés no chão e faz a plateia não só simpatizar consigo, como viver aquilo na pele com ela, e como eu amo esse tipo de ator/atriz! Espero vê-la indicada a prêmios grandes em breve, assim como foi com a igualmente fantástica Florence Pugh.
- Igualmente bem no filme, está o contraponto de Julia, o observador interpretado por Burn Gorman, que consegue ser medonho apenas com o olhar, ao mesmo tempo que a nossa percepção e pré-concepções são expostos, afinal aquele é o rosto do cidadão e, assim como Julia, poderíamos estar tirando conclusões baseadas apenas na aparência, e o ator também traz essa ambiguidade para a mesa com muito sucesso. São atuações quase minimalistas que fazem um filme de premissa simples e até batida, ser algo fresco e diferente. Um exemplo é aquela cena do metrô, tensão que dá pra cortar com uma faca e é tudo direção e atuações.
- A construção do clímax funcionou demais para mim,
gostei de como a profissão de Julia ser atriz foi usada ali, os caminhos que a história parece que vai tomar e aí BAM! E aquele olhar de nojo no último frame do filme que parece dizer "I fucking told you so" foi TÃO gratificante! A jornada de Julia é completa e ela descobre uma força que talvez nem ela sabia que tinha, TÃO fodona.
- A diretora disse que neste filme teve influências de Hitchcock, David Fincher e Satoshi Kon e eu consigo ver todos esses toques em "Watcher", mas o produto final tem sua identidade própria.
- Curioso que tanto em "Watcher" como em "It Follows", há uma cena em que a personagem interpretada por Maika Monroe vai ao cinema e o filme passando é "Charade" (1963).
Órfã 2: A Origem
2.7 773 Assista AgoraBotei esse filme pra ver numa noite enquanto me preparava pra dormir, pois, na minha cabeça, as cartas já estavam todas na mesa e não tinha como me surpreender como no anterior; bem como a tentativa de fazer a órfã Esther parecer ainda mais jovem nesta prequel me parecia muito difícil de alcançar, afinal a atriz Isabelle Fuhrman não tem mais onze anos.
Essa parte da menina realmente ficou bizarro, mesmo com os ângulos de câmera, os filtros que embaçam a fotografia e os outros artifícios para enganar o nosso olhar que insiste em ver a mulher de vinte e poucos anos, e não uma menina de sete anos. Mas dentro da premissa insólita, esse "vale da estranheza", para mim, funcionou como mais um elemento narrativo do terror/suspense ou mesmo como algo camp, uma vez que o filme tem muito mais humor desta vez.
Com minha suspensão de descrença ligada, me peguei não só desperto, acompanhando o desenrolar da trama, como pas-sa-do com a direção que a história toma! Eles conseguiram de novo!! O frescor da reviravolta reorganiza todas as peças no jogo e dá todo um novo fôlego ao filme, não só pelo conteúdo escandaloso da revelação, mas pelo momento na história em que ela acontece; pois quando parece que estava vendo apenas uma versão inferior do primeiro filme, ele mostra que era tudo um set-up para uma punchline que te acerta por onde você não espera,
invertendo as dinâmicas de poder e nos fazendo torcer pela "vilã".
Isabelle Fuhrman continua bem no papel de Esther, impressiona menos que no primeiro filme, mas entrega; Julia Stiles (que estou odiando na 5ª temp de "Dexter") aqui serve uma personagem que funciona tão bem com Fuhrman quanto Flora e Donatella (quem pegou, pegou), as cenas das duas são folhetinescas, deliciosas; e o pai interpretado por Rossif Sutherland é um SABOR...
Esse é um filme que pede constantemente que o espectador embarque no que ele propõe, já que parasse para pensar dois segundos sobre o que estava vendo, as fraquezas do roteiro ficariam evidentes. Mas ele também não se leva a sério, o que funciona como um "tão ruim que fica bom", ou seja, é uma pataquada bem tosca e eu curti.
Saltburn
3.5 852Essa tal de Emerald Fennell é mesmo uma coisa né? Fez tudo nesse filme hein escreveu, produziu e dirigiu! Estou encantado. E me surpreendeu ver o nome de ninguém menos que Margot Robbie entre os produtores, passado!
A história vai num crescendo de loucura e perversão, mentiras e sedução, crime, ambição e luxo difícil de prever e tudo com muita convicção, algumas cenas eu desejei que fossem cortadas bem antes, mas Fennell não grita "corta!" até que nossa capacidade de levantar a sobrancelha tenha sido testada ao máximo. Adorei os excessos, o jogo de manipulação, a falta de limites, a vida de fachada da aristocracia... Espécie de "Segundas Intenções" (1999) elevado ao cubo, até no uso maravilhoso da música, eu já amava "Murder on the dancefloor" da Sophie Ellis Bextor desde que ela veio no programa da Hebe (kkkk), amei esse revival que está tendo. Uma fotografia vibrante, colorida, sexy, linda, linda, linda.
Barry Keoghan faz aqui uma atuação tão assombrosa quanto em "O Sacrifício do Cervo Sagrado", com seu olhar hipnótico de gato e carrega o filme com força de um ator mega experiente; Rosamund Pike é um acontecimento, amo essa atriz, e parece estar se divertindo muito no papel; Richard E. Grant e Carey Mulligan completam a constelação de veteranos que dão o tom da comédia dark, oscilando entre a caricatura e o realismo sem perder o tom; Alison Oliver foi a revelação do filme para mim, como Venetia, e Archie Madekwe conseguiu me fazer odiar seu Farleigh Start; Jacob Elordi é um ator que vi poucos trabalhos, curti em "Euphoria" S01, mas sua onipresença na cultura pop me repele... aqui ele serve algo que não parece muito nuançado, exceto pela cena da visita à casa de Oliver, onde seus olhos e seu sorriso forçado comunicam muito bem sua raiva por ter sido feito de idiota, o auge.
Sexy, perverso, satírico, incontrito e muito bem realizado.
A Rosa Púrpura do Cairo
4.1 591 Assista AgoraAssistir a este filme depois de ter visto "Barbie" é engraçado: personagem de um universo de faz-de-conta que transpõe a fronteira para o mundo real, sente o choque desta realidade que não funciona como no seu mundo perfeito e causa muita confusão, dando origem a diversas cenas engraçadas; aqui foram a do dinheiro de mentira, o carro que não está pronto pra fuga assim que se entra nele, a espera pelo fade out depois do beijo perfeito...
Filme bem-humorado e charmoso que brinca com a fantasia invadindo o mundo real durante a depressão americana, e como a magia do cinema é capaz de fazer sonhar e esperar o melhor da vida, mesmo diante das tristezas que passamos. A indústria de Hollywood entrando em polvorosa foi divertido, a breve discussão sobre quem dá vida ao personagem, se o roteirista que o escreve ou o ator que o interpreta; Mia Farrow e Jeff Daniels estão encantadores, mas Danny Aiello e Dianne Wiest também brilham.
O final acabou comigo, foi como um soco totalmente do nada! Por que ele fez aquilo?!... Fui despedaçado e perdi a fé na humanidade. Nunca confiarei em um ator novamente.
Femme Fatale
3.1 193 Assista AgoraAndo numa onda de reassistir filmes que não vejo há 20 anos ou mais, e só agora me dei conta disso, mas estou gostando desse movimento de resgate e reavaliação. "Femme Fatale" (2002) é um deles, lembro de assistí-lo no auge da adolescência e foi meu segundo do Brian De Palma. Gostei muito dessa coisa de thriller sexual à época, afinal, hormônios né.
Nesta revisão via NetMovies, logo na sequência do roubo em Cannes, percebi detalhes nos acontecimentos ali que, parando para pensar um pouco, não fazem muito sentido; mas gosto de como o diretor parece aproveitar ideias do primeiro "Missão: Impossível" (1995), criando uma ambientação bem parecida ali. E analisando algumas cenas no decorrer da história, tudo que a personagem de Rebecca Romijn, Laure Ash, precisa para escapar de seus perseguidores, cai diretamente em seu colo como uma intervenção divina (ou Deus ex machina, se preferir)... um pouco forçado né, convenhamos. O roteiro, também assinado por De Palma, abusa dessas conveniências, coincidências e do acaso, assim como muitas atitudes questionáveis dos personagens para que sua trama se desenrole, expondo fragilidade na escrita.
Mesmo assim, eu não consigo evitar gostar de "Femme Fatale"; é um daqueles filmes onde os prós superam os contras, pra mim. O estilo do diretor para os enquadramentos, os zenitais, os movimentos de câmera como travellings, o seus característicos 'split screens', perspectivas forçadas com dois assuntos em foco; um em primeiríssimo plano e outro ao fundo... O jeito que ele brinca com a linguagem cinematográfica é simplesmente delicioso.
Sobre o enredo, De Palma parece fazer aqui uma versão exacerbada do seu "neo-noir", pegando clichês do estilo e batendo-os no liquidificador (do mesmo jeito que Wes Craven fez com o slasher em "Pânico"); temos a personagem-título, uma clássica bombshell blonde, personagens sem moral, um homem acusado injustamente e por aí vai. A intriga e o quebra-cabeça que vão se formando são sedutores, as várias reviravoltas do roteiro... tudo me diverte muito mais do que aborrece.
Até o infame twist da banheira, eu gosto, pois não é um simples "foi tudo um sonho", o que invalidaria todo o filme; mas sim uma espécie de premonição que potencializa tudo aquilo como uma realidade paralela (ou um filme dentro do filme), e ao final, nos brinda com outro resultado da equação, bem mais satisfatório, dadas as decisões diferentes que foram tomadas a partir daquele ponto.
A música do premiado Ryuichi Sakamoto, que faleceu há menos de um ano (R.I.P), é excelente, embora nem sempre condizente com o clima do que está acontecendo na tela; e os figurinos luxuosos assinados por uma gama de designers de alta costura são lindos.
Rebecca Romijn, que na época ainda assinava "Romijn-Stamos" (a melhor versão de Mística dos "X-men" até hoje), nunca esteve tão estonteante e sua performance não é digna de nenhuma indicação a prêmios, mas ela se sai bem aqui; e Antonio Banderas está empenhado, sua afetação na cena com Lily no quarto de hotel lá pela metade do filme é um deleite.
Enfim, um cult subestimado.
Noite e Dia
3.7 6Que belo filme. Gosto da direção onírica, às vezes parece usar de uma linguagem teatral; baseia-se principalmente em diálogos, atuação e cenários/locações. As falas são tão deliberadas, o idioma francês, tão charmoso... A direção de arte é lindamente minimalista, o apartamento de Jack e Julie, algo nele me lembra capas de álbuns e cenários de videoclipes dos anos 90. A cidade de Paris, uma coprotagonista. Amo os cortes, as elipses da montagem; lembram o estilo do Godard, o triângulo amoroso remeteu a Truffaut.
Delicadeza e poesia vêm à mente quando penso em cenas como Julie cantando pelas ruas de Paris ou ela com Joseph parados de frente ao monumento com os carros passando e a câmera lentamente se afastando, abrindo o plano, enquanto ouvimos Joseph enumerar as coisas que gosta e não gosta em Paris. A música também é linda, o jogo de luz, sombras e cores da fotografia também. Ah... O amor na juventude tão lindo e tão triste. Gosto de filmes assim, que te permitem ir fundo no que os personagens estão sentindo.
O jeito que o rosto de Julie (Guilaine Londez) me lembrou Amy Winehouse... Meu primeiro filme da diretora Chantal Akerman.
O Chalé
3.3 723 Assista AgoraAssisti sem saber que era da dupla responsável por "Goodnight mommy", que ainda não assisti, mas que me foi bastante recomendado.
É um filme atmosférico, pesado no lado psicológico, e o que eu mais gostei foi o jeito que o roteiro joga com as diferentes possibilidades para explicar o que diabos está acontecendo ali:
Será que Grace está fazendo tudo durante seus episódios de sonambulismo? Ela tem dupla personalidade? Será que as crianças estão pregando uma peça nela? Será que tem mesmo uma presença sobrenatural na casa? Alguém do culto de Grace estaria fazendo aquilo? Eles morreram e estão no purgatório? Ou, minha solução preferida, o pai das crianças estaria por trás de tudo?...
Trilha sonora dá show, por ex. na cena em que eles estão dirigindo até o chalé, sobe um grave arrepiante! E a fotografia do Thimios Bakatakis? O mesmo cara que fez "O Sacrifício do Cervo Sagrado" (excelente trabalho); é agourenta, claustrofóbica, rica em luz natural, filmada em película, brinca com as proporções do chalé e da casa de bonecas... é mais um trabalho lindo desse ícone. Outra coisa que eu gosto é ser um filme de terror da Hammer, um estúdio tão clássico.
As referências a "Enigma de Outro Mundo" vão além da cena em que os personagens estão assistindo ao filme de John Carpenter, pois aqui também temos personagens isolados pela neve, acontecimentos estranhos, intriga do início ao fim... O que também remete a "O Iluminado". Mas acho que o filme mais imediato que "O Chalé" traz à mente, é "Hereditário", não só visualmente ou por ter elementos como o terror em decorrência do luto, tensões familiares e uma casa de bonecas... mas também por toda a forma como o roteiro é estruturado, e esse aspecto me incomodou um pouco, até porque o lançamento foi muito próximo um do outro para ser considerada uma coincidência ou uma referência. Ficou a sensação de algo meio derivativo mesmo.
O elenco tem só cinco atores praticamente, o que eu achei sensacional, porque em momento nenhum isso me ocorreu até os créditos subirem, não parece um filme "vazio" ou carente de mais elenco, todos preenchem a tela, muito competentes; Riley Keough é cativante e tem a voz de veludo herdada do avô, ninguém menos que Elvis Presley (fiquei passado) e sua personagem, Grace, carrega muito bem o filme com todas as suas nuances; Richard Armitage entrega a dubiedade que o personagem pede, tanto que fiquei desconfiado dele o filme todo,
sendo que após revelado o seu não-envolvimento no plano, só torna ele um péssimo pai, pois todas as suas decisões são péssimas;
Dados os pontos positivos e negativos do filme, não achei parado, nem previsível, nem anticlimático; tem uma direção competente, um visual belíssimo, é bem tenso, o roteiro tem furos (por que ela precisa esconder dele que está se medicando? Isso não faz sentido!) e deixa pontas soltas ou abertas à interpretação, dependendo do ponto de vista, o final poderia seguir caminhos mais instigantes dado todo o leque de "what ifs?" que ele abre, mas está longe de ser um filme ruim.
Sobrenatural: A Origem
3.1 728 Assista AgoraA dedicação e o entusiasmo da gangue de Leigh Whannell, James Wan, Oren Peli e Jason Blum em se revezarem para produzir, roteirizar, dirigir, atuar, bater claquete, passar cafezinho etc. nos filmes de terror uns dos outros nos últimos 20 anos é muito legal. Me dá aquela sensação de estar vendo um projeto despretensioso, feito entre amigos que têm ideias criativas para driblar orçamentos modestos e verdadeiro amor pelo gênero, mesmo trabalhando dentro de um contexto mercadológico.
Contudo, mesmo o melhor tipo de set para se fazer um filme do gênero, não necessariamente é garantia de render exemplares memoráveis como foram "Jogos Mortais", "Atividade Paranormal" ou "Invocação do mal", dos supracitados. Ainda mais quando estamos falando do terceiro filme de uma franquia, que geralmente é onde o trem começa a descarrilar.
Neste terceiro filme, a cadeira de diretor ficou vaga, uma vez que James Wan estava ocupado dirigindo "Velozes 8" (aqui ele é coprodutor e faz uma pontinha na cena do teste de atuação de Quinn); então Leigh Whannell, que volta a escrever e atuar, faz aqui sua estreia na direção.
Tendo crescido profissionalmente em Hollywood lado a lado com Wan e tendo escrito o ótimo "Jogos Mortais", Leigh Whannell claramente não é nenhum iniciante dentro da indústria, porém, sentar na cadeira de diretor aqui foi inédito para ele. Ele TEM boas ideias e executa bem seus sustos, como o do atropelamento, super eficaz e chocante; A longa sequência da câmera noturna no closet, em que Quinn quebra o gesso das pernas e quase termina em tragédia; e aquele momento da janela me fez literalmente pular do sofá gritando (e logo em seguida gargalhar alto da minha própria idiotice)! Mas talvez o acúmulo de funções tenha exigido um pouco demais de Whannell e o lado mais psicológico, atmosférico e creepy do terror não funcionou tão bem pra mim... Dá para resumir o filme naquele tipo de horror que é um jogo de esperar pelo próximo susto enquanto aturamos diálogos fracos.
Lin Shaye está de volta como Elise, cujo destaque central foi um dos maiores acertos deste irregular roteiro (e matá-la no primeiro filme foi a pior ideia), ela *É* a estrela da franquia e sua conexão emocional com a audiência, e não me admiraria se a decisão de fazer uma prequel ser totalmente para trazê-la de volta; Angus Sampson (olá moço) e o próprio Leigh Whannell, os caça-fantasmas dos filmes anteriores, que adicionam humor ao filme; E finalmente, Michael McKay, que já nos deu um dos maiores jump scares do cinema em "Se7en - Os Sete Crimes Capitais" como a vítima do pecado da "preguiça", faz aqui um trabalho razoável como "O Homem Que Não Consegue Respirar"... Entre as atuações menos impressionantes estão o pai e a filha que parecem um casting unicamente para trazer algum "star power" por imposição do estúdio: Dermot Mulroney faz um pai completamente desprovido de emoção num contexto que exigia justamente isso dele; é o tipo de ator que se acha bom demais para esse tipo de filme, fazendo o mínimo para receber seu cheque e meter o pé; Já Stephanie Scott (coitada) faz o que pode, mas sua Quinn é apagada, lembrando um clone pálido da Selena Gomez. Ou seja, claramente há atores 100% comprometidos com o projeto e outros que nem tanto assim. O que me pega aqui é a parceria de Leigh Whannell e Lin Shaye, muito parceiros.
Ainda sobre o roteiro e a direção, outros acertos de Whannell são as cenas em que olha para a solidão de Elise na ausência de seu marido e o momento com o fantasma da mãe de Quinn no clímax. Recorresse menos ao melodrama e melhor trabalhados, com foco maior no aspecto humano da história, esses temas sensíveis que o roteiro aborda, como traumas, perdas e luto poderiam funcionar ainda melhor. Por outro lado, Whannell consegue, como já disse, um bom equilíbrio entre humor e terror pela primeira vez na franquia, abandonando o ar pateta presente nos capítulos anteriores. Continuo não curtindo a mitologia do "The further", acho tudo meio cafooona demais, conceitualmente e na realização, mas temos aqui o melhor uso disto.
Por ser um "capítulo 3" que ainda por cima é uma prequel, o esperado a esta altura era já estar tudo esfarelando e que fosse muito pior do que de fato é, mas "Sobrenatural: A Origem" se virou bem sem os maiores nomes de seus antecessores (James Wan, Patrick Wilson e Rose Byrne) criando uma razão no roteiro para a ausência da família Lambert (a trama é anterior à sua introdução), Whannell injetou fôlego passando para a cadeira de diretor e manteve o nível da franquia, sendo uma boa diversão despretensiosa de shopping.
A Coisa
3.2 812 Assista AgoraÉ preciso muita coragem ou estupidez para aceitar fazer um remake do clássico cult "The Thing" de John Carpenter. Sendo justo, de todas as ideias ruins que poderiam ter surgido, fazer um prequel baseado nos eventos que ocorreram na base norueguesa que os personagens do filme de 1982 acham no início daquele filme, é um bom argumento e faz sentido. Mas daí a fazer um filme à altura daquele, é uma história completamente diferente.
O excesso de personagens sem profundidade e muito parecidos entre si, não ajuda, eu nem sei quem foi o homem branco que sobreviveu e correu atrás do cachorro no final (risos). Um monte de cientistas que tomam decisões nada científicas a partir do momento que levam o bloco de gelo com a criatura para a base, foi foda de engolir kkkk.
O destino do piloto americano do brinco poderia ter sido mais ambíguo e seria ótimo... mas também poderia ser pior. Então acho que foi positivo.
O mais frustrante é que o filme chegou a ter uma versão com efeitos práticos bem decentes - mais ou menos na pegada do que Rob Bottin e Stan Winston fizeram 29 anos antes - e um clímax que contava mais sobre a origem da 'coisa'; havia na nave várias espécies diferentes de aliens que foram assimilados pelo bicho, dando a entender que a espaçonave fora roubada pelo bicho e caiu na Terra... porém o estúdio não gostou e decidiu trocar tudo por um CGI inferior e aquele desfecho genérico naquela nave genérica.
Falta o suspense, o senso de paranoia, claustrofobia e a capacidade de síntese da versão oitentista, além dos efeitos especiais espetaculares e designs de monstro memoráveis. O filme tem como principal atenuante, o cuidado com os detalhes da história que estabelecem os eventos do filme clássico, demonstrando pelo menos certa reverência ao que Carpenter realizou.
Histórias Assustadoras para Contar no Escuro
3.1 551 Assista AgoraFilme de terror bem nota 7, baseado em um livro de sucesso dos anos 80 capitalizando sobre a tendência teen cheia de nostalgia de "Stranger Things", "It" e "Fear Street".
O elenco é ok, as histórias são assustadoras o bastante para o público PG13, têm algo creepy no tom delas, têm bons monstros com designs fiéis às artes do livro (obrigado Guillermo Del Toro), há riscos reais uma vez que os jovens morrem mesmo (pelo menos até o final deixar isso em aberto na esperança de uma continuação) e alguns efeitos práticos bons, mesmo que haja também bastante CG ruim.
Por sua natureza infantojuvenil, é compreensível a falta de mais gore nas cenas de matança, o que não curti é a explicação final para as histórias com a resolução do mistério, bem chocha.
Barbie
3.9 1,6K Assista AgoraO filme me divertiu muito com as constantes quebras de expectativa que ele propõe, desde a cena de abertura que satiriza "2001". As gargalhadas surgem principalmente com as piadas que a Mattel se permitiu ser alvo e o escárnio com os pilares frágeis que sustentam a masculinidade. A indicação de "I'm just Ken" a melhor canção original no Oscar parece certa, assim como as de melhor direção de arte, figurinos, melhor atriz para Margot Robbie e melhor diretora pra Greta Gerwig.
O elenco é quase um "who's who" da constelação em atividade atualmente (meu coração vai para Issa Rae e o trio de "Sex Education", Ncuti Gatwa - que estava TÃO lindo -, Connor Swindells e Emma Mackie, que só de contracenar com Margot Robbie já zerou aquele meme sobre elas serem idênticas) e foi muito legal ir reconhecendo ao longo do filme cada rosto.
Gostei de como balancearam as zoeiras à Mattel e suas contradições, como a administração majoritariamente masculina, piadas e fatos com a importância da boneca como um símbolo feminista ao longo da História, e como o espírito do tempo desta geração trouxe novas problemáticas a serem expostas. Aparentemente nenhum elogio ou ataque possível à Barbie como conceito foi deixado de fora, o que eu achei refrescante, e a forma como tudo isso foi costurado em uma trama exigiu habilidade. Tenho a impressão que o roteiro partiu desses pontos de vista e opiniões para só então construir o enredo, o que eu achei interessante.
Porém, não é um filme imune a críticas. Ryan Gosling faz um trabalho apenas ok como Ken, o que não chegou a prejudicar o personagem porque, enfim, é o que ele sempre serve, mas achei que poderia ter mais nuance. America Ferrera também não curti a atuação ou a personagem, a atriz não parecia conectada com aquele mundo como o roteiro pedia (algo que ficou bem evidente em entrevistas) e a personagem é uma chata. E não vejo graça no Will Ferrell e o núcleo dele com os executivos da Mattel, são bobos mas não engraçados. Algumas digressões do roteiro me perderam e o ritmo sofre para manter o momentum.
Talvez a campanha de marketing mais cara da História disfarçada de filme, talvez a comédia-produto mais relevante desta década, talvez a melhor versão de "feminism for dummies" já filmada, e certamente o último filme-evento de que tivemos notícia.
Perdeu uma estrela por não ter nem uma pontinha da Trixie Mattel, crime de homofobinha.
Crepúsculo dos Deuses
4.5 794 Assista AgoraUm filme que em 1950 teve a coragem de falar de Hollywood como essa máquina que mastiga e cospe fora seus astros, em uma época onde a imagem da "fábrica de sonhos" era vendida para o mundo como o cartão-postal do sonho americano, é muito visionário e metalinguístico. Há de se entender que em pleno clima de pós-guerra, expor assim as feridas que a transição do cinema mudo para o falado deixou na indústria, e os talentos que se viram sem espaço naquela nova lógica do mercado, como Norma Desmond, não era a imagem que os estúdios queriam passar.
Isso para não falar que uma atriz aos 50 anos sem trabalho era muito comum naquele tempo, enquanto atores homens tinham uma carreira muito mais longa. Pelo mesmo motivo que a relação de Norma com um homem mais jovem não era bem vista pela sociedade da época; porém, em se invertendo os papéis, isso era percebido com naturalidade - como acontece até hoje. Não à toa, a história do jovem roteirista com problemas financeiros que acaba na mansão da atriz rica de meia idade reclusa, ávida por um retorno às telas, e que enxergam a própria salvação um no outro, culminando em um affair fatal, soava tão possível e é considerado o primeiro a apresentar tropos do que viria a ser conhecido como "hagsploitation" (gênero que explorava a figura de mulheres mais velhas como megeras decrépitas e psicóticas); ao mesmo tempo que usa elementos do film noir, como a narração em off e a tragédia do narrador.
Há um elemento de melancolia real de estrelas descartadas que permeia todo o filme, como na sequência em que Norma Desmond faz uma visita aos estúdios da sua antiga "casa", a Paramount; ao ser barrada nos portões, Desmond brada que sem ela, nada daquilo existiria, e Gloria Swanson não mentiu, pois já foi o maior nome da produtora; Também está presente na figura do mordomo Max, interpretado por Erich von Stroheim, cuja história de ter sido um diretor de filmes mudos também é inspirada em sua vida; e em participações como a do astro Buster Keaton. É uma carta de amor e também uma nota de repúdio ao cinema.
Para ser justo, Norma é uma diva cheia de caprichos e exigências, e não seria errado deduzir que parte de sua derrocada artística tenha se devido ao seu próprio gênio e teimosia em se adaptar à nova tecnologia, já que ela demonstra aversão aos filmes falados. Não por acaso, a atuação de Gloria Swanson beira o exagero, com seus olhos arregalados e muita expressão corporal; uma vez que atriz e personagem são formadas pelo cinema mudo, faz todo sentido. Outro eco da história de Desmond que existe em Swanson: o filme que vemos junto com Norma e Joe em seu projetor, é um filme real de Gloria dirigido por von Stroheim (Max) em seu auge. E sua cena vestida como Chaplin é uma recordação carinhosa do mestre símbolo daquela era, mas também algo que Swanson fazia no início da carreira.
William Holden está bem como Joe Gillis, sua atuação é econômica, mas repleta de nuances; ele não é um golpista, mas a situação que se apresenta diante dele, cai como uma luva para resolver todos os seus problemas, um caso clássico de "a ocasião faz o ladrão". Logo ele percebe que está envolto em uma teia de dependência emocional e mentiras, se questiona ainda mais quando vai se aproximando da aspirante a roteirista Betty Schaefer, e toma a decisão que julga moralmente correta, mas infelizmente é tarde demais. Billy Wilder sabia o que estava fazendo quando rodou aquela cena dele de traje de banho na piscina...
A forma como a direção de arte ajuda a contar a história é brilhante: objetos de cena como o órgão tocado por Max; os porta-retratos de Norma mais jovem; o roteiro de "Salomé" escrito por ela e editado por Joe; a arma que termina sendo determinante na história; a cigarreira que Joe ganha dela no ano novo; e o próprio carro dele que é o pontapé inicial da história - todos esses 'props' são usados narrativamente de uma forma muito eficaz por Wilder.
Detalhes que eu curti também são a chegada de Joe na mansão meio gótica e aquela dinâmica inicial onde a figura "decadente" não permite que ele saia, remete a "Drácula"; e o plot twist de Max revelando que não só foi o diretor do primeiro filme de Norma, mas também seu marido! Excelente controle narrativo.
E por último, os diálogos são um deleite, desde a narração em off de Joe, que estabelece o tom, descreve personagens com seu olhar enviesado e acrescenta leves toques cômicos, fazendo dele um narrador nada confiável; Suas cenas com a bela Betty Schaefer têm uma dinâmica leve, ela está decidida a trabalhar com Joe, e ele aos poucos vai se rendendo a ela... Mas é Norma quem tem as falas mais memoráveis do filme – Wilder e cia. criaram tantos diálogos icônicos: "I AM big. It's the PICTURES that got small" é a minha favorita; e a descida das escadas, onde ela quebra a quarta parede falando das "pessoas no escuro" referindo-se à plateia e vem em direção à câmera para o fade out... é simplesmente assombroso.
Esse filme foi um dos que, na minha opinião, fez jus à fama que carrega e entregou tudo que eu nem sabia que precisava: é divertido, envolvente, bem escrito, bem dirigido, tem um elenco fabuloso, cheio de metalinguagem e easter eggs.
O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei
4.5 1,8K Assista AgoraFrodo, eu te odeio, seu verme egoísta; Sam, para de ser cadelinha desse hetero, ele não vai te comer; Gollum tenho zero penas, teve o que mereceu, trabalho esplêndido de Andy Serkis porém; Miranda Otto como Éowyn melhor personagem, uma das únicas três mulheres com fala de toda a trilogia, inventora do feminismo; Legolas fez muito menos nesses filmes do que sua fama vendia e tem menos screentime que o rei chato que morreu debaixo do cavalo; Aragorn, um homem que não tem piru em um universo onde ninguém transa; Gandalf ganha pontos por ser a bicha fabulosa que é o Ian McKellen yaaass kween!
É esse que haviam me dito há vinte anos que era o melhor dos três, really?... A história é toda uma borefest, é brega, quando Peter Jackson dirigiu isso, o plot já estava velho e rançoso, "História Sem Fim" fez tudo isso aqui e melhor vinte anos antes, "Ah, mas Tolkien criou os tropos", palmas para ele, mestre. Mas todo mundo que seguiu no seu rastro fez melhor, até "A Lenda" com Tom Cruise, que tá no mesmo nível narrativo, só que tem a decência de ser mais curto. Meu veredito é: um grande surto coletivo.
O Senhor dos Anéis: As Duas Torres
4.4 1,1K Assista AgoraÚnica cena digna de nota foi a batalha das árvores Ent, quando solta a água é catártico, lindamente filmada e montada, lembrou aqueles filmes de monstro gigante dos anos 50. Só tinha assistido até este aqui nos anos 2000 e segue sendo o que mais me agradou na trilogia, mas aihn... que filme chato gente.
Top Gun: Maverick
4.1 1,1K Assista AgoraHmmm não sei se achei tão melhor assim que o primeiro filme. Certamente que o conflito entre Maverick e Rooster cria uma tensão movida a mágoa, culpa e um desejo reprimido de se conectar, que é interessante... O elenco atualizado para 2022 tem mais cara de mundo real... Jon Hamm e Ed Harris no elenco como contrapontos masculinos à figura narcisista de Tom me parece correto... A cena entre Maverick e Iceman, com todo o contexto da doença de Val Kilmer, tendo em mente que nenhum dos dois queria realmente fazer o "Top Gun" original e agora se reconectam neste aqui quase 40 anos depois é carregada de significado, mas a direção de Joseph Kosinski falha em canalizar essa emoção... As cenas aéreas são indiscutivelmente superiores aos takes soltos do filme de 1986, a clareza da decupagem aqui é estupenda... Mas a cena inicial com os caças na pista para decolar carece do charme e do talento de Tony Scott para criar aquelas silhuetas contra o céu em chamas... Não tem nada de errado com o filme, entretanto ele não me conquistou como seu antecessor.
O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel
4.4 1,9K Assista AgoraAssim como da primeira vez que assisti, há cerca de vinte anos, achei chato, longo, sem uma única fala memorável ou cena empolgante, os personagens não me cativam, a construção de universo não me impressiona, e assistí-lo foi como um dever de casa que eu queria muito terminar. Uma estrela pelas trucagens de câmera, brincadeiras com proporções e perspectiva, que são impecáveis; principal legado desse filme.
Na Mente do Demônio
1.7 63 Assista Agora- Neill Blomkamp ("Distrito 9") escreve e dirige este filme que parte de uma premissa insólita envolvendo tecnologia e sobrenatural através de simulações virtuais para investigar casos de possessão demoníaca; que me impressionou pelo bom aproveitamento do budget de ridículos US$1,5 mi – os efeitos visuais são pontuais e satisfatórios –; Na escalação do elenco, que é competente em estabelecer uma ligação emocional entre os personagens, sobretudo a relação de mãe e filha, cuja química era essencial para o filme funcionar; E que também me agradou pela escrita funcional de Blomkamp; os diálogos são claros, sem encheção de linguiça e ele se permite viajar nesta trama algo camp onde o Vaticano usa padres-soldados e a tecnologia para exterminar demônios (o timing para esta informação ser revelada para o espectador foi bem eficaz). Nada inovador, pois ainda recorre a clichês sempre que julga necessário, mas existe algo de fresh na abordagem do tema.
- O que eu não gosto nem um pouco é do design do bicho. Não causa nenhum tipo de medo ou arrepio, pois ninguém tem medo de um homem com cabeça de pássaro. Também faltou gore aqui.
- A direção faz boas escolhas no geral, especialmente considerando que foi rodado durante a pandemia da covid-19, e extrai boas atuações do elenco, com ações e reações plausíveis diante das situações que se apresentam. É um esforço criativo que tem seus méritos dentro de um subgênero do terror, mas que deixa a constante impressão que funcionaria muito melhor como um curta.
Missão: Impossível 3
3.4 513 Assista AgoraEsse filme nunca falha em me dar uma injeção de adrenalina com apenas 3 minutos de projeção, não importa quantas vezes eu assista. A eficácia dessa cena 'in medias res' é espantosa porque ela faz um monte de coisa num espaço de tempo ridículo: apresenta um vilão que não está para brincadeira na forma do hipertalentoso Philip Seymour Hoffman; mostra Ethan Hunt mais vulnerável e impotente do que nunca; Tem a melhor atuação do Tom Cruise na franquia até então, passando por todos os estágios do luto a cada número da contagem regressiva; estabelece que o negócio agora é muito mais sério, com o presumido assassinato da mocinha; e espalha várias pistas do que está por vir na história de forma bem sucinta, com diálogos como "Eu implantei uma carga explosiva na sua cabeça. Soa familiar?"; "Ah, como você me ajudou no avião? Daquele jeito?"; "Mas... eu já te dei o pé de coelho", etc... Então, quando chegamos nesses pontos narrativos e essas peças vão se encaixando no quebra-cabeça, a gente já prende a respiração, porque como é dito a certa altura: "Isto é adrenalina. Você vai sentir isso". E. COMO. ESSE. FILME. ENTREGA. É o primeiro - e o melhor - longa co-escrito e dirigido por J.J. Abrams.
Gosto deste elenco também, Tom Cruise nos dá a melhor encarnação de Ethan Hunt até aqui, pois seu vínculo emocional com a Julia de Michelle Monaghan é bem construído, eles são um casal bem mais cativante que o par do filme anterior; Ving Rhames tem um merecido desenvolvimento em sua relação com Hunt; Keri Russell tem poucas cenas, mas sua personagem é marcante demais; Jonathan Rhys-Meyers e Maggie Q sendo lindos; Laurence Fishburne tem ambiguidade e boas falas; Simon Pegg é introduzido como o recorrente Benji; Aaron Paul logo antes da calvície antigí-lo em cheio... Não gosto do Billy Crudup em geral, mas aqui ele tem um papel que me pegou. Mas sem dúvida, o rosto desse filme é o do saudoso Philip Seymour Hoffman, o homem faz *O* melhor vilão da franquia com sua interpretação magistral de Owen Davian, o jeito que ele pega falas potencialmente bregas e dá a elas um ar realmente ameaçador é coisa de artesão. Ele é focado, ele é frio, é totalmente blasé, mas também sobe o tom quando preciso, ele é imprevisível, ele sempre parece ter a vantagem sobre Ethan. Minha cena preferida é a do avião, tem algo da dinâmica Batman/Coringa de "The Dark Knight", sendo que este veio antes. Cara, como Seymour Hoffman faz falta! Ele era um dos grandes. E se este filme tem um defeito é não ter cenas suficientes com ele.
O estilo de direção de J.J. Abrams era, para mim, o que havia de mais maneiro nos anos 2000: muito contraste, muita saturação, pouca profundidade de campo nos planos médios, uns flare e uma granulação bonita, montagem fluida, a câmera na mão aqui serve ao propósito de dar o senso de realismo e urgência que Abrams introduziu é que ajudou a revitalizar "M: I".. Isso daqui é o puro suco!
Também me agradou a forma que as máscaras são usadas neste aqui, muito mais pontualmente e com máximo impacto em ambas as cenas. Mostrar também como elas eram feitas e como funcionavam efetivamente foi outro acerto, já que o conceito de impressora 3D ainda não era tão presente no cotidiano das pessoas.
Outra coisa que é divertida é ficar pegando os easter eggs de "filme do Tom Cruise": a clássica cena dele bonitão andando de moto, as corridinhas, o início da sua busca por mais realismo com stunts perigosos; além dos callbacks aos anteriores, sempre acrescentando algo de fresh, a descida clássica pelo cabo é precedida por uma inédita subida caminhando pela parede; a festa de gala aqui é muito mais movimentada, tensa e legal que a do primeiro; tem uma rápida cena no poço do elevador recordando a cena que matou o agente do 1...
No filme de John Woo, Ethan era mais um super-herói que resolvia tudo praticamente sozinho e neste aqui, a equipe volta com uma participação maior, o que eu prefiro, pois dá mais dinamismo e tensão às sequências. E é sequência foda após sequência foda, o ritmo nunca cai! Só para pontuar algumas, ele entrega aquela abertura eletrizante, o resgate de Lindsey, a invasão ao Vaticano e a festa da captura de Davian, a cena do avião, onde Seymour Hoffman brilha demaais, o ataque e resgate de Davian na ponte (principal set piece do filme), o roubo do pé-de-coelho em Xangai, aí temos o clímax da abertura resolvido, que eu acho divertido, mesmo que muita gente ache anticlimático... Todas funcionam.
Há de se contextualizar que se hoje o que manda são franquias intermináveis e multiversos de heróis, nos idos de 2006, as trilogias é que eram a tendência do mercado e eram o que vendiam box de DVDs, "Matrix", "O Senhor Dos Anéis", "X-men"... Sem contar que Tom Cruise estava com a popularidade em baixa depois de se tornar o maior símbolo da cientologia, pular no sofá da Oprah e ser alvo de inúmeras chacotas, o que até afetou a bilheteria baixa do filme. Então, um quarto filme não fazia sentido naquele zeitgeist, este filme era para ser a homenagem-tributo ao legado da franquia que encerraria (em tese, pois óbvio que o dinheiro fala), logo,
Ethan Hunt morrendo aqui era algo que causava um certo impacto.
Nick & Norah: Uma Noite de Amor e Música
3.5 847Um filme onde Michael Cera (cuja comédia física baseada em apenas existir nunca falha) é o cara que faz as gatas do colégio brigarem por ele, e que dá a Kat Dennings seu primeiro orgasmo, só não consegue ser mais inverossímil do que Dennings, que tem charme e beleza de sobra, dizendo que não se acha tão bonita ou cool suficiente para ele. Para o Michael Cera.
Esta comédia romântica não funciona por outros motivos além desses; a jornada noite de adentro é até simpática, mas o filme sofre de um plot extremamente previsível; a direção não tem personalidade nenhuma e parece não entender o star quality dos seus protagonistas; As situações em que eles são colocados não têm o apelo cômico que seus idealizadores acreditam, exceto por um único 'prop', uma certa goma de mascar, que tem o melhor arco e garante os melhores momentos da fita. Tivessem feito um filme sobre a jornada daquele chiclete, seria muito melhor. Cameos legais de Andy Samberg, Seth Meyers, Mimi Imfurst, Billy Griffith e Jay Baruchel.
Zohan: O Agente Bom de Corte
2.5 957 Assista AgoraDado o panorama mundial atual, acho que demorou até demais para a HBO Max anunciar que retirará de seu catálogo no final de Jan/2024 esta comédia besteirol produzida e estrelada por Adam Sandler, sobre um soldado de elite israelense que forja a própria morte para seguir seu sonho de ser cabeleireiro nos EUA.
Como todo bom besteirol, ou você embarca na palhaçada, ou acha tudo forçado, ridículo e até ofensivo. Eu me diverti, dei risada, curti os cameos de Chris Rock e Mariah Carey, confundi a Emmanuelle Chriqui com Nina Dobrev (idêntica) e tentei olhar com bons olhos a leveza com que o filme aborda as diferenças entre os dois povos; pelo bem da comédia e porque em 2008, o mundo era outro.